quinta-feira, 31 de julho de 2014

O apeadeiro do desejo


O apeadeiro do desejo,
embrulhado no encarnado beijo,
o apito na garganta da insónia tombando sob os socalcos granitos,
o corpo roda, o corpo canta,
o corpo... o corpo é um pedaço de cacimbo,
esquecido nas mergulhadas mãos de cera,
o corpo arde na fogueira,
acorrenta-se ao cansado limbo,
o corpo... o corpo que a aldeia inventa,
e não lamenta...
o apeadeiro do desejo,
o corpo... o corpo é uma sebenta envenenada,

Uma estrada...
descendo a montanha das coxas cinzentas,
o corpo se enterra na derramada carne,
como uma árvore sem voz,
o corpo levita, o corpo não aguenta...
o silêncio triste das canções de Domingo,
uma estrada, e um corpo vestido de amanhecer,
espera, espera o regressar do apeadeiro do desejo,
espera... espera o vento nascer,
o corpo é uma rosa recheada com palavras de papel,
uma estrada, um barco correndo no pôr-do-sol,
o corpo se cansa e ama... ama o encarnado beijo,

O corpo não cessa,
e chora,
o corpo é um vinhedo com tecto de marfim,
o dia míngua, o dia nunca terá fim...
enquanto o corpo habita no meu peito,
deseja e escreve no xisto leito de pele doirada,
o corpo vomita os sons do orgasmo silencioso,
o corpo..., o corpo se esconde no colmo com paredes de vidro,
o corpo não cessa,
e chora...
enquanto houver madrugadas de brincar...
o corpo..., o corpo se ama e adora..., o corpo, o corpo é um poema de amar!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 31 de Julho de 2014

Arte


Esta arte,
Este povo no pedestal da saudade,
Dizem-me que há um desejo em tempestade,
Uma mulher que arde,
Uma mulher que arde… arde na lareira da vaidade,


Esta arte,
Estas cores pinceladas de veneno,
O beijo que assombra a árvore no vento ameno,
Uma mulher que arde,
Arde… no meu peito sereno,


Esta arte,
Este povo que teima em não se revoltar,
Dizem-me que há no mar,
Uma mulher que arde,
Arde… arde sem vontade de regressar,


Esta arte,
Que o meu corpo consegue transpirar,
Esta arte que não respira nas noites de luar,
Que arde…
Que arde… que arde sem parar,


Esta arte,
Que os musseques alicerçam ao cais dos afogados,
Meu povo… meus coitados,
Esta arte que arde…
E não vos deixa sossegados.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 31 de Julho de 2014

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Arcadas em flor


Não sei porque chora,
este granito das arcadas em flor,
porque se cansa esta cidade...
porque morre este amor,
se a noite não vai acordar,
e a tarde,
e a tarde teima a alicerçar-se nos lábios da dor,
não sei porque chora,
este granito sem cor,
que no cansaço mora,
que dos abraços inventa as palavras de amar,
quando se dissipa no teu corpo o silêncio grito...
não sei porque chora,
este granito em teu olhar,
esse corpo fervilhando em desejo,
não o sei, agora,
se esse granito é luar...
ou... ou se é um beijo,
não o sei...
porque chora este granito das arcadas,
em flor semeados os seios da alvorada,
este granito das madrugadas,
que um dia desenhei,
e hoje, e hoje não é nada.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 30 de Julho de 2014

terça-feira, 29 de julho de 2014

A Casa Amarela


Desejastes-me Senhora,
quando eu tudo tinha,
hoje, que não tenho nada,
vós, minha Senhora,
odiais-me...
pareceis, hoje, uma alminha,
denegrida,
deitada na madrugada,

Desejastes-me Senhora,
nas mansardas de Belém...
fazíamos amor olhando o rio,
triste, e habitado por chulos, putas... e Cacilheiros,
à janela,
os cigarros semeados numa casa amarela,
fumegavam, e gritavam... e gritavam... esta Senhora é bela,
bela Porcelana,
que rica Porcelana... ela!
Desejastes-me Senhora,
quando eu tudo tinha,
hoje, que não tenho nada,

vós, minha Senhora,
odiais-me...

O poeta é um fotógrafo de palavras,
um pintor de caricias e medos,
o poeta é... o poeta é um escultor...
molda, molda o corpo da minha Senhora bela,
do granito embalsamado...
que olhando outro rio,
não triste, não habitado por chulos, putas... e Cacilheiros,
vive como um coitado,

vós, minha Senhora,
odiais-me...

E ainda guardais dentro de um livro uma envelhecida flor,

Não morreu o poeta, não morreu a minha Senhora bela...
mas... mas morreu o amor,

E morreu a casa amarela.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 29 de Julho de 2014

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Grito, fujo... às palavras começadas por...


