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sábado, 28 de fevereiro de 2015

Crianças de luz


Não penso
não imagino as palavras semeadas nos relvados da saudade
não penso
não durmo
acreditando nas marés de vidro
descendo da montanha
imagino...
riscos suspensos na alvorada
crianças de luz gritando pela liberdade
e nada
nem ninguém
nas ruas desta cidade.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 28 de Fevereiro de 2015

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

as ruas húmidas do desejo

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


quando as palavras semeadas no papel envelhecido
morrem
aquele que as escreve
despede-se
entre lágrimas e falsos sorrisos
um desenho insignificante
poisa docemente no vulcão da madrugada
sem mágoa
ou... ou paixão
abraça-se à noite dos tristes aconchegos
grita pelos sonhos
e... e em vão...

percebe que a vida é um triângulo de luz
voando nas ruas húmidas do desejo
tenho medo do silêncio
e do cansaço dos dias junto ao rio...
aquele que as escreve
despede-se
e parece um vadio
esmiuçando ossos e cigarros
ou... ou talvez não...
porque tem no corpo um vazio
um buraco negro recheado de insónias e imagens sem nome
como têm os pássaros nos prismas imaginados por uma árvore doente...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 24 de Fevereiro de 2015


domingo, 11 de janeiro de 2015

Corpos de Luz


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Esse teu corpo de luz
algures no espaço da solidão
ouvindo as lágrimas sem nome
que anoitecem na minha mão
esse teu corpo de vulcão
descendo a montanha do vento
depois... alicerça-se nas árvores negras da tua boca
sílabas estonteantes
e loucas
na ardósia tarde da melancolia
a eira em ferida
o trigo em chamas
salivadas pelo silêncio das palavras
e das vergonhosas gaivotas sem asas
esse teu corpo de luz
dançando na alvorada meus lábios
demoradamente sós...
perdidas
esquecidas
mortas...
como todos os corpos de luz
como todas as palavras...
murmuradas
… e amadas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 11 de Janeiro de 2015

sábado, 10 de janeiro de 2015

Esta noite


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Esta noite desconhecida
quando há palavras que se entranham no meu peito
estas veias onde correm avenidas
e gajos sem jeito
e néones travestidos de solidão
esta noite
a tua noite
sem janelas
sem... sem entardecer
e no entanto
sou laminado pelos teus lábios
incandescentes

a arder...

esta noite
vou voar no teu silêncio
(se ainda existir em ti silêncio)
caminhar na neblina
como se eu fosse um fio de luz
em translação
as cinco primeiras pedras do amanhecer
cinco apenas
nas palavras estonteantes
mergulhadas em cubos de gelo
e...
e... cabanas de porcelana.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 10 de Janeiro de 2015

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

A prisão do “Adeus”


Na prisão do “Adeus”
velhas flores são torturadas pelo silêncio da luz,
não existem janelas, não existe uma porta,
frestas,
ou... ou literatura,
lá fora, na rua,
ouvem-se os gritos dos pássaros e das abelhas,
há um subscrito negro onde alguém escreveu...
“para a morte”
as velhas flores não precisam de saber qual é o significado da morte,
elas são velhas flores torturadas...
pelo silêncio da luz,
(e a morte é o anoitecer de cheiros e sons
que só as velhas flores conseguem desenhar
nas húmidas paredes da prisão do “Adeus”)
na prisão do “Adeus”
velhas flores são torturadas pelo silêncio da luz,
não existem janelas, não existe uma porta,
frestas,
ou pedaço de areia com sabor a mar...
e as grades de ferro transformam-se em madrugada vestida de branco.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 11 de Dezembro de 2014

sábado, 6 de dezembro de 2014

O menino da preia-mar


Há feridas invisíveis no teu sorriso
que nem o espelho da saudade consegue desenhar,
pareces uma fotografia embalsamada,
sem alma...
esquecida num qualquer lugar,
há feridas invisíveis...
e crateras de espuma
que só as tuas pálpebras alicerçam às meticulosas palavras sem destino,

