Fazendo uma pausa na poesia; Vemo-nos em
Agosto – Gabriel García Márquez.
(Francisco)
brevemente, neste espaço, vou começar a vender parte dos meus 8000 livros, ficarei apenas com os livros de poesia…
(Francisco)
No rasto dos duendes eléctricos
(poesia 1978-2018) de ADOLFO LUXÚRIA CANIBAL.
Porto Editora.
Adolfo Luxuria Canibal é o
pseudónimo de Adolfo Morais de Macedo.
Licenciado em Direito
pela Universidade de Lisboa, foi advogado e é consultor jurídico.
É o vocalista do grupo de
rock Mão Morta.
Boas leituras.
(Francisco)
O TEU CABELO SÃO PRIMAVERAS
SÃO OS BARCOS QUE VOAM SOBRE OS TEUS OLHOS
SÃO A FLOR QUE
TENS NA MÃO
SÃO AS PALAVRAS
O TEU cabelo É UM CORAÇÃO
SÓ NA NOITE;
COMO EU.
SÓ NA NOITE!
(orgasmo literário)
Flor De Fumo e Outros
poemas de Nadia Anjuman.
Nadia Anjuman poeta e
jornalista afegã, nasceu a 27 de Dezembro de 1980 e faleceu a 4 de Novembro de
2005 na cidade Herat (Afeganistão).
Morre às mãos do marido, por ciúmes pelo seu sucesso enquanto poeta.
O poeta e ex-ministro da Cultura Luís Castro Mendes, autor do prefácio
da versão portuguesa, descreve a expressão de Nadia Anjuman como “uma poesia de
um desespero manso, de uma desilusão que não grita para não estilhaçar as
possibilidades de beleza que o mundo sucessivamente recusa, mas que nos
interpela com mais força, pela violência do seu silêncio”. (fonte
Expresso)
Depois de fazer um interregno
nas minhas leituras sobre o surrealismo português, tendo nesse intervalo de
tempo lido a Sophia (obra completa poesia e prosa), Júlio Pomar e Vinicius
(antologia poética), volto com Artur do Cruzeiro Seixas.
Artur do Cruzeiro Seixas
é um dos grandes nomes do surrealismo português e europeu.
Nasceu na Amadora em 3 de
Dezembro de 1920 e faleceu em Lisboa a 8 de Novembro de 2020.
Há um livro de Cruzeiro
Seixas e de Luiz Pacheco que eu gostava muito de ter, quando tiver dinheiro é
claro; Comunidade, tem 36 páginas e custa 1350€.
Aos leitores deste
espaço, deixo a sugestão.
Na imagem: Obra Poética,
Artur do Cruzeiro Seixas, Porto Editora.
24/02/2024
Podíamos partir em
direcção ao mar
E levar connosco todos
estes livros,
Todas estas memórias.
Podíamos brincar no mar
E desenhar na areia o
sorriso do silêncio,
Podíamos escrever na
espuma do mar…
O quanto mar existe nos
teus olhos,
Do mar Oceano das tuas
mãos,
Podíamos regressar a
Ítaca
E resgatar o soldado
infeliz,
Conversávamos com a
esposa de Zenão…
(o paradoxo de Zenão)
Podíamos voar sobre as
árvores,
Podíamos cantar junto ao
rio…
Podíamos aprisionar o
vento
E a chuva,
Podíamos partir em direcção
ao mar
E levar connosco todos
estes livros,
E todas estas sombras.
04/11/2023
Afinal onde ficou
O teu primeiro olhar
Onde se esconde
O teu primeiro sorriso
A tua primeira lágrima
Afinal onde ficou
O teu primeiro olhar
Onde se esconde agora
O teu primeiro silêncio
Para mim
Afinal onde ficou
A tua primeira palavra
Que se abraçou
Ao meu poema
Afinal onde ficou
Onde se esconde
O teu primeiro olhar
Do teu primeiro beijo
Afinal onde mora
Onde está
A tua primeira alegria
Do dia
Em poesia.
15/10/2023
Semeio as minhas palavras
No curvilíneo teu corpo
Madrugada em desalinho
Neste pequeno leito em
linho
Meu doce grama de saudade
Semeio as minhas palavras
Dentro de ti
Em ti
Madrugada
Sentido rio que se
esconde em tua mão deserta
Liberta do meu pulso
Da caneta que te escreve
E inventa nos teus seios…
O beijo.
Semeio em ti doce
madrugada
As alegres
E as tristes
Minhas amargas palavras
Meus poemas em teus
lábios
Quando me beijas e eu
sinto a frescura da manhã
Em fuga
E se esconde na fogueira
do silêncio…
Invento em ti a enxada
Que desbrava a terra
ensanguentada
Das guerras
Da fome
Do infeliz desejo que
queria ser…
O sonho
No sonho de escrever nos
teus lábios
Todas as equações que o
corpo absorve
E come
E lambe…
Toda a tua pele de
saudade.
Semeio as minhas palavras
no teu púbis
E à janela do nosso
quarto
Ele que nos olha
Que nos sente
E mente…
Ele…
O agricultor de palavras
Da enxada
Do livro prateado
Sobre a
mesinha-de-cabeceira…
E no entanto
Semeio-te com as minhas
palavras
Na tua pele
Nos teus lábios
Na tua boca.
E eu
E eu sou o louco
O que pensa muito
O que não devia pensar
Pensando que te desejo
dentro deste livro secreto
Que deixo sobre o aparador
Ao deitar
Meia drageia de saudade
E no entanto
Escrevo em ti de ti o que
que preciso de escrever
Do amar
Do que me amas e não
devias amar
Porque sou apenas um
agricultor
Um agricultor de palavras.
28/09/2023
Afasta-te de mim
Afasta-te da minha voz
E das minhas mãos
Afasta-te das minhas
palavras
Das minhas noites…
E das minhas equações
Afasta-te do meu olhar
Afasta-te dos meus poemas
Os que escrevi
E os que irei escrever
Afasta-te do meu mar
E dos meus sonhos
Afasta-te da lua a
crescer
E do luar
Poisado nos meus braços
Afasta-te dos meus beijos
E dos meus cansaços
E afasta-te dos meus
livros
Que escondo nos meus abraços
28/09/2023
Meu pequeno solstício do desejo
Meu poema
Minha oração cansada
Quando deitada
Nesta cama
Sem perceber
Se um dia ao acordar
Também acordará a poesia
A mentira fictícia da
ausência
Entre o sonho e o mar
Entre o mar
E o dia
E o dia em clemência
Pedindo
Ordenando que acorde também
a noite
Quando um pedaço de tudo
Se ri de mim
E rindo
Também me rio também me amar
Do mar eu
Ao teu nosso mar
Meu pequeno solstício do
desejo
Meu poema
Minha oração cansada
Quando deitada
Nesta cama
Dos livros nossos livros
Das nossas flores
Flores nossas mãos
entrelaçadas
Ao lençol de neblina
Que cobre a tua pele
Do linho amargo ao
silêncio-pastel
Deitado na tela
Deitado no teu ventre.
27/09/2023
Pego no teu cabelo
Sonâmbulo acordar da
manhã
Pego no teu cabelo e
lanço-o ao vento
Como se fosse uma semente
Ou um pedaço do meu
pensamento
Como se fosse um corpo
que não sente
Indolor dentro deste
pequeno cubo de silêncio
Pego no teu cabelo e lanço-o
ao vento
Primeira lágrima da manhã
Que me mente
E me diz que não habita o
sofrimento
Nos teus olhos de mar
Neste velho jardim com
sabor a mágoa
Pego no teu cabelo
Pedaço de vinho
Neste cálice doirado
Pego no teu cabelo
abençoado
Que voa sobre o luar
Sem perceber que na minha
mão
Brinca o Outono
Pego no teu cabelo
Sonâmbulo acordar da manhã
Janela virada para o mar
Quando as algas são as
Princesas da preia-mar
Que no teu cabelo eram
crianças… crianças de brincar.
24/09/2023
Às vezes éramos apedrejados pelo silêncio
Às vezes éramos escravos
Do silêncio
Às vezes gritávamos
Às vezes chorávamos
Às vezes tínhamos em nós
toda a alegria
Às vezes sentíamo-nos os
filhos do poema
Da poesia
Que às vezes atrapalhava
o dia
Às vezes marchávamos em
direcção ao mar
Às vezes fazíamos de mar
Quando o mar
Às vezes
Se disfarçava de um outro
mar
Às vezes ouvíamos o apito
do comboio
Na algibeira de transeuntes
aflitos
Com fome
Que às vezes sentíamos
enquanto o sono não regressava
Das vezes que se despedia
E nós sem saber o
significado de manhã
Quando às vezes
Se perde um sorriso no
meu olhar
E lá se vai a manhã
De apenas algumas vezes
Às vezes fugíamos
E às vezes pegávamos nas
espingardas da insónia
Disparávamos incenso contra
o sol
E sal contra a lua
E de todas as vezes
Regressavam sempre a nós
as outras vezes
Dos dias de às vezes
Meio-escondidos na rua
Meia-lua dos teus olhos
Que às vezes ofusca
Que às vezes me chama
E lamenta
Esta espingarda de corda.
23/09/2023
Escrevo no teu peito o postulado da equação de Deus, na revolta dos teus seios em direcção ao exército da insónia, recordo a primeira equação da equação de Deus, e como poderei esquecer, se a escrevi no teu seio esquerdo, e como poderei me esquecer da integral do desejo, depois de elevar a raiz cúbica da paixão, à decima quinta potência de Zeus, perceber que pouco ou nada restou, a não ser, que tudo, mas tudo mesmo, é apenas a unidade.
O uno.
O uno divisível, que
mesmo dividido em milhões de pedacinhos, será sempre o uno, o homem, o filho de
Deus.
Escrevo no teu peito e de
alguma coisa me vou esquecer.
Esqueci o teu nome,
quando o escrevi milhares de vezes no folheto do meu coração, esqueci os teus
olhos, o teu cabelo, sem cabelo, do vento, ao vento, entre mim e as primeiras
lágrimas da manhã
Depois, traçamos uma
recta de (A) até (B), e da equação dessa recta multiplicamos a integral solucionada
na tarde passada,
Pifou, o gajo.
Escrevo no teu peito,
SOCORRO, como se estivesse a ser perseguido pela revolta das enxadas do nosso
querido Douro,
Oiço-os, sinto-os, lá
longe, muito longe
Todos aqueles que
morreram no Douro.
Escrevo no teu peito o
postulado da equação de Deus, percebo que é complexa, percebo que este meu
pobre computador nunca conseguirá encontrar uma solução, a não ser…
Voar sobre o mar.
E morrer no mar.
Escrevo no teu peito a
sinceridade da noite, que aos poucos se entranha nos ossos, como lâminas de
geada, como saliva misturada com aparas de madeira, o lápis sobre a mesa, a
folha movimenta-se, eu escrevo no teu peito, o lápis esconde-se na minha mão, e
tu,
Dormes sobre mim.
Escrevo no teu peito a maré
que regressa, do Deus que se afasta, e me persegue enquanto não lhe resolver a
equação,
Pifou, o gajo.
Voar sobre o mar.
E morrer no mar.
Escrevo no teu peito o
postulado da equação de Deus, na revolta dos teus seios em direcção ao exército
da insónia, recordo a primeira equação da equação de Deus, e como poderei
esquecer, se a escrevi no teu seio esquerdo, e como poderei me esquecer da integral
do desejo, depois de elevar a raiz cúbica da paixão, à decima quinta potência
de Zeus, perceber que pouco ou nada restou, a não ser, que tudo, mas tudo
mesmo, é apenas uma sombra abraçada à unidade; somos apenas Zeros e Uns. Somos
código binário.
17/09/2023
(Ficção)
Sou Príncipe
Tu és Princesa
Sou o guardião dos teus
olhos de mar
Sou cavaleiro em revolta
Nos teus doces lábios de
mel
Sou barco de papel
Sou flor rasurada
Sou luz diáfana
No silêncio da madrugada
Sou faina
Príncipe à tua volta
Tu és Princesa
Na
mão da aforada
Que corre e que grita e
não se solta
Da manhã que acorda
envenenada
Sou Príncipe
Tu és Princesa
Sou o teu poeta
adormecido
Sou o teu escrivão
Que dorme esquecido
Do mar que se esqueceu
De um dia ter pedido
De todos os Príncipes do
Reino
A alvorada sem ninguém
Triste e só
Triste nos olhos de alguém
Sou Príncipe
Tu és Princesa
Sou o cálice envenenado
Sobre a mesa do poeta
No poema encarcerado
Em gritos e revoltado
Ergue-se do alegre chão
Que me aponta
A mão
Do não
E dispara contra o meu
coração
Sou Príncipe
Tu és Princesa
Sou um cavaleiro em
revolta
Que de batalha em batalha
De planície teu cabelo em
treliças de alecrim
Corre para o mar
E jamais volta
E jamais amará as
palavras do luar
Porque chove
Porque gritam as sílabas
do meu poema…
Se a noite é escura
E eu sou o Príncipe
E tu és a minha Princesa.
