quarta-feira, 30 de abril de 2014

cigarros do nada


havia em ti pérolas de naftalina
eu pensava que o mar era só meu
e o egoísmo alimentava-me e fazia com que as minhas asas de amanhecer...
ardessem
como o cigarro que fumo e suspenso na janela com vista para os patamares do Douro
o rio entranhava-se em pedacinhos de dor
sofrimento
e algumas lágrimas invisíveis... poucas... voavam como gaivotas sem nome
descubro o amor numa solitária videira
a paixão numa triste pedra em granito... perdida na rua
à espera do silêncio na esquina sem transeuntes
e oiço as palmeiras com sombras de doirado anoitecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 30 de Abril de 2014

terça-feira, 29 de abril de 2014

nem amar... apareces


apareces
desapareces
submerges como se fosses um beijo cansado
esquecido nos lábios de uma flor...
a manhã em construção
uma mão na face clandestina do olhar
não és Lua
noite
nem amar...
Apareces
desapareces
nos sonhos silêncio do mar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 29 de Abril de 2014

segunda-feira, 28 de abril de 2014

acordar


trazes no peito o peso da madrugada
as sílabas cansadas do amanhecer
trazes na mão a velha enxada...
e ao pescoço
o silêncio da alvorada
trazes no peito a mágoa do alicerce invisível
e os fios de luz
em pergaminhos agrestes com odor a limão
trazes a solidão
e as cartas esquecidas na gaveta da lareira...
e hoje
hoje nada acorda de ti que se entranhe em mim...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 28 de Abril de 2014

domingo, 27 de abril de 2014

prisioneiros do Céu


há um xisto vestido de tristeza
uma nuvem sangrenta poisada em ti
árvore sonolenta
magoada
jardim descalço
jardim... jardim filho da madrugada

há um rio perdido na calçada
esperando a tua mão
há um rio dentro de ti
correndo
correndo... correndo nas tuas veias de solidão
e gritando e gritando...

há um xisto no muro onde me sento
e te espero
dou-me conta que hoje não há o rio dentro de ti
que tens lágrimas
que... que danças no jardim
magoada no jardim descalço...

adormeço
sonho com fios de nylon aprisionando o Céu
que tens estrelas no olhar
e flores
flores na tua doce boca de jasmim
há um xisto... de tristeza... há um xisto dentro de mim.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 27 de Abril de 2014

cais do adormecer

no seu término o dia mistura-se com as sombras do prazer
o teu corpo mergulha sobre o meu peito flácido
quase a adormecer
lá fora há poemas por escrever
palavras vagabundas correndo junto ao Tejo
folheio as pequenas páginas dos teus seios
descubro o significado de “Amor”...
e sinto a paixão a entranhar-se nos meus ombros

há silêncios a descer a tua pele de doirado sémen
que acabam por morrer
semeiam-se nos límpidos lençóis de seda
como jangadas esquecidas em Cais do Sodré...
afinal... o sonho são as pequenas páginas dos teus seios
à janela do “Adeus”
simplesmente inventando soníferos de cartão
e livros a arder

há em ti um púbis construído de andorinhas
e flores de papel
e no seu término...
o dia... o dia cansado de viver
como se o teu corpo embrulhado nos meus braços de aço laminado
adormecesse vivesse amasse e morresse
e descubro o significado de “Amor”...
e de ser “amado”.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 27 de Abril de 2014




sombras


há silêncio nos teus lábios
pequenos beijos envenenados pela paixão
palavras dispersas
palavras sem canção
há matemática no teu olhar
equações trigonométricas nos teus braços
há silêncios...
e pedacinhos panos com sabor a saudade
disfarçados de madrugada
há barcos fantasma na tua mão Oceano
e sombras e sombras... e sombras que a noite vomita
e alimentam o teu sonho


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 27 de Abril de 2014

sábado, 26 de abril de 2014

palavras não lidas


do centro da galáxia chega a mim a voz rouca da solidão
traço rectas no corpo da Lua
desenho corações na ofuscada luz da paixão
do centro da galáxia...
um fio de saudade que se alicerça aos meus braços
e me pede
e me obriga
… a escrever palavras não lidas


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 26 de Abril de 2014
Sem comentários.

três velhos dias


mais um Sábado...
procuro a equação tangente à parábola da insónia
hesito
fico confuso
da rua oiço as luzes em néon adormecido
cansadas
e hesito
fico confuso
mais um Sábado...
sem horário
janelas com vista para o mar
hesito...

