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sábado, 2 de abril de 2016

Ao espelho


Sofro por ti meu amor

Sinto a tua mão no meu rosto cansado pela doença

Sinto no meu corpo

As marras do destino

Habito em ti

Sou pedaço do teu cansaço

Livro das tuas palavras

Algumas parvas

Algumas insignificantes

Sofro o derradeiro sofrimento

Que as marés do inferno me trazem

Não tenho medo da tua partida

Não tenho medo da tua ausência

Suicido-me nos teus lábios

Acabrunho-me nas imensuráveis paixões dos poços da morte

Estou só meu amor

Partiste sem me avisar

Naquela noite das sombras do esquecimento

Suicido-me no teu perfume

Caminho calçada abaixo

As rosas da melancolia

As raízes dos soníferos orgasmos da manhã

Fugidios corações de aço

No corpo debruçado sobre o parapeito do desejo

Estou cego meu amor

Os dias tristes da tua ausência

Ao longe os apitos da locomotiva do adeus

Nunca mais quis o amor

Nunca mais quis a infância desenhada em Luanda

Perder-me numa Alijó encurralada no esquecimento

O frio

O frio disfarçado de abismo

O amor regressado do mendigo palhaço do deserto

Saber que amanhã estou só

Eu

A noite

O amontoado de sucata

As árvores do teu sorriso

Estou só


Só neste sargaço da sonolência do labirinto de asas

Pássaros enraivecidos

Limitados pela cabeça do sono

Tenho medo meu amor

Tenho medo da madrugada

E acreditar que estás vivo

Ao meu lado

Esticando o dedo…

Então engenheiro!

Não tenho palavras do suicídio fictício da minha vida

O Tejo peneirento algures nos teus lábios

Estou feliz hoje

Permaneço no esquadro envidraçado do teu olhar

Meu amor

Me encontro encurralado no esquecimento

Submersos esqueletos de gelatina

Ao espelho

O meu corpo envidraçado

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 2 de Abril de 2016

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Barcos de sombra


Este triste rio

Que desabraça as suas margens

Que troca o silêncio da noite

Por gaivotas em papel

E barcos de sombra

Agacha-se quando a solidão brinca no vento

Sorri quando a melancolia voa sobre os coqueiros

Este triste rio

Que habita no meu peito

Não dorme

Não come…

Mas ama

E sofre

Como eu

Uma caravela sem destino

No estrelar do desejo.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

sexta-feira, 20 de Novembro de 2015

terça-feira, 14 de abril de 2015

O vento me abraça, o vento me enlaça, o vento…


O vento não passa por mim

Não me abraça

Não brinca comigo no jardim

O vento ignora o baloiço da minha infância

Deixa-me sem paciência

Para as coisas

As mais simples

E as mais belas

O meu cão fugiu de casa

Ou fartou-se da casa

Ou cansou-se das minhas palavras

E nem o vento o traz

 

E nem o vento me leva

Como o faz

Às folhas caducas de uma árvore

Ou aos cabelos desalinhados da doença

Não toca nas páginas escritas sobre a minha secretária

Nem nos livros não lidos

Por falta de tempo

Por falta de vontade para o fazer

O vento não passa por mim

Não me abraça

Nem dá força à tua barcaça

Que andas à deriva

 

Num Oceano sem nome

Algures entre Luanda

E

E Lisboa

O vento

Esquece

O vento esquece a criança que vive dentro de mim

Que brincava num quintal

Recheado de sombras e cheiros

Que trouxe

Mas com o tempo se perderam nos socalcos do Douro

E outro vento

 

Os levou

Para outro Oceano

Tão distante

Meu amor

Tão distante que nem à velocidade da luz

Eu

A criança

Conseguia alcançá-los

Os calções

Os papagaios de papel


Longe

 

Procurando outro vento

Numa outra cidade

Sem ruas

Sem pessoas para amar

Apenas cinzas

De um velho cigarro

Suspenso

Entre dedos

E rochedos

(O vento não passa por mim

Não me abraça

Não brinca comigo no jardim

 

O vento ignora o baloiço da minha infância

Deixa-me sem paciência

Para as coisas

As mais simples

E as mais belas)

Como o sorriso do teu amanhecer

Junto ao Tejo

Os cacilheiros embriagados de transeuntes

Apressados

Tão apressados

Que

Que deixaram de sentir o vento

 