Um rio esquizofrénico que não me deixa viajar,
sou acorrentado ao tédio cansaço do cais invisível,
não durmo, não vivo... vivendo nos lábios do desamor,
uma estrada congestionada abraça o teu corpo de linho,
e pareces um cortinado com odor a morte suspenso na solidão,
sem sorte,
grito, fujo... às palavras começadas por... não sei, talvez... talvez por A,
vendo o meu nome em troca de livros, vendo poemas em toca de beijos,
vendo-me... vendo-me em troca de nada,
nada,
que hoje a noite vai ser uma trampa,
um rio, um rio esquizofrénico que não me deixa viajar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 28 de Julho de 2014

domingo, 27 de julho de 2014

Os socalcos das coxas cinzentas dos pinheiros bravios...


Feliz aquele que tem alguém para amar,
feliz aquele que tem um livro para ler,
escrever, tão feliz... tão feliz aquele que sente a noite adormecer,
adormecer... nos braços do luar,

Feliz aquele que tem lábios para beijar,
que habita numa boca com sorriso de amor,
feliz aquele que inventa cabelos na planície do amanhecer,
e sem querer... e sem querer começa a chorar,

Felizes os barcos que têm marinheiros de papel,
corpos nus, corpos com sabor a mel...
feliz aquele que tem seios para pintar,
segredos para desvendar, quando o calendário da solidão... desaparece no mar,
feliz, eu?
talvez venha um dia a acreditar,
que há sanzalas com odor a chocolate,
que existem nuvens plantadas nos socalcos das coxas cinzentas dos pinheiros bravios...
feliz aquele que morre sem o perceber,
feliz..., tão felizes os cigarros de fumar,
tão felizes os cigarros de viver,
… quando há uma mulher embrulhada numa folha amarrotada,

Feliz aquele que tem alguém para amar,
feliz aquele que tem um livro para ler,
feliz..., tão feliz aquele que tem um poema a crescer...
a crescer... no verbo desejar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 27 de Julho de 2014

sábado, 26 de julho de 2014

A Calçada do Adeus


Esta vida que não me esquece,
cai a noite e me absorve, e me evapora,
desço a calçada como poeira cansada,
e aos poucos, despeço-me do rio,
despeço-me da alvorada,
sento-me, e espero o regresso do amanhecer,
folheio um livro, leio um poema amaldiçoado,
dói-me o corpo, e esta vida que não me esquece,

Desenho uma gaivota apaixonada pelo silêncio do mar,
há uma cabana sem lareira, uma cabana atraiçoada,
e eu sentado, converso com a gaivota, converso com a cadeira...
sobre esta vida que não me esquece,
e me evapora,
folheio, folheio... e o livro do poema amaldiçoado... me deseja,
me leva para o solstício do beijo,
e sendo eu sou um ausente,
que não sente, que não ama...
pergunto-me... o que é o amor?
É uma cidade destruída? É uma canção com poemas de chorar?
que a vida não esquece, que a vida não me esquece... de me recordar...

Esta vida que não me esquece,
quando lá fora há estrelas à minha espera,
quando lá fora a gaivota apaixonada... chora,
porque foi maltratada, porque foi espancada...
pelo vento da clareira cinzenta,
que desce comigo a calçada, e... e me atormenta.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 27 de Julho de 2014

O livro que arde, e não sente nada...


Há um beijo desgovernado,
há uma planície na frescura dos teus lábios,
um livro que arde, um livro que desiste de amar...
há silêncios com sabor a amanhecer,
olhares desatentos, olhares... olhares suspensos nas pálpebras da solidão,
há uma mulher com asas de papel na varanda do terceiro andar,
não chora,
não... não olha para ninguém,
há um beijo desgovernado,
uma manhã prisioneira que teima em acordar,
há um veleiro perdido no mar,
onde habita o marinheiro amor,

Há um corpo que procura os rochedos da dor,
e finge ser a preia-mar, e finge ser a cidade inacabada, sem braços, sem mãos...
sem... sem madrugada,

Há uma planície na frescura dos teus lábios,
um rio que desce a montanha sem perceber o significado da paixão,
há peixes assassinados,
peixes... peixes coloridos no cansado coração,
há um terceiro andar, e há uma rua com cabelos de oiro,
uma eira esquecida nas noites de luar,
uma estrada,
o livro que arde, e não sente nada,
há... há uma mulher... há uma mulher amada...
sem o saber, sem o sentir,
há um beijo,
um beijo que não sabe sorrir...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 26 de Julho de 2014

sexta-feira, 25 de julho de 2014

O tambor do desassossego


Quando o tambor do desassossego entoa no coração da sanzala,
há uma palavra reescrita na pele húmida do amanhecer...
leio... leio SAUDADE...