um dia
dois dias
… três velhos dias

hesito...
e fico confuso
procuro o cosseno hiperbólico do cansaço
calculo a integral tripla do amor
raios...
não o consigo
rasgo
destruo a folha quadriculada
tão velha
tão... infeliz como as luzes em néon adormecido...
um dia
ontem... ontem tu eras capaz

um dia
dois dias
… três velhos dias.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 26 de Abril de 2014

rosas tuas mãos


as rosas tuas mãos em decomposição
sinto-lhes o perfume de palavras em construção
o poema evapora-se no corpo nu da madrugada
dizem-me que deixaste de olhar o amanhecer
que... hoje és apenas uma árvore
sem folhas
sem... as rosas tuas mãos em decomposição
esperando que venha o rio e com ele o silêncio das lágrimas embainhadas no Luar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 26 de Abril de 2014

sexta-feira, 25 de abril de 2014

as palavras de solidão


imagino-te submersa em palavras de solidão
imagino-te vestida de poesia
de cravo na mão
imagino-te livre
nua
imaginar...
a madrugada sem nome
voando sob a cidade dos xistos embriagados
e há um rio em silêncio
um rio... um rio apaixonado
imagino-te deitada na areia pálida do Mussulo
escrevendo as palavras de solidão

no meu corpo
em mim
em construção

imagino-te com asas em papel amarrotado
escrito
rasgado no centro geométrico
rodando
brincando junto aos coqueiros imaginados
imagino-te de lábios desenhados
no muro da insónia
e sonhas
sonhando...
que te imagino submersa em palavras de solidão
e há uma varanda com cortinados de paixão
e há uma canção que acorda em ti... que te imagino submersa... solidão

no meu corpo
em mim
em construção.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 25 de Abril de 2014

viver não vivendo


vivo fingindo viver
procurando o que já morreu
inventando palavras que nunca tive a coragem de escrever
vivo esperando o amanhecer
que da madrugada cresçam lábios de cereja
e pedacinhos de papel com barquinhos desenhados
vivo debaixo da sanzala encarnada
olho o Sol e sinto a tua pele misturada com imaginados sorrisos
de prata
cachimbos mergulham e acreditam que
vivendo fingindo viver...
um dia

um dia vou regressar ao quintal recheado de mangueiras
com sombras estrelares
fingindo
correndo...
amando os velhos telhados de luz
como amo o fingimento de fingir que vivo

vivo fingindo viver
nesta jangada de silêncio
com velas de pano
viver viver viver...
não sabendo o significado do amor
amando fingindo que amo
sou um marinheiro esquecido no Oceano
procurando
inventando...
dormindo nas esplanadas que habitam no Tejo
recordando muros amarelos
porque fingindo viver... não vivo... não vivo esta vida de corpos em mármore.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 25 de Abril de 2014

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Hoje


Hoje sinto a falta da cor dos teus lábios,
do silêncio do teu olhar,
hoje sinto a falta do inseminado teu sorriso,
do pergaminho teu corpo...
escrito,
nu...
hoje sinto a falta do teu cabelo disfarçado de jardim,
sentado sobre uma lápide de saudade,
olhando o mar...
sonhando,
porque hoje...
hoje sinto a falta dos teus braços.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 24 de Abril de 2014

quarta-feira, 23 de abril de 2014

“Livro”


Porque te chamo de “Livro”...
se tu és um extenso areal,
de pele húmida,
e seios doirados?
Vives em frente à Baía de Luanda,
e escrevo no teu corpo palavras,
palavras que o Oceano me rouba,
como me roubou a infância,
me prometeu... sim, que um dia eu ia regressar...
Eu... eu regressar às tuas páginas esbranquiçadas,
anónimas como eu... corpo nu enfeitado com janelas de porcelana,
“Livro”...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 23 de Abril de 2014

terça-feira, 22 de abril de 2014

a claridade da saudade


não me recordo
esqueci a palavra mágica para ter acesso ao teu coração de navegante
perdi-me na insónia
e acordei na ilha teu corpo desnudo
fatigante
como estrelas em morte por asfixia
não me recordo
não sei como se escreve a palavra “amor”...
esqueci
e deambulo na rua com candeeiros de solidão
naquela cidade onde habitavam fotografias doentes
tão doentes que apenas se deslumbravam nelas a claridade da saudade

o relógio que vivia na torre da Igreja morreu
como morreram todos os Sábados da minha alma
não me recordo
da Primavera
de como regressei
do mar
e da paixão das gaivotas em cio
não me recordo
de quando ainda tínhamos silêncio
e jangadas envenenadas pelos muros do desespero...
recordo-me de recordar beijos
e sinto o odor dos lábios em pequenas tempestades de desejo.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 22 de Abril de 2014

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Luar


Hoje, tu, não estavas,
provavelmente tinhas partido, sem uma carta de despedida, sem um desenho esquecido na parede do quarto,
percebi que os nossos lençóis não tinham o teu perfume,
olhei o espelho do guarda-fato... e apenas uma poeira de néon, nada mais...
o teu rosto das noites imaginárias tinha voado,
abri a janela... e pareceu-me ver o teu corpo naufragado, sem voz, sem pétalas azuis,
hoje, tu, hoje tu não estavas,
e o meu relógio de pulso não cessou de girar... girar, girar... como eu, em volta do Luar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 21 de Abril de 2014

domingo, 20 de abril de 2014

fui...


