segunda-feira, 31 de março de 2014

Papeis de estanho


Tenho medo de ti, quando me espreitas da janela da solidão,
percebo que estás frágil, inconformado, ausente das minhas mãos de chocolate,
fumo-te sabendo que habitas nos meus olhos de cascalho...
sou triste quando os teus lábios dormem nos meus lábios,
e invento papeis de estanho para esconder as minhas lágrimas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 31 de Março de 2014

domingo, 30 de março de 2014

Bocas famintas

foto de: A&M ART and Photos

Sou absorvido pelos tentáculos da insónia,
dou-me conta da noite triste,
confusa, e só...
pertenço às paredes límpidas da solidão fantasma, às vezes, ela, veste-se de livro,
e dorme na minha mão disfarçada de rocha ensanguentada com dentes de leão,
outras, ela parece o cortinado inanimado da minha janela sem fotografia para o mar,

Sou absorvido por barcos longínquos das tardes de cacimbo,
sou o portão de entrada do quintal imaginário rodeado de mangueiras e sombras,
oiço o sorriso do embondeiro a sobrevoar o meu olhar, e sei que estou vivo porque alguém pega na minha mão de menino e diz-me que sou filho do Oceano,
sou absorvido por tudo e por nada,
pelas palavras, e pelas montanhas, e pelas ardósias envergonhadas do desejo,
sou... pelos tentáculos da insónia,

E.. e dos beijos,
sou um cadáver sem nome,
e enquanto era absorvido... sei lá por quem eu era absorvido!
mãos, pernas, braços, caricias, loucas caricias de mãos desconhecidas,
e no entanto, ainda pertenço aos indefinidos corações de incenso com borboletas cinzentas...
e bocas, absorvido por bocas famintas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 30 de Março de 2014

Esconderijo da solidão

foto de: A&M ART and Photos

Sacias-te na minha sede mergulhada em perfumados cachimbos de prata,
encontras em mim a doce corrente do aço clandestino da saudade,
sei que existo porque escrevo-te palavras, vãs palavras que o tempo come, e alimentam as tempestades da dor,
sacias-te em mim como se eu fosse um marinheiro escondido na escuridão da cidade,
procurando engate, procurando o prazer sem o prazer... no inanimado mundo da morte,
procurando mãos silenciosas para argamassarem o meu corpo aos cais do desgosto,
e sinto-me uma ténue folha de papel esquecida no teu ventre,
sacias-te nos meus olhos, e cerro-os para me ausentar de ti,
palavra, palavra do engano que sente o sofrimento,
e... dizes-me que todas elas são inconstantes equações trigonométricas,
cansadas,
tão cansadas como as tuas mãos poisadas no meu rosto de lata...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 30 de Março de 2014

sábado, 29 de março de 2014

Coração em pedra

foto de: A&M ART and Photos

Ele tinha um coração em pedra, daquela pedra ínfima que alimenta os beijos nocturnos dos pássaros,
vinha a chuva, e viam-se-lhe as perdidas chapas de zinco nos pobres telhados da madrugada,
hoje, ele, hoje ele dispensa o significado da palavra “AMOR”, porque onde a tinha escrito, na folha caduca da árvore tombada, essa, essa... morreu, morreu a palavra... morreu a árvore tombada,
fingiam-se amantes abraçados aos pinheiros mansos no recreio da escola, e sempre, e sempre havia uma janela em ruínas, pedaços de lágrimas que sobejavam do sino da Igreja,
ao longe sentiam-se os feirantes que tudo vendiam, e de nada servia gritarem... “Vendem-se Beijos Embalsamados”, porque de beijos, nada, nem o vento, nem o triste amanhecer na boca dela,

Desenhei-lhe os lábios na esplanada do falso diamante,
escrevi nos seus seios “AMAVA-TE”..., hoje escrevo, não, hoje nada lhe escrevo, porque o amor desaparece e aparece como as sombras dos barcos em movimento,
recordo o púbis coloidal do imaginado olho de vidro, fundeado na minha mão,
a mesma que depois de suicidada, acariciava-te os esconderijos do néon vaginal,
e assim, ele tinha um coração em pedra, e assim... ele dorme sobre as candeias do luar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 29 de Março de 2014

O homem de negro

foto de: A&M ART and Photos

O homem de negro aparece-lhe no sonho de papel,
apalpa-lhe o seio, acaricia-lhe as coxas diurnas da paixão,
ouvem-se os estilhaços de um corpo de porcelana,
um tiro de desejo, e “PUM”... a madrugada morre, e o homem de negro transforma-se em mão,
clandestina,
cinzenta,
o homem de negro é a escuridão,
e do espelho inseminado do prazer vêm os cintilantes corações de prata,
lá fora um letreiro grita “Hoje há moelas”, e a rua veste-se de transeunte mendigo,
e hoje, e hoje a mulher apalpada pelo homem de negro, dorme... tranquila, dorme docemente como as curvas esverdeadas dos olhos das searas em construção,
o homem..., o homem de negro, triste, desaparece quando alguém liga o interruptor do amor,
e um pedaço de aço incandescente poisa no seu ventre...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 29 de Março de 2014

