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segunda-feira, 31 de julho de 2023

Nortada

 Lateja a mingua luz da montanha

Abraça-se a mim o vento em nortada

Esta casa em aflição

Que arde

Grita

Lateja a míngua luz do teu olhar

Socalco que se esconde no doiro rio

 

Lateja a míngua luz da montanha

Às árvores de cartolina colorida

O rio em saudade

Que arde

Grita

No centro da cidade

 

Lateja a míngua luz em silêncio

No silêncio que te beija

Deste rio que corre nas tuas veias

Entre lágrimas de chuva

E de estrelas sem brilho

Que também elas latejam

Na cidade luz

Da míngua montanha

Que dorme em desespero

 

Lateja a míngua luz nos teus lábios

Que sofrem

Que procuram a liberdade

Da luz que lateja da minha nortada

Nesta triste e pobre cidade

Que traz o vento

E leva de ti o sofrimento

E a saudade.

 

 

 

31/07/2023

Alijó

Francisco

sábado, 6 de maio de 2023

Caravela do silêncio

 Perdidos, aqui,

Perdidos na imensidão da poesia,

Dos corpos suspensos, nos corpos em palavras de arder…

Perdidos de ti,

No novo dia,

Quando este dia… parece sofrer,

 

Quando este dia em caravela do silêncio,

Rompe a madrugada,

Quando deste dia, sem o dia…

Se faz à estrada,

 

Perdidos, aqui,

Nas mãos da minha amada,

E da querida manhã, recebo em despedida…

Na voz de gritar,

A triste madrugada,

Da triste partida…

 

Perdidos, aqui,

Coração dos milagres,

Perdidos em ti…

Perdidos na montanha envenenada,

Tão pedidos,

Tão distantes,

As mãos da minha amada…

Quando ela se esconde… se esconde dentro das estrelas brilhantes.

 

 

 

Alijó, 06/05/2023

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 5 de maio de 2023

A tua mão, meu amor

 Levo as minhas palavras

Em rebanho,

Subo a montanha, subo-a até ao cume,

Abro os meus braços de invisível silêncio…

E voo-o até longe,

Pego naquele livro que não se cansa de me olhar,

Aquele mesmo livro,

Olha… aquele…

O das palavras de dormir,

E lá dentro brincam as mãos com que acaricio o teu rosto de mar,

 

Sou filho do silêncio,

Meu amor,

Preciso tanto do silêncio,

Como preciso dos teus lábios…

Como preciso da tua boca,

E se não estivéssemos em Maio,

Sim, meu amor, Maio…

Mês de Maria, Maio de mulher, Maio de mãe…

 

Se não estivéssemos em Maio,

Eu estava louco,

Louco por ti,

Louco por todas as flores…

Louco dentro destas palavras em loucura,

E, no entanto,

Meu amor,

Não estou louco…

 

Nunca estive louco.

Abraço-te enquanto a noite se despede de mim…

E uma lágrima de sono

Anda de cama em cama,

E beijo-te calorosamente na ausência da tua mão,

Sofri tanto, meu amor,

Sofri tanto com as ruas de Setembro,

Quando ainda acreditava nas acácias do meu pai…

As acácias do meu pai morreram,

Mais tarde, morreu o meu pai,

E eu, continuei a acreditar nas acácias do meu pai,

Mas depois, ficou tudo tão triste…

 

Procuro a tua mão perdida no lençol da paixão,

Ó madrugada de sonhar…

Procuro-a, e não me canso de a procurar,

Quando sei que a noite começa a embriagar-se nos teus lábios,

(tenho medo de que a noite roube os teus lábios, meu amor!)

Tenho tanto medo.

Todos os dias, escrevo-te,

Escrevo-te dentro desta ausência que o meu corpo sente…

Escrevo-te enquanto percebo que há uma lágrima de mar

Na tua mão que procuro;

E mesmo assim…

Tenho medo de que me roubem os teus lábios meu amor!

 

Tenho tanto medo…

E não me canso de a procurar.

Procuro-a entre os destroços das minhas palavras,

E sobre esta secretária, a minha ausência travestida de insónia…

(Levo as minhas palavras

Em rebanho,

Subo a montanha, subo-a até ao cume,

Abro os meus braços de invisível silêncio…

E voo-o até longe)

E quando chegar ao longe…

A tua mão procurada poisará no meu peito.

 

 

 

Alijó, 05/05/2023

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Sonhos de sonhar

 Dos braços desta ribeira

Recebo a voz do silêncio,

Nos braços desta ribeira

Vêm a mim as semeadas palavras

Que na voz do silêncio

Acordam as madrugadas,

 

Dos braços desta ribeira,

Ribeira que corre nas minhas veias,

 

Dos braços desta ribeira

Que em círculos brinca na minha mão,

Vou procurar a manhã que acorda,

Na manhã que mergulha na montanha…

Nos braços desta ribeira,

Ribeira das noites em luar,

Regressam a mim os sonhos,

Os sonhos de sonhar.

 

 

 

 

Alijó, 19/01/2023

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Rio invisível

 

Íamos à montanha

Em busca das serpentes

E desenhávamos um rio invisível

Nas pedras adormecidas,

 

Depois

Descíamos à aldeia

E nunca encontramos o sono

Nas mãos de uma árvore,

 

Mas víamos as lágrimas

Que sobejavam das lareiras da insónia

E deste pequeno incêndio de tristeza

Acordavam as estrelas da madrugada,

 

E ficávamos sem a madrugada

Como ficamos sem a lua

Quando este mar salgado

Se suicidou no areal da saudade.

 

 

Alijó, 21/12/2022

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Gaivotas em silêncio

 Não inventes o mar dos monstros marinhos

Não deites fora a espátula que dá forma à tela

E que faz com que os pássaros brinquem sozinhos

Não. Não deites fora o vento que faz trabalhar os moinhos

Enquanto na tua mão brinca um barco à vela.

 

Não penses que o mar é só teu

E que da ondulação

Um cachimbo de prata

Se alicerça na tua boca.

 

Não. Não penses que ganhastes o céu

Porque nem à terra pertences. Não deites fora as gaivotas do silêncio

Que povoam os cabelos amargurados da madrugada.

Não

Não deites fora a magreza dos pinheiros mansos

Quando da montanha vem a escuridão.

 

Quando a montanha é o teu coração.

Não. Não inventes o sono nas planícies

Enquanto o sono é apenas um voo

Uma constelação de silêncios

Que morre nos lábios das estrelas.

 

Não. Não digas que a manhã está nublada

Só porque a manhã está nublada,

 

Ou porque morreu uma gaivota,

 

Morrem todos os dias milhões de gaivotas

Morrem por dia

Milhões de crianças

Mulheres

E versos

E aterra sempre a girar.

 

Suicidam-se por dia

Não sei quantos homens e mulheres

E que ambos acreditam que o suicídio é a solução…

E o suicídio não é a solução

Para homens

Para mulheres

Quanto mais para uma gaivota.

 

Não inventes o mar

Nas mãos daquele que não gosta do mar.

 

E não culpes Deus porque o dia está nublado,

Porque Deus não entende de meteorologia

Nem de matemática

Nem de nada;

Deus é apenas um colar de pérolas

Que transportas ao peito

E quando uma gaivota está em silêncio…

Deus… está a cagar-se para a gaivota

E para ti

E para mim

E para a terra

E para todas as gaivotas em silêncio

E para os versos das gaivotas em silêncio.

 

Não inventes o mar

Nas mãos daquele que não gosta do mar

Não desejes que o mar

Entre pela tua janela

Quando tão pouco tu tens uma janela…

 

E que esta gaivota não seja estúpida.

 

 

 

 

 

Alijó, 19/12/2022

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Instante

 Primeiro levaram todas as crianças da montanha

Depois levaram todas as árvores e todos os pássaros

Num final de tarde

Levaram as pedras e todos os animais

Caiu a noite

E levaram a lua e todas as estrelas

 

E roubaram a noite

 

E aqui estou

Perdido nesta montanha de insónia.

 

 

 

 

 

Alijó, 05/12/2022

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Lágrimas de Deus

 

Sento-me nesta pedra cinzenta

Olho a montanha enquanto saboreia o prazer

Do último cigarro da manhã

Ao fundo

O rio encurvado nas lágrimas de Deus

 

E percebo que este rio

Que esta montanha

Que este cigarro e que este Deus

Não me pertencem

Nunca me pertenceram

 

 

Alijó, 21/11/2022

Francisco

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

O mendigo da cabeça cortada

 

Ordenou-lhe que se ajoelhasse, ele fê-lo sem hesitar, e só depois de sentir no pescoço o frio da lâmina da espada que o Rei Nu segurava com as duas mãos, percebeu que este lhe ia cortar a cabeça; durante alguns segundos viu-a rolar calçada abaixo, depois, acordou sobressaltado e deu-se conta que estava a sonhar.

