quinta-feira, 12 de junho de 2014

Versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada

foto de: A&M ART and Photos

Não acredito nos teus cabelos, são voláteis, são versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada,

Um dia, qualquer dia, todas as árvores do meu jardim se transformarão em desejo,
das suas folhas, cairão palavras,
coisas,
pedras,
cabelos, vidraças... todas... estilhaçadas,

Todas perfumadas,
não acredito, e tenho medo à noite vestida de insónia,
todas elas, todas mesmo..., um dia, qualquer dia..., cairão na tua mão,
como granizo envenenado pelo silêncio dos teus beijos,
como barcos defuntos no cemitério do prazer,

Não acredito nos teus cabelos,
e quando sinto a presença do teu corpo, percebo que não existe corpo,
apenas uma montanha de sombras,
apenas..., e nada mais do que isso, porque, porque tu nunca tiveste corpo,
porque..., porque tu não existes!

Se não existes,
se não tens corpo...
como poderás ter beijos em silêncio..., como?

Ah... e a tua boca?
Sem palavras, sem lábios, sem... sem comestíveis corações de papel,
ao jantar,
uma colher de sopa misturada com algumas insignificantes carícias...
e..., e uma flor semeada no teu ventre de cristal,

(Não acredito nos teus cabelos, são voláteis, são versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada)

Tínhamos cartas que os anos 90 engoliram numa tarde de Agosto,
nas folhas apenas alguns desenhos,
um alucinante odor a paixão,
e..., e tudo se perdeu, e tudo... tudo mesmo, morreu numa noite de Novembro...
Viva a solidão! Viva esta vida sem vida... Viva, vivendo, sem cartas com odor a “paixão”,

(ouvem-se sílabas de areias no teu olhar)

E a luz da minha biblioteca, ténue como as minhas mãos, despede-se de mim com um sorriso de incenso.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 12 de Junho de 2014

Sem comentários:

Enviar um comentário