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terça-feira, 20 de dezembro de 2022

A Janela

(ao meu avô Domingos)

 

 

Deixaste fugir

Os espantalhos dos campos de milho de Carvalhais

Fumaste todos os cigarros

Dos espantalhos dos campos de milho de Carvalhais

Ias à janela

Beijavas a lua

E voavas até ao apeadeiro mais próximo.

 

Cresceste

Fizeste-te louco

Caminhaste pelas calçadas e ruelas

De uma cidade morta

Com cheiro a incenso

E a sexo

E a merda.

 

Pensavas que os campos de milho de Carvalhais

Eram o mar disfarçado de pedra-pomes

Mas os campos de milho de Carvalhais

Eram canções de vento

Palavras enamoradas

Pensavas que os campos de milho de Carvalhais

Pertenciam às esplanadas

Onde fumavas cigarros de prata

Acepipes

E pequenas larvas.

 

Mas daquela janela

De onde conseguias observar a torre da Igreja

E todos os cacilheiros com destino a Santa Cruz da Trapa

Havia uma ponte invisível

Com odor a naftalina

E lábios de saudade.

 

Cansavas-te dos campos de milho de Carvalhais

Galgavas as sombras

E as ribeiras de pólen

Dos campos de milho de Carvalhais

E à janela

Iluminada pelo silêncio da noite

Lá estava ele o coitado do espantalho

Com mãos de vidro

E pernas de vergonha…

 

Não tenhas medo

Meu querido irmão

Das infinitas palavras que habitam o dicionário

Não tenhas medo

Meu grande irmão

Do sono

Da paixão

E da morte,

 

Tudo faz parte

Tudo é vida

(Tudo é fado)

E umas vezes é sorte.

 

Escrevia cartas ao sono

O garoto mimado

Como se o sono fosse um gajo porreiro

Mas o sono

Que tal como os campos de Carvalhais

É um grande filho da puta

Embriaga-se durante a noite

E durante o dia

Vai à janela de Carvalhais

Puxa de um cigarro

E em silêncio

Apanha o primeiro cacilheiro com direcção a Santa Cruz da Trapa…

 

Os livros comiam-me

(e se ainda fossem gajas!)

Agora livros…

 

Quem quer um gajo com livros

Com discos

Com isto e aqueloutro

Sem tudo

Com nada

Ausente

Astronauta

Cançonetista

E nas horas vagas

Trapezista de circo ambulante

E stripper.

 

Íamos à Cárcoda

Sentávamo-nos sobre as pedras

Conversávamos de gajas

E até me queria impingir uma gordinha

Com sotaque de futura empresária…

Não gostei da ideia

(não por a moçoila ser gordinha, mas não nasci para ser capitalista)

E vender artesanato

Pior ainda…

Não nasci para nada.

 

Pelas seis horas da madrugada

A janela

Aos poucos

Fechava-se como se tratasse de um caracol

E escondia-se dentro do quarto,

 

E da algibeira

Sem perceber porque tinha lá pedaços de néon

E um cachecol das estrelas em papel

Acordavam as espigas de milho dos campos de Carvalhais,

 

E o silêncio era tal…

Que ouvíamos a respiração ofegante da tristeza.

 

 

 

 

 

 

 