sexta-feira, 28 de março de 2014

O inútil perpendicular


Sinto-me um inútil perpendicular ao cateto do teu desejo,
sei que através do cosseno do teu olhar, existe vida, sonhos, flores triangulares,
sinto-me uma equação diferencial sem resolução,
uma parábola suspensa nos teus seios de diamante lapidado, ferido pela directriz dos teus lábios,
sei que sim, sei que sou um panfleto embebido na paixão...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 28 de Março de 2014

quinta-feira, 27 de março de 2014

o sonho aos teus braços

foto de: A&M ART and Photos

do silêncio habitado que consome o teu cansado perfume
a alga minha suspensa no amanhecer teu
do silêncio amargurado que constrói moinhos de vento
eu oiço os teus argamassados gemidos
tristes

tristes tão tristes que a chuva acorrenta o sonho aos teus braços
do silêncio
o teu nosso silêncio...
o mar que engole os rochedos da paixão
e...

e de nada serve gritar pelo amor das árvores e das palavras
nuas
as tuas
as tuas mãos poisadas em mim
que não pertenço aos teus cabelos de mel


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 27 de Março de 2014

quarta-feira, 26 de março de 2014

Os cadeados invisíveis do desejo


Dizes-me que a noite é uma construção em néon adormecido,
vives pedindo-me palavras, vives... regateando silêncios entre carris de aço,
dizes-me que sou um cadáver embriagado,
triste... triste e sem cansaço,
sem o cansaço pedestal do azoto,

Dizes-me que amanhã não há paixão,
que todos os rios são solitários e casmurros, e... e sem mãos para as caricias do amanhecer,
sinto-te embalada no gatilho do incenso coração,
sem a espingarda neblina teu olhar, sem... sem flores a envelhecer,
e mesmo assim, dizes-me que sou um transeunte envenenado pela solidão,

Dizes-me que sou a tua nuvem colorida,
mas apenas o dizes quando te convém,
dizes-me que na madrugada nua...
não há nada, nada, nem ninguém,
porque me dizes ser eu uma estrela de algodão?

Dizes-me que não entendo os teus lábios em puro cristal,
que sou desastrado, ingénuo... que sou um falhado,
que sou o teu livro do mal...
como petroleiros da insónia esperando o marinheiro apaixonado,
como o triste vagabundo... no Inferno da cidade dos canibais,

Dizes-me que a noite é uma construção em néon adormecido,
pergunto-te se nos teus seios habitam jasmins, amoreiras... rosas encarnadas,
respondes-me que não, e dizes-me que há em ti o sorriso envelhecido,
como gelatina encaixotada nas janelas desalmadas,
e depois, depois... desapareces entre as rochas e os cadeados invisíveis do desejo.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 26 de Março de 2014

terça-feira, 25 de março de 2014

Aqui perdidas em ti


Aqui vou procurando as sílabas perdidas em ti,
aqui abraço o cansaço dos teus lábios,
aqui adormeço, aqui... aqui habito como um sonâmbulo embriagado,
uns dias olho o luar, outros... outros apetece-me chorar,
aqui não há mar,
gaivotas,
cacilheiros travestidos de neblina,
aqui, eu, percorro as cinzas do teu olhar,
e sonho, e penso, e quero partir como partem as andorinhas depois do término da Primavera,
aqui me esqueço, aqui...
aqui fundeio o meu cadáver de pano,
e grito, Aqui... Aqui a vida é um engano,

Aqui me amanho como um rebanho de desejo,
escondo-me na montanha do adeus, e nada, e nada,
aqui tenho livros que não quero ler,
odeio as palavras, odeio o querer...
querer que não tendo vou ter,
o quê?

Que aqui vou procurando as sílabas perdidas em ti,
os jardins sem flores,
as nuvens tão negras, tão negras... que é sempre noite,
sempre... sempre noite,
aqui não há Cais do Sodré,
machimbombos, mangueiras... papagaios em papel colorido,
aqui me enforco, aqui habito imaginando que tenho ossos, que tenho vida...
tecto com estrelas em chita, aqui... aqui nada me excita,
nem as palavras, nem as imagens das fotografias assassinadas,
aqui não há madrugada,
amanhecer,
aqui, aqui apenas existe dor, aqui, aqui apenas existe... engano.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 25 de Março de 2014

segunda-feira, 24 de março de 2014

Viagem ao centro dos teus olhos


Verdes pergaminhos do amanhecer amargurado,
cintilantes madrugadas com sabor a desejo,
vagabundas manhãs infestadas de corações de mel,
viajo dentro de ti como os pássaros quando regressa a chuva miudinha,
verdes cansados beijos,
verdes lábios,
… boca dispersa na Primavera das flores campestres,
verdes olhos, verdes... verdes pergaminhos do amanhecer amargurado,
viajante solitário procurando abrigo, e um abraço se levanta do chão,
e dou-me conta que é noite,
cortinados cerrados...
e da tua janela... e da tua janela apenas uma sombra de silêncio.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 24 de Março de 2014

domingo, 23 de março de 2014

Noite em mim aos tentáculos sonoros do meu peito

foto de: A&M ART and Photos

A noite não regressa, a noite é uma prostituta convicta, fã da escuridão,
eu, eu pertenço à noite, os teus lábios são filhos da noite, e as estrelas convencem-te que existe vida nas pedras, que existe vida nas árvores e gaivotas, que existe vida nos velhos cacilheiros...
atiro-me ao rio e procuro as tuas mãos que pertenceram ao meu rosto,
vivo, respiro pigmentos coloridos de saudade, e... e como fã da noite, sofro como sofrem os veleiros quando cessa o vento,