fui...
nos pedacinhos invisíveis da lanterna da solidão
fui percorrendo todos os corações de areia que habitam no teu peito
fui...
fui... fui o regresso adiado

fui...
marinheiro envenenado pela escuridão da insónia
saltei a janela que aprisionava os meus braços
fui...
fui sem saber que um dia deixaria de ter mãos

fui...
fui um dia de chuva miudinha
sentei-me sem saber que existiam esconderijos disfarçados de manhã
fui...
fui... fui um emaranhado de lágrimas esperando o amanhecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 20 de Abril de 2014

olhos de naftaleno...


a espuma em pálpebras de cianeto
o relógio suspenso entre o sono e a madrugada construída de esferas metálicas
a chuva miudinha entranha-se no corpo da serpente de chapa
enrola-se na sinfonia do teu olhar...
e descansa
dorme
e sonha com as sandálias do amanhecer
eu procuro-te na imensidão da escuridão nocturna do perfume

tu disfarçada de árvore e apenas em ti poisam gaivotas ensonadas
a espuma embainha-se nos teus seios floridos
há palavras inaudíveis no teu sorriso
há cansaços desgovernados vestidos de barcos
prostitutas com coração de marinheiro
e candeeiros em braços de lentidão
o amor fuma cigarros com poemas de cartão
e tu pareces a ponte iluminada da paixão

o amor é uma parvoíce
como todos os poemas que escrevo
como todas as palavras que grito...
a espuma é o teu corpo em pedaços de retracto
imagens simples
tristes
o amor é a noite desconexa
com olhos de naftaleno...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 20 de Abril de 2014

sábado, 19 de abril de 2014

prisões de vento


não percebo a prisão de vento que são os teus braços
quero voar... e não consigo subir à árvore do teu sorriso
planar no teu silêncio
não percebo as andorinhas do teu cabelo
parecem tristes
parecem aquilo que sou quando cessam todas as luzes

não percebo porque sou obrigado a sonhar
quando deveria navegar sobre um Oceano de insónia
não percebo as nuvens cinzentas das montanhas abandonadas
sem vida
sem... sem madrugadas
afinal... nada percebo e nada sei a teu respeito

percebo que vives
percebo que morrerás sem perceberes que eu já percebi... que aquela montanha é apenas uma sombra de olhos cerrados
não percebo os cigarros que vivem como se fossem palavras
palavras que se escrevem em ti
e de palavras será construída a tua lápide
quando acordar o Sol e eu talvez sentado sobre um pedaço de xisto esperando que acordes

não percebo a ausência dos calendários sem janelas
as ruas parecendo um jardim vestido de nus obscuros sons
um baterista esquecido num coreto de aldeia
e tu moves-te como se fosses um pedestal pesadíssimo
granítico
ignóbil cansaço nos teus braços que são uma prisão de vento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 19 de Abril de 2014

se o teu corpo falasse


se o teu corpo fosse apenas uma palavra
uma flor solitária no jardim dos jasmins
uma estátua sem nome
sexo
ou idade...
se o teu corpo fosse a noite enfeitada com lantejoulas e alecrim
desconexo melódico das músicas sem anoitecer
conforme os sonhos da insónia
se o teu corpo fosse uma guitarra
uma bateria prisioneira num quinto andar com janelas para o Tejo...
um cacilheiro em combustão
procurando poemas

inventando livros nas mãos do silêncio
se o teu corpo fosse uma sinfonia de fotografias a preto-e-branco
nua
sexo
ou idade...
se o teu corpo habitasse na ponte do incenso
mergulhada na tristeza de um olhar pintado de verde
nua
sexo
ou... idade
se o teu corpo fosse um livro de ler
a lareira do Inverno recordando a saudade...

se o teu corpo existisse
tivesse vida como a vida das minhas personagens
se ele me dissesse que me amava
se o teu corpo fosse a jangada
a livraria enfeitada com o pó envenenado das sanzalas perdidas no Oceano...
nua
sexo
ou... idade
se o teu corpo falasse
gritasse
- eu estou apaixonada...
e eu acorrentava-me ao teu corpo com o nome de “palavra”...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 19 de Abril de 2014

sexta-feira, 18 de abril de 2014

candeeiros com braços de prata


quatro bancos em madeira
um jardim em desassossego
três árvores
… duas belas mulheres
uma Primavera
com plátanos de brincar
quatro bancos em madeira
dois corpos em translação
quatro seios em rotação
… e duas belas mulheres
duas mulheres em solidão
quatro bancos em madeira e uma gaivota em papel

um barco com pálpebras de chocolate
um marinheiro vestido de vampiro
duas belas mulheres
e quatro bancos em madeira
percebem na insónia a sinfonia dos candeeiros com braços de prata
um jardim em desassossego
um Oceano desgostoso
triste...
tão triste como os fios de nylon que aprisionam o sexo dos pássaros
uma Primavera inventada pelo poeta dos farrapos amanhecer
senta-se nos quatro bancos em madeira...
… acaricia as duas belas mulheres e as três árvores


