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foto de: A&M ART and Photos
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O menino de sorriso amarelo não acredita no Natal,
alimenta-se de pigmentados corações de açúcar, dança descalço
sobre as pedras quadriculadas do caderno de Matemática, inventa
equações que para não esquecer o significado de cada uma,
escreve-as na adensada areia branca da praia das gaivotas cinzentas,
o menino não acredita que existem barcos com asas, o menino não
acredita que existem pássaros com âncoras de verniz e paisagens
prateadas nas janelas do olhar, o menino
Sou seu?
Ela dizia-me que quando eu fosse grande
Aparecerá na tua sombra um poema chamado saudade,
Cresci, fiz-me de homem
Fizeram-no homem com braços, com pernas, com...
cabeça e olhos, tudo, tudo em granito, puro, do Transmontano, mas
nunca contou que
Aparecerá na tua sombra um poema chamado saudade,
Sou seu?
O menino de sorriso amarelo não acredita no Natal,
o menino de sorriso amarelo não gosta do Natal, das coisas
supérfluas e inanimadas como as árvores rendadas do pijama dela,
Ela dizia-me que quando eu fosse grande um poema
chamado saudade aparecia na minha sombreada constipação nocturna
das flores ainda não oferecidas
Posso oferecer-lhe flores, menina?
O parvalhão do moço, dizem que sou eu, inventava
palavras e escrevia-as sobre a pele incandescente da areia branca das
praias do Mussulo, o menino de sorriso amarelo queixava-se que a
travessia transatlântica era uma maneira fácil e cómoda de se
esconder dos embondeiros com lábios de suor encarnado, havíamos de
descobrir o amor e a paixão, o silêncio quando a noite rompes os
cortinados vazios dos púbis em fúria, havia sempre um clitóris
agoniado, sem sentido, às vezes
Envergonhado,
Outras
Outras..., não, não gosto do Natal, e o poeta é
lindo enquanto escreve, e o homem de pedra é homem enquanto a pedra
não se desfaz, esmigalha-se... e o pó entranha-se nos móveis do
quarto com varanda para o Tejo,
Os apitos chegavam-nos de Cais do Sodré, elas
vestidas de meninas gritavam...
Olá meninos, vamos a uma voltinha?
Inseríamos a moeda na ranhura... e voávamos sobre
as oliveiras invisíveis que me acompanhavam desde o Douro ainda não
Património da Humanidade, mas um Douro carrancudo, encurvado... como
cobras de cabeça em prata que pernoitavam no vão de escada do sótão
dos esquimós de aço, que inventávamos nos iglus que o prazer
carnal transmitia aos alicerces de leite-creme depois das aventuradas
passagens pelo carrossel do sexo vampiro, o sangue aparecia nos
tornozelos da ardósia tarde, os cobertores
A menina dança?
Nem dançava nem tão pouco consentia que lhe
apalpassem as mamas, como as plantas do canteiro da dona Augusta,
acariciávamos-lhes as doces pétalas de chocolate, e depois
Envergonhado,
Aparecerá na tua sombra um poema chamado saudade,
Sou seu? eu... o poema chamado saudade...
Subíamos, descíamos, rodávamos em sentido
contrário aos ponteiros do relógio do tio Serafim, e vinha-me à
memória o círculo trigonométrico do tesão quando o cosseno de
trinta e cinco graus adormece sobre as âncoras de verniz e paisagens
prateadas nas janelas do olhar, choravam elas, tremiam, e
Não deixavam que lhe apalpássemos as mamas porque
diziam
São estrelas com sabor a tristeza,
As flores, o carrossel e o vão de escada,
Cais do Sodré em sólidos apitos, e eu
O menino de sorriso amarelo não acreditava no
Natal,
Depois
Acordei, fizeram-me de homem
E tal como o menino
Não
Acredito
Que existem pássaros com âncoras de verniz e
paisagens prateadas nas janelas do olhar, o menino
Sou seu?
É ela, quando acendo a luz do candeeiro da
mesa-de-cabeceira e vejo lá poisado um par de óculos, um livro do
Agualusa e o “Quinto Livro de Crónicas” de A. Lobo Antunes, e
oiço-o em teias de aranha caminhando no corredor do
Carrossel
Inseríamos a moeda na ranhura...
E no corredor do sótão um jacaré de palha seca
brincava com o menino que
Não
Acredito
Que existem pássaros com âncoras de verniz e
paisagens prateadas nas janelas do olhar, o menino
Sou seu?
Um carrossel pintado de fresco,
Cuidado
“Pintado de Fresco”
O Natal... e as meninas não gostam que eu lhes
ofereça flores...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 8 de Dezembro de 2013