Como eu

Eu

A criança do baloiço

Inventando círculos de prata

Nas manhãs engolidas pelo cacimbo

O vento

O vento é uma desgraça

Não passa

Nem me abraça…

A cabeça estoira

E a chuva pendura-se

No vento que de mim desistiu.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 14 de Abril de 2015

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Palavras de zarcão


Não saboreies as minhas tristes palavras de zarcão
que a manhã come enquanto dormes e finges sonhar
não permitas que entre o mar dentro de ti
e se alicerce aos teus desejos
não tenhas medo dos cortinados cinzentos
que a madrugada esconde nas pálpebras do vento
como quem morre
em sofrimento...

Não saboreies os meus lábios encaixotados
como pedaços de cacos e miudezas...
que galgaram o Oceano em direcção ao teu coração
não digas que a noite é uma mistura gasosa de iões e positrões...

Não
não saboreies os meus tentáculos de espuma
como se eu fosse uma cidade voando na preia-mar
não confundas o amor com a amizade
não
não confundas as palavras tontas com as palavras embriagadas
pelo cansaço
ou... ou pelo Inverno em desassossego,

Não saboreies as minhas tristes palavras de zarcão,

Inventa amanheceres de cartão
gaivotas de porcelana...
mas... não
não saboreies as milhas tristes palavras de zarcão.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 2 de Dezembro de 2014

sábado, 29 de novembro de 2014

Vento sofrido


A astronomia loucura do profeta
as paredes encarceradas do guerreiro desconhecido
à força e pela força
o cansaço espaço de luz nos confins rochedos da melancolia
a astronomia
embriagada pelos momentos sem pressa
numa carta de despedida
sem palavras
ou... ou remetente
uma aventura na escuridão da cama do sonambulismo
os cigarros absorvidos pela morte do fumo colorido...
e um caixão de espuma poisado nos alicerces da canção de revolta

cessem este destino
e o silêncio
da atmosfera encarnada em comestíveis soluços de desejo
a astronomia loucura do profeta
sentado em frente ao espelho da agonia
sem sentido
sem... sem melodia
antes de acordar o dia

o vento sofrido
o corpo mordido pelos meus dedos
o odor embalsamado do prazer
em finíssimos gemidos
e uivos...
e no entanto
não existem ruas na minha mão
casas
flores
nada
apenas... um rio adormecido numa fotografia
e um Domingo desorganizado e despido...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 29 de Novembro de 2014

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O vampiro


O vampiro ensanguentado
é filho de um quadrado,
à noite, coitado, adormece empoleirado no cansaço,
e pela madrugada, acorda vestido de roseira,
nunca conheceu a mãe,
apenas existe uma fotografia pendurada no espelho do amanhecer,
e ao longe, e ao longe uma fogueira...
e no centro da fogueira... palavras que ele recusa ler,
é destemido, e é solitário,
o vampiro ensanguentado desiste de observar os plátanos
e os anzóis de papel, senta-se junto ao rio...
e sonha com os barcos de vidro,

apanha com a mão os pedacinhos mais frágeis do vento,
sorri, sorri porque acredita no luar,
o vampiro... ensanguentado...
é filho de um quadrado,
e detesta as tempestades de amar,

não sei, não sei se ele vai ler estas palavras...

terá de apagar a fogueira,
ir ao seu centro...
e das cinzas,
ressuscitar os corações de sofrimento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 6 de Outubro de 2014

sábado, 23 de agosto de 2014

Bufunfa...


Procurava nas penteadas espigas de milho,
o sabor amargo de amar,
deitava-me sobre o chão frio do granito ensanguentado da eira,
pincelava o luar de madrugada,
e procurava...
adormecia sem o perceber,
porquê?
e se era aquele o momento de o fazer!
o sino ouvia-se ao longe,
o horário deixou de fazer sentido,
tal como o calendário,
procurava... e nunca as encontrava...

As chaves do espigueiro telintavam numa algibeira furada,
que servia de esconderijo a um corpo emagrecido,
cansado,
e ferido...