A noite entranha-se em mim, oleia-me os tentáculos sonoros do meu peito,
finjo viver quando lá fora, quando do outro lado da rua... não vivem, não existem...
nem noite, nem estrelas... e apenas uma corda de nylon me aprisiona a este cais poético derramando palavras nas searas de Carvalhais,
e escondia-me dentro do canastro... e sonhava que um dia, eu, eu pertenceria à noite.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 23 de Março de 2014

Vidas anónimas com sabor a naftalina

foto de: A&M ART and Photos

Sem o vento ardem as minhas asas,
evaporam-se todos os meus sonhos de neblina adormecida,
hoje, hoje pareço um transatlântico enferrujado, velho e cansado,
sem coração, eu, eu a pedra do muro em desgosto,
subo as escadas do silêncio... e, e sei que não lhes pertenço,
ausento-me, escondo-me, invento vidas anónimas com sabor a naftalina,
sem o vento,
ardem...
ardem as minhas mãos coloridas,
e de dentro de ti vêm a mim as palavras mortas, as palavras não minhas,
ardem e sinto,
sinto que deixei de caminhar nos teus olhos envergonhados...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 23 de Março de 2014

Que estou vivo, que estou vivo sem o saber


Recomeço, esqueço-me que estou vivo, oiço na TV um grupo de Jazz, deslumbrante para um Sábado sem memória, escrevo sem saber porque o faço, talvez recorde os teus beijos, talvez recorde a tua ausência, talvez viva sem o saber,
Que estou vivo,
Permaneço inconstante, finjo ser uma equação diferencial sem solução, pego numa integral tripla e acaricio os teus lábios de garra madrugada, e amanhã sobejam palavras escritas por mim na tua degradante janela, o velho Augusto pega no cigarro enrolado pela tristeza, amanhã não sei se estou vivo, amanhã não sei se estarás ao meu lado, amanhã sinto que tal como o título do Livro de Miguel Esteves Cardoso “O amor é Fodido” eu... eu estou fodido... tal como o amor, oiço o programa de jazz, imagino a tua pele rosada embainhada nos lençóis de uma cidade a que apelidaram de Lisboa, esqueço a poesia, tenho raiva da poesia, porque sou uma incógnita vestida de equação trigonométrica,
Que estou vivo,
Tenho medo que morras, porra... porque morrerás tu, porque escrevo sabendo que a inveja infesta as minhas palavras, os meus olhos, sei que existes dentro de um cubo de vidro, um aquário com barbatanas de papel, e lá fora regressam os corações de cintilantes pergaminhos com bordados e flores envelhecidas, percebo a tua dor, percebo que aos poucos te vou perder, e nada, nada consigo fazer para te resgatar do rio apelidado de medo, oiço-os, vejo-os na tua mão como se fossem pedras acabadas de nascer, que estou vivo? E amanhã o saberei,
A inveja dos outros quando as palavras crescem nos teus seios, a inveja de partires e não ser capaz de te procurar-te no Oceano mais longínquo das minhas veias argamassadas, via-te sentada numa esplada de vidro, sentia o pulsar do teu desejo quando abríamos um livros de AL Berto e líamos um dos mais belos poemas, depois... depois tínhamos o Pacheco e o magala travestido de poeta, eu, deambulando pela rua à procura do banco em madeira onde nos sentávamos, e... e pegava na tua mão, e escrevia no teu corpo, tantas e tantas... vezes em sentido, eu
Que estou vivo, que estou vivo sem o saber,
O uísque desaparece e entranha-se no gélido teu orgasmo, apaixonei-me pela escrita de António Lobo Antunes, cresci com Milan Kunera, e hoje, hoje apenas vivo finjindo que vivo, sou um cadáver em movimento curvíleneeo e uniformente acelerado, não sou Angolado, não sou Português... sinto-me apátrida como o destino, penso, não caminho, olho os jardins e sei que algures por lá andas escondida, talves te tivesses transfomado em arbusto, em saudade ou... ou em objecto de velharia na banca de uma qualquer feira, recomeço, esqueço-me que estou vivo, oiço na TV um grupo de Jazz, deslumbrante para um Sábado sem memória, escrevo sem saber porque o faço, talvez recorde os teus beijos, talvez recorde a tua ausência, talvez viva sem o saber,
Que estou vivo, que há pessoas prontas a assassinarem-me intelectualmente, mas eu, eu estou vacinado conta a inveja, mas eu, eu estou habituado a ser huminhado, e o velho Augusto perdido nos cigarros de enrolar, e eu perdido no gélido teu corpo de amendoeira, e, eu...
Que estou vivo, que estou vivo sem o saber,
Que amnhã existirá um amanhecer, que amanhã... amanhã sem o saber, tu, tu quererás pertencer às minhas palavras, porra... não podes morrer, não, não poedes,
Que estou vivo?
E uma âncora de desejo permanecerá no teu corpo...