em ti o menino vestido de preia-mar
que corre e correr... e corre sem se cansar,
em ti e de ti...
as feridas entristecidas dos biombos nocturnos da vaidade,

esta cidade,
o teu corpo vagueando no sexo da paixão
como um cadáver enraivecido... fundeado no rio sombreado pelo incenso...
uma carta sem destino que te bate à porta,
um carro preguiçoso em tristes aventuras,
há feridas invisíveis no teu sorriso
que os cigarros da despedida alimentam,
mas... mas no teu olhar cessaram as lágrimas de chocolate,

em ti
e de ti...

a mentira do silêncio embrulhada na portaria
de pequeníssimos fios de luz,
o teu livro preferido que arde... enquanto se extingue o dia,
dentro dos teus seios,

em ti
e de ti...

o cansaço abstracto das montanhas de papel,
os rochedos envenenados pela noite dos marinheiros
e que tu não entendes os seus medos
e inquietações,
não me ouves... porque a minha voz pertence ao cacimbo
e do cacimbo emerge como uma lâmina de sangue,
em veias de nylon
ao deitar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 6 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

O transeunte


Saber amar-te… é não perceber a razão de existir,
É mais fácil resolver uma equação diferencial… do que saber amar-te,
Escrever-te sabendo que nada lês do que escrevo,
Porque não tens tempo, porque pertences ao grupo que me apelida de louco…
Um coitadinho, um coitadinho que se julga poeta,
Pois eu não sou poeta, pois eu não sou escritor,
Pois eu… ai como eu gostava de saber amar-te…
Eu não sou artista, não sou nada,
Sou um que vagueia nas ruas inventadas por um louco igual a mim,
Julgava que era porta,
Dizia-se escritor, artista…
E… e morreu num banco de jardim,

Como eu vou morrer,

Saber amar-te sabendo que o amor é um círculo de luz,
Um espelho sombreado quando desce a noite sobre os teus seios,
Saber amar-te eu gostava, esforço-me… mas… mas a vida é uma vaidade,
E o amar… e o amar pertence ao amava,
Esforço-me, esforço-me como se eu fosse um rio abraçado ao mar,
Enrolados, todos nós, eu o rio e o mar… enrolados ao teu sorriso,
E no entanto,
Não sei amar-te,
Nem por palavras,
Nem por desenhos…
E eu, e eu que não sou poeta,
Nem artista… como vou morrer,

Morrendo… sem o saber; amar-te!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 4 de Agosto de 2014

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada

foto de: A&M ART and Photos

Não acredito nos teus cabelos, são voláteis, são versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada,

Um dia, qualquer dia, todas as árvores do meu jardim se transformarão em desejo,
das suas folhas, cairão palavras,
coisas,
pedras,
cabelos, vidraças... todas... estilhaçadas,

Todas perfumadas,
não acredito, e tenho medo à noite vestida de insónia,
todas elas, todas mesmo..., um dia, qualquer dia..., cairão na tua mão,
como granizo envenenado pelo silêncio dos teus beijos,
como barcos defuntos no cemitério do prazer,

Não acredito nos teus cabelos,
e quando sinto a presença do teu corpo, percebo que não existe corpo,
apenas uma montanha de sombras,
apenas..., e nada mais do que isso, porque, porque tu nunca tiveste corpo,
porque..., porque tu não existes!

Se não existes,
se não tens corpo...
como poderás ter beijos em silêncio..., como?