Havia lágrimas nos olhos das frestas do espigueiro,
a madeira envelhecida... rangia... parecia um homem desiludido com a vida,
acordavam-me para o jantar,
e fazia de conta que não ouvia...
nem sentia...
o vento soprar,
e eu procurava... e ele em pequenos círculos... me abraçava,
acreditava que das pálpebras dos pinheiros fugiam as estrelas em papel,
acreditava que à resina regressavam as plumas fluorescentes das meninas de cartão...
e nunca vi o mar acorrentado ao granito ensanguentado da eira,
nem os barcos, nem os marinheiros com odor a sexo,
e no entanto... havia uma mulata que dançava na eira só para mim,

O zinco da sanzala gritava,
e um menino em calções chorava grãos de pólen,
não havia abelhas para me consolarem...
nem... nem mangueiras sombreadas nas mãos dos mabecos enfurecidos com o meu sorriso,

Bufunfa...
o kimbundu poético da paixão dos pássaros,
o voo silencioso dos dentes de marfim sobre a mesa da sala de jantar,
uma ténue luz que iluminava o capim que jazia nas bermas da estrada,
caminhava, caminhava... e não tocava no granito ensanguentado da eira,
brincava com os papagaios de papel inventados nos seios de um coqueiro,
cintilavam em mim as gazelas, os elefantes... e ao meu lados os entristecidos marinheiros...
e procurava...
adormecia sem o perceber,
porquê?
e se era aquele o momento de o fazer!
Levantar-me do chão frio do granito ensanguentado da eira.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 23 de Agosto de 2014

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Dois corpos prisioneiros no espaço


O amor,
movimento circular uniformemente acelerado,
dois corpos prisioneiros no espaço,
três pontos os absorve,
o desejo,
o beijo...
e o abraço,
o amor,
o rio que corre para o mar...
e não mais vai regressar,
o silêncio impregnado nos lábios da madrugada,
o amor,

O amor desgovernado,
sem cais para aportar...
o amor de amar...
o amor, o amor submerso num triste olhar,

Entrelaçadas mãos,
numa cama deitadas,
o amor quando de um espelho ressaltam os pigmentos do amanhecer,
a janela encurralada na floresta,
o amor,
o amor verdadeiro, o amor... o amor sem se ver,

(o amor,
movimento circular uniformemente acelerado,
dois corpos prisioneiros no espaço,
três pontos os absorve,
o desejo,
o beijo...
e o abraço,
o amor)

O amor vestido de saudade,
o amor pintado numa parede invisível, o amor... o amor sem tempo para pensar,
as estrelas, o luar, o amor... o amor das palavras quando um túnel de vento se esquece de acordar,
o amor,
duas mãos entrelaçadas,
milhares de dedos encostados à tua pele bronzeada,
o amor, o amor de uma caravela,
correndo, correndo... correndo no pulso de uma sanzala...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 18 de Julho de 2014

domingo, 11 de maio de 2014

sonhos da tempestade


mergulho nos sonhos da tempestade,
depois, depois adormeço na espuma invisível do vento,
pergunto-me se existem cabelos de porcelana no teu sorriso,
dizem-me... dizem-me que o teu sorriso não me pertence,
há um exíguo cansaço no meu peito,
uma corrente de aço que me suspende ao Luar,
um constante fluxo de iões voando nas asas da gaivota madrugada,
mergulho em ti, mergulho nas tuas mãos de rosa ensonada,
mergulho no amanhecer,
sem o saber,
como um inocente corpo abandonado nas sombras da cidade,
como um esqueleto sem vontade de amar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 11 de Maio de 2014

domingo, 23 de março de 2014

Vidas anónimas com sabor a naftalina

foto de: A&M ART and Photos

Sem o vento ardem as minhas asas,
evaporam-se todos os meus sonhos de neblina adormecida,
hoje, hoje pareço um transatlântico enferrujado, velho e cansado,
sem coração, eu, eu a pedra do muro em desgosto,
subo as escadas do silêncio... e, e sei que não lhes pertenço,
ausento-me, escondo-me, invento vidas anónimas com sabor a naftalina,
sem o vento,
ardem...
ardem as minhas mãos coloridas,
e de dentro de ti vêm a mim as palavras mortas, as palavras não minhas,
ardem e sinto,
sinto que deixei de caminhar nos teus olhos envergonhados...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 23 de Março de 2014

