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segunda-feira, 8 de abril de 2019

A mosca


Parem todos os imbecis.

Parem todos os ignorantes,

Energúmenos e os ausentes.

Parem todos os automóveis,

Parem todos os loucos,

Parasitas e poucos.

Parem todas as campainhas,

A minha,

A do vizinho.

Parem a Terra,

O silêncio,

E as mulheres belas.

Parem o trânsito,

As ruelas,

Ruas,

Cadelas.

Parem as putas,

Os putos…

E as naus encarceradas nas tuas mamas.

Parem.

Por favor, parem.

Parem as flores,

Os jardins,

Os amores.

Parem.

(Parem todos os imbecis.

Parem todos os ignorantes,

Energúmenos e os ausentes).

Parem os chulos,

Prostitutos,

Afins…

Parem tudo. Dói-me a cabeça.

 

Parem.

 

E, respeitem os ciganos!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

08/04/2019

sábado, 19 de dezembro de 2015

Um par de cornos, um avental e uma faca do tamanho de um beijo, uma merda, a minha vida, a dela e a vida de quem não dorme…


Conhecia-a numa noite de Inverno, no planalto do desassossego habitavam as planícies da solidão, dias a fio encurralado numa jaula, à janela tinha a companhia da Gaivota Desejo, conheci-a numa noite de Inverno enquanto acendia a lareia, confesso, nunca tive, não tenho… apetências para lareiras, o meu caso é mais de insónias, tardes confusas

Confusas?

Sim, confundo o triste olhar do céu com os beijos da geada, sim, confundo os plátanos nus com a tua nudez… e que desperdício, o desgosto de acordar tarde, e tu

Sofrias de sinusite aguda, durante a noite não dormias, já dormes, meu querido? Não, não durmo, e de sinusite aguda transformou-se numa loba, tinha asas e voava sobre o Tejo,

E tu, e tu acreditavas que eu era marinheiro de profissão, tinha dois filhos e morava num cubículo recheado de velharias, alguns livros, dois ou três pratos e uma colher, a sopa infestada de sono, a sopa entranhada entre o ontem e o amanhã, não, não meu querido, não acredito numa só palavra tua,

Confusas?

Distantes e abstractas todas as minhas manhãs, conheci-a numa noite de Inverno, algas mortas, as profundezas da palavra acorrentada à lareira, bêbado, sou bêbado… cambaleava sobre a areia fina do destino, tinha dois filhos e morava num cubículo recheado de velharias, alguns livros, dois ou três pratos e uma colher, a sopa infestada de sono, o sono enfestado de sopa, e nunca vi o mar, meu querido, o mar…

Durmo!

À meia-noite regressava o eléctrico, descalça com os sapatos de salto alto suspensos no cansaço, vomitavas as dores do teu camuflado esqueleto pela manhã, vomitavas

Ela já foi dormir…

Vomitavas todos os gemidos da Sinfonia da paixão, acreditas, meu querido?

Fui despedido

Durmo! Ela foi dormir, ela quase nem me olhou

Boa noite…

Fui despedido e agora vou viver de esmolas e serviçais serviços, boa noite, ela já foi dormir, fui despedido como são despedidos todos os poetas, dizem que as mulheres têm o prazer de despedir poetas,

Foda-se o poema,

Boa noite…, nada mais, boa noite e partiu sem deixar rasto, algumas roupas, uma pequena pasta com alguns papeis e uma esferográfica, talvez comece a escrever, escrever-me definitivamente com o meu nome, endereço e rua,

Ela partiu, boa noite, cansaço o caraças…,

Um par de cornos

O caraças, tu andas é com algum Mânio, iletrado, dormir, fui despedido acreditando que levaria a vida de escritor,

Uma merda, escrevo uma merda e merda

Um par de cornos, um avental e uma faca do tamanho de um beijo, uma merda, a minha vida, a dela e a vida de quem não dorme…

 

(ficção)

Francisco Luís Fontinha – Alijó

sábado, 19 de Dezembro de 2015

sexta-feira, 18 de abril de 2014

candeeiros com braços de prata


quatro bancos em madeira
um jardim em desassossego
três árvores
… duas belas mulheres
uma Primavera
com plátanos de brincar
quatro bancos em madeira
dois corpos em translação
quatro seios em rotação
… e duas belas mulheres
duas mulheres em solidão
quatro bancos em madeira e uma gaivota em papel

um barco com pálpebras de chocolate
um marinheiro vestido de vampiro
duas belas mulheres
e quatro bancos em madeira
percebem na insónia a sinfonia dos candeeiros com braços de prata
um jardim em desassossego
um Oceano desgostoso
triste...
tão triste como os fios de nylon que aprisionam o sexo dos pássaros
uma Primavera inventada pelo poeta dos farrapos amanhecer
senta-se nos quatro bancos em madeira...
… acaricia as duas belas mulheres e as três árvores