Alijó, 20/12/2022

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Ilusões de Amor

Francisco Luís Fontinha

Lisboa, 87/88
Alijó / S. Pedro do Sul – Carvalhais, 89
Parte I
Pensamentos de um homem morto
 1
Hoje pude olhar o nascer do sol!
Seus raios são luz que iluminam a esperança,
Não de viver, mas de sonhar.
Tudo o que me rodeia, acorda de um sonho adormecido,
A Primavera finalmente encontrou o renascer
De um amor incompreendido.
Tenho medo…, não de morrer, mas… de sonhar!
2
Estou só e todo o silêncio é pouco.
Entre estas paredes de quem sou prisioneiro,
Recordo-me dos mais loucos e distantes pensamentos,
As pedras que me escutam, olham o transformar
Da minha sombra na escuridão, e que é testemunha
Do meu processo de destruição…
O insignificante a que pertence o meu pensamento,
De nada compreende o meu passado…
3
Em cada segundo de silêncio, o meu pobre corpo
Descansa entre o sonho adormecido,
E todo o meu sofrimento é constante,
Vertical, horizontal, é dor,
E tu nunca compreendeste o que me espera,
Eles dizem-me que o fim está próximo,
Não da morte,
Mas de tudo aquilo que não compreendo…
4
As palavras,
Gritam-me constantemente o silêncio da morte.
A alegria que existe dentro de mim
Não é real, é apenas uma vontade sem vontade
De viver um futuro denegrido, hipotecado ao diabo.
A tua sombra faz com que o meu caminho
Seja projectado num passado distante da minha verdade,
E o teu futuro encalha no meu presente.
Ao longe, olho a tua sombra, e o teu sorriso é lindo!
5
Adeus liberdade solitária!
Tu compreendes-me?
É essa a razão que faz o meu destino
Parecer e ser incompreendido.
Há momentos e não momentos que imagino a separação,
E outros, fico só e o meu corpo adormece.
Em breve vou morrer…, e então serei feliz!
6
Tudo parece impossível!
Viver, sonhar e amar…
Até adormecer é impossível.
Serei diferente?
Olho na luz que me ilumina, e duvido da sua presença,
E da minha existência.
Não compreendo a verdade,
E permaneço rebelde além da destruição…, fico contente.
7
A alma que chora no meu infinito,
Faz de mim solitário,
E o meu coração esconde-se no desconhecido.
No presente, não penso o futuro,
E..., momentaneamente esqueço o passado,
Mas tudo parece impossível…
Não me preocupo quem sou,
E gostava de saber quem serei mais tarde…

Parte II
O acordar de uma mulher
1
Vou caminhando rua acima
Fugindo do meu ideal,
Ao longe recordo o mar,
E compreendo não ser eu real.

Seu olhar olha-me constantemente
E recordo minha sombra,
E um dia…, se voltares a ser minha amante,
Certamente não serei feliz como a pomba.

Maldita escuridão!
Serei eu um sonhador?
E pergunto ao meu coração
A razão de tanta dor…
2
Estou perdido
Numa canção onde posso recordar-te,
E não imaginas o que tenho sofrido
Não ser eu capaz de amar-te.

Gostava de dizer-te alguma coisa…
E por minha culpa
O sol no horizonte pousa,
E transporta-me para tão grande luta.

Conquistei o teu sofrimento
Numa noite em Setembro,
Com os teus cabelos soltos no vento,
Que já esqueci e não me lembro.
3
As folhas caídas
Repousam eternamente neste lugar,
Olho ao longe, as árvores despidas
À espera de um novo luar.
Sozinho e triste
Caminho sobre casas ruídas,
Mas…, o meu amor não resiste
Às folhas caídas.
4
Alem recordo o teu rosto
Repartido pelos movimentos vividos,
Brilhante como Sol-Posto
Imagino horizontes denegridos…
Alem ouço a tua voz
Que me tira as forças para continuar;
E alguém chama por nós
Na razão de amar.
Alem recordo o teu sorriso
Tal como se tratasse de uma estrela cintilante,
Alguém perde o juízo,
E eu, eternamente,
Adormeço no mar…
5
As flores acordam ao amanhecer
Caminhando em distantes mágoas,
Em pensamentos que me fazem reviver
A pureza de suas águas.

Recordarei sempre o teu olhar
Tal como o teu corpo,
Sabendo que não te posso amar
Porque brevemente estarei morto.

Sofro por tua causa
E desconheço se vou resistir;
Em mim apodera-se uma pausa
E logo me leva a partir.
6
As estrelas deixaram de brilhar
E o mar fica distante!
A noite, transparente, parece reconhecer
Sombras encalhadas na ruela,
E ao fundo, a luz cansada de acender,
Apresenta-me uma mulher muito bela.
As estrelas deixaram de brilhar
E o mar fica distante!
Olhei o meu amor
Escondido na cabana,
Escondia sua voz no tambor
E iluminava objectos de porcelana.
As estrelas deixaram de brilhar
E o mar fica distante!
O caos do meu pensamento
Transporta-me para o final,
E todo o meu sofrimento
Esconde-se como um animal.
As estrelas deixaram de brilhar
E o mar fica distante!