domingo, 16 de março de 2014

Testemunhas de uma fogueira em evaporação

foto de: A&M ART and Photos

Não sei quem és, como te vestes e o que pronuncias, não sei se és um pássaro em decomposição, uma árvore solitária que habita os jardins da cidade adormecida, tão pouco se és a madrugada, o Domingo quase a terminar, a noite a nascer, não, não sei o que és e quem tu és,
Como posso eu sorrir às tuas lágrimas? Percebes-me agora? O Domingo em término, a noite quase noite, a crescer e a erguer-se na tua boca de cristal, e quase não oiço as tuas palavras de porcelana, e quase, a janela da paixão a encerrar-se eternamente, para sempre e só..., hoje tu, amanhã eu, depois as pedras e os canteiros, as flores, os pinheiros de uma infância entre o mar e a montanha, sinto-me prensado, sinto-me um muro argamassado pela tristeza,
Quem sou?
Não sei, nunca soube, talvez... talvez no Domingo que vem, talvez amanhã, talvez no descanso das roldanas, uma corda em direcção ao sexto andar, subo as escadas, sinto-me cansado, os cigarros, a idade, a saudade, novamente os cigarros,
Oiço-os como testemunhas de uma fogueira em evaporação,
Cigarros vadios, como-os vivos, oiço-te e não sei
Quem sou?
Sim, e tu, quem és, o que fazes aqui, aqui dentro de mim?
Uma esplanada vazia, e regressa o dia da Poesia e eu sem poemas para ti... porque, porque não sei quem és, o que fazes dentro de mim, deixas-me cansado, ausente, embriagado, e sei que algures nessa cidade vives e choras, e recordas meia dúzia de cartas, poucas palavras,
E eu, eu sem poemas para ti,
Quem sou?
O vento, sim o vento, pensas que eu sou o vento? Sim, penso, imagino-te sentado na esplanada vazia, apenas uma mesa e quatro cadeiras, conversas com duas ou três sombras, bebes uma bebida invisível, pegas num livro, voltas a poisa-lo sobre a mesa, depois vais à gabardina e puxas de um pequeno caderno, acendes o cigarro, desorientadamente...
Quem sou?
O cigarro acende-se a ele próprio, ganha vida como as tuas palavras, sofre e chora, e acredita na tristeza como acredita que tu, sim tu
O vento!
Sim eu, percebo que me imagines como o vento quando se alicerça na minha pele, sim como o vento, quando rodopia em redor dos meus seios, e tu, e tu
Eu?
Oiço a voz, oiço-os a arder na escuridão de um final de Domingo, amanhã, amanhã talvez..., amanhã talvez “uma esplanada vazia, e regressa o dia da Poesia e eu sem poemas para ti... porque, porque não sei quem és, o que fazes dentro de mim, deixas-me cansado, ausente, embriagado, e sei que algures nessa cidade vives e choras, e recordas meia dúzia de cartas, poucas palavras”, e eu, e... eu,
Só, eu e uma corda em direcção ao sexto andar...
E eu, eu sem poemas para ti,
Quem sou?

(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 16 de Março de 2014

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Gaguez tempestuosa

foto de: A&M ART and Photos

Engasgo-me nas palavras tuas das comestíveis ausentes marés do Inferno,
oiço o telintar da janela em fervor, depois, as pétalas cinzentas desgovernam o leme da tempestade,
a saudade existe?
pergunto-te se me ouves quando adormeço nos teus finos ombros de colmo... e sinto na tua pele o desejo indesejado do sofrimento,
o cansaço da tua voz,
o vento da nuvem de gelatina que sobrevoa a tua triste cama,
oiço...
finjo pertencer aos cadáveres invisíveis como esqueletos fotográficos em fina prata,
o livro de ti como eu, ambos esquecidos no oitavo andar das árvores de copa gaguez...
engasgo-me nas palavras, fumo os cigarros embebidos em alfinetes de pura lã virgem,
e...
e dizem-me que do outro lado da rua, uma criança brinca, passeia... pega na rosa dos teus lábios,
sente-se o beijo,
sente-se a tua mão pasmada sobre o silêncio da alvorada,
e do nu teu corpo,
e do... e do nu teu corpo alguns ossos desistem de sonhar...
e tu,
tu acreditas na saudade, no Inverno, e tu... acreditas nas sandálias de corda... e tu...
… e tu dizes-me...
- Amanhã, num pedaço de papel, deixo-te a minha dor.