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 18 de Abril de 2014

sábado, 14 de dezembro de 2013

papel de parede

foto de: A&M ART and Photos

o papel tua pele que se entranha na madrugada
a canção do menino triste esconde-se entre os arbustos loucos da despedida
o salário emagrece os seios das meninas de leite
e o menino não tem medo do silêncio amanhecer
o papel estremece e arde
e a fogueira dos teus sorrisos parece a chuva violenta das tardes em tempestade
vadias e tristes
tristes.. e emagrecidas mulheres de areia na tua pele anelar que a solidão tece como velhas teias de aranha
tua doce lâmina de papel que um calendário come e vomita nas gotículas negras do suor em suaves prestações de desejo
abraço-te
não
é proibido abraços e beijos e...
pontapés em sílabas mortas
doentes
ou... envenenadas
o cheiro a mofo sai da minha algibeira
o dinheiro em pequenos esqueletos de vidro... simplesmente se derretem como cubos de chocolate...
há farturas
churros e guardanapos nus com braços em prata
a roulote engana-se no pavimento
e desaparece no corredor da morte
há flores à tua espera
há uma lápide de prazer deitada num divã menstruado...
e... e o papel tua pele que se entranha na madrugada
não é mais do que pequenas partículas de sémen desproporcionais que uma equação diferencial alimenta
vive
vive só como vivem os pinheiros esquecidos na montanha do destino...
come-me enquanto durmo
e sonho com janelas pinceladas de verniz
com telhados de cinza
e ardósias...
e o meu nome
o meu nome desenhado a giz
a senhora professora diz que é banal a paixão dos lábios siderais das mangueiras ensanguentadas
há masturbação em grupo na sala da saudade
e... e os beijos proibidos... proibidos são... como o papel de parede gritando LIBERDADE.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 14 de Dezembro de 2013

sexta-feira, 19 de abril de 2013

A roulote da alegria

foto: A&M ART and Photos

Andávamos de terra em terra, andávamos de luar em luar, éramos dois mutantes fugitivos aos arautos das marés de inverno, sonhávamos, desesperávamos-nos quando encalhávamos sobre as fragas frágeis das aldeias em flor, e tínhamos medo do dia seguinte, e quando acordávamos, continuava tudo igual ao dia de ontem, amanhã, dizem, amanhã é Sábado, levantarmos-nos não muito cedo, o duche, o pequeno-almoço, e uma torrada para o REX, tomar café, de preferência DELTA RUBY, e depois de enganar-me com as sombras de cigarros apagados desde Maio de 2012, regresso a casa, ligo o portátil e escolho o Ubuntu como Sistema Operativo, fartei-me do Windows e das suas birras, parecendo às vezes certas mulheres, chatinhas, tão chatinhas que as prefiro a elas do que a ele, mas enquanto existir o Linux não o trocarei por outro qualquer, porque há coisas inconfundíveis, incontornáveis, amores eternos, amores como o das pessoas, amores
(sou a favor do software livre e aberto a todos)
E depois de tantos amores, e depois de portátil ligado, vou à minha caixa do correio, - Levanto-me, abro a porta da biblioteca, passo pelo corredor, atravesso em bicos de pés a sala de jantar, mergulho num pequeno Hall e depois de ultrapassar a cozinha, entro definitivamente no quintal, e cerca de quinze metros depois, abro a caixa, e correio... nenhum – quem é que tinha o atrevimento de me escrever, digam-me – Quem? - só o “Fisco”,
(andávamos de abraço em abraço, andávamos de gemido em gemido)
Faço uma visita breve ao meu blogue, talvez escreva alguma coisa, depende dos sábados e do estado da caneta Parker de tinta permanente, até à data nunca ame deixou ficar mal, escreve sempre aquilo que quero e desejo, e Às vezes, até me obriga a escrever aquilo que não quero, mas ela é assim, e assim me vai acompanhar até ao fim
(fim de mim, fim de ti, ou fim de um texto qualquer ou poema)
Copiam tudo, aqueles sacanas, e de “O Medo” de AL Berto, na mão, abro-o, e verifico que é uma edição de Outubro de 1991, Contexto-Círculo de Leitores, e com o número de edição do Círculo de Leitores 3138, nada disto importa, apenas que este livro vale algum dinheiro – Talvez cento e vinte euros – mas a minha curiosidade está na contracapa onde vive um pequeno texto meu, de 9 de Maio de 1994, em Vila Real e digo ser esse o dia mais feliz da minha vida,
E reza assim,
“Não tenho medo
de estar só...
não tenho medo de morrer,
mas... sinto medo de estar vivo!
E se eu morrer,
Que seja sozinho;
tenho medo da multidão,
e sei que não estarás ao meu lado!