17/09/2023
S. Martinho do Porto, Janeiro de 1989,
Deste quarto, dentro
deste quarto, olho o mar e pinto o mar nos meus olhos, antes de adormecer. Deste
quarto, onde me escondo, não sabendo porque me escondo, neste quarto pinto o
sol no tecto, no tecto deste quarto, e sinto neste quarto, dentro deste quarto,
o assobiar dos barcos da minha infância.
Neste quarto, de onde
oiço o mar, pincelo o meu olhar com estrelas-do-mar e silêncios de alegria, depois,
depois peço ao guarda deste quarto, peço ao senhor António, que liberte todas
as serpentes, que dormem neste quarto e não gostam de poesia, como todos os que
detestam poesia, que são muitos, que são alguns, não pertencem a este quarto,
de onde eu, pela janela deste quarto, sinto o cheiro do mar, e depois,
E depois nada. Fico dentro
deste quarto.
Vou à janela deste
quarto, puxo por um cigarro, acendo-o preguiçosamente, eu oiço-os
Entre gritos, ao lado
deste quarto,
Sem perceberem que dentro
deste quarto,
Habito eu, o poeta
suicidado por uma bala de medo numa tarde junto ao Mussulo.
Então senhor António, as
serpentes?
Sei lá eu das serpentes,
menino,
Sei lá eu.
E de dentro deste quarto,
nem eu, nem eu, senhor António,
Nem eu.
Neste quarto, de dentro
deste quarto, oiço o sorriso das girafas, brincando no capim como se fossem
crianças pinceladas de saudade, neste quarto, dentro deste quarto todos os
papeis são loucos, todas as palavras são loucas, neste quarto, de dentro deste
quarto, todos os Sábados, junto ao rio…
Então o senhor António
pensava que as serpentes não sabiam ler?
Sei lá eu, menino,
Sei lá eu,
Nem eu, de dentro deste
quarto,
A bala sorriu e caiu no
pavimento lamacento. Dentro deste quarto, neste quarto, aos Sábados, oiço o
mar, desta janela sem sorriso, enquanto o senhor António se vai travando de
amores com as serpentes,
E o menino,
O menino, deste quarto,
de dentro deste quarto, deste quarto, dentro deste quarto, olha o mar e pinta o
mar nos seus olhos, antes de adormecer. Deste quarto, onde se esconde, não
sabendo porque se esconde, neste quarto pinta o sol no tecto, no tecto deste
quarto, e sente neste quarto, dentro deste quarto, o assobiar dos barcos da sua
infância.
16/09/2023
Luís
Das sete espadas do inferno
Recebo as cabeças dilaceradas
pelo poema em veneno,
Depois, pego em todas as
palavras e semeio-as na sombra desenhada pela noite,
Mausoléu do silêncio, vírgula
suspensa na tarde,
Das sete espadas, recebo
o primeiro beijo da madrugada,
Vestido de negro,
E pincelado de medo.
Do rio sonolento, as
vozes do inferno, chamam-me e apelam-me…
“que o dia se transforme
em noite,
E as estrelas,
Em beijos croché com
pedacinhos de sonho…”
Nunca terás as chaves do
céu, dizia-me ele antes das sete espadas…
Partirem em direcção ao
nada,
Quando o dia se cansa da
tarde,
E velozmente,
Suicida-se na mão do
Magala que está sentado na Torre de Belém.
Das sete espadas do
inferno
Recebo as cabeças dilaceradas
pelo poema em veneno,
Recebo o livro, recebo a
morte,
Depois,
Sento-me e olho pelas
janelas do inferno…
A planície vestida de branco,
Com árvores em papel,
Depois,
Sento-me e olho pelo
tecto do inferno…
As estrelas vestidas de
silêncio
E o sol,
E o sol olha-me,
Puxa-me…
E abraça-me como quem
abraça a tempestade.
16/09/2023
Francisco