Sento-me junto ao pequeno charco acabado de nascer,
puxo de um cigarro,
e finjo ver o mar a regressar da sombra das mangueiras,
as pequeníssimas películas de cacimbo alicerçam-se aos meus dedos,
ao longe, mulheres... e fogueiras,
e missangas de medos,
saltitando nos braços cansados de um esqueleto de papel,
oiço o bater fulgurante do zinco conta a solidão de um menino chorando,

Um dia a guerra o levará,
sua mãe morta rezará no altar da areia branca do faroleiro de pedra,
os meus dedos minguam quando um cadáver de insónia poisa no meu cigarro...
e espero... e não regressa o mar,
desce um corpo de prata dos coqueiros envelhecidos,
há uma palavra reescrita na pele húmida do amanhecer...
leio... leio SAUDADE...
e adormeço sem me apetecer,

Em criança brincava com silêncios e um velho triciclo em madeira,
acreditava nas flores,
acreditava que um dia..., que um dia voava como os pássaros,
envelheci, e o meu cigarro terminou quando um paquete de rebuçados atracou em mim,
transeuntes com pesadíssimos caixotes em madeira,
choravam...
e círculos de espuma saltavam à corda no cais dos caixotes em madeira...
perdi-me, e hoje... e hoje sento-me junto ao pequeno charco acabado de nascer,

O mar não regressará nunca,

E,

Quando o tambor do desassossego entoa no coração da sanzala,
há uma palavra reescrita na pele húmida do amanhecer...
leio... leio SAUDADE...

E leio sofrer!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 25 de Julho de 2014

quinta-feira, 24 de julho de 2014

“O Senhor Anónimo”


O teu corpo quando absorvido pela perspectiva cavaleira do desejo,
a tua pele tracejada nas ruelas da minha solidão,
sinto-te porque existe à minha volta uma lanterna de silêncios,
sinto-te porque em ti crescem as héderas nocturnas da cidade das sílabas,
e cruzam-se as palavras nos comboios que descem a montanha do amor,
há rochedos enfeitados com pálpebras de papel amarrotado,
olhares que me aprisionam e me transformam em apitos de suor,
na areia da insónia alguém desenha beijos,
e o sonho os leva, leva-os... até deixarem de ser beijos,
depois, depois os beijos ressuscitam a aparecem como algas imperfeitas que o medo alimenta,
o corpo flutua na morte clandestina do homem com rosto de triângulo,
e um dos catetos abra-se à hipotenusa,

Na lapela, um nome, ilegível, gatafunhos...
apelidei-o de “o senhor anónimo”,
cerca de quarenta anos, apátrida, e marinheiro de profissão,

O teu corpo, pouco ou nada me interessa,
embrulhado em geometria... apenas sobressaem os segmentos de recta do cansaço,
o barco onde trabalho e habito... há muito deixou de ter flores e cartas com corações...
a palavra “amo-te” não faz sentido, não pertence ás marés por onde navego,
peço que regresse o vento,
e vem a tempestade,
peço a tua pele tracejada... e sou apedrejado por crianças em fúria, como se eu fosse o culpado pela tristeza das lâminas da madrugada,
e não tenho onde me esconder,
precisava apenas de um pedaço de pano,
um cortinado envenenado,
o teu corpo, pouco ou nada me interessa,
comparado com a multidão de sombras que me acorrentam ao cais dos tentáculos de néon.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 24 de Julho de 2014

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Navalhas do sofrimento


Oiço das navalhas do sofrimento,
os teus beijos prometidos,

Lamento,

Oiço os teus anseios,
quando nos entra o mar casa adentro,
desço as escadas,
escondo-me nos teus lábios...
amo tanto o mar... que não consigo olhá-lo, tocar-lhe,
como não sou capaz de poisar a minha mão no teu luar...
e...
e simplesmente ficar lá, ela imóvel, prisioneira de ti,
e... e coitada da minha mão,
esponjosa, magra... cansada das palavras tristes,
das palavras... das palavras amargas,
e o movimento curvilíneo... em busca do teu coração,

O cofre com fechadura invisível,

Lamento,

Oiço das navalhas do sofrimento,
os teus beijos prometidos,
oiço-os e nada posso fazer,
lá fora está noite,
escuridão,
posso dar-me ao trabalho de procurar as tuas lágrimas,
nunca as encontrarei,
tão pouco sei se choras, se ris... se gritas... ou inventas árvores no recreio da escola,
e quanto a mim, nunca, nunca fui capaz de encontrar o que quer que seja,
porque sou desajeitado,
porque... as sombras do teu corpo habitam nas drageias do silêncio...
e há sempre um braço a proibir-me... de... de amar, de construir amores nas flores do amanhecer,

Tão longe, os teus sôfregos olhos perdidos na constelação AMAR,
o telescópio vagueia na eira da poesia,
e nem assim, e nem assim é possível observar os teus olhos...

Lamento,

O significado de corpo, agora é rocha vadia,
que caminha nas ruas com candeeiros de prata,
lamento...
ouvir das navalhas do sofrimento...
os teus beijos prometidos,
sofridos,
oiço-os e nada posso fazer,
apenas lamentar,

Que o cofre com fechadura invisível,
seja o teu coração protegido por um velho cubo de vidro,
aquário, peixe, avião... pá.. barco carregado de fantasias e travestis,
bares recheados de coquetes e marionetas envergonhadas,
alienados vizinhos que fumam cigarros de lata,
que o cofre se parta,
e morra...
como morrem os poetas,
como morrem os fantasmas... quando no relógio de pulso da solidão são quatro horas da madrugada,
nasci às sete horas e trinta minutos,
era Domingo...
e deixaram em mim as navalhas do sofrimento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 23 de Julho de 2014

terça-feira, 22 de julho de 2014

O Cometa Amar


Não te mexas,
deixa poisar o Cometa Amar na Sombra do teu olhar,
não grites,
mantém-te imóvel nos lábios do entardecer,
não fales, não... não grites,
geme no salivar nocturno que acolhe o luar,
não te mexas, por favor!
Silencia-me como se eu fosse apenas e só o teu livrinho de cabeceira,
a tua almofada recheada com seios de verniz...
o espelho do teu quarto, onde dormes, sonhas... e... e brincas...
como uma menina mimada,
escondida na madrugada,

Não te mexas,
fala-me, ouves-me?
Não te mexas,
acaricia o cansaço dos meus abraços com o teu cabelo de cetim,
não grites,
por favor... não sejas assim...

Assim, como?
Assim... menina mimada,
menina com sabor a Musseque,
menina... menina bronzeada,

Não,
não te mexas,
escreve no meu peito de xisto tudo aquilo que te apetece fazer,
sei lá eu...
também não o sei, meu Amor, mas não te esqueças de nada,
escreve tudo, escreve...
mas... mas não te mexas,
escreve em mim, desenha em mim,
o mar,
o pôr-do-sol, ou... ou a saudade,
o poema mais belos da montanha do desejo,
escreve, não te mexas, escreve... escreve beijo,

(Assim, como?
Assim... menina mimada,
menina com sabor a Musseque,
menina... menina bronzeada).


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 22 de Julho de 2014

Divulga Escritor – Francisco Luís Fontinha

Divulga Escritor – Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Inventa-me


Inventa-me,
desenha no meu corpo as línguas de fogo que os teus lábios libertam,
escreve-me, escreve em mim as palavras proibidas, as palavras falseadas,
invade-me,
faz de mim uma equação trigonométrica,
soma-me, divide-me… e multiplica-me,
mas… inventa-me,
no pecado mais secreto do teu olhar,

Inventa-me,
no silêncio das madrugadas,
inventa-me no espelho onde escondes o teu rosto…
quando poisa a noite sobre ti,

Inventa-me nas catacumbas da insónia,
faz de mim a sombra mais bela do amanhecer,
inventa-me,
como flor,
como abelha…
inventa-me e acolhe-me na tua colmeia,
que eu seja o mel dos teus sonhos,
que eu seja… a tua invenção,

Inventa-me,
faz de mim pássaro, barco… ou… ou avião,
não tenhas medo de me inventar,
não, não tenhas medo de me amar,
inventando-me,
escrevendo em mim os números primos, ímpares… ou… ou pares,
inventa-me,
inventa-me sem chorares!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 21 de Julho de 2014

domingo, 20 de julho de 2014

As sanzalas embalsamadas!


Aos dias ímpares, as horas que me são roubadas por uma mão sem nome,
as sílabas disparadas pela espingarda das sanzalas embalsamadas,
o meu corpo não cessa no púlpito do cansaço, ele evapora-se, ele... ele transforma-se em zinco lamaçal,
há uma criança inventada, uma criança perdida na saudade...
aos dias ímpares, as horas malvadas,
que alimentam a dor,
que... que engolem todos os amanheceres,
e do meu corpo, apenas o coração de pedra ficou adormecido na eira da poesia,

Aos dias ímpares, o triste calendário envergonhado,
a desassossegada fantasia de um texto alienado, quando arde na fogueira da tua pele,
uma cidade nos espera, uma cidade em papel...

Aos dias ímpares, as horas, os minutos, e os... e os milésimos de segundo,
alguns em liberdade, e outros... e outros acorrentados a um envelhecido veleiro,
hoje não há vento,
hoje... hoje apenas a límpida tarde de pano a soluçar sobre as árvores do triângulo equilátero,
é este o meu Mundo?
ter uma cidade sem candeeiros em desejo,
ser filho de um desenho que o tempo apagou numa longínqua parede,
e contento-me com todos os dias ímpares, as horas que me são roubadas...