Claro que eu percebo estas palavras e porque as escrevi naquela data, mas já não importa, e copiam tudo, aqueles sacanas, copiam os poemas, copiam-me os textos, copiam tudo, aqueles estúpidos pássaros de bico amarelo e negros como a noite, recordo-me em miúdo de ver um em casa do meu avô, dentro de uma gaiola, e já na altura, ficava confuso ver alguém com asas dentro de um pedaço de rede, sem liberdade, apenas porque canta lindamente,
(e se um dia, um louco, fizer o mesmo comigo, isto é, construírem à minha volta uma rede invisível, onde me aprisionam, apenas porque escrevo, apenas porque gosto de ler, apenas... porque sou eu)
Andávamos de terra em terra, andávamos de luar em luar, éramos dois mutantes fugitivos aos arautos das marés de inverno, sonhávamos, desesperávamos-nos quando encalhávamos sobre as fragas frágeis das aldeias em flor, sem flores, sem janelas, depois, depois voaram-nos as palavras e os bancos de jardim com meninas de livro na mão, sentadas, cruzavam a perna, e de saia meio de chita, meio de qualquer coisa, esqueciam-se que eu era um pássaro esquecido dentro de uma gaiola numa aldeia do Concelho de S. Pedro do Sul,
(- Tens saudades minhas, meu querido amigo? - e só sei que era Sábado, e que depois de escrever qualquer coisa, deixava o portátil ligado, música em sons melódicos para os fantasmas da livraria, e antes do meio-dia, todos os Sábados, dirijo-me à barbearia do senhor António, desfazem-me a barba e venho descontraidamente almoçar, com o meu querido AL Berto sempre à minha espera, sobre uma secretária de madeira)
Uma das meninas levantou-se do banco onde estava ancorada, colocou o livro debaixo do braço, o olhar dela cruzou o meu, e hoje, hoje acompanha-me todos os dias e todas as noites dentro da roulote da alegria.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 28 de março de 2013

Comboio para o Grafanil

foto: A&M ART and Photos

Imagens, solstícios de imagens descem metodicamente do tecto do impostor prazer que a luz provoca nos corpos negros, absorvidos pelos espelhos e pelos cortinados de espuma, onde te ajoelhas, onde te deitas, onde
(me masturbo)
Imersas minhas mãos nos solavancos que os vidros de areia escrevem nas paredes de barro depois das chuvas dos finais de tarde, lamento informá-lo mas
(ela morreu de tédio, desassossego, ou)
Mas ficou-nos sobre a mesa-de-cabeceira as fingidas pétalas dos perfumes embriagadas depois de caírem sobre as lajes de granito os melancólicos ossos da paixão dos peixes, havíamos construído e declarado guerra aos apaixonados cansaços vestidos de sobretudo encarnado, circulavam pela cidade, durante a noite, em busca de imagens, comida e simples jornais desvairados que alguém tinha deixado nos caixotes do lixo, um dos títulos anunciava a possibilidade da queda do governo, e se ele cair, que caia, mas que não se aleije, salvo seja, senhores das imagens que entram pelos meus olhos, eu nua, eu com uma câmara fotográfica em busca de um passado desperdiçado nas clareiras águas salgadas das praias com varanda para as traseiras, íamos à janela, e suspendíamos os seios no peitoril cinzento com saliva esverdeada, perguntávamos-lhe o que tinha, e ela respondia-nos
Fígado,
(ela morreu de tédio, desassossego, ou)
(me masturbo)
Imagens, muitas, loucas e loucos, como as árvores do Outono mergulhadas em rochas de iodo, e tédio, e cansaço... todos, temos, lamento informá-lo mas... cessaram as imagens a preto-e-branco, e se eles caírem, paciência, uns vão dizer que vamos melhorar, outros que nada mudará, eu nem sei o que lhe dizer Dona Menina Amélia... olhe
Seja o que Deus quiser,
E se ele não quiser, paciência, venham as imagens esquecidas, venham os bancos de jardim com ripas de madeira, venham eles e elas, todos e todas, a luz e a escuridão, o silêncio e a algazarra, o branco e o negro, e as pedras, e
(os barcos de papel com melodias entrelaçadas nos dedos)
E as flores, todas as flores, não falando nas algibeiras com a laje apodrecida, as moedas, poucas, caem até se estatelarem na cave, sombria, e sem janelas e sem abraços, coitadas, infelizes, aqueles e aquelas, pobres miúdos de porcelana com sorriso de nuvem embebida no sono longínquo das amendoeiras em flor, e se eles caírem?
(Imagens, muitas, loucas e loucos, como as árvores do Outono mergulhadas em rochas de iodo, e tédio, e cansaço... todos, temos, lamento informá-lo mas... cessaram as imagens a preto-e-branco, e se eles caírem, paciência, uns vão dizer que vamos melhorar, outros que nada mudará, eu nem sei o que lhe dizer Dona Menina Amélia... olhe), um dia perceberás a minha cabeça, um dia perceberás que sou tão normal como todas as outras pessoas que circulam à nossa volta, como são as moscas, como são as abelhas, como são todas as imagens, e todas as palavras
Normais,
Sou normal como qualquer árvore do jardim de Luanda, ou como qualquer machimbombo ou como o Mussulo, normal, sou, como a estrada para o Grafanil, ou
Normais,
Ou o cheiro da terra depois da chuva, e um dia, um dia perceberás que apenas a mulher da máquina fotográfica, essa sim, louca como os comboios em direcção ao Tua
(pare, escute, olhe... atenção aos comboios)
Proibido fumar, peço desculpe PROIBIDO O TRÂNSITO PELA LINHA,
E o Tua morto,
É como lhe digo Dona Menina Amélia, se cair
Caiu como vão cair os finos fios de luz das mandíbulas empobrecidas, loucas, loucas, loucas como uma montanha de areia, com braços de aço e olhos de plástico, simplesmente, se caírem que não o façam sobre mim,
(É como lhe digo Dona Menina Amélia, se cair)
O importante são as imagens, e por muito que eu o descreva, acredite em mim, só vendo, consegue vossemecê imaginar uma mulher nua dentro de um quarto escura a fotografar sombras? E junto à mulher um escadote com acesso ao infinito? Consegue?
É claro que não, Fígado,
(ela morreu de tédio, desassossego, ou)
(me masturbo),
Ou por falta de luz...