Para publicação

domingo, 19 de abril de 2015

Sorriso de granito


A casa amarela

Dos segredos invisíveis

A impossibilidade de amar

Quando o vulcão da esperança

Em línguas de fogo

A aventura de cessar

Todos os prazeres da vida

Deixar de viver

Meu amor

Estando vivo

Deixarei de pertencer aos sábados melancólicos

Se me abraçares no espelho da paixão

 

Deixei de perceber o amor

E perdi-me no tempo

Não sei o que é amar

Quando amado fui

E amado não serei mais

As mãos

As tuas mãos pinceladas no meu corpo

 A atmosfera embriagada das cancelas do amanhecer

O amor imperfeito

Ingénuo

Ambíguo…

Amanhã

 

Meu amor

Domingo

Sem sentido

Perdido

Eu

Nas tuas sombras de incenso

Pego nas tuas asas de papel

Escrevo uma mensagem

E voas

Como corpos em cinza

Levados pelo vento

Das tristes insígnias

 

Tenho medo

Meu amor

De amar-te

Quando percebi

Que não sei amar

Sou um imbecil

Um… um vulto de nada

À janela

Olhando a tua alegre beleza

Na escondida esplanada

Sentados

Brincamos às escondidas

 

Eu escondo-me

Tu escondes-te

… e ele

Eu

Escondido no teu peito

A masturbada cintilação

Das palavras em flor

Os livros comprados

Meu amor

As palavras penhoradas

Por ti

Quando a minha vida

 

Valia quase nada

Não tenho preço

Nem idade

Nem fotografia

Sou um triângulo apaixonado

Pelas janelas das equações diferenciais

O caderno

Em quadrados

O teu corpo

O meu corpo

Em pedaços de rectas

Sem destino

 

Tu

Ao acordar

A carta de despedida

Envidada

Do cansaço

Atravessava a eira

Sentava-me

Meu amor

Ouvia o sino de Carvalhais

Meu amor

Oito horas da noite

Vejo-a

 

Sinto-a

Quando a janela em liberdade

Me trazia o som das cigarras

Pensava em ti

Pensava na Teoria da Relatividade

Ai…

Meu amor

A saudade

Caminhava sobre o teu corpo de gesso

A iluminação da alegria

Hoje

Não

 

Meu amor

Hoje eu não te mereço…

Tenho em mim a tua morte

Sílaba apaixonada

Das pedreiras abandonadas

Vou

Não regresso

Meu amor

Aos teus braços

Sei que a noite me mantém vivo

Porque cerro os olhos

Pego numa tela vazia

 

E desenho o teu sorriso de granito…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 19 de Abril de 2015

terça-feira, 31 de março de 2015

Entre beijos e poeira…


As línguas abraçadas no céu-da-boca

A chuva argamassada contra o silêncio nocturno

Em redor de dois corpos invisíveis

O prazer nas palavras

Saltitam enquanto folheamos um livro sofrido

Em lágrimas

Da morte inanimada

O Sol embrulhado dentro de quatro paredes

O tecto desce

Desce…

E tomba no pavimento lamacento de um dos corpos

O fim da tarde evapora-se

Nos lábios de um cigarro

Negro

Noite

Sombrio

Como os pássaros da minha aldeia

Subo aos teus cabelos

E sento-me nas avenidas envernizadas da madrugada

A cidade cresce

Os automóveis enfurecidos

Em raiva

Como os cães selvagens

Montanha abaixo

A ribeira espera-os

Como visitantes insignificantes

O sexo suspenso nos cortinados do desejo

Os gemidos

E as sílabas da saudade

Há no teu corpo

Vapor de água

E cristais de prata

A imagem das tuas coxas em finas lâminas de desassossego

O mar

O mar dentro de ti

Construindo marés de esferovite

E alguns sorrisos apaixonados pelo sono

Perdi-me neste tempo infinito

Quando ainda existiam equações de areia

No quadriculado olhar

Hoje

Sou uma caneta avariada

Que deixou de escrever palavras

Que…

Que tem uma lápide sobre a secretária

E uma fotografia

Húmidas vogais

Agarradas às escadas da paixão

Sem saberem que a morte

Não é a morte

Que o medo

Não é… o medo

Voar

Sofrer enquanto caminho sobre um arame

(sempre quis ser trapezista)

Artista de circo

Palhaço

Andante…

Sem nome

Quando acordo e sinto que estou vivo

A praia parece a eira de Carvalhais

Graníticas espigas de cio

Nas frestas do sonho

Oiço o sino da Igreja

Quase a desfalecer

Tensão alta

(dizem)

E nos teus cabelos

As luas de Saturno

Envergonhadas

E Titã…

Entre beijos e poeira…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 31 de Março de 2015

domingo, 17 de agosto de 2014

O alicerçado enforcado


Há nesta árvore nua e ensonada,
uma vida sem alma,
um corpo fusco com odor a embriaguez,
há nesta árvore um sorriso,
uma varanda com fotografia para o mar,
o silêncio é contagioso,
doença que invade o alicerçado enforcado...
o homem que inventa tristezas,
o homem que escreve insónias,
há nesta árvore estórias,
madrugadas sem nome,
o homem...
o homem das asas negras,
esperando o regresso da jangada de granito,
ele não resiste,
e insiste...
desenhar na tempestade o infestado grito,
há...
há nesta árvore nua e ensonada,
um poeta em chamas..., um poeta que arde na fogueira...!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 17 de Agosto de 2014

sábado, 16 de agosto de 2014

Línguas de fogo


Tracejadas línguas de fogo,
sinto as mandíbulas da solidão a alicerçarem-se ao meu peito,
há um cansaço travestido de silêncio que alimenta este corpo de madeira,
que anda à deriva no rio nocturno da dor,
os livros divorciaram-se de mim, os livros parecem tentáculos de sílabas agarradas ao meu pescoço,
não me deixam respirar,
eles não o permitem...
sentar-me junto ao areal das cornijas de cartão,
sorrateiramente escondo-me no quarto envidraçado,
onde habita uma gaivota de porcelana,
e há nas fresta da insónia crucifixos doirados, algumas telas embriagadas e néons apaixonados,
… não consigo levantar-me deste rio, e eu não sei como sair deste círculo cinzento...

Sou todo absorvido pelas janelas da paixão,
embrulhado ás línguas de fogo, pareço um caixão de zinco descansando na despedida,
há uma madrugada em fuga, há uma rosa embalsamada que chama por mim...
hesito,
vou...
não vou...
aprisionados marinheiros de vodka em revolta,
oiço a voz dos agrestes pinheiros balançando na montanha do amor,
hesito...
vou... não... não vou...
não quero,
desisto da poesia!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 16 de Agosto de 2014

sábado, 2 de agosto de 2014

Jangadas de incenso


Lembras-me as jangadas de incenso nos braços de uma amada,
há dentro desta casa uma cancela em madeira,
uma cerca de prata,
lembras-me as sílabas com odor a madrugada,
numa cama onde habitam dois corpos embrulhados em azevinho,
há uma arca cerrada com cadeados de luz,
lá dentro, cartas... cartas vestidas de cinza,
migalhas,
seios de verniz suspensos no espelho das tuas pálpebras de alecrim...
lembras-me as jangadas com velhos bancos revestidos a amanhecer,
uma Lisboa apaixonada por transeuntes embriagados, loucos... e marinheiros de palha,
lembras-me uma cidade com vidros de papel,

E migalhas...
lembras-me as flores deitadas no teu peito,
um cigarro a arder..., um cigarro sem jeito nos lábios dos marinheiros de palha,
lembras-me os poemas por escrever,
quando havia no teu corpo pedaços de borboletas e canalha a brincar...
lá dentro, cartas... cartas vestidas de cinza,
e... e migalhas,
lembras-me as tardes sentado a desenhar o Tejo na minha mão,
inventava barcos de cartão,
inventava gaivotas com bolas de sabão,
lembras-me...
lembras-me o silêncio das jangadas de incenso!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 2 de Agosto de 2014

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Noites de Sexta-feira...


Tenho no meu peito um fóssil,
uma lâmina de aço laminado,
tenho no meu peito uma cidade, uma mulher que habita nessa cidade, uma lâmina...
que me estrangula, que me absorve,
e engole,
nas noites de Sexta-feira...

Há um triste olhar que me acompanha desde as ruas de Luanda,
olhava as sanzalas, inventava grãos de areia no Mussulo,
desenhava peixes nos machimbombos com coração de granito,
ouvia, às vezes, um grito...
e engole,
nas noites de Sexta-feira,

Há um apito quando oiço a voz do silêncio,
uma criança com mãos de sisal,
deitada na eira de Carvalhais,
tenho no meu peito um fóssil,
um lâmina de aço laminado,
uma luz esculpida na calçada do abismo...
havia entre nós um muro amarelo,
havia ao longe um rio embriagado,
eu, eu sorria,
eu, eu descia... até que os tentáculos do desejo me levavam,
e quando regressava,
o apito... apitava...

O vício vomitava sílabas com sabor a alumínio,
e eu, eu dançava sobre uma nuvem de nada,
que me estrangulava, que me absorvia,
e engolia,
nas noites de Sexta-feira...
… e percebia o significado de liberdade.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 1 de Agosto de 2014

domingo, 27 de julho de 2014

Os socalcos das coxas cinzentas dos pinheiros bravios...


Feliz aquele que tem alguém para amar,
feliz aquele que tem um livro para ler,
escrever, tão feliz... tão feliz aquele que sente a noite adormecer,
adormecer... nos braços do luar,

Feliz aquele que tem lábios para beijar,
que habita numa boca com sorriso de amor,
feliz aquele que inventa cabelos na planície do amanhecer,
e sem querer... e sem querer começa a chorar,

Felizes os barcos que têm marinheiros de papel,
corpos nus, corpos com sabor a mel...
feliz aquele que tem seios para pintar,
segredos para desvendar, quando o calendário da solidão... desaparece no mar,
feliz, eu?
talvez venha um dia a acreditar,
que há sanzalas com odor a chocolate,
que existem nuvens plantadas nos socalcos das coxas cinzentas dos pinheiros bravios...
feliz aquele que morre sem o perceber,
feliz..., tão felizes os cigarros de fumar,
tão felizes os cigarros de viver,
… quando há uma mulher embrulhada numa folha amarrotada,

Feliz aquele que tem alguém para amar,
feliz aquele que tem um livro para ler,
feliz..., tão feliz aquele que tem um poema a crescer...
a crescer... no verbo desejar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 27 de Julho de 2014

sábado, 26 de julho de 2014

A Calçada do Adeus


Esta vida que não me esquece,
cai a noite e me absorve, e me evapora,
desço a calçada como poeira cansada,
e aos poucos, despeço-me do rio,
despeço-me da alvorada,
sento-me, e espero o regresso do amanhecer,
folheio um livro, leio um poema amaldiçoado,
dói-me o corpo, e esta vida que não me esquece,

Desenho uma gaivota apaixonada pelo silêncio do mar,
há uma cabana sem lareira, uma cabana atraiçoada,
e eu sentado, converso com a gaivota, converso com a cadeira...
sobre esta vida que não me esquece,
e me evapora,
folheio, folheio... e o livro do poema amaldiçoado... me deseja,
me leva para o solstício do beijo,
e sendo eu sou um ausente,
que não sente, que não ama...
pergunto-me... o que é o amor?
É uma cidade destruída? É uma canção com poemas de chorar?
que a vida não esquece, que a vida não me esquece... de me recordar...

Esta vida que não me esquece,
quando lá fora há estrelas à minha espera,
quando lá fora a gaivota apaixonada... chora,
porque foi maltratada, porque foi espancada...
pelo vento da clareira cinzenta,
que desce comigo a calçada, e... e me atormenta.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 27 de Julho de 2014

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Navalhas do sofrimento


Oiço das navalhas do sofrimento,
os teus beijos prometidos,

Lamento,

Oiço os teus anseios,
quando nos entra o mar casa adentro,
desço as escadas,
escondo-me nos teus lábios...
amo tanto o mar... que não consigo olhá-lo, tocar-lhe,
como não sou capaz de poisar a minha mão no teu luar...
e...
e simplesmente ficar lá, ela imóvel, prisioneira de ti,
e... e coitada da minha mão,
esponjosa, magra... cansada das palavras tristes,
das palavras... das palavras amargas,
e o movimento curvilíneo... em busca do teu coração,

O cofre com fechadura invisível,

Lamento,

Oiço das navalhas do sofrimento,
os teus beijos prometidos,
oiço-os e nada posso fazer,
lá fora está noite,
escuridão,
posso dar-me ao trabalho de procurar as tuas lágrimas,
nunca as encontrarei,
tão pouco sei se choras, se ris... se gritas... ou inventas árvores no recreio da escola,
e quanto a mim, nunca, nunca fui capaz de encontrar o que quer que seja,
porque sou desajeitado,
porque... as sombras do teu corpo habitam nas drageias do silêncio...
e há sempre um braço a proibir-me... de... de amar, de construir amores nas flores do amanhecer,

Tão longe, os teus sôfregos olhos perdidos na constelação AMAR,
o telescópio vagueia na eira da poesia,
e nem assim, e nem assim é possível observar os teus olhos...

Lamento,

O significado de corpo, agora é rocha vadia,
que caminha nas ruas com candeeiros de prata,
lamento...
ouvir das navalhas do sofrimento...
os teus beijos prometidos,
sofridos,
oiço-os e nada posso fazer,
apenas lamentar,

Que o cofre com fechadura invisível,
seja o teu coração protegido por um velho cubo de vidro,
aquário, peixe, avião... pá.. barco carregado de fantasias e travestis,
bares recheados de coquetes e marionetas envergonhadas,
alienados vizinhos que fumam cigarros de lata,
que o cofre se parta,
e morra...
como morrem os poetas,
como morrem os fantasmas... quando no relógio de pulso da solidão são quatro horas da madrugada,
nasci às sete horas e trinta minutos,
era Domingo...
e deixaram em mim as navalhas do sofrimento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 23 de Julho de 2014

sábado, 7 de junho de 2014

Shot de AMOR!


Hoje, quero fugir,
esconder-me na sanzala da minha infância,
com os meus frágeis bracinhos, chapinhar nos charcos de areia,
hoje, hoje a noite parece um cortinado de incenso, ténue silêncio nos teus dedos,
faltam-me as palavras, faltam-me corpos para escrever as palavras,
de neblina, de pólen... corpos, de cera, de nada, apenas corpos sem significado,
hoje, quero fugir,
hoje, hoje pareço uma locomotiva galgando os campos de milho de Carvalhais,
apitos,
e gritos,
hoje,
hoje, os teus olhos incendiaram os meus lábios,

(palpita-me que hoje vais descobrir o texto invisível que esconde o meu peito)

Hoje, quero-te,
fugir,
alegrar-me com o teu sorriso de bambu,
afagar o mabeco desgostoso, cansado da vida, cansado... cansado destas palavras...

(Cansado da tua ausência, e não estás ausente, e não... e não hoje, por favor, hoje não, hoje não sonhos nos teus cabelos)

Hoje, quero fugir,
desenhar-te na minha boca,
hoje, esconder-me em ti,
como uma criança amedrontada,
triste,
com medo,
medo que do mar venha a sanzala da minha infância,
e me traga,
paciência...
porque hoje, hoje quero fugir,
e hoje quero-te em mim,
construindo círculos de preia-mar,

Hoje, quero-te,
fugir,
alegrar-me com o teu sorriso de bambu,
afagar o mabeco desgostoso, cansado da vida, cansado... cansado destas palavras...

(searas, margaridas, hoje todos me pedem as palavras que nunca escrevi)

E hoje, e hoje escrevo porque te vi,
e sem ti,
senti o luar poisar nos meus ombros,
senti o xisto dos muros caindo dos socalcos imaginários,
como os barcos de papel,
como os marinheiros de sisal,
enfeitados com plumas encarnadas e sorrisos de vodka,
e hoje, e hoje quero fugir,
aterrar num bar sem conhecer ninguém,
sem palavras,
sem... sem ti,
sentir o machimbombo da paixão em pequenos soluços,

(e nada como uma bebida com sabor a amar)

Um shot de AMOR!
Porque hoje quero fugir,
um shot de saudade,
porque hoje sem ti,
senti a tua fotografia na montra de uma livraria,
raios...
outra vez a poesia,
um shot, por favor,
um shot de alegria,
um shot para me recordar,
como eram lindos os teus seios de madrugada,
e hoje, hoje quero fugir,

(sem me preocupar com o amanhecer, sem me preocupar com nada).


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 7 de Junho de 2014