Ah... e a tua boca?
Sem palavras, sem lábios, sem... sem comestíveis corações de papel,
ao jantar,
uma colher de sopa misturada com algumas insignificantes carícias...
e..., e uma flor semeada no teu ventre de cristal,

(Não acredito nos teus cabelos, são voláteis, são versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada)

Tínhamos cartas que os anos 90 engoliram numa tarde de Agosto,
nas folhas apenas alguns desenhos,
um alucinante odor a paixão,
e..., e tudo se perdeu, e tudo... tudo mesmo, morreu numa noite de Novembro...
Viva a solidão! Viva esta vida sem vida... Viva, vivendo, sem cartas com odor a “paixão”,

(ouvem-se sílabas de areias no teu olhar)

E a luz da minha biblioteca, ténue como as minhas mãos, despede-se de mim com um sorriso de incenso.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 12 de Junho de 2014

sexta-feira, 25 de abril de 2014

viver não vivendo


vivo fingindo viver
procurando o que já morreu
inventando palavras que nunca tive a coragem de escrever
vivo esperando o amanhecer
que da madrugada cresçam lábios de cereja
e pedacinhos de papel com barquinhos desenhados
vivo debaixo da sanzala encarnada
olho o Sol e sinto a tua pele misturada com imaginados sorrisos
de prata
cachimbos mergulham e acreditam que
vivendo fingindo viver...
um dia

um dia vou regressar ao quintal recheado de mangueiras
com sombras estrelares
fingindo
correndo...
amando os velhos telhados de luz
como amo o fingimento de fingir que vivo

vivo fingindo viver
nesta jangada de silêncio
com velas de pano
viver viver viver...
não sabendo o significado do amor
amando fingindo que amo
sou um marinheiro esquecido no Oceano
procurando
inventando...
dormindo nas esplanadas que habitam no Tejo
recordando muros amarelos
porque fingindo viver... não vivo... não vivo esta vida de corpos em mármore.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 25 de Abril de 2014

quinta-feira, 13 de março de 2014

Doces lábios

foto de: A&M ART and Photos

Tens nos teus doces lábios o labirinto pavimentado do desejo,
há no teu olhar uma caravela de paixão,
beijos, lágrimas que só a madrugada consegue construir,
tens em ti o sofrimento pincelado de amanhecer, como os peixes e os pássaros magoados,
há na tua boca o cansado silêncio,
e às vezes, tão poucas... sinto nas tuas mãos o vibrar da noite,

Uma mulher de pálpebras cerradas a gritar por ti, sofre, sente os teus dedos no distante luar,
uma estrela que deixou de brilhar,
a música que cessou e nunca mais se ouviu dentro dos teus seios entre palavras e sonhos de sonhar,
desenhos, rabiscos de luzes em voos nocturnos, ausentes da cidade,
e a cidade vive nas tuas veias de cenário envelhecido, longe, longe do pôr-do-sol,
… longe... longe dos teus doces lábios em pedaços de labirinto pavimentado do desejo...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 13 de Março de 2014

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Palavras magoadas

foto de: A&M ART and Photos

Sabíamos que a noite pertencia aos pilares de areia,
tínhamos nos nossos corações pedaços de papel,
algumas palavras incompreendidas,
palavras... palavras tristes, palavras magoadas,
e versos em construção no interior das nossas veias,

Sabíamos que existia o amanhecer,
que éramos só nós os únicos habitantes da cidade da solidão,
sabíamos que o mar nunca, que o mar nunca nos ia pertencer,
e mesmo assim, desconhecendo a madrugada e mesmo assim... sonhávamos,
como cigarros a arder,

Sabíamos que em todas as igrejas do nosso corpo poeirento uma nuvem de lágrimas brincava,
que nas nossas mãos existiam palavras e palavras magoadas,
corríamos como comboios desgovernados de encontro às portas do inferno,
tanto, tanto, tanto... tanto sofrimento no tecto do luar, tanto, tanto calor nos lençóis da esperança,
que um dia descobri que não te amava,

Tínhamos imagens negras suspensas nas paredes de gesso do nosso imaginário,
brincávamos às escondidas,
escrevíamos palavras, palavras magoadas, palavras tristes, palavras nuas das Cinderelas palavras,
palavras entre palavras,
… nas tuas palavras em mim corpo de geada procurando o busto lendário,

Pedaços de papel,
abelhas que desenhavam o céu nos nossos braços picados por... palavras magoadas,
e sonhávamos,
e... e tínhamos nas pálpebras coloridas do incenso os cristais do amor,
e sabíamos e tínhamos... e queríamos fugir para o infinito como duas rectas paralelas em alegre pastel, havia uma tela, uma velha tela... com sabor a mel.