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 18 de Abril de 2014

Noites embriagadas


A bateria balança sobre o palco da tempestade
o baterista entra-se no meu silêncio
e absorve-me,
os sons melódicos do Jazz correm nas minhas veias desconexas
há marinheiros na minha mão que procuram o Oceano da loucura
e absorvem-me,
e sinto-os como se fossem a Primavera
correndo
caminhando sobre a límpida areia de veludo,

A música acorrenta-se aos meus braços de porcelana
choram as cordas da guitarra friorenta dentro de um cubículo sem janelas
e eu, eu transformo-me em palavras,
há poemas no meu peito com sabor a clandestinidade
beijos em pergaminhos que sobejaram da saudade...
e absorvem-me...
pequenas réstias de limalhas de aço
brincam nos meus sonhos...
e absorvem-me,

A bateria não se cansa dos meus fantasmas
o baterista suspenso no arame de papel que constrói a madurada
e absorvem-me as sonoras lágrimas da manhã,
sei que no teu rosto de madeira habitam fotografias a preto-e-branco
e outros suspiro sem nome,
homens desejando a morte
e a morte que não cessa de gritar...
absorvo-te enquanto desenhas nos seios da literatura sons geométricos das noites embriagadas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 18 de Abril de 2014

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor


os tentáculos do meu sonho


oiço os tentáculos do meu sonho
quase que lhes toco
acaricio-os como se fossem o rosto negro da mulher com asas de saudade
converso com eles... mas existe um cortinado de estanho que ofusca o fumo da solidão
sei que do outro lado do cortinado vives e tentas agarrar-me
mas eu voo sobre os telhados de vidro que tens no teu cabelo
oiço-os
quase que lhes toco...
e acordo e percebo que apenas há noite e pedacinhos de sombra acorrentando o meu corpo...
sou ou não sou um corpo navegante?
um corpo... em busca do cais do sossego
oiço-os e toco-lhes oiço-os e toco-lhes oiço-os e toco-lhes


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 17 de Abril de 2014

quarta-feira, 16 de abril de 2014

corrente em aço


porque choram as pedras entranhadas na pele da tua mão?
pergunto-me e não percebo porque há círculos com olhos verdes,
quadrados com sorriso de gaivota sem nome,
pergunto-me...
porque existe no teu pulso a corrente em aço,
a dor, o sacrifício de um simples abraço,
porque escreves o teu poema nos meus olhos,
se eu,
cego... não o consigo ler,
gritas-me e sussurras-me palavras...
e eu, eu não as quero ouvir,
porque tenho a certeza que choram as pedras entranhadas na pele da tua mão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 16 de Abril de 2014

terça-feira, 15 de abril de 2014

sonhos com sabor a papel...


nos teus lábios habita o solstício da paixão
sinto o odor cansado do teu cabelo voando sobre as sombras da solidão
há lágrimas no teu sorriso
há insónia na tua noite construída de trapos e cortinados negros
e dos teus olhos
o silêncio das caricias desenhadas pela mão de um coração
sinto-o
e oiço-o
como os sonhos que vivem dentro de mim
nos teus lábios habita o sofrimento envenenado
e lá fora alguém grita o teu nome
sons metálicos cambaleando sobre a dor
traços
triângulos
círculos com olhos verdes
nos teus lábios a imagem da criança em pequenas viagens
espera pelo machimbombo
um homem puxa-o com um cordel imaginário
e de rua em rua
e de casa em casa
leva mangas e cacimbo e capim
tem nas mãos a dócil fotografia de uma cidade perdida
o mar alicerça-se às pernas do menino...
a criança vê nos zincos telhados outros meninos
meninas
e sonhos como os dele...
sonhos com sabor a papel...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 15 de Abril de 2014

segunda-feira, 14 de abril de 2014

a gaja das pernas altas


a gaja das pernas altas
é uma chata
a gaja parece um morcego vestido de noite
uma lanterna embriagada procurando imbecis
ruas
portas
e janelas sem número de polícia
a gaja das pernas altas
é uma chata
pinta os lábios de amanhecer
dá beijos com sabor a madrugada
a gaja é perfeita

ruas
portas
janelas
e dos cabelos da gaja das pernas altas...

crescem... crescem algas envenenadas
flores
árvores secas
e... e pássaros moribundos
morrem
cinzas
e a gaja das pernas altas...
... é uma chata


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 14 de Abril de 2014

domingo, 13 de abril de 2014

desejar


desejo-te na saliva noite do amanhecer
perguntas-me se hoje é Domingo...
e eu, e eu não sei responder
ignoro o calendário e todos os horários que brotam do teu cinzento corpo
sou uma sombra que voa dentro de ti
noite
noite embriagada que embrulha o teu olhar
desejo-te... e canso-me de te desejar


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 13 de Abril de 2014

sábado, 12 de abril de 2014

Quintal de prata


Inseminas-te nos meus braços,
beijas-me,
desenhas no meu corpo traços,
círculos, quadrados, estrelas à janela das pálpebras cansadas,
inseminas-te e beijas-me...
como se eu fosse a árvore do teu quintal de prata.

Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 12 de Abril de 2014

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Em combustão


Viajo pelos cinzeiros envenenados das manhãs de Primavera,
sinto a sombra deles impregnada na minha janela,
oiço-os e vejo-os nas palmeiras do quintal contíguo ao meu,
a manhã levanta-se e começa a cambalear nas tuas mãos de desejo adormecido,
viajo e sei que existem pálpebras encharcadas na neblina inventada,
à lápide o teu retrato, à lápide... o teu nome reescrito e escrito pelas estrelas da saudade,
sou um cadáver imaginário que habita na loucura,
corredores sem portas,
e tectos...
tectos descendo até não poderem mais,
cansados,
tão cansados que pedem licença ao rodapé...

(por favor... ajudem-nos)

e o rodapé de livro na mão...

(quero lá saber... do pavimento não passarão)

viajo dentro dos teus fluidos depois de te levantares do meu corpo,
sei que está um crucifixo a observar-nos... mas nada nos diz,
e apenas nos olha,
olha-nos como se fossemos dois pedaços de madeira em combustão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 11 de Março de 2014

quinta-feira, 10 de abril de 2014

A montanha do adeus


Vivíamos sobre o traço invisível que separa a areia movediça do silêncio amanhecer,
colocávamos os pés na sombra da madrugada, ainda a crescer, menina, menina de lânguido sorriso,
menina de alegre olhar,
sonhávamos com flores que gritavam palavras antes de adormecerem,
e víamos na noite o corpo perfeito da solidão,
entranhava-se-nos e levitávamos como dois pássaros loucos,
procurando beijos,
pintando os lábios das amachucadas folhas de papel...
vivíamos sobre o traço invisível,
o dia e a noite num compartimento único, sem janelas, sem porta de entrada, sem... sem os seios das pétalas azuis depois do banho de espuma, não chovia, não... não pertencíamos ao mesmo círculo verde de olhos cinzentos,
e dormíamos sem sabermos se era dia,
noite, ou... ou apenas o espelho da saudade suspenso no tecto estrelado de uma caverna deixada ao abandono na montanha do adeus...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 10 de Março de 2014

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Carta do Canadá


A correspondência pesadíssima balançava no meu braço esquerdo, de mão amachucada dentro da algibeira, procurava cigarros com sabor a saudade, o carteiro nem tinha começado o giro e já se encontrava cansado, sonolento, e o carteiro... eu mesmo, disfarçado de andaime ambulante e despropositadamente peguei num subscrito, apenas porque chamou-me a atenção a quantidade de selos e os desenhos dos mesmos, deslumbrantes como as planícies iluminadas das ruas embriagadas de uma cidade em construção,
Deve vir de longe, pensei,
E eu, eu ali, suspenso entre o olhar obtuso e a penumbra neblina do fumo do meu pobre cigarro, comecei a manuseá-lo como se fosse o rosto de alguém desconhecido, alguém que pela primeira vez tocava nas minhas mãos, senti um leve arrepio e sou embrulhado em palavras, confesso, palavras que nunca na minha vida de carteiro tinha encontrado, tocado..., ou, tocar toquei..., mas apenas nos selos, e por alguns minutos,
Acariciado?
Isso, acariciado, isso, acariciei,
E repentinamente sou invadido por pequeníssimos sons metálicos, e


“Canadá, 09/04/2014
Meu querido,
Devido às circunstâncias que tu já conheces, fui obrigado a ausentar-me desse País e da tua vida, não sei se o fiz de livre vontade, não sei se o devia ter feito, mas..., e fi-lo acreditando que me libertava da tua voz, não o consegui e ela permanece entranhada no meu corpo esguio de árvore caduca, e não estou arrependido, não, não estou arrependido,”
Entre o silêncio sinto a dor que o meu cigarro provocava nos meus dedos e o cheiro a pele queimada, sentia-me tão embalsamado pelas palavras que me embrulhavam que acabei por esquecer-me que estava a fumar e que o diabo do cigarro tinha acabado de morrer, a morte, sempre a morte dos cigarros, essa sim, o medo que me atormenta, quando vejo e sinto a morte de um, seja um só ou vinte, ou trinta...,
E voltava a sentir no meu esqueleto as tais palavras que eu nunca duvidei que vinham do subscrito que poisava na minha mão,
“Ontem estive a reler as nossas cartas, tanto tempo passou entre as equações dos nossos corpos na ardósia de um velho divã e o sentido poético dos teus dedos, lembras-te quando lias para mim AL Berto?, lembras-te quando lias para mim Cesariny?, ontem percebi que as Acácias deixaram de sorrir quando entraste naquela ruela sem janelas, e tu, e tu nunca mais regressaste, e tu”
Possa... que não entendo nada disto!,
“E tu começaste a ter asas, a sair de casa manhã cedo, e às vezes, nem regressavas no final da tarde, e eu sentia que te perdia como o marinheiro sabe quando a sua embarcação está prestes a afundar-se... e pluf, novamente silêncio, e pluf, novamente Primavera,
E pluf, entravas casa adentro e com o teu sorriso de solidão dizias-me
Olá amor!,
E hoje enquanto relei-o as nossas cartas, algumas delas parecem os cigarros do carteiro aí da tua rua, cartas mortas, descoloridas, e os corações desenhos por mim..., não corações, desapareceram como desapareceu o cinzeiro de prata que levaste para vender e em troca
Pluf,
Mais um regresso adiado, e eu, eu acreditava sempre, sempre,”
Procuro outro cigarro, sinto frio e percebo que alguma coisa não está correcta, aquelas palavras e aqueles sons metálicos deixavam-me totalmente desnorteado, tremia, ressacava, e no entanto, e no entanto conhecia aquela voz que vinha da escuridão,
“Meu querido, espero que entendas a minha ausência, espero...”
Deixei de ouvir a voz e cada vez menos chegavam a mim os metálicos sons, até que
“Despeço-me com saudade,
Sempre,
Alberto”
Volto a colocar o subscrito na sacola e começo a caminhar para a primeira casa da rua, a Dona Joana esperava a carta da filha que tinha partido para Lisboa, ainda menina, ainda inocente,
E uma luz preenche as minhas pálpebras de verniz, os meus olhos pareciam cortinados negros sem vontade de correrem em direcção ao cais dos cigarros mortos, aos poucos, muito devagar... vou-os abrindo como quem abre pela primeira vez uma porta de entrada de uma casa descolorida e percebi, e percebi que tinha sonhado,
E percebi que não havia carteiro nenhum e percebi que nunca existiu subscrito nenhum, e tão pouco conheço alguém que viva no Canadá...
Corro para o banho e depois de alguns minutos a sacudir as palavras do subscrito..., percebi que nem da cama ainda tinha saído.




Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 9 de Março de 2014

terça-feira, 8 de abril de 2014

Flores triangulares


Percebo que as equações do meu corpo não têm resolução,
sou um aglomerado de números complexos, integrais duplas e triplas, habitam nos meus braços,
percebo que tenho um sorriso em granito, e sei que nas quadrículas do meu peito...
suspendem-se as infinitas cordas paralelas do nylon madrugada,
um imbecil programado, um corpo onde se misturam os algoritmos de Fortran e as raízes quadradas do obscuro olhar, sem sentido, único, proibido estacionar o meu corpo em cima do passeio da solidão,
cruzo os braços,
e pergunto-me...
o que faz o poema sem nome dentro do silêncio amanhecer?
sem prazer,
a vida é um fluído em escoamento permanente...
em direcção ao mar,
em construção... como corpos geométricos procurando amor nas flores triangulares...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 8 de Março de 2014

segunda-feira, 7 de abril de 2014

palavras de dizer


não sei o que te direi amanhã
tão pouco se existe amanhã
palavras deixei de as ter
de as escrever
não sei o que te direi...
e amanhã é já quase hoje
e hoje... nada tenho para te dizer
vou inventar-te uma estória
com... claro que é com palavras
uma estória de um amanhecer
que se recusou a acordar
e amanhã
amanhã talvez tenha alguma coisa para te dizer
não sei o quê
não o sei
porque amanhã
amanhã é amanhã
e amanhã não sei o que te direi


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Março de 2014

domingo, 6 de abril de 2014

Estórias sem palavras...


Inventava estórias para eu adormecer,
dizia-me que todas as estrelas tinham mãos, que todas as estrelas tinham... coração, amor, e... e paixão,
acordava cedo,
sussurrava-me palavras inaudíveis, palavras frágeis, palavras sem rosto,
nuas palavras em corpos vestidos de papel,
inventava estórias com sabor a chocolate,
e ouvia o som melódico da voz invisível,
tinha medo do mar,
e hoje, hoje... amo-o, amo-o como se ele pertencesse à minha vida,
corresse nas minhas tristes veias, nas minhas... tristes palavras,
e eu menino, acreditava nas suas estórias...
nas palavras de estórias que vagueavam sobre os telhados da cidade imaginária.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 6 de Março de 2014