(texto de ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 23 de Marvo de 2014

sábado, 22 de março de 2014

O cansaço da manhã

foto: Algures entre Luanda e Lisboa – Setembro/1971

Percebia-se nas tuas tristes pétalas o cansaço da manhã,
flutuávamos sobre as palmeiras hilariantes junto à Baía, davas-me a mão, e obrigavas-me a sonhar,
dizias-me que os barcos eram corpos moribundos de passageiros em viagem,
e do cais observávamos os caixotes em madeira prontos para o suicídio da loucura,
eu, eu acorrentava-me a ti como se tu fosses um embondeiro entre nuvens e sanzalas, que voava,
que... que acreditava em papagaios de papel e nos alicerces nocturnos de uma cidade em construção,

Gosto muito de ti, dizia-te!
Quero ser como tu, simples, como as primeiras palavras que me ensinaste e os primeiros rabiscos que deixei em todas as paredes da casa onde tínhamos as mangueiras e as pombas... e o portão, o portão...
imaginava-me a sobrevoar todo o bairro em cima de um velho triciclo,
e... e nunca me esquecia de te esperar no final do dia,
“percebia-se nas tuas tristes pétalas o cansaço da manhã”,
e chorava quando adormecia sem perceber que já tinhas chegado...

E chorava quando me mostravas o mar, e as gaivotas, e... e os coqueiros,
levavas-me ao Baleizão, sentávamos-nos na esplanada, e eu, eu sonhava como essa cidade em construção que um dia tive de abandonar, regressei às tuas mãos, regressei como um velho caixote em madeira... procurando corpos moribundos em viagem,
afinal... afinal também me transformei em passageiro em viagem,
um caixote em madeira, com olhos, com braços, com mãos... e sonhos de sonhar,
barco, dei-me conta que hoje sou um barco rumo ao desconhecido,
um barco travestido de saudade.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 22 de Março de 2014

sexta-feira, 21 de março de 2014

Cidade do amor

foto de: A&M ART and Photos

Nas minhas mãos cinzentas,
promíscuos cigarros me enganam...
obscenas, elas, elas vestidas de papel de parede,
nas minhas mãos habita uma árvore de nome Primavera,
e eu, sem o saber, escrevo no seu tronco as palavras minhas da noite incógnita,
ela, ela chora, ela, ela não tem corpo, ela, ela é de porcelana invisível,
e vive numa cidade, com nome...
“a cidade do amor”... a cidade que me engana.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 21 de Março de 2014

“Gaivota madrugada” na rádio – Antena 1 – Programa de José Candeias


O meu poema, escrito e publicado ontem, “Gaivota madrugada” foi lido hoje na Antena 1 no programa de José Candeias (aprox. minuto 8).

Link:


Quero agradecer ao João Moreira de Sá dos Blogues Sapo, à Antena 1 e ao José Candeias. Obrigado.

quinta-feira, 20 de março de 2014

Gaivota madrugada

foto de: A&M ART and Photos

Voas nos meus olhos, gaivota madrugada,
procuras em mim, palavras,
voas porque sentes nos teus lábios o vento em desejo,
e no teu prometido beijo, uma simples canção, melódica... e adormeço,
e esqueço que lá fora habitam telhados de vidro, esqueletos de prata,
bairros em lata,
lá fora, na imensidão nocturna da embriaguez,
e um dia, talvez... talvez percebas as minhas tristes palavras,
como pertence aos muros o xisto envenenado,
dos socalcos... o cansaço humano vestido de negro,
e no rio... no rio o meu corpo ensanguentado pelas nobres estrelas da cidade,
voas, voas sem saber que estou vivo...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 20 de Março de 2014

Blogue Cachimbo de Água em Destaque – Sapo Angola – Francisco Luís Fontinha


Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor


quarta-feira, 19 de março de 2014

Sombras cristalizadas


Aqui, permaneces intocável, como o guião de um filme em construção,
aqui sentes-te o herói térreo das sombras cristalizadas,
funestas palavras, os cigarros voam sobre as árvores do quintal,
há uma nuvem de açúcar quase a evaporar-se nos teus lábios,
e sentes?
sentes as palavras não ditas, aquelas que escrevíamos em noites de ninguém?
sentia-te perto, e tu longe,
tão longe que nem as estrelas conseguiam abraçar-te,
dar-te um beijo,
simples, tão simples como adormeceres no cansaço da vida,
e a vida é o esconderijo da dor,
habita em ti e de ti se alimenta...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 19 de Março de 2014

terça-feira, 18 de março de 2014

Pigmentados beijos

foto de: A&M ART and Photos

Pigmentados beijos de ti, Sereia adormecida,
Oceano retalhado dos teus lábios amanhecer,
mulher que sonha e inventa palavras nos muros de xisto ao luar,
regressa a ti a noite, e dela, todas as fotografias mais belas que se alicerçam no teu peito,
beijos, bocas renegadas e sem jeito,
árvores poisando pássaros apressados e apaixonados...
louca, tu, quando acordas e vês no espelho da poesia os seios desgrenhados do poeta,
inventas,
e finges orgasmos nos socalcos mergulhados em lágrimas,
e alimentas...
e sentes... sentes lá fora o deambular da chuva miudinha,
que os pigmentados beijos de ti..., Sereia adormecia, essa... constrói a neblina.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 18 de Março de 2014

Blogue Cachimbo de Água em destaque – Sapo Angola


segunda-feira, 17 de março de 2014

Panfletos negros

foto de: A&M ART and Photos

Liberto-me dos panfletos negros que habitam nos muros tuas mãos,
há pedacinhos de silêncio, pequenas gotículas de solidão invisíveis ao meu olhar,
escrevo-te, escrevo-te sabendo que hoje existe luar, e palavras impregnadas nos seus lábios,
e que... e que o amor morre, como eu, como tu, como... como os rios antes de adormecerem,
sonharem...
liberto-me percebendo que às palavras dar-lhe-ei o descanso eterno,

E que o meu envelhecido corpo, esse, coitado... cinza,
dispersa,
voando sobre os imaginários telhados de Luanda,
liberto-me,
sim, claro que sim... liberto-me dos panfletos negros,
sombrios, nuvens de chocolate mergulhadas em nocturnas estrelas sem pálpebras,

A cidade submerge da tua boca de cristal puro,
o vidro dos teus olhos... parte-se... e sinto-o descendo a calçada em direcção a uma rua sem saída,
uma penumbra fresca de água e estanho embalsamam o teu corpo em papel vegetal,
e oiço a tua voz em pequenos grunhidos...
como um calendário ardendo na fogueira do desejo,
e dizem-me que estou em liberdade.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 17 de Março de 2014

domingo, 16 de março de 2014

Testemunhas de uma fogueira em evaporação

foto de: A&M ART and Photos

Não sei quem és, como te vestes e o que pronuncias, não sei se és um pássaro em decomposição, uma árvore solitária que habita os jardins da cidade adormecida, tão pouco se és a madrugada, o Domingo quase a terminar, a noite a nascer, não, não sei o que és e quem tu és,
Como posso eu sorrir às tuas lágrimas? Percebes-me agora? O Domingo em término, a noite quase noite, a crescer e a erguer-se na tua boca de cristal, e quase não oiço as tuas palavras de porcelana, e quase, a janela da paixão a encerrar-se eternamente, para sempre e só..., hoje tu, amanhã eu, depois as pedras e os canteiros, as flores, os pinheiros de uma infância entre o mar e a montanha, sinto-me prensado, sinto-me um muro argamassado pela tristeza,
Quem sou?
Não sei, nunca soube, talvez... talvez no Domingo que vem, talvez amanhã, talvez no descanso das roldanas, uma corda em direcção ao sexto andar, subo as escadas, sinto-me cansado, os cigarros, a idade, a saudade, novamente os cigarros,
Oiço-os como testemunhas de uma fogueira em evaporação,
Cigarros vadios, como-os vivos, oiço-te e não sei
Quem sou?
Sim, e tu, quem és, o que fazes aqui, aqui dentro de mim?
Uma esplanada vazia, e regressa o dia da Poesia e eu sem poemas para ti... porque, porque não sei quem és, o que fazes dentro de mim, deixas-me cansado, ausente, embriagado, e sei que algures nessa cidade vives e choras, e recordas meia dúzia de cartas, poucas palavras,
E eu, eu sem poemas para ti,
Quem sou?
O vento, sim o vento, pensas que eu sou o vento? Sim, penso, imagino-te sentado na esplanada vazia, apenas uma mesa e quatro cadeiras, conversas com duas ou três sombras, bebes uma bebida invisível, pegas num livro, voltas a poisa-lo sobre a mesa, depois vais à gabardina e puxas de um pequeno caderno, acendes o cigarro, desorientadamente...
Quem sou?
O cigarro acende-se a ele próprio, ganha vida como as tuas palavras, sofre e chora, e acredita na tristeza como acredita que tu, sim tu
O vento!
Sim eu, percebo que me imagines como o vento quando se alicerça na minha pele, sim como o vento, quando rodopia em redor dos meus seios, e tu, e tu
Eu?
Oiço a voz, oiço-os a arder na escuridão de um final de Domingo, amanhã, amanhã talvez..., amanhã talvez “uma esplanada vazia, e regressa o dia da Poesia e eu sem poemas para ti... porque, porque não sei quem és, o que fazes dentro de mim, deixas-me cansado, ausente, embriagado, e sei que algures nessa cidade vives e choras, e recordas meia dúzia de cartas, poucas palavras”, e eu, e... eu,
Só, eu e uma corda em direcção ao sexto andar...
E eu, eu sem poemas para ti,
Quem sou?

(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 16 de Março de 2014

O vento das canções de Outono

foto de: A&M ART and Photos

Dizias-me que eras o vento das canções de Outono,
e eu, eu acreditei, escrevi palavras para essa canção...
desenhei beijos para os teus lábios,
dizias-me que te chamavas “menina do mar” de do mar... não eras nada,
nem onda, nem pôr-do-sol... nem jangada,
um dia fizeste-me acreditar que eras livro de poesia,
eu tentei, tentei ler, folhear... e não eras nada,
apenas uma esbranquiçada página com um palavra... “saudade”,
dizias-me que tinhas na mão a caneta das minhas palavras,
eu, eu sentia-a no meu rosto, como o vento das canções de Outono,
e eu, eu acreditei na tua pele com flores de papel,
e tudo o que me disseste... hoje, hoje escrevo-o na rocha embalsamada na montanha do “adeus”.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 16 de Março de 2014

sábado, 15 de março de 2014

Simplesmente... me inventas

foto de: A&M ART and Photos

Inventas o prazer nas folhas pergaminho do desejo,
há uma caneta de tinta permanente pronta em ti a escrever,
sombrear o teu corpo de espuma em finíssimos traços de madrugada,
há silêncio nas tuas pálpebras enquanto imagino o poema que vou declamar no teu olhar,
e a cidade adormece sobre o travesseiro da paixão,
inventas o amor, inventas-me na escuridão,
simplesmente... me inventas, fazes de mim uma triste flor, a palavra que teimo em não pronunciar,
inventas na minha boca as caricias infinitas dos círculos do amanhecer,
e depois,
e depois... e depois desapareces nos carris que o aço alimenta, e desenhas na parede do medo o ciume,
amar, não amar, ser amado... não ser amado, … sou eu,
inventas o prazer e o meu corpo é um esqueleto de veludo...

Um barco em esferovite das brincadeiras de menino,
inventas o prazer disfarçado de naftalina, dentro do armário apodrecido,
dás-me cigarros para eu fumar e fumo-os como se precisasse de fugir,
correr, subir a montanha... e voar em ti,
sorrir... dou-me conta que deixei de sorrir, de viver... como viviam os pássaros na aldeia,
inventas as bonecas que dormem nos musseques, e dos zincos telhados... a solidão,
há entre nós a melódica canção, o corpo mergulhado em lençóis de linho,
a janela de onde é impossível olhar o mar, o Mussulo... e a Baía,
Inventas-me nos quadriculados cadernos, fazes de mim uma equação trigonométrica,
sem resolução,
um barco, dizes-me que sou um barco...
que inventaste para te divertires enquanto não regressa a ti o sonho e a noite e a insónia toma conta dos teus lábios...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 15 de Março de 2014

Preciso

Foto de: A&M ART and Photos

Preciso de um nome para saborear a tua pele,
qualquer um, apenas um nome, uma palavra, vã... uma palavra retirada da ardósia da tarde,
preciso de uma madrugada para pincelar o teu rosto no espelho do luar,
qualquer luar, qualquer noite construída do nada, uma só noite,
e quando amanhecer, finjo que sonho, finjo que no meu tecto habitam estrelas em papel,
finjo... finjo que do amor crescem palavras, e apenas uma será escrita na tua pele...
preciso de um corpo, preciso da tua pele que ilumina o teu corpo,
uma só, palavra, desenho, ou... ou som melódico como as árvores casadas,
e finjo, e sei que algures habitas nas janelas da cidade,
uma só palavra, uma só cidade,
preciso,
preciso de uma palavra, de um só nome, para ornamentar a tua pele de oiro...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 15 de Março de 2014

sexta-feira, 14 de março de 2014

Poema acabado de escrever

foto de: A&M ART and Photos

Quero o teu corpo mergulhado em mim,
sentindo-o nos meus dedos, semeando-o no meu peito,
há nos teus lábios o anseio, o desejo, e a plenitude perfumada da rosa acabada de nascer,
a madrugada cessa, vai-se... e corre em direcção ao rio imaginário que só o teu púbis conhece,
e tu, e tu dentro de mim, esperas-me, esperas as minhas mãos que se entranham nos teus seios de ribeira adormecida, imaginas-me um esqueleto de sémen...
saberei a cor dos teus olhos envergonhados?
quero o teu corpo, a tua pele insígnia quando florirem as árvores na Primavera, quero-o...
sentar-me no teu colo, acariciar a tua boca como se fosses um poema acabado de escrever,
ainda sem nome,
apenas um poema como tu,
um poema mergulhado em palavras esbranquiçadas que só os muros do medo... conhecem, e amam,
quero-o, assim, quero-o eternamente meu, eternamente amado... eternamente... quero-o.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 14 de Março de 2014

quinta-feira, 13 de março de 2014

Doces lábios

foto de: A&M ART and Photos

Tens nos teus doces lábios o labirinto pavimentado do desejo,
há no teu olhar uma caravela de paixão,
beijos, lágrimas que só a madrugada consegue construir,
tens em ti o sofrimento pincelado de amanhecer, como os peixes e os pássaros magoados,
há na tua boca o cansado silêncio,
e às vezes, tão poucas... sinto nas tuas mãos o vibrar da noite,

Uma mulher de pálpebras cerradas a gritar por ti, sofre, sente os teus dedos no distante luar,
uma estrela que deixou de brilhar,
a música que cessou e nunca mais se ouviu dentro dos teus seios entre palavras e sonhos de sonhar,
desenhos, rabiscos de luzes em voos nocturnos, ausentes da cidade,
e a cidade vive nas tuas veias de cenário envelhecido, longe, longe do pôr-do-sol,
… longe... longe dos teus doces lábios em pedaços de labirinto pavimentado do desejo...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 13 de Março de 2014