(e a tela da vida arde como ardem os livros de poesia dentro do teu e do meu e deles... corpos de gel perdidos numa esquina de luz)


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 19 de Fevereiro de 2014

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Círculos, círculos de ténue luz

foto de: A&M ART and Photos

Círculos, círculos de ténue luz sobre os teus olhos cinzentos,
lá fora ouve-se o granizo comendo os sonhos daqueles que dormem, e saltitam sobre as nuvens de vento,
lá fora há pálpebras que choram,
automóveis que se recusam a andar,
suspendem-se nas canadianas, procuram de vez em quando uma bengala de verniz...
lá fora tudo parece ser feliz, as plantas argumentam nas palavras os distintos sons dos teus lábios,
círculos,
quadrados,
quarta-feira... a luz inverna e todos os silêncios ancorados a ti,
tu, quem és?
tu... tu o que fazes junto a mim quando me olho no espelho, quando descrevo as nódoas do meu rosto por meia dúzia de palavras, tão poucas... mínimas... que apenas pronuncio... “ausência e dor”,
e círculos..., círculos viciados em sexo e drogas, deitados na relva do pôr-do-sol,
e... e círculos, círculos de ténue luz sobre os teus olhos cinzentos.


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 2 de Janeiro de 2014

domingo, 5 de janeiro de 2014

Fotografia sem nome

foto de: A&M ART and Photos

Perspectivo-me sobre a sombra lâmina do teu sorriso de gaivota sem poiso
há uma linha transversal que nos separa e aproxima
como uma fotografia sem nome na mão do louco muro em xisto
desço às fronteiriças margens do desejo
desço até que sou engolido pelo cosseno de trinta e cinco graus dos teus lábios...
desejarás-me ainda depois das equações diferenciais dormirem dentro dos quadriculados cadernos?
Invejo-te a liberdade
e os voos nocturnos quando se esquecem de ti e tu
e eu
suspensos no estendal das sílabas poéticas que o veneno da tua boca alicerçou na tempestade
há em nós uma circunferência de luz com braços de areia
húmidas todas as palavras dos anzóis do medo das sanzalas com vozes de zinco
com olhos de fome...
e chove
chove sobre o teu corpo de nylon onde se abraçam os barcos desvairados quando o vento se entranha no amor e nos transporta para o infinito
e lá ao fundo... a sombra lâmina do teu sorriso de gaivota sem poiso.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Ou... ou talvez... não

foto de: A&M ART and Photos

Vinte e uma horas e as ratazanas azuis deambulam no corredor da insónia
sou invadido por um sonho em tons de branco
e um tecido opaco ofusca-me o olhar
a cegueira entranha-se na minha mão
passo-a pelo teu rosto e verifico que não tens rosto...
… vinte e uma horas e tu não existes
e tu
tu pareces uma rosa desgovernada na paisagem sem moldura
uma tela em branco
uma janela...
janela sem caixilho... quando sinto o vento entrar e nada posso fazer
e nada me apetece fazer...

Deixo a caneta sobre a secretária
deixo um dos livros em pausa perto da mesa-de-cabeceira
desligo o interruptor da saudade
dos sonhos
e percebo que a lâmpada do desejo nunca mais se acenderá na minha vida...
anticongelante corre-me nas veias tristes e sonolentas
agrestes
precoces como os primeiros passos em sandálias de couro
os calções voavam sobre as mangueiras sem bandeira
e a apátrida criança nunca mais quis olhar o mar...
desistiu
desistiu dos sonhos com bonecos de peluche

Desistiu dos velhos pinheiros de Carvalhais
da eira
do espigueiro...
vinte e uma horas em Portugal Continental
e um miúdo perde-se na imensidão das ruas com os espelhos das velhas secretárias
com velhos papeis
em velhos edifícios atulhados em reumatismo e bicos de papagaio...
o tempo acabou
e os calões hoje são gaivotas com sandálias de couro
que brincam no Baleizão
ou...
ou... ou talvez... não.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 26 de Dezembro de2013

sábado, 21 de dezembro de 2013

Um monstro com olhos em xisto

foto de: A&M ART and Photos

O pormenor emblemático do corpo composto por luz, pétalas encarnadas e algumas insónias margaridas, o jardim parece um monstro recheado de nozes, vozes, um monstro com olhos em xisto, socalcos, montanhas... e nas veias, o rio
O Douro?
O sorriso das madames com plumas desiguais sobre os ombros sombreados pelas nuvens que a noite constrói depois de todas, ou apenas uma ou outra, luzes de néon vomitarem as palavras encravadas nas montras da cidade, oiço-te vaguear como uma gaivota ferida, doente, oiço-te mergulhar no meu Douro que odeio, confesso... que sempre odiei, vivi para ser uma cidade, com bares, ruas e ruelas, travestis, putas, e donzelas... o Douro enerva-me, desiludiu-me quando o encontrei pela primeira vez... como me desiludiram algumas das mulheres que eu tive
(como desiludiste algumas das mulheres que tiveste)
Como me desiludiram algumas das calçadas empedradas com acesso ao rio, outro rio, um rio com vida, um rio com esqueleto de marinheiro, em cio
O Douro?
A ponte iluminava-se, a ponte voava sobre os espaços exíguos da minha cabeça, acordava com pequenas grandes tonturas, acordava a fumar cigarros proibidos e deitava-me a fumar
Cigarros proibidos?
O Douro enerva-me, desculpem-me, mas amo a cidade do Tejo, amo a ponte, os charros que fumei enquanto choramingava... e depois caía num qualquer bar em Cais do Sodré, depois era madrugada, deambulava pelas ruas mais profundas, mais escuras, mais... mais amadas em mim, depois cambaleava, tropeçava no paralelepípedo e vomitava sons inaudíveis dos carris frios, tão frios como o teu corpo de menina enquanto descia Setembro sobre uma sombra em Trás-os-Montes, odeio-te sabendo que sou prisioneiro de ti, odeio-te sabendo que só serei livre quando
Pegar na tua mão, acariciar-la como se fosse a folha de um dos livros do António Lobo Antunes, ou um dos pares de luvas de lã que tive em miúdo, depois deixei de sentir frio porque as minhas mãos transformaram-se em rochas, pedaços de granito, eles também gélidos, eles também... sós, depois vieram os olhos verdes que a pouco e pouco ficaram sem cor, hoje são daltónicos e precisam de lentes para ler as tuas palavras das tuas cartas que eu te reenviei... e hoje, hoje sinto saudades
Da cidade do Tejo,
A ponte iluminada balançava quando o vento vinha para me levar e sempre que me preparava para partir, não partia, um carro de brincar iluminava a ruela dos candeeiros mortos, movimentava-se por quatro pilhas de um volt e meio, redopiava em círculos, usava a voz das minhas palavras na boca das outras palavras, aquelas que nunca consegui escrever, dizer amo-te é mentira, ilusão, despedida,
Saudades?
Do Tejo,
Dizer desejo-te é mentira, ilusão, despedida,
Saudades?
Do Tejo,
(dedico esta música a todos os meus amigos)
Amigos? Quais amigos... dás-te conta que não tens amigos, e que se vivesses na cidade do Tejo não tinhas um cão com catorze anos, caquéctico, rabugento... mas engraçado, porque só ele percebe porque choro, quando choro...
(qual é a frase?)
O pormenor emblemático do corpo composto por luz, pétalas encarnadas e algumas insónias margaridas, o jardim parece um monstro recheado de nozes, vozes, um monstro com olhos em xisto, socalcos, montanhas... e nas veias, o rio, a heroína em ebulição sentia-se e no tombar das árvores doidas, como sonâmbulos corpos emagrecidos havia sempre alguém que não regressava,
(ai a frase... a frase...)
O Douro?
A límpida água dos sonhos e da esperança voltam à panela de pressão e evaporam-se nas avenidas encantadas dos guindastes com braços em aço e lábios em pergaminho,
Hoje temos beijos,
(quer uma ajudinha... senhor Francisco?)
Hoje temos beijos, saudades e nada mais do que isso... e redopiava em círculos, usava a voz das minhas palavras na boca das outras palavras, aquelas que nunca consegui escrever, dizer amo-te é mentira, ilusão, despedida,
Saudades?
Do Tejo,
(diga comigo senhor Francisco... “Com os voos nocturnos da menina Amélia a sobremesa adormece sobre a mesa-de-cabeceira”)
Hoje temos beijos, saudades e nada mais do que isso... e redopiava em círculos, usava a voz das minhas palavras na boca das outras palavras, aquelas que nunca consegui escrever, dizer amo-te é mentira, ilusão, despedida,
Saudades?
Do Tejo,
E dizer amo-te é pura loucura, desilusão... sei lá que mais...
(à escolha)
E diziam-me que aqui existiam verdejantes barcos com asas em porcelana... pode lá ser...
E é, e é... é assim desde que partiste...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 21 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Nada mais

foto de: A&M ART and Photos

Fingíamos o sossego quando dentro de nós habitavam tempestades
fugíamos para o cume da montanha mais próxima
abríamos uma das quatro janelas da ginga
fundeávamos junto ao corpo emagrecido que a madrugada acabava de expelir
fingíamos
e fugíamos
e uma chaminé alicerçava o vento à copa das árvores
os pássaros pareciam agulhas enfeitando panos de renda
e os poucos galhos dos desenhos queimados...
apenas sobejaram os lenços de papel
lágrimas
e nada mais para recordar...

A saudade morria...
e aos poucos erguia-se o desejo cansado
virgem...
atraiçoado

Fugíamos das cavernas com carris de prata
abríamos o livro dos sonhos na página duzentos e sessenta e três...
a ginga vomitava soníferos gonzos com alegres pregos de aço
a árvore de Natal tinha desmaiado...
tonturas
talvez devido ao excesso de luz
ou... com medo das sombras que todos nós sabíamos existirem no nosso corredor sem portas
ouvíamos vozes que provavelmente tinham a sua origem no presépio da loja Chinesa...
e confesso que não percebi patavina do que elas diziam...
apenas percebi que a vaca sofria de cólicas renais
e
nada mais.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 16 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Um corpo submerso nas sílabas do desejo