@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 30 de Janeiro de 2014

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Palavras de papel

foto de: A&M ART and Photos

A noite destrói todas as palavras de papel que o invisível destino escreve
a noite inventa-se na algibeira do clandestino miúdo com suspensórios de vidro
o miúdo estupidamente apaixonado por uma uma gaivota...
… chora
transpira como lâminas de aço quando a lareira acesa derrete o silêncio
há uma pauta sobre a mesa da sala de jantar
na pauta brincam notas musicais órfãs
crianças das ruas sem nome não vivem... mas também não choram
crianças com mastros ao peito... vivem navegam choram e morrem...
e bandeiras de cetim sobre os cabelos cinzentos da tristeza dizem-lhes o que é a saudade
a noite embriaga-se como pedaços de xisto descendo os socalcos com as penumbras das sonâmbulas cambotas correndo e as bielas... as bielas nas mãos do miúdo estupidamente apaixonado...
… que chora... elas imóveis elas silabadas elas... elas são as bielas dos covis iluminados pela loucura neblina que o desejo procura no corpo nu sem nome as bielas fodem...
Alimentam-se dos sombreados tectos de verniz que às esplanadas de areia acordam como tecidos mortos e envenenados e doirados e... e a noite em papel dissolve-se na garganta do condenado
hoje há moelas
moedas de prata
lágrimas de crocodilo
e dentes de marfim
A janela do muro envidraçado abre-se e a noite começa a comer o miúdo depois de destruir todas as palavras de papel que o invisível destino escreveu
e o pobrezinho menino prostitui-se no cais de embarque dos petroleiros ofegantes
a gravata esgana o pescoço dos homens de mini-saia
os sapatos de três andares... adormecem noite adentro num sótão abandonado
a gaivota do amor
não dorme
não vive
chora
chora... chora... parvo... porque choras tu?
e era capaz de acreditar nos objectos negros das portas com triângulos desenhados...
com... com coxas cosidas pelas mãos da Avelã costureira...
Peneirenta
rafeira
e ordinária...
a noite é uma puta desgraçada
e feia...
a noite fode-nos como cinzeiros em prata nas mãos de um drogado...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 23 de Dezembro de 2013

domingo, 17 de novembro de 2013

o corpo malfadado

foto de: A&M ART and Photos

Inventei o cansaço
o tédio
e a dor
inventei os palhaços em aço
o remédio
e o amor
fui amado
desamado
e dissecado por um doutor
inventei as amendoeiras em flor
os guindastes em movimento
e o vento

(fui filho
sou filho
e continuarei a ser... filho)

inventei o cansaço
o tédio
e a dor
tive palavras reescritas em muros em xisto
sou pai dos profetas falhados
inventei o livro da noite com holofotes embriagados
fui drogado
fui homem deambulando nos silêncios das montanhas amoreiras
fui desempregado
cristão
e baptizado
inventei-me homem e sou um livro sem coração

inventei-me sabendo que tu me inventavas
inventei a palavras que tu me odiavas
inventei o cansaço
o abraço
e os lábios com sabor a mel
tive pássaros com asas em papel
inventei-me dentro de uma nuvem imaginando que me abraçavas
tive tudo
tive tudo e não tenho nada
fui infeliz
feliz
cadeira de esplanada

(fui filho
sou filho
e continuarei a ser... filho)


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 17 de Novembro de 2013

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

prata cinzenta

foto de: A&M ART and Photos

réstias de prata cinzenta
como sobrevoam os teus seios de xisto pergaminho
descem socalcos até encontrarem os moinhos do desejo
e desenham línguas de vento na boca em pincéis de beijo
réstias de prata cinzenta
nas mãos de um menino alimentado pelo silêncio medo
há palavras que acordam cedo
e constroem as manhãs do triste vizinho