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 8 de março de 2013

Mulheres a preto e branco

Ei-lo que se recusará a regressar antes que a ponte velhíssima de madeira se desmorone sobre as pálidas algas das tristes tardes de Inverno, ei-lo, o transeunte mais procurado dos Pinhais de Cima, aldeia pacata e silenciosa que cresceu, aos poucos como um cogumelo de areia, entre as rochas fragmentadas das cabeças ocas dos homens com pernas de cimento, enferrujado o aço, sobejaram algumas paisagens que um fotografo famoso guardou para a posteridade, algumas fotografias a preto e branco, porque ele sempre amou as fotografias a preto e branco e não se cansa de dizer que
São como as mulheres, belas,
Uma fotografia a preto e branco e uma mulher, ambas elas belas, e a diferença está no papel, a fotografia exibe um papel macio, cristalino e cintilante, e a mulher, exibe uma pele de sombras que caminham sobre as ondas cristas que a maré desenha nos desejos depois de partir o pôr-do-sol e antes de regressar a lua,
Ei-lo, o ausente mutante que acreditava nas palavras que lia, ei-lo agachado no pavimento húmido dos quartos reles de pensões miseráveis, e no entanto, ele, preferia as fotografias a preto e branco, e às mulheres, das mulheres recebia uma chave de carícia em formato de três por três e que tinha como objectivo abrir todos os corações mais secretos e encerrados das noites ilimitadas, quando a tangente de (x) tende para uma cama com lençóis de papel e um guarda-fato com um espelho onde se vê o círculo trigonométrico das mulheres de coração claustrofóbico, ele
Sou uma fotografia aparvalhada, vesti-me de palhaço, sem tenda de circo e apenas com uma roulote dei duas voltas à aldeia dos Pinhais de Cima, e desenha no invisível rectas, cubos, círculos, triângulos e meninas de chocolate,
Existem mulheres a preto e branco como fotografias com coxas transeuntes, e têm o coração tão fechado, tão fechado, que nem o amigo Rocha das Chaves consegue abri-los, coisas dos artistas, escritores e poetas, porque se eu tivesse a habilidade que ele tem para abrir fechaduras...
Meu Deus, quantos corações,
(paciência, cada um tem o seu ofício, e eu, não tenho nenhum)
E eu tenho muita, como as árvores, vou esperando que cessem todas as tempestades e que uma nuvem com recheio de amor desça às profundezas das masmorras onde se passeiam correntes e argolas e animais ferozes, a selva desceu à cidade, os rios fugiram para a montanha, e um ditador roubou-nos o mar, mas não nos importamos, já nos roubaram tantas coisas
Que
É mais uma, que diferença faz?
(este bloqueio vai estar activo durante mais 1 dia e 23 horas)
Que nascemos para vivermos sobre tempestades (só alguns) e que também (só alguns) são incapazes de abrir uma simples fechadura, ou
Arrombar a janela de paixão,
Ou levitar sobre os telhados dos Pinhais de Cima, vestido de domador de feras, porque começando por ele, há feras completamente indomáveis como o porteiro do edifício contiguo à repartição onde trabalha o Alfredo, o velho Alfredo que desde que me lembro espera e desespera pelo regresso
E ei-lo que se recusará a regressar antes que a ponte velhíssima de madeira se desmorone sobre as pálidas algas das tristes tardes de Inverno, ei-lo, o transeunte mais procurado dos Pinhais de Cima, aldeia pacata e silenciosa que cresceu, aos poucos como um cogumelo de areia, entre as rochas fragmentadas das cabeças ocas dos homens com pernas de cimento, enferrujado o aço, sobejaram algumas paisagens que um fotografo famoso guardou para a posteridade, algumas fotografias a preto e branco, porque ele sempre amou as fotografias a preto e branco e não se cansa de dizer que são como as mulheres, belas, e como as flores, ainda mais belas que as fotografias, mas
Menos belas que as mulheres a preto e branco.

(ficção não revisto)
Francisco Luís Fontinha

sábado, 12 de janeiro de 2013

Invenções do corpo sonolento

As tuas mãos percorriam milimetricamente os espelhos de invenções do corpo sonolento que alguém tinha deixado sobre a cama com os lençóis de espuma que o mar vomita quando bate nos rochedos da saudade, inventavas o amor desértico onde brincavam os dromedários objectos voadores sobre as planícies das tuas coxas ensanguentadas devido ao excesso de palavras, de vogais, de sílabas, e as frases escorriam pelo canto da boca, um líquido esbranquiçado derretia-se na penumbra nuvem de açúcar, roçavas-te nos poste de chocolate com pontinhos de néon, e começam as construções dos corações de neve, tínhamos
Música encaixotada nos papelões cinzentos distraiam as ovelhas e as cabras que solitariamente arrebanhavam a erva das calçadas de vidro, janelas se abriam, janelas se fechavam, e janelas partiam em direcção aos loucos pasteis de nata que a cidade desenha em cada pastelaria visitada, um palerma, lá fora, enquanto chove docemente, apita, aos berros, um automóvel esfomeado, velho, cansado, talvez sem seguro ou inspecção médica, e os corações de neve
Incham, quando batem à porta e do outro lado aparece o cobrador de fraque, muito bem vestido, muito bem alimentado, palhaço, que o circo da aldeia estacionou na paragem do autocarro da carreira, sentia-se agoniado, sentia-se
Farto, dos vidros falsificados, farto dos pasteis de anta invisíveis e que apenas serviam para enganar o desgraçado estômago de xisto, e as pessoas
Suicidavam-se estupidamente contra os eléctricos,
Havia gajas com saia de chita e luvas de cetim, havia marinheiros poisados em cada patamar da escada de acesso ao navio dos corações de neve, havia gajas, havia gajas suspensas no tecto do circo da aldeia, o mesmo que tinha abandonado o cobrador de fraque, idiota com brilhantina no cabelo de piaçaba,
Havia gajas inconstitucionais, com reformas de duzentos e setenta e quatro euros, havia gajas inconstitucionais com reformas de trezentos e setenta e nove euros, havia gajas
De fraque, e brilhantina no cabelo de piaçaba, que os urinóis das despensas dos prédios clandestinos jorravam contra as faces cruzadas de um cubo de cerâmica dentada, as maçãs, e os pêssegos, e as laranjas, todas, todos
Havia gajas desesperadas, com o passe caducado, nas paragens dos eléctricos, e o vento nocturno quase sempre trazia um colar de pérolas, e a saia e o lenço, e as mãos
As tuas mãos percorriam milimetricamente os espelhos de invenções do corpo sonolento que alguém tinha deixado sobre a cama com os lençóis de espuma que o mar vomita quando bate nos rochedos da saudade, inventavas o amor desértico onde brincavam os dromedários objectos voadores sobre as planícies das tuas coxas ensanguentadas devido ao excesso de palavras,
Da morte
As vogais, de sílabas, e as frases escorriam pelo canto da boca, um líquido esbranquiçado derretia-se na penumbra nuvem de açúcar, roçavas-te nos poste de chocolate com pontinhos de néon, e começam as construções dos corações de neve.

(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó