foto de: A&M ART and Photos
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Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma
mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído
nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com
pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e
tal como aconteceu com o abajur
Morreu
E cessaram no teus olhos as madrugadas sem a
presença de mãos calejadas pelo engaço, o peso da enxada absorve
os poucos ossos do teu empobrecido esqueleto, e tudo em ti
Pobre,
Morreu,
Cessou a luz que ilumina os trilhos nocturnos das
montanhas de alecrim, sentia-te bocejar junto ao gesso em pedaços de
tabique onde um lindo crucifixo da mãe Arminda, coitado, suspenso,
só... e no entanto, olho-o e pergunto-me
Porquê?
Morreu e cessou,
E pergunto-me se ainda vou a tempo de regressar, e
pergunto-me
Pobre,
Morreu?
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
O carrossel das palavras girava ferrugento e as
ventoinhas cinzentas, em madeira, vomitavam vogais, outras vezes,
sentíamos os sorrisos castanhos das abelhas de asa encarnada,
ouvíamos as crianças deambulando mentiras de pano na fragilidade do
sono, encerravam as janelas com fotografia para o dia de ontem, e
Pobre,
Morreu,
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
O carrossel em círculos ao redor de uma haste
óssea, e lembrava-me do teu esqueleto de geada nas manhãs de
Inverno, queríamos descer as escadas graníticas, e
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
Tombávamos sobre o pavimento dorido, cansado, e
triste
Magoado?
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma
mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído
nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com
pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e
tal como aconteceu com o abajur
Morreu
E tal como a Primavera,
Morreu?
Não
Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma
mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído
nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com
pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e
tal como aconteceu com o abajur
Morreu,
Recordo-me dos telhados em zinco voarem sobre um
tapete de lã, recordo-me dos alicerces aldrabados por um sucateiro,
e no final do dia, tudo dava certo, as metralhadoras dos teus abraços
acordavam sobre as mangueiras do quintal esquecido no centro de uma
cidade, as munições em puro aço rompiam os muros em xisto e
ouvíamos o telintar dos guizos de um chibo mal educado, de um chibo
Morre o abajur e cessa a luz do desejo, uma
mesa-de-cabeceira definitivamente órfã, e do naperon construído
nos serões de Inverno... ouvem-se pequenas lágrimas misturadas com
pegajosas sílabas de carvão, sei que o teu rosto viveu numa tela e
tal como aconteceu com o abajur
Morreu,
E o carrossel dançava nos cabelos loiros dos barcos
em flor, e o carrossel das palavras, não de todas, mas o carrossel
só de algumas palavras
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Sentiam-se sós... quando descia sobre as árvores
do Tejo uma gabardina esbranquiçada que escondia no seu interior
Morte?
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Os poucos ossos sobejados do esqueleto que te
acompanhava enquanto eu fazia amor com o teu corpo mergulhado em
sombras e lá fora
Morte,
(não temos sorte nenhuma, senhor Luís)
(ai como eu sofro)
Lá fora dormiam os candeeiros que um louco semeou
no centro do passeio, os carros rosnavam
e
“Cuidado Com os Carros”
Mordem?
E lá fora um cortinado guilhotinado vendia o corpo
como robalos sobre um pedaço em madeira...
“Hollywood... pá”.
(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 5 de Outubro de 2013
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