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor




quarta-feira, 12 de março de 2014

Uma árvore suspensa na solidão

foto de: A&M ART and Photos

Há no teu sangue a paixão do amanhecer, penso eu,
vives como se fosses uma árvore suspensa na solidão,
choras, sonhas? Há em ti as insígnias da madrugada,
como lisas paredes ente a montanha e o mar,
há no teu sangue a saudade da vida, dos telhados em zinco perdidos nos velhos musseques...
há no teu peito uma rosa dentada, uma Bedford amarela prisioneira a um cordel imaginário, sem folgas, sem ruas, esplanadas, ou... ou simples palavras,

Há no teu corpo uma âncora em papel que te fundeia ao cais da dor,
âncora salgada e filha do barco marinheiro em combustão,
vives no teu sangue como serpentes envenenadas, tristes... e ausentes,
há no teu sangue a noite onde escreves poemas,
inventas rios e dos rios... recordas-te do rio Congo? E das bananeiras pedindo-te perdão...
… ou... ou quando te deitavas na areia límpida do Mussulo,

Há nas tuas veias o sangue da paixão, penso eu,
aquele que te alimenta, o penhasco bravio dos pinheiros mansos,
há em ti cortinados que encerram as janelas do teu olhar,
meigo como as gaivotas, colorido... sensato, há no teu sangue o meu sangue,
o sangue dos livros que leste e depois... apenas lá,
lá... no longínquo Oceano de lata.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 12 de Março de 2014

terça-feira, 11 de março de 2014

Regressar

foto de: A&M ART and Photos

Imagino-me deitado nos teus recortados sonhos de papel cenário,
acaricio a tesoura da saudade e sinto-lhe o perfume do amanhecer,
há entre nós uma sombra louca em betão armado,
amado cacilheiro vagueando ruas e avenidas sem janelas para o mar,
imagino-me adormecido,
ausente dos teus beijos,
imagino-me deitado nos teus tristes lábios quando a tua pele se despede da madrugada,
há uma ponte para atravessarmos, há uma ponte imaginária nas tuas mãos de cidade sem nome...
e dos teus dedos vejo crescerem dentes de gladíolos como desenhos de paixão ancorados ao meu peito de celofane,
imagino-me sentado esperando o teu regresso...
e sei que nunca vais regressar, porque é impossível regressarem aqueles que nunca existiram...
e fico junto ao cais, imaginando-me deitado nos teus recortados sonhos de papel cenário,

Imagino-me deitado nos teus olhos com odor a amoreiras apaixonadas,
imagino-me cinzento,
nuvem sem rumo, nuvem em pequenos farrapos de nada,
imagino-me sendo as tuas pálpebras e percebo o significado da dor,
imagino-me deitado... de papel cenário,
cansado... cansado dos versos embriagados,
imagino-me o cigarro que não consegue arder porque acredita nos sonhos de papel cenário,
e quando se afunda a noite no meu corpo...
o circo emerge de mim,
palhaços, trapezistas... e animais embalsamados... imaginam-me deitado nos teus seios poéticos com sabor a sílabas abençoadas,
como os pássaros...
como os pássaros poisados em jangadas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 11 de Março de 2014

Concerto Solidário dos 40 anos do IPO-Porto!

A todos aqueles que desenham sorrisos em pergaminhos tristes, às vezes cansados e desiludidos. Obrigado.

Destaques do Blogue Cachimbo de Água – Sapo Angola


Poema de Francisco Luís Fontinha em destaque no Sapo Angola – Cenas da Net.

segunda-feira, 10 de março de 2014

Melanoma


Às fingidas rosas do meu envelhecido jardim,
às árvores envelhecidas do meu envelhecido jardim,
aos pássaros do meu envelhecido jardim e que infestam o meu corpo de sons estúpidos,
sangrentos,
como o amanhecer do teu olhar,

À Primavera que quase a regressar... eu não a sinto,
porque o meu envelhecido corpo que habita no meu envelhecido jardim... morreu,
voa ente noites de prazer e poesia... sem o saber,
e palavras que não consigo assassinar,
se eu pudesse... matava-a... à maldita “melanoma”,

Se eu pudesse, se eu quisesse... o meu envelhecido corpo que habita o meu envelhecido jardim... transformava-o em poéticos melódicos sorrisos,
mas não,
não a consigo assassinar,
nem tão pouco me apetece escrevê-la,

Às formigas do meu envelhecido jardim onde pernoita o meu envelhecido corpo,
sinto-o como se fosse uma âncora de papel sobre os ombros de um feliz travesti,... embriagado com a beleza do espelho mágico de uma Lisboa enfeitada com envelhecidos jardins e envelhecidos corpos... todos... todos embriagados,
sonolentos,
como as nuvens cinza dos cinzeiros de lata,
como... como os meus cigarros que dormem numa esplanada vagabunda, sós, sós... como eu,