O sonâmbulo amachucado


Desenhava a tua voz no meu cansaço, sentia as tuas palavras amorfas nos meus braços, e tínhamos a consciência do término do dia, as horas para nós apenas significavam sombras, dispersos espinhos de uma rosa em decomposição, e havia dentro de nós o abismo disfarçado de melancolia, acordávamos tristes, dormíamos embrulhados em pequenas lâminas de prazer, sabia que o teu corpo flutuava numa janela envidraçada, virada para o Tejo, desenhava nas paredes do teu cabelo o afago da despedida, partias, voltavas, partias..., como os barcos a vapor procurando marinheiros, como lareiras acesas quando o doce Inverno invadia a cidade recheada de estrelas com sabor a embriaguez, lá fora
Preciso de ti, meu amor, ouvia-te enquanto te olhavas no espelho da saudade,
Pertencíamos às fogueiras imaginárias do quarto penumbra que nos servia de esconderijo, habitávamos no exíguo refúgio da literatura barata, pobre, esfomeada, e tu
Preciso de ti, meu amor,
Havia arbustos escondidos nas tuas mãos, pedaços de chuva miudinha nas tuas nobre pálpebras e
Preciso...
E quando percebíamos que a noite tinha sido engolida pela boca do caranguejo de mil patas..., tu, tu
Preciso de ti, meu amor, eu, eu ouvia-te do outro lado a caverna iluminada por morcegos, alguns vultos que nunca cheguei a conhecer, e claro, pelos teus beijos disfarçados de desejo, sentia-me perfeitamente feliz, quando não o era, sentia-me perfeitamente humano, quando não o era, e desenhava na tua voz as palavras que nunca escrevi, dizia-te que te amava... e não te amava, dizia-te que te desejava...
Preciso,
E...,
Preciso meu amor,
E nunca te desejei, e nunca foste a âncora que aprisionava o meu corpo ao cais das Colunas, eu regressava, sentia o peso dos caixotes em madeira, lá dentro quase nada, lá dentro... apenas, apenas objectos e memórias, e dor, e sofrimento com tentáculos,
E,
Preciso de ti, meu amor,
Um cigarro, um cigarro cor de amendoim sobre a mesa do café, ouvia um CD com os poemas de “AL Berto na Casa Fernando Pessoa”..., e
Preci...
E esperava que o mar entrasse em mim, que nunca entrou, que nunca me levou, apenas...
Te trouxe?
Regressei como um sonâmbulo amachucado, um menino que trazia na algibeira sonhos, calções e que acreditava no silêncio da gaivota pergaminho que dormia todos os dias na mesa da sala de jantar, perguntava
Precisam de mim?
E o amor respondia que sim, que precisava, que
Te trouxe?
Era meia-noite e o horizonte encerrou-se como os cortinados no Teatro, fim da peça, as personagens evaporavam-se à medida que tu
Precisas de mim, meu amor?
E eu, e eu...
Não, não quero regressar, não, não preciso de ti, meu amor, porque desenhei a tua voz no meu cansaço...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 6 de Março de 2014

sábado, 5 de abril de 2014

fantasmas do teu jardim


lia no teu o olhar o cansado abismo
aquele homem vestido de naftalina com odor a solidão
eras um livro sem palavras, um livro só, descalço... um livro que todos apelidavam de saudade
lia no teu olhar o silêncio da sanzala de prata
meninos que inventavam amanheceres
e meninas que dormiam fingindo o cacimbo da dor

lia e não queria acreditar
que havia sofrimento nos teus desejados ombros
lia e não queria acreditar
que existia no teu rosto lágrimas de chorar

rochas embalsamadas, pilares de areia, zinco, zinco que embrulhava a tua mágoa
e eu, eu acreditava que eras em porcelana
pintada de rosa adormecida
e eu, eu acreditava que no teu jardim viviam fantasmas..., fantasmas... meu amor
podia lá ser
podia lá ser..., no teu jardim... fantasmas...

lia no teu olhar o triângulo equilátero da tua paixão
pegava nos teus ângulos, calculava o seno e o cosseno do teu mesmo olhar
aquele que eu lia
lia... e deixei de ler
fiquei cego, ou... simplesmente voaste em direcção à ponte sem treliças
e deixei de olhar

e deixei de viver
lia no teu olhar o poema envenenado pelo ciume
lia e não mais quero ler
ler... o que diz o teu olhar... meu amor


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 5 de Março de 2014

Eternamente sonhos


Os muros da tua insónia servem para me ausentar dos teus beijos,
tenho medo das tuas mãos, e do teu sorriso, e dos... medo dos teus olhos de andorinha de papel,
os muros da tua pele são como o Pôr-do-Sol..., sento-me e imagino-me dentro do Oceano,
procurando algas, procurando barcos em esferovite... e coisas sem sentido, como os teus lábios,
cansados,
tão cansados que são eternamente sonhos,
pedras,
janelas com figurantes vestidos de neblina,
sandálias,
pernas,
as mãos da andorinha de papel...
procurando-me enquanto imagino o meu corpo prisioneiro no Luar...

Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 5 de Março de 2014

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Esqueletos cinzentos


Imagino-me embrulhado nos suspensos olhos dos teus lábios,
sinto-os a alicerçarem-se aos meus,
imagino-me acorrentado ao teu olhar,
pálpebra infinita da madrugada,
sinto-a e imagino-me em círculos verdes com braços de prata,
uma louca locomotiva entra-me porta adentro e finjo habitar nas tuas mãos de pérola adormecida,
imagino-me longamente só esperando as personagens dos teus sonhos,
os vivos, os mortos, sonhos... e os impossíveis de realizar,
como as tuas palavras,
difíceis de escrever,
impossíveis... impossíveis de pronunciar,
e depois regressam todos os esqueletos cinzentos da neblina,

Imagino-me sentado no teu ventre desgovernado,
sílaba cansada da literatura que poisa sobre os teus seios de sanzala,
imagino-me um menino apaixonado,
triste,
tão triste que... tão triste que acredito pertencer aos sisudos livros do luar,
imagino-me filho da noite em construção,
um menino rebelde, sem pátria, sem pão,
e à minha volta gravitam as tuas perdidas caricias perpendiculares aos relógios de pulso,
derradeira e desamada paixão, esta, viver não vivendo, amar... amar... não amando,
e no entanto,
eu, eu invento, eu corro em direcção aos rochedos das tuas coxas em silêncio...
imaginando, imaginando estrelas de papel nos teus cabelos de gaivota.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 4 de Março de 2014

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor


quinta-feira, 3 de abril de 2014

As flores do teu olhar


São longínquas as flores do teu olhar,
vivem como ervas daninhas encobertas pela sombra do luar,
são as flores do teu olhar que se alicerçam na tua boca,
alimentam os teus lábios...
e trazem a noite,

São pérfidas as mãos do teu olhar,
são pergaminhos enganados nas palavras de amar,
são alegres, tristes..., são as flores do teu olhar que poisam no meu peito,
e da noite, o teu cabelo suspenso no amanhecer,
vive e ama... e deseja-me enquanto pinto as flores do teu olhar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 3 de Março de 2014

quarta-feira, 2 de abril de 2014

A banheira do prazer


Enquanto te absorves na banheira do prazer e te libertas das caricias minhas palavras,
eu, um incipiente nocturno das fábulas sem habitação, construo o teu corpo com a espuma imaginaria que poisa nos teus seios de marfim,
de escultor nada tenho,
e imagino-te pintada no poema cansado da madrugada,
enquanto te banhas e te absorves..., nada em ti eu desejo, porque a ténue luz do silêncio te come, e alimentas o olhar das personagens solitárias da cidade do caos...
a paixão embainha-se no cortinado que nos separa, eu de um lado, e tu... tu... mergulhada, molhada, à espera das minhas mãos sem rumo, como a geada quando esconde o sorriso dos loucos pássaros,
e eu, eu um incipiente nocturno das fábulas sem habitação,

Apaixonado?
talvez... talvez não,
porque sou um acorrentado ao cais dos sofridos beijos em noites de tristeza,
eu pregado à insónia?
talvez... talvez não,
porque não estando apaixonado, porque não sendo o perfume dos teus cabelos..., sou, sou um delinquente invisível do amor,
sou uma gaivota que levita quando desapareces do meu olhar e te transformas em rio,
e sei que o teu corpo fundeado na banheira do prazer... é um barco, um barco com nome de mulher...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 2 de Abril de 2014

terça-feira, 1 de abril de 2014

neblina de medo


há uma neblina cinzenta poisada no cansaço dos dias
emagrecem as horas e os minutos e os segundos
há uma imagem prateada com sabor a calendário submerso na solidão
os dias não são dias
e das noites
ouvem-se as tempestades indesejáveis do silêncio

há uma parede mergulhada nas tuas veias de cigarros envenenados
e oiço as tuas palavras ensanguentadas de dor
flores são pedaços de poema com asas de papel
gaivotas mórbidas que invadem as sílabas do sofrimento
há uma neblina de medo
e ele e ele é a tua âncora de xisto em fatias de néon que a cidade absorve


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 1 de Abril de 2014

Gaivota clandestina


Percebo a insónia tua quando abres a janela do desejo, e voas, e evaporas-te como uma gaivota clandestina, sem nome, apenas... só,
percebo nos teus olhos a tristeza das tuas lágrimas, livres como a Primavera, e voas, e só...
sinto em ti o cansaço do corpo que espera o clarear da madrugada,
oiço a tua voz de cristal... e sei, e sei que habitas na minha mão,
escrevo no teu rosto as palavras não escritas, as palavras invisíveis... e só, só...
percebo que na tua voz existe melancolia, amargura, livros, livros em pedaços de lume,
percebo que há pétalas coloridas, e que há outras tão negras, negras... tão negras como a noite,
tão negras como os teus cabelos em silêncio... e só, e só, que tudo percebo.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 1 de Abril de 2014