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 11 de Novembro de 2013

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Um corpo submerso nas sílabas do desejo

foto de: A&M ART and Photos

Um corpo estaticamente só, um corpo submerso nas sílabas do desejo, um corpo entre montículos de saudade e rochas de insónia, uma luz alimenta este corpo, um espelho alimenta a luz que alimenta este corpo, um corpo... não é um corpo, um corpo vazio, solidificado, um corpo voando sobre a montanha da solidão,
Vens à janela, abres-te e sentes o vento em ti,
Um corpo inocente coberto pela espuma volátil do incenso, um corpo de água, só, um corpo cintilante, um corpo
Ausente?
Dorido, que não sente o corpo em corpo das flores...
Um corpo estaticamente só, um corpo submerso nas sílabas do desejo, um corpo entre montículos de saudade e rochas de insónia, um corpo poisado sobre o peito de um homem...
A imagem emagrece o corpo, a luz que alimenta este corpo, é alimentada por um outro corpo,
E o espelho depois de ser corpo.
Imagem, flutua sobre as vértebras do cansaço, e és transparente como as noites vestidas de negro, e és desejada como os pilares de areia das madrugadas em delírio, despes-te e olhas-te no espelho
(alimento a luz que alimenta o corpo)
O teu,
Quero ser um pedaço de montanha, ou um veleiro agasalhado de lareira acesa, caminhar junto a um rio com dentes em marfim, um corpo belo, desejável, um corpo em decomposição, a parte física sobre a mesa-de-cabeceira e a parte invisível dentro de mim, dentro da trovoada, das nuvens envergonhadas quando a luz ejacula sobre o abajur da tristeza e eu
O teu corpo é teu?
(alimentado pela luz que alimenta o corpo)
Desculpem... morri,
Um corpo de água, só, um corpo cintilante, um corpo
Ausente?
Quero ser o vestíbulo que habita no teu quarto secreto, a cabeça onde poisa o ombro, também ele... secreto, todo o corpo teu não existe, nunca apareceu à janela do meu castelo, o teu corpo é um embuste, falsificado, o ilustre Doutor das clarabóias domésticas que a tua mão abraça,
Quero o ser como são as palavras antes de escritas, aquelas que são pensadas e que por
Vergonha?
Pudor?
Um corpo belo esconde-se no interior de um cobertor, invento marés e mesmo assim
Não o consigo, não sou capaz que te dispas e fiques só corpo, só
Pudor?
Vergonha das palavras que tenho medo de escrever, vergonha dos beijos que tenho medo de desenhar na parede dos teus seios, o teu corpo, meandro sabático das sandálias em couro, os calções parecem perdizes brincando nos patamares no coração do Douro,
Vamos jantar?
Comer o teu corpo, ele, apenas ele... dentro do prato cerâmico, outrora em alumínio, hoje mendigo, o espelho que alimenta a luz ou a luz que alimenta o teu corpo, e uma corda feliz saltita nas mãos de uma criança...

(ficção – não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Outubro de 2013

domingo, 25 de agosto de 2013

Nunca mais o branco fumo dele nos meus lábios

foto de: A&M ART and Photos

Porquê?
Os navios em fúria de apitos, amontoavam-se à porta de casa, lá dentro, eu e ele, tentávamos esconder as amarras dentro da gaveta da cómoda, eles cá fora, gritavam
Porquê?
Marinheiros famintos, procuravam qualquer objecto que servisse para derrubar a frágil porta, escondemos-nos junto ao corredor que dava acesso à casa de banho, o peitoril fumegava, alguém já nos tinha lançado algo de combustível, algo de destruidor, abracei-me a ele, e com toda a minha força
Porquê?
Fiquei não sei quantas noites pensando que nunca mais terminaria a sangrenta guerra de palavras da cidade dos desejos, multipliquei abraços, dividi beijos, e hoje
Porquê?
Hoje pareço um íngreme cavalo de areia correndo sobre o mar,
E com toda a minha força apertei-o como quem aperta o único filho, e pela madrugada, não sei qual delas, ele partiu, consegui desembaraçar-se dos meus abraços, e
Nunca mais o branco fumo dele nos meus lábios,
Nunca mais
Porquê?
O silêncio pergaminho das suas mãos no meu rosto,
Nunca mais a voz desajeitada dele no espelho da casa de banho, irritava-me
Vens jantar logo, meu querido?
Irritava-me
Três torradas chegam, meu querido?
Assim não, assim sentia dentro de mim uma escada rolante em direcção ao poço profundo da tristeza, irritava-me
Querido
Sim, diz?
Querido, logo chegas cedo a casa?
E apetecia-me gritar, não regressar, nunca, irritava-me
Sim, diz?
Que coisa... a tua...
Os navios em fúria de apitos, amontoavam-se à porta de casa, lá dentro, eu e ele, tentávamos esconder as amarras dentro da gaveta da cómoda, eles cá fora, gritavam
Porquê?
Eles cá fora pareciam um exército de mendigos, procuram-nos como quem procura o vento antes de levantar âncora, o veleiro poisava-se sobre um banco de areia, rodopiava em pequenos círculos... e dali não zarpava nunca,
Porquê?
Os marinheiros famintos, o azedume dos versos que o poeta louco tinha deixado sobre a mesa-de-cabeceira no quarto da amante voavam porque o vento que antes se fazia sentir no corredor começou aos poucos a avançar em direcção ao quarto, a amante tinha desaparecido, ele e o amante, também desaparecidos, apenas os famintos marinheiros enrolados em poemas de “merda” que o louco poeta ante de suicidar-se tinha esquecido, tal como a janela aberta
Porquê? Esta chuva de papeis com pequenas palavras...
Os marinheiros
Porquê?
O poeta louco
Onde está ele?
A amante do poeta louco
Irritava-se com as palavras do seu amado, algo de destruidor, abracei-me a ele, e com toda a minha força
Porquê?
Porque hoje é Domingo, porque hoje há quitetas e cerveja Cuca...
Porquê?
Porque uivam os navios quando estão em sossego?