Aos sinos da Igreja do meu envelhecido jardim onde habita o meu corpo em jejum,
lágrimas para quê?
às palavras que resisto em não escrever, como amar, ou... rezar,
e se eu a pudesse assassinar...
rezava... rezava até não me cansar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 10 de Março de 2014

domingo, 9 de março de 2014

sofridos beijos

foto de: A&M ART and Photos

os sofridos beijos da aranha madrugada
cansada
os sofridos beijos da mulher amada
as flores poisam nela como o diáfano pergaminho embalsamado
coitada
nas pálpebras do triste amanhecer
e sem querer... ou sofrer
espera desesperadamente pelo amado
o homem de papel com olhos de luar
os sofridos beijos na penumbra noite em sofrimento
há nela um punhado sorriso de mar...
e de amar... ama as carícias do vento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 9 de Março de 2014

Boneca de porcelana

foto de: A&M ART and Photos

Aparecias no descampado morro da solidão,
trazias vestido o perfume da paixão,
e nos seios a cansada poesia do louco poeta,
depois... depois desaparecias na escuridão de uma porta sem fechadura,
deixavas-me suspenso nas amoreiras do desejo,
e entre um beijo,
e entre a saliva do silêncio...
nada mais do que a tua sombra transposta como a matriz ranhura,
ouvíamos o mar galgar as tempestades da tua pele,
e pergaminhos de suor, pequenas gotículas de gemidos ais...
alicerçavam-se à minha mão descarnada, como uma árvore esquecida na madrugada,
e percebia de ti as inconstantes locomotivas do amor,

(tínhamos dentro de nós o beijo e as sílabas desenfreadas com dentes afiados,
não havia em nós as coloridas paredes de verniz,
não havia em nós os sonâmbulos cubos do amanhecer...
e mesmo assim, quase sempre, desejava-te como a caneta de tinta permanente deseja o papel nu,
ausente,
de ti, de mim... de nós, quando se acendiam os candeeiros das avenidas com palheiros de prata)

Aparecias, e desaparecias...
acorrentada a uma fotografia junto ao lago com cisnes circulares e olhos de noite,
procurávamos nas janelas das camas ensonadas os cortinados do Adeus,
ausentávamos-nos, e regressávamos anos depois...
tudo como dantes, tudo tão igual em pequenas fotocópias de prazer,
e sentíamos em nós os tristes pilares do edifício amarelo,
descíamos as escadas, íamos à cave dos sótãos com zincados tectos, e sabia que habitava em ti a fuga, fugias, regressavas... e quando me apercebia, lá estavas tu sentada em mim,
eu era a tua estátua de marfim,
e entre lágrimas e alguns poemas..., nada nos pertencia,
tínhamos dois corpos ancorados aos rochedos de Belém,
e entretínhamos-nos a contar os comboios em corridas apressadas para Cascais,
e depois..., e depois adormecias nos meus braços como uma boneca de porcelana...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 9 de Março de 2014

sábado, 8 de março de 2014

O marinheiro imaginário

foto de: A&M ART and Photos

Não pertencias aos ciprestes voltados para o rio,
trazias na algibeira um punhado de tabaco, algumas gotinhas de vodka... e eras marinheiro fundeado na paixão dos homens,
olhávamos a ponte submersa nos rochedos vermelhos,
e sabíamos que nunca mais haveria sol dentro de nós,
eu, eu era uma gaivota suspensa nos teus lábios... e voava em ti como uma louca espuma depois do adeus,

Desenhávamos relógios de luar nas pálpebras de Belém,
dávamos as mãos... e caminhávamos até deixarmos de ver as estrelas,
o silêncio transformava os cigarros em longos suspiros que só o desejo percebe,
e sabe,
e às vezes, poucas, éramos visitados pelo “chapelhudo” vestido de verde seara de trigo,

Não pertencias aos ciprestes e tínhamos inventado o alegre som melódico das palavras,
(acorda agora o “Planeta 3”)
os corpos murchos deambulavam nos cansados campestres telhados de colmo,
não pertencias nem nunca pertencerás às engasgadas folhas de papel pardo, sem poemas, nuas como nós,
e tínhamos uma noite imaginária dentro de uma Lisboa que escrevia nos nossos corpos o desassossego,
e eu, e eu gostava do teu olhar que transpirava vogais com sabor a amêndoa e a chocolate,

Vinha o dia e com ele, os círculos e os quadrados..., vinha o dia e tu não me pertencias,
vagueavas de esquina em esquina,
de cidade em cidade, e de porto em porto, de barco para barco,
e os cigarros fumavam-se sem que eu percebesse a tua ausência, e tu não estavas lá, como sempre, eras apenas uma sombra da noite com roupas de amanhecer, talvez fosses a madrugada, ou... o rio sem palavra,

E nada como dantes, Dead Combo, e uma esplanada vazia, hirta... sem coração,
Lisboa pertencia aos guindastes com dentes de marfim,
sentávamos-nos sobre a calçada descalça, e via-mos os beijos das estátuas de granito abraçados aos sofás de ardósia esperando o regresso da tarde, e vinha a tarde... e queríamos a noite, a noite só para nós...
e não, nunca, pertenceste ou pertencerás aos ciprestes voltados para o rio.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 8 de Março de 2014