Algo de errado se passava com a sua vida, pois o Rei nunca cortaria a cabeça a um mendigo, e este último não sonha.

Então mergulhou na sombra e questionou-se… porquê eu?

Será porque escrevo nas paredes da casa de banho?

O dia estava frio. Na silenciada manhã ouviam-se os gemidos dos primeiros cigarros em combustão, aos poucos, muito devagarinho, as primeiras crianças deslocavam-se para a escola, e num ápice, como se tivesse caído do céu uma montanha de pássaros, toda a rua ficou intransitada; chovia torrencialmente e apenas de barco era possível chegar ao cais.

Sabes, ouvi dizer que todos os mendigos são felizes…

Eu sei!

Como vou agora atravessar a rua com toda esta enxurrada?

De relance viu sua majestade o Rei Nu, mas como tinha sonhado que este lhe tinha cortado a cabeça, hesitou, pensou muito bem, e decidiu não lhe pedir ajuda,

E se o gajo hoje me corta mesmo a cabeça?

Um mendigo sem cabeça não é anda, é um corpo, como tantos outros, que passam apressadamente para o trabalho.

E não seremos todos nós… corpos?

Adiante.

Meteu-se à água muito pausadamente para não se enfiar em algum buraco que estivesse submerso, chegou ao cais, e com algum esforço, deitou a mão ao muro de vedação e num pequeno salto no escuro, atravessou-o sem dificuldade.

Do outro lado da rua e já no cais, deu-se conta que tinha esquecido o pequeno saco que trazia na mão, onde algumas bugigangas se escondiam no seu interior, neste caso, todos os seus pertences, e mentalmente deparou-se com o dilema de voltar a atravessar novamente a rua ou partir mesmo assim; sem nada.

Partiu assim mesmo.

Na algibeira, juntamente com dois ou três cigarros, tinha a caneta de tinta permanente que lhe tinham oferecido e que de nada lhe servia, pois não tinha papel com ele, tão pouco uma secretária e cadeira onde sossegadamente poderia sentar-se e escrever alguma coisa. Sentiu o vento no rosto; e pensou que tudo se conjugava para pegar no barco à vela e zarpar em direcção ao desconhecido.

Perdeu-se de amores por uma Princesa, nunca soubemos se era a filha do Rei Nu ou outra qualquer, tem um rebanho de cabras e dizem, quem já o viu, que é muito feliz.

Como são felizes os mendigos que se perdem de amores por uma Princesa e têm um rebanho de cabras.

 

 

 

Alijó, 21/10/2022

Francisco Luís Fontinha

(ficção)

sábado, 20 de junho de 2020

Hoje


Não tenho pressa de caminhar.
Não tenho na mão a pedra filosofal.
Não. Não percebo este rio a chorar.
Quando o cansaço laminado da manhã, sofre, vomita as palavras de Inverno.
Não tenho nos livros as tuas mãos quando o amanhecer acorda,
Não sei quantas pedras, hoje, tenho para atirar à tua sombra.
Não tenho a madrugada para chorar.
Não tenho as lágrimas para desenhar,
No chão abandonado pelo silêncio.
Não tenho a noite para dormir.
Não tenho o dia para sorrir.
Não. Não sei se hoje é dia para correr,
Chorar,
Ou morrer.
Não tenho as letras do teu sorriso,
Quando o sol ilumina os candeeiros do sofrimento.
Não tenho as imagens do mar,
Salvado pelo amanhecer.
Não tenho as sandálias dos pequenos alicerces da cidade dos Deuses.
Não. Não tenho pressa de caminhar.
Não me digam que hoje posso subir à montanha da despedida.
Não o vou fazer.
Porque hoje,
Hoje não tenho tempo para morrer.
Hoje não é o tempo da partida.



Francisco Luís Fontinha
20/06/2020

domingo, 26 de janeiro de 2020

Onde mora o silêncio, se não em ti?