foto de: A&M ART and Photos

Um corpo estaticamente só, um corpo submerso nas sílabas do desejo, um corpo entre montículos de saudade e rochas de insónia, uma luz alimenta este corpo, um espelho alimenta a luz que alimenta este corpo, um corpo... não é um corpo, um corpo vazio, solidificado, um corpo voando sobre a montanha da solidão,
Vens à janela, abres-te e sentes o vento em ti,
Um corpo inocente coberto pela espuma volátil do incenso, um corpo de água, só, um corpo cintilante, um corpo
Ausente?
Dorido, que não sente o corpo em corpo das flores...
Um corpo estaticamente só, um corpo submerso nas sílabas do desejo, um corpo entre montículos de saudade e rochas de insónia, um corpo poisado sobre o peito de um homem...
A imagem emagrece o corpo, a luz que alimenta este corpo, é alimentada por um outro corpo,
E o espelho depois de ser corpo.
Imagem, flutua sobre as vértebras do cansaço, e és transparente como as noites vestidas de negro, e és desejada como os pilares de areia das madrugadas em delírio, despes-te e olhas-te no espelho
(alimento a luz que alimenta o corpo)
O teu,
Quero ser um pedaço de montanha, ou um veleiro agasalhado de lareira acesa, caminhar junto a um rio com dentes em marfim, um corpo belo, desejável, um corpo em decomposição, a parte física sobre a mesa-de-cabeceira e a parte invisível dentro de mim, dentro da trovoada, das nuvens envergonhadas quando a luz ejacula sobre o abajur da tristeza e eu
O teu corpo é teu?
(alimentado pela luz que alimenta o corpo)
Desculpem... morri,
Um corpo de água, só, um corpo cintilante, um corpo
Ausente?
Quero ser o vestíbulo que habita no teu quarto secreto, a cabeça onde poisa o ombro, também ele... secreto, todo o corpo teu não existe, nunca apareceu à janela do meu castelo, o teu corpo é um embuste, falsificado, o ilustre Doutor das clarabóias domésticas que a tua mão abraça,
Quero o ser como são as palavras antes de escritas, aquelas que são pensadas e que por
Vergonha?
Pudor?
Um corpo belo esconde-se no interior de um cobertor, invento marés e mesmo assim
Não o consigo, não sou capaz que te dispas e fiques só corpo, só
Pudor?
Vergonha das palavras que tenho medo de escrever, vergonha dos beijos que tenho medo de desenhar na parede dos teus seios, o teu corpo, meandro sabático das sandálias em couro, os calções parecem perdizes brincando nos patamares no coração do Douro,
Vamos jantar?
Comer o teu corpo, ele, apenas ele... dentro do prato cerâmico, outrora em alumínio, hoje mendigo, o espelho que alimenta a luz ou a luz que alimenta o teu corpo, e uma corda feliz saltita nas mãos de uma criança...

(ficção – não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Outubro de 2013

domingo, 6 de outubro de 2013

cristais vagabundos

foto de: A&M ART and Photos

porque te alimentas do néon moribundo das portas em ruína
e percebes que os meus olhos são cristais vagabundos
sem número de policia
apenas uma simples janela de porcelana
quando regressa a noite
disfarça-se de gaivota
deixa ficar os poucos vidros sobre a mesa-de-cabeceira
e voa na cidade do medo

leva na algibeira o candeeiro mordomo
que sua senhora adorada lhe ofereceu um dia longínquo
quando ainda existiam lábios de borboleta
nas plantas marginais
do silêncio com algas
e dentro de um velho caderno
o esqueleto de duas ou três integrais
simples duplas triplas... como o teu corpo em despedida

partias no primeiro autocarro da carreira sem rumo definido
entre curvas e lagartos
livros e camaradas apaixonados pela vodka da menina Alice
partias
e eu deixava de ver-te logo a seguir à curva junto à ravina
despedia-me de ti dentro do meu quarto escuro
e chorava
chorava medalhas de prata que me ofereceste e nuca fui capaz de as usar...

(porque te alimentas do néon moribundo das portas em ruína
e percebes que os meus olhos são cristais vagabundos
sem número de policia
apenas uma simples janela de porcelana)

por medo
ou vergonha
nunca encontrei as tuas mãos no meu rosto triangular
e chegava a casa
e a casa parecia-me um cubo em betão armado
com braços em aço
com olhos em cristal
como os meus

(cristais vagabundos)


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
(não revisto)
Domingo, 6 de Outubro de 2013

sábado, 5 de outubro de 2013

(ai como eu sofro)