(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 25 de Agosto de 2013

sábado, 15 de junho de 2013

Suspensos do amanhecer

foto: A&M ART and Photos

Tinhas-me inventado com palavras de vento
abríamos as janelas da imensidão suspensa no amanhecer
sofrendo-nos como às portas em versos poeirentos
velho cansado sofrimento
em ti me recusava escrever
sabendo eu que padeces perdida no centro dos inesquecíveis momentos,

Havíamos concedido imagens dos troncos sangrentos
pedacinhos em madeira adormecida
tínhamos vontades sofridas
como nas gargantas sílabas dos textos em divãs de areia
sobre uma paisagem imaginada por loucas rochas escaldantes
esmigalhados tormentos vivendo-se entre cidades e campos,

Tinhas-me inventado... de vento
como sandálias de cortiça pedestres em caminhos sem saída
sonhos presos aos tectos circunflexos por medida
e abríamos os socalcos da montanha mórbida em línguas gasosas do desejo alento
assento sobre a palavra derretida
havíamos inventado o tempo e os cardumes assassinos perdidamente arrolados...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

domingo, 19 de maio de 2013

A montanha da paixão

foto: A&M ART and Photos

Todas as palavras que escrevo
são túneis de vento
correndo sobre o mar
e de Setembro
até Novembro
imagino-as caminhando sobre o salgado amar,

Todas as estrelas palavras que o céu absorve
comem-se-lhes sílabas e tristes vogais
sonhos
loiça estampada com os teus lábios
e línguas matinais escondidas nos umbrais
portas de entrada... ou apenas... nada,

Todas... escrevo
sobre o teu peito camuflado nos carris da tempestade
a saudade
das coisas que transformam em corpos de olhar
olhar amar e... escrever
são túneis de vento... descendo a montanha da paixão.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 26 de março de 2013