As árvores deste jardim cansado,
Onde adormece o silêncio das palavras assassinadas por mim,
Há um luar desiludido,
Que grita às planícies do alecrim,
O poema desejado,
Entre versos e ossos embalsamados,
Vem a esta casa, o miúdo perdido,
Das montanhas húmidas,
A voz que alicerça a fome,
A rua que limita o olhar,
Sem nome,
Sem mar,
As árvores distintas dos pássaros, o medo de dormir,
Numa cama de pétalas encarnadas,
Nas veias, o orgasmo do cobalto,
A madeira envernizada,
Porque as lágrimas,
No rosto se perdem,
E fogem para o triste adormecer,
O vulcão quase a vomitar palavras de nada,
Sempre em alerta, sempre abandonada,
A casa,
O ódio madrugada da vida,
Entre correr,
Entre morrer,
Simples, assim,
Simples, simples, nada esquecer.
O mendigo que corre na calçada,
Desejado por uns, amaldiçoado pela namorada,
Escreve-me,
Oiço-o,
Na alvorada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
26/01/2020

sábado, 23 de novembro de 2019

O sono


Dorme, dorme, meu menino.

Nas lágrimas desta cidade.

Na rua caem palavras de saudade.

No altar veneras o Santo Peregrino.

Dorme.

Dorme, meu menino.

Dorme, dorme, meu menino.

Nos livros de sonhar.

Dorme, meu menino.

Menino do mar.

Dorme.

Dorme, meu menino.

Nas manhãs de desenhar.

Dorme, dorme, meu menino.

Dorme nesta cama de palavras incertas.

Dorme, meu menino.

Nas cantigas de amanhecer.

Meu menino, dorme.

Dorme, antes de nascer.

Dorme.

Dorme, meu menino.

Dorme nas sombras da madrugada.

Meu menino, menino, dorme.

Nesta pedra cansada.

Nesta pobre calçada…

Dorme.

Meu menino, dorme.

Meu menino, dorme.

Dorme sem almoçar.

Meu menino, dorme.

Dorme até antes de jantar.

Meu menino.

Dorme.

Dorme, cansado, meu menino, dorme.

Dorme à beira desta montanha desabitada.

Meu menino.

Menino.

Dorme nesta aldeia amaldiçoada.

Dorme.

Dorme, meu menino.

Esquece o sono de ontem.

Recorda o sonho de hoje.

Meu menino. Dorme.

Dorme. Menino que foge.

 

 

 

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

23/11/2019

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

A saudade


Tenho saudades das tuas mãos poisadas no meu rosto,

Quando ao longe, um rio encurvado, dormia na sombra da montanha.

Tenho saudades do teu cabelo, como pingos de chuva, aos poucos, voando pelo jardim.

Tenho saudades do teu olhar, pela manhã, se impregnava no meu olhar.

Tenho saudades do teu sorriso,

E das flores do teu sorriso.

Tenho saudades da tua sombra,

Do teu perfume,

E das janelas coloridas que desenhavas no meu berço.

Tenho saudades do mar,

E dos barcos brincando no mar.

Tenho saudades de uma Luanda quando eu suspenso na tua mão…

Me recusava a caminhar.

Tenho saudades da escuridão,

Da noite,

E da tua canção.

Tenho saudades dos teus papagaios em papel, colorido, como o arco-íris.

Tenho saudades da claridade,

Dos rabiscos que eu fazia nas paredes da nossa casa,

E das mangueiras abraçadas a mim.

Tenho saudades dos aviões,

Dos gelados no Baleizão…

E de outras ocasiões.

Tenho saudades do circo,

Dos palhaços,

E dos trapezistas disfarçados de palhaços.

Tenho saudades, muitas, de ti, minha querida.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

21/11/2019

segunda-feira, 18 de março de 2019

O silêncio.


Entre as mulheres, o crucifixo da paixão,

As sílabas na rebelde tarde poeirenta,

Esperando o regresso do rio Doirado.

As palavras milagrosas, nas mãos do peregrino,

As lágrimas, tenebrosas,

No rosto do pobre menino…

Escrevo-te esta canção,

No papel pardo, que alimenta,

E respira,

O meu corpo cansado.

E, o vento me atira,

Todas as pedras da montanha,

Ninguém me apanha na escuridão…

Sofro, a morte aparece suspensa nas paredes da aldeia,

Tenho uma ideia,

Um dia, um dia deitar-me no chão,

E sonhar-te enquanto caminhas em direcção ao mar.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 18/03/2019