foto de: A&M ART and Photos

Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e tal como aconteceu com o abajur
Morreu
E cessaram no teus olhos as madrugadas sem a presença de mãos calejadas pelo engaço, o peso da enxada absorve os poucos ossos do teu empobrecido esqueleto, e tudo em ti
Pobre,
Morreu,
Cessou a luz que ilumina os trilhos nocturnos das montanhas de alecrim, sentia-te bocejar junto ao gesso em pedaços de tabique onde um lindo crucifixo da mãe Arminda, coitado, suspenso, só... e no entanto, olho-o e pergunto-me
Porquê?
Morreu e cessou,
E pergunto-me se ainda vou a tempo de regressar, e pergunto-me
Pobre,
Morreu?
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
O carrossel das palavras girava ferrugento e as ventoinhas cinzentas, em madeira, vomitavam vogais, outras vezes, sentíamos os sorrisos castanhos das abelhas de asa encarnada, ouvíamos as crianças deambulando mentiras de pano na fragilidade do sono, encerravam as janelas com fotografia para o dia de ontem, e
Pobre,
Morreu,
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
O carrossel em círculos ao redor de uma haste óssea, e lembrava-me do teu esqueleto de geada nas manhãs de Inverno, queríamos descer as escadas graníticas, e
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
Tombávamos sobre o pavimento dorido, cansado, e triste
Magoado?
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e tal como aconteceu com o abajur
Morreu
E tal como a Primavera,
Morreu?
Não
Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e tal como aconteceu com o abajur
Morreu,
Recordo-me dos telhados em zinco voarem sobre um tapete de lã, recordo-me dos alicerces aldrabados por um sucateiro, e no final do dia, tudo dava certo, as metralhadoras dos teus abraços acordavam sobre as mangueiras do quintal esquecido no centro de uma cidade, as munições em puro aço rompiam os muros em xisto e ouvíamos o telintar dos guizos de um chibo mal educado, de um chibo
Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e tal como aconteceu com o abajur
Morreu,
E o carrossel dançava nos cabelos loiros dos barcos em flor, e o carrossel das palavras, não de todas, mas o carrossel só de algumas palavras
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Sentiam-se sós... quando descia sobre as árvores do Tejo uma gabardina esbranquiçada que escondia no seu interior
Morte?
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Os poucos ossos sobejados do esqueleto que te acompanhava enquanto eu fazia amor com o teu corpo mergulhado em sombras e lá fora
Morte,
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Lá fora dormiam os candeeiros que um louco semeou no centro do passeio, os carros rosnavam
e
“Cuidado Com os Carros”
Mordem?
E lá fora um cortinado guilhotinado vendia o corpo como robalos sobre um pedaço em madeira...
“Hollywood... pá”.


(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 5 de Outubro de 2013

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

um corpo putrefacto como as flores de Sábado à noite...

foto de: A&M ART and Photos

a quem pertencerá este corpo que habita nas escadas do meu sótão?
não vestido
voando como abelhas e poisando nas pétalas de madeira
debaixo do corrimão...

oiço-o ofegante adormecido nas noites de solidão
oiço-o em corrida apresada descendo a calçada
abrindo janelas
abrindo... olhares cintilantes com sabor a estrelas do mar

oiço os apitos marinheiros
embriagados por ti
e em ti
quando inventas seios de prata e coxas de chocolate

oiço-o mergulhar nas minhas asas
são os teus sorrisos vagabundos como silêncios prisioneiros das aranhas clandestinas
mórbidas
mortas pela ranhura de uma lâmina de barbear

(a quem pertencerá este corpo que habita nas escadas do meu sótão?
não vestido
voando como abelhas e poisando nas pétalas de madeira
debaixo do corrimão...)

e oiço-o suspenso nas árvores do jardim da Estrela
e oiço-o que me chama e precisa das minhas mãos para subir as escadas da insónia
pertencerás tu aos grandes pilares de areia?
o comboio cintila e morre nos teus olhos cintilantes envenenados pela luz falsa
reescrita nos muros das palavras deambulantes que as gaivotas trazem da ilha...
oiço-o
e oiço-o sobre a cama esperando pelos meus lábios de sabão
como as pequenas caravelas de esferovite perdidas no tanque dos quatro caminhos

a quem pertencerá? um corpo voando nas marés de vidro
um corpo um apenas e simples corpo
o teu corpo que ninguém consegue explicar a quem pertencerá...
terá nome idade sexo religião? um corpo putrefacto como as flores de Sábado à noite...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 2 de Setembro de 2013