E a tua mão... e a tua mão, um dia, terá um nome, idade, raça, sexo... religião,

Aos dias ímpares, a geometria na doçura da caligrafia,
um poema morto, um poema descendo a calçada em direcção ao infinito...
e o meu corpo não cessa no púlpito do cansaço...

E o poeta permanecerá eternamente nas sanzalas embalsamadas!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 19 de Julho de 2014

sábado, 19 de julho de 2014

E sábado..., e sábado os ASSASSINOS...


Sábado,
a metralhadora do silêncio começa a disparar,
uma mulher vestida de negro, caminha vagarosamente para o altar,
alguém a espera, alguém a ama, e só alguém a pode desejar,
sábado,
hoje não há palavras de escrever,
hoje só uma ténue lâmina de sémen suspensa na janela da cidade com chaminés de vidro,
ela dispara, ela mata... e depois, depois cessa... depois... depois abraça-se às feridas que choram,
hoje, sábado, a metralhadora do silêncio começa a disparar...
a tarde escoa-se através de uma conduta de beijos, e há os cabelos da noite enrolados no vento,
a mulher leva um livro na mão, uma bala que lhe dita o futuro não existente,
ela deita-se sobre a lápide da solidão, e espera, e espera...

Espera que um coração de papel acorde da ressaca de sexta-feira,

Sábado,
um dia invisível,
chuvoso,
a cidade com chaminés de vidro, arde,
e sente,
os estilhaços no corpo de uma criança,

ASSASSINOS!

Sábado prometido,
hoje, hoje, hoje o que posso eu dizer...
que invento mulheres vestidas de negro?
que há metralhadoras apontadas ao meu peito?
Sábado...
ASSASSINOS!

Os meninos,
brincam no centro do furacão,
os calções fendidos, os calções de chocolate baloiçando nas pernas íngremes da madrugada,
e sábado..., e sábado os ASSASSINOS...
saciam-se à volta de uma mesa redonda, recheada de comida,
e os meninos, morrem,
e os ASSASSINOS... e os ASSASSINOS escondem os sobejantes calções de chocolate,
e ninguém, e ninguém os consegue parar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 19 de Julho de 2014

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Dois corpos prisioneiros no espaço


O amor,
movimento circular uniformemente acelerado,
dois corpos prisioneiros no espaço,
três pontos os absorve,
o desejo,
o beijo...
e o abraço,
o amor,
o rio que corre para o mar...
e não mais vai regressar,
o silêncio impregnado nos lábios da madrugada,
o amor,

O amor desgovernado,
sem cais para aportar...
o amor de amar...
o amor, o amor submerso num triste olhar,

Entrelaçadas mãos,
numa cama deitadas,
o amor quando de um espelho ressaltam os pigmentos do amanhecer,
a janela encurralada na floresta,
o amor,
o amor verdadeiro, o amor... o amor sem se ver,

(o amor,
movimento circular uniformemente acelerado,
dois corpos prisioneiros no espaço,
três pontos os absorve,
o desejo,
o beijo...
e o abraço,
o amor)

O amor vestido de saudade,
o amor pintado numa parede invisível, o amor... o amor sem tempo para pensar,
as estrelas, o luar, o amor... o amor das palavras quando um túnel de vento se esquece de acordar,
o amor,
duas mãos entrelaçadas,
milhares de dedos encostados à tua pele bronzeada,
o amor, o amor de uma caravela,
correndo, correndo... correndo no pulso de uma sanzala...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 18 de Julho de 2014

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Cidades com coração de pedra


Não me perguntes onde vivem as cidades com coração de pedra,
porque a noite é escura, porque a noite é bela, e sombreada...
não me perguntes de quantos desejos estou à espera,
porque não espero desejos,
porque não existem desejos nas cidades com coração de pedra,

Não me perguntes a cor do meu olhar,
não,
sim, sim... eu tenho olhar,
mas... mas não desconheço as cores,
mas... nunca vi o mar, o amor, e as flores,

Não me perguntes...
porque há em mim uma lâmina em betão armado,
triste,
triste e cansado,
não,
não me perguntes pelas árvores do meu quintal,
não, e nunca... e nunca tive um quintal,
e nunca, até ver... fui... fui degolado,
posso ser parvo,
e louco,
mas... mas não conheço as cores,
mas... mãos não sei o significado de “amores”,

Tudo para mim é pouco,
e perguntarem-me pela madrugada é como se me tirassem os livros, e o luar,
e a insónia, e todos os sonhos de criança...

Não me perguntes onde vivem as cidades com coração de pedra,
não me digas que amanhã os beijos são de papel,
não, não o suportaria...
que um dia,
que um dia me perguntasses como são os meus lábios enquanto dormem...!

Porque,
Porque os meus lábios nunca, nunca, porque os meus lábios nunca dormem.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 17 de Julho de 2014

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Terra prometida


A terra que te prometi, existirá?
o chão lapidado onde rolavam dois corpos de arame, como era o seu nome...
esqueci o significado de noite,
esqueci o horário nocturno das avenidas em flor,
a terra, a terra que te prometi... não, nunca, nunca mais a observei,
antes brincávamos como duas crianças em frente ao mar,
e hoje,
e hoje o chão lapidado onde habitavam os nossos corpos deixou de existir,
havia uma cama fictícia com duas lanternas de silêncio...
havia um apito que assinalava a nossa partida,
partir,
não regressar, nunca, e nunca mais a observei.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 16 de Julho de 2014

terça-feira, 15 de julho de 2014

O livro sem medo


O cansaço adensa-se nos teus lábios,
murmúrios de odores invisíveis alicerçam-se aos teus pulsos,
pareces uma árvore em papel, uma flor indefinida, ainda por descobrir...

O cansaço dilata-te as pálpebras de xisto,
ouves a voz do livro poisado na mesa-de-cabeceira, e dormes, e dormes...

És prisioneira da manhã acabada de nascer,
embrulhas-te no lençol da preguiça, e estendes os braços até tocares o Sol,
uma fina película de insónia brinca nos teus seios de mar,
uma fragata pronta a disparar... não o consegue,
fica ofuscada pelo teu olhar, desassossegada, ela, suicida-se no rio da saudade,
amas e não amas,
finges partilhar os segredos da madrugada,
e o cansaço, desfigura-te o cabelo de pergaminho, e evapora-se nas frestas do beijo,

Cerras os lábios cometidos pelo cansaço,
sentas-te em frente à esplanada de areia branca, e ela, a barcaça, grita o teu nome,
regressam os homens dos canhões de pele embalsamada, és linda, és amada...

A maldita mordaça,
que te proíbe as palavras do amor,

O cansaço adensa-se...
a amizade cai sobre um telhado de vidro, fica sem vida,
fica... fica enraizada na escuridão de um bar,
o cansaço não espera, e o coração não resiste às sílabas que sobejaram da lareira da poesia,
há uma lágrima,
morta,
há a prisão disfarçada de jardim soberbo...
com flores alienadas que inventam amor onde apenas habita a amizade...

O livro,
o livro sem medo, levita nos teus sargaços de alecrim,
o livro das vozes, deixa de ser o livro das vozes...
e do livro, e do livro sem medo,
sai um menino a brincar com um triciclo,
colorido,
que... que faz o cansaço dilatar-te as pálpebras de xisto...
… e uma multidão de sombras, saídas do livro sem medo,

Desejam uma carícia tua... um gesto de giesta florida, desejam-te!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 15 de Julho de 2014

Dentro de ti


Imagino-me dentro de ti,

O sonho, o sonho invade a clarabóia das serpentes,
há uma montanha, uma montanha desenhada na rocha submersa da solidão,
imagino-me dentro de ti,
sentir o odor do papel amarrotado, triste...
cansado,
o sonho tem um nome,
vive dentro de um corpo anónimo, diluído nas asas de uma gaivota,
há um esqueleto em revolta,
faminto,
tão... tão desgraçado...
escreve, e das palavras se alimenta,
e vive, e sonha...

Imaginando-se dentro de ti!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 15 de Julho de 2014

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Olhar suspenso nas cerejas do amanhecer


Há um olhar suspenso nas cerejas do amanhecer,
não existem em mim palavras para o descrever, desenhar…
observar como se ele fosse o silêncio do luar,
mas esse terno olhar... existe, tem um corpo, tem uma alma… e tem asas de voar,
sinto-o todas as manhãs, todas as noites quando habitadas pela insónia,
ele grita pela solidão, e ela, e ela aparece-me vestida de branco,
sei que a loucura não só pertence aos humanos,
conheço árvores loucas, pedras ainda mais loucas, e flores… tão loucas como eu…
sinceramente, este olhar, o olhar que está suspenso nas cerejas do amanhecer…, não,
nunca me pertencerá,
talvez…
talvez seja a ténue luz do desejo, talvez tenha um nome, um apelido,
Um beijo para me presentear,
Talvez,
gritar por ele,
gritarei, gritarei sem o saber,
e talvez, e talvez o venha a desejar…
o querer,
Há um olhar que pertence aos sonhos de sonhar,
um círculo, um quadrado… um triângulo no rosto da música mais bela da floresta…
talvez,
talvez esse olhar, o olhar suspenso nas cerejas do amanhecer…
me diga,
me diga o que fazer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 14 de Julho de 2014

domingo, 13 de julho de 2014

Este poema com o nome de beijo!


Horrível,
este poema sem marinheiro,
feliz deste barco embrulhado no vento,
desgovernado,
só...
só... e em sofrimento,
faltam-lhe as palavras,
faltam-lhe... faltam-lhe os encantos dos murmúrios de Inverno,
este poema... filho do Inferno,
que arde na lareira do desejo,
horrível...
este poema com o nome de beijo!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 13 de Julho de 2014

Páginas sem nome


Que faço a estas páginas sem nome,
que digo às palavras escritas nestas páginas sem nome...!

Triste, a mão que se recusa a escrever,
a mão trémula que inventa cigarros de arder...
que faço a estas páginas de escrever,
anónimas, desorganizadas... páginas mortas, páginas amarguradas,
triste, a mão que acaricia o rosto da madrugada,
e não se cansa de amar,

Que faço... ao cabelo sem vento!

Sem nome, prontas a escrever,
que faço eu mergulhado no teu corpo de neblina...
triste, a mão que não se cansa de sombrear o amanhecer,

Que faço, eu!

Que faço eu nesta tela envergonhada,
onde moram os teus seios de menina...
que triste..., que triste as páginas deste livro quase a morrer,
que faço eu, às palavras não escritas,
aos beijos desenhados na mesa-de-cabeceira,
sem saber o que fazer...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 13 de Julho de 2014

sábado, 12 de julho de 2014

Fogo


Fogo,
o teu corpo em liberdade,
suspenso nos braços do desejo,
o fogo que não arde,
o teu corpo quando mergulhado nas asas da madrugada,
o fogo, o fogo em teus cabelos que gritam o silêncio,
o teu corpo evapora-se e dele nasce o beijo,
o fogo... o fogo húmido da tua pele,
adormecida nas mãos cansadas,
tristes, tristes... porque o amor alicerça-se à alvorada,
e o fogo, o fogo que invade o verbo amar,
o fogo extingue-se e tu... e tu és um cubo de vidro com janelas para o mar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 12 de Julho de 2014

Viver


Vivíamos encaixotados numa lâmina de silêncio,
tínhamos dentro de nós o sonho, tínhamos a transparência do amanhecer,
vivíamos sem saber que vivíamos...
viver,

Vivíamos dentro do espelho de uma folha por escrever,
vivíamos como se amanhã fosse o dia mais belo do luar,
tínhamos as palavras em gritos, e vivíamos acreditando que havia uma árvore nua, em despedida...
sentada na alvorada... esperando o regresso do mar,

Vivíamos no centro do círculo de vidro,
tínhamos no olhar a distância transatlântica do desespero..., havia em nós o medo, a solidão,
vivíamos não vivendo,
… porque tínhamos um beijo em nossa mão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 12 de Julho de 2014

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Mãos de papel...


Não estavas,
levemente desapareceste nos panos húmidos da manhã,
sentia-se a brisa que regressava da montanha,
peguei na tua mão,
percebi que era de papel, percebi que era impossível segurá-la...
hesitei,
voltei a pegar,
a tua mão ardeu, e vi a cinza madrugada rolando calçada abaixo,

O rio absorveu-a, o rio absorve todos os corações sem nome,
levemente... deixou de haver manhã,
perdi a noção do meu corpo, perdi nas pálpebras da tua dor o meu sorriso...
fiquei carrancudo, absorto, como o granito esquecido numa rua sem janelas,
a pedra, e as flores...
absorvidas pelo mesmo rio que hoje alimenta o meu desejo,
não estavas,
e hoje tenho medo a todas as mãos de papel...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 11 de Julho de 2014

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Não, não me obrigues a voar!


Não alimentes a minha fome,
porque eu não quero comer,
não, não grites o meu nome...
… porque sem a tua mão sou capaz de viver,

Escrever,
e... e sonhar,

Não alimentes a minha fome,
não cerres toas as janelas do meu olhar,
não me peças para chorar,
não, não sei chorar...

(escrever,
e... e sonhar),

Não alimentes a minha fome,
não quero os teus lábios de ciclone,
vagueando no meu peito, sobrevoando os meus cabelos tristes,
não,
porque insistes?
que eu seja o que nunca quis ser,
não,
não quero comer,
não,
não quero correr...
apenas quero ser o mar,
com lençóis de amanhecer,

(escrever,
e... e sonhar),

Não, não me obrigues a voar!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 10 de Julho de 2014

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Pedra de sentar


Esta pedra de sentar,
o sonho quando se apaga e voa sem que ninguém o consiga alcançar,
esta poeira cristalina sem encontrar o mar,
este verso prisioneiro da maré, pontapeando a sombra do sono,
uma cama me grita, e eu, eu obedeço,
me deito, adormeço,
esta pedra de sentar,
alucinada como os botões de rosa de odor a madrugada,
este meu corpo acorrentado ao velho Cacilheiro,
correndo, andando, estropiando o Tejo envergonhado,
este meu olhar cerrado,
como nuvens de papel, como algodão doce na mão de uma criança...

Pedra de sentar,

Esta pedra de sentar,
disfarçada...
disfarçada de amar,

A morte alicerça-se-lhe e ele acredita na pedra de sentar,
vai à janela... sem se levantar,
das árvores que observa, há uma que lhe acena, e o cumprimenta,
come uma sopa, e... e ela, o alimenta,
ele acredita que no próximo amanhecer, uma gaivota o vai visitar,
então, ele, fica esperando na pedra de sentar,
como um rio, ou... ou como um mendigo saboreando a noite,
vai às putas, e esquece-se de regressar...

Esta pedra de sentar...
deprimente sobre a pele encaracolada da tempestade,
ele, ele não sabe que do outro lado do rio, há uma cidade,
ele, ele não sabe que do outro lado da cidade, há um esconderijo,
um jardim empedrado, e que na lapela usa um lenço colorido,
detesta todas as gravatas,
detesta todos os lençóis com o aroma a cansaço,
detesta um simples abraço,
esta pedra de sentar,
irrita-me, e até parece um esqueleto com pernas de chocolate,
com olhos de solidão...
esperando, esperando... esperando a alegria acordar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 9 de Julho de 2014

terça-feira, 8 de julho de 2014

A clarabóia das lágrimas


Esta tenaz vagarosa mergulhada nas minhas palavras,
da lareira do silêncio, oiço as moléculas transparentes do amor,
sufocam-me, alimentam-se do meu cansaço,
o cansaço de escrever,
o cansaço das palavras,

A lanterna do teu olhar, cega-me, transforma os meus olhos em pedaços de papel,
e nele... escrevo as palavras que ninguém... que ninguém lê...

Não sou capaz de desistir,
partir para outros Oceanos, mais calmos, tranquilos... como os teus braços,
há sempre um espelho que transporta o meu rosto para o futuro...
envelheço, e sento-me num abandonado banco de jardim com uma concertina na mão,
e dela sinto em mim as recordações das tempestades voluptuosas...

Não há um fim, apenas o passar de uma parede negra... para uma outra, a curta distância...
uma parede castanha, alvenaria com cicatrizes comestíveis,
flores,
tenho as flores que sobejaram do jardim ardido na lareira do silêncio...
e deixei de ter o pavimento térreo que me acompanhava nas horas indolores do meu pulso,

A lanterna do teu olhar, cega-me, transforma os meus olhos em pedaços de papel,
e nele... escrevo as palavras que ninguém... que ninguém lê...

E ninguém quer...

Esta tenaz vestida de forca,
embrulhada numa túnica branca,
há uma porta dos fundo que me serve de escapatória...
um ponto de fuga, um simples ponto triste, um ponto tridimensional esquecido na solidão,
e ninguém quer...

Que... que a clarabóia das lágrimas ressuscite da montanha!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 8 de Julho de 2014

segunda-feira, 7 de julho de 2014

O enclave da insónia


O teu beijo amorfo,
clandestino do enclave da insónia,
cai a noite sem perceberes que a noite é uma mulher invisível,
uma amante cobiçada por todos,
suspensa nos tentáculos das estrelas sem nome,
o teu beijo silencia-se e morre...
o teu beijo deixa de ser beijo,
e transforma-se em desejo,
inverso, transverso esforço que alicerça o teu corpo à ponte metálica...
balança e não cai,
e levita depois de acordar a madrugada,
como se de um pôr-do-sol em decomposição se tratasse...

O teu beijo amorfo... evapora-se,
morde os lábios de cetim, e... e vai à janela da solidão procurar pedacinhos de papel colorido,
imagina-me uma sombra com pequenos ramos que partem na ferocidade do vento,
vergo-me, troço-me até palmilhar a terra húmida depois da chuva do fim de tarde,
e fico estendido como uma pedra entre o sacrifício e a vontade de correr...
beija-me, penso-o enquanto aos poucos esforço-me para me levantar,

Agarro o teu beijo amorfo,
acaricio-o na palma da minha mão de caduca folha,
sinto-me desgovernado quando imagino o mar a entrar no meu corpo,
penso que vou morrer,
penso que serei o primeiro a partir... por motivos de um beijo amorfo...
sei que a morte é natural... normal,
mas... tudo por um beijo?
o cansaço invade-me,
a força motriz que alimenta os eléctrodos do meu coração... começa a esvaziar-se,
os eléctrodos apaixonam-se por mim,
e fico sem jeito,
fico... impávido enquanto o teu beijo amorfo desce a Calçada da Ajuda...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Julho de 2014