A banheira insónia da paixão

A&M ART and Photos

Imaginava-te uma sombra de luz rodeada por leões e cavalos e abelhas, imaginava-te selvagem como as acácias do madrugar vento da cidade pintada de amarelo, imaginava-te hirta, morta, abandonada, numa tela de prata com fios invisíveis de chocolate e café depois do jantar, imaginava-te sentada numa pedra com cinco esquinas, três andares, e uma cave
Uma casa de banho e uma banheira, uma janela para o quintal da vizinha, velha e rabugenta, imaginava-te sentada na banheira a confidenciar segredos às pétalas de água em gotas minúsculas, e lá fora habitavam as grandes nuvens de tédio, brincavas com a espessura do sonho, e fechavas a mão no meu peito de xisto,
Imaginava-te no espelho da cave abraçada ao piaçaba, e teias de aranha, e o soalho em decomposição, imaginava-te o putrefacto esqueleto das flores apaixonadas pelos olhos do leão, e com sorrisos construídos em mentiras e finais de tarde imaginários, brincavas com o cavalo e com as abelhas, como o fazias em criança, e como o fazíamos enquanto amantes por correspondência, um curso suspenso no tecto da noite corpuscular, uma menina de celofane embrulhada em relógios a pilhas, e tudo quando depositávamos os pertences mais secretos num armário incorrecto, em pedaços de lixo, sem porta, como as lareiras de trás-os-montes
O frio silêncio em meus braços,
Imaginavas-me sentada na banheira, olhava a torneira e sentia o vazio da água a correr, imaginava-te como um rio, entre pedras e curvas, até que ao longe, da janela, sabia que encontravas sempre, que encontravas o mar, mas hoje, hoje percebo que perdeste-te nas imagens brancas de uma cidade inexistente, uma cidade sem casas, uma cidade com fome, sem amor, e eu, parva, imaginava-te a subires os quase cinquenta degraus, ouvia-te o pulsar do coração, ouvia-te a voz pregada ao corrimão e quando batiam à porta
Ele está?
Mentia-lhes e dizia-lhes que deixei de ver-te como quem abandona um álbum de fotografia, com histórias, com corações e nas traseiras dela inscrito “EU + TU”, mentia-lhes e dizia-lhes que a última vez que estive contigo foi nos rochedos junto ao cais dos homens apaixonados, onde sempre que vem a trovoada de incenso, uma boca procura docemente os inocentes poemas da menina que passa as horas sentada na banheira a brincar com a água, a imaginar
A praia, o mar em decomposição, as janelas do ciúme às portas da ruína, os automóveis procurando alimentarem-se de saliva, beijos e outros pequenos organismos, sempre, vivos,
A imaginar do longínquo campo de trigo, um corpo, nu, deitado entre a terra e as pedras ao redor da eira, o canastro dorme com as espigas de milhos colhidas no ano anterior, às vezes, desaparecia e escondia-me lá dentro, deitava-me em cima do milho e imaginava-te
Nos teus braços, lábios,
Imaginava-te sobre mim como as pequenas sombras de luz que as fendas das ripas construíam nas doiradas espigas, pedia que começasse a chover, e o sol fazia de mim um boneco cansado, um boneco de palha seca, e um chapéu com três ou quatro buracos, estava de pé e encontrava verticalmente com a ajuda de um cabo da piaçaba,
Na cave, entre teias de aranha, imaginava-te mergulhada no círculo trigonométrico e traçava ângulos no teu peito, calculava a tangente três meios de pi, e entre os teus seios, sabia que dois triângulos rectângulos brincavam como duas mãos de milho, seco, dentro do espigueiro, com ranhuras de luz,
Nos teus braços, lábios, a carlinga pesadíssima poisada nas pedras abandonadas das tardes encobertas, pedíamos sol, e tínhamos chuva, pedíamos beijos, e infelizmente, nunca tínhamos beijos, nem água, nem a banheira para ela brincar, imaginava-lhe uma banheira e imaginava-a sentada à beirinha como se estivesse dentro de um barco a remos a olhar distraidamente os finos papeis de esperança onde escrevíamos recordações com marisco, bebíamos cerveja e sonhávamos com papagaios de papel sobre o Céu, logo pela manhã, mesmo antes de acordarmos,
E acordávamos ressacados, dávamos conta que não tínhamos banheira, o pequeno barco a remos encontrava-se estacionado junto ao contentor do lixo e a janela da casa de banho, onde eu a imaginava sentada esperando pelo meu regresso, nunca
Existiu,
(tínhamos medo da solidão, comprávamos cigarros avulso e líamos os jornais da semana anterior, tínhamos alguns livros que íamos vender para comermos, e um dos teus cachimbos queria fugir, tentou cortar os pulsos com um isqueiro, não o conseguiu, não teve coragem para o fazer, e, mentia-lhes e dizia-lhes que deixei de ver-te como quem abandona um álbum de fotografia, com histórias, com corações e nas traseiras dela inscrito “EU + TU”, mentia-lhes e dizia-lhes que a última vez que estive contigo foi nos rochedos junto ao cais dos homens apaixonados, onde sempre que vem a trovoada de incenso, uma boca procura docemente os inocentes poemas da menina que passa as horas sentada na banheira a brincar com a água, a imaginar)
E imaginava-a, sem roupa, dentro da banheira com espuma de Primavera.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha