sábado, 18 de outubro de 2014

Morte inventada


A morte inventada pela dimensão do infinito,
a equação do desespero cansa-se dos meus braços,
alicerça-se na geada cinzenta dos hospícios sem janelas,
a morte cintila no tecto da solidão...
e o rio me come,
e o rio me leva... e não voltarei aos fios de nylon da cidade,
o livro de ti, arde,
e das lâmpadas do abismo... filamentos de sangue em construção,
o navio solitário escreve-se e silencia-se na montanha de uma fotografia,
há no teu olhar a neblina do pastor sem solução,
há nos teus lábios os secretos sonhos do perdão...
e não conseguirei alcançar as tuas pálpebras de anelar sombra com odor a cansaço...
morrerei como um pássaro,
a morte não sabe...
que os suspiros da hipnose madeira fantasma... flutua nas plumas de uma bailarina,
partirei,
partirei como um veleiro sem velas,
disfarçado de homem...
com uma gaivota no meu coração.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 18 de Outubro de 2014

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Enigma dos oceanos de cartão


O triste enigma dos oceanos de cartão,
o vulcão da saudade mergulhado numa áspera lâmina de solidão,
espera-se o regresso, e o viajante sem destino... nos aplausos do silêncio,
há um circo de esperança rodopiando sob o tecto de lona da insónia,
pergunto-me porque choram as árvores de papel,
percebermos que há no seu coração uma enxada de silício,
uma roda dentada em putrefacção, perdidamente... percebermos a sinfonia dos horários obscuros,
há um Deus com esqueleto de xisto...
e de socalco em socalco,
desassossegado... suspensas as mãos em corpos de espuma, grita comigo,
absorve-me como se eu fosse um travestido cansaço com dentes de marfim,
no telhado de uma camponesa com saliva nas pálpebras,
sei que há na cidade dos pequenos charcos de doirado sangue,
uma menina com duas rectas paralelas procurando o infinito,
e sinto,
o pulsar das laranjas rochedos abaixo,
alguém escreve nos meus braços os rancores de uma tarde inexistente,
uma carta secreta com desenhos abstractos... ainda permanece na minha algibeira,
existe nela um estranho perfume com odor a dor,
o viajante desalojado carrega os livros do sofrimento,
entra num bar, senta-se... senta-se à minha frente e dou-me conta que ele é apenas um espelho fusco, negro... alguém escolhido pelo comandante do navio das indolores pinturas.... diz que me ama,
não amo, não quero amar... e não desejo que me amem,
preciso de fugir desta sanzala com olhos de incenso,
deitar-me dentro do vulcão da saudade, sentindo nas minhas veias o palpitar dos azulejos pintados à mão,
tenho medo de ti quando entras no meu quarto e me perguntas pelos malmequeres,
e não tenho coragem de dizer-te que os perdi, destruí-os pensando que eram soníferos indefesos,
pensando que eram apenas sombras de água...
como tens passado, enigma dos oceanos de cartão?



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 17 de Outubro de 2014

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Canção suicida


Há na madrugada uma canção suicida,
alimenta-se de palavras,
respira insónia e transpira solidão...
há no teu olhar uma triste noite de viver,
que te embriaga como se fosses um marinheiro cansado de aportar,
como se fosses um esqueleto de morrer...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 17 de Outubro de 2014

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

A chuva vestida de branco


Odeio as poças de água
odeio os nenúfares e os sombreados vultos da noite
odeio a poesia
as palavras
e a felicidade...
ah... odeio a chuva vestida de branco,

odeio os acenos
e os enganos,

odeio...

odeio as sanzalas com telhados de vidro
as cidades sem transeuntes
nus
descalços
odeio as calçadas
e os cansaços,

odeio as pontes
e os beijos
odeio o silêncio e os cigarros de matar...

odeio... odeio o mar,

odeio as poças de água
odeio os nenúfares e os sombreados vultos da noite
odeio a poesia
e as espingardas de brincar
odeio... odeio a solidão e as lareiras invisíveis
odeio as cabanas inseminadas nos seios da montanha,

tudo odeio...
até que das nuvens inventadas pela madrugada
desçam a mim os sorrisos do milagre!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 15 de Outubro de 2014

terça-feira, 14 de outubro de 2014

As palavras de matar


São estes os teus medos,
são estas as tuas lágrimas envenenadas pelo silêncio,
são eles que te protegem,
são eles que te enforcam na madrugada,
oiço o sussurrar da alvorada,
são estes os teus desejos impossíveis de realizar,
são estas as pálpebras do teu olhar,
são as tuas veias o cansaço de amar,
viver...
e sonhar,
são estas as palavras de matar,
vejo o ressuscitar de um cigarro laminado pelo fogo...
e há uma cabana com versos de enganar,
e há um rio com vontade de partir...
zarpar,
são elas as rodas dentadas do sofrer,
que te movimentam,
são elas,
são eles os lânguidos amanheceres que te enfrentam...
e baixinho,
te dizem... são horas de adormecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 14 de Outubro de 2014

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

O flamejante sorriso do abismo


Porque dormem no meu olhar
os traços coloridos de silêncio?

Porque existe um veleiro desgovernado
no Oceano meu sofrimento,
se o vento,
se o vento deixou de correr junto às palmeiras...

Porque vagueiam na minha mão
as palavras nocturnas da dor,
quando o livro poisado na minha mesa-de-cabeceira...
ardeu,
morreu,
e hoje é apenas cinza como os traços coloridos de silêncio...

Porque dormem no meu olhar
os traços coloridos de silêncio?

Se nas tuas pálpebras crescem andorinhas sem asas!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 13 de Outubro de 2014

sábado, 11 de outubro de 2014

A arte de matar


Estas telas assassinas
suspensas nas pálpebras nocturnas do sofrimento
um grito que voa sobre os telhados de vidro
uma voz rouca
alicerçada às cores incendiadas do teu olhar
um corpo que range
e sofre...
e espera desesperadamente...
que regresse a “arte de matar”
sem fôlego
rompes a geada do amanhecer
sobes as escadas íngremes do silêncio,

E cais... e cais sobre a calçada do Adeus!

Cinco pedras de xisto
poisam na tua algibeira de sonífero falsificado
acordas
e o cansaço saltita nos teus ombros
como uma corda de nylon que aprisiona o navio da dor
sem marinheiros, sem mulheres vestidas de paisagem,

Estas telas assassinas
que na tua mão circulam desejando enfrentar o medo
as palavras que tens nas paredes do teu quarto...
de nada te servem
são palavras
são versos
são telas assassinas
que a “arte de matar” inventou...
das tuas janelas vêem-se os malmequeres adormecidos
como cadeiras de vime esquecidas no jardim da solidão
um lago cumprimenta-te... e tu, e tu, e tu ficas feliz
como se fosses um pássaro com asas de papel doirado...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 11 de Outubro de 2014

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

A cidade do engano


Este sismo que avassala o teu corpo,
esta espera... infinita,
esta cidade recheada de cansaços
e sombras prateadas,
esta tempestade sem nome
que atravessa as tuas mãos
e desagua no rio das lágrimas
como um pedaço de silêncio em tuas mágoas,

Este sismo travestido
que dorme nos teus cabelos...

Este sismo que avassala o teu corpo
e te engole como uma pedra mortífera,
finges que não,
finges... finges como o poeta,
dizes-me que está tudo bem,
e à tua volta,
uma cidade em revolta
uma cidade que me engana...

E te mata com espingardas de tristeza!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 10 de Outubro de 2014

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Poema sem coração


A água com que te embrulhas
pertence ao silêncio,
os meus braços que rejeitas
pertencem aos rochedos amorfos,
a noite... a ninguém pertence...
a noite é uma equação sem solução,
como a água com que te embrulhas,
a noite é um poema sem coração.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 9 de Outubro de 2014

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Edifício envidraçado


Este edifício envidraçado
que não cessa de chorar
esta noite húmida vestida de mulher
que não se cansa de gritar...
este cansaço teu
esta rua sem ninguém
este espaço exíguo
que ofusca o teu olhar...
esta cidade recheada de mendigos
como eu
assim...
procurando abrigos,
este teu corpo engraçado
que ilumina a sanzala do adeus
este teu desejo premeditado
que se enforca na terceira árvore do jardim,
este edifício doente
triste
e com odor a solidão,
esta cidade que me sufoca
e arde
no meu peito desassossegado...
sem me dizer... sem me dizer que hoje não há luar,
falta-me o lugar
e a estrada para caminhar,
e quando encontrar o rochedo da dor...
parar
e me sentar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 8 de Outubro de 2014

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Hoje


Hoje,
hoje um dia perfeitamente de “merda”,

tudo parece desabar sobre os meus ombros,
chove,
hoje,
hoje estás triste,
hoje,
hoje estás ausente...

hoje,
hoje percebi que em breve partirás,
e hoje...
eu, e hoje, eu sem paciência para as palavras,
odeio... as palavras,
odeio a arte de escrever,

odeio a literatura,
odeio a pintura,

hoje,

hoje...

hoje odeio a noite,
e os esconderijos nocturnos da solidão,
hoje,
hoje um dia sem memória,
hoje um dia sem história,
hoje... hoje sinto-me um prisioneiro das sombras do infinito...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 7 de Outubro de 2014

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O vampiro


O vampiro ensanguentado
é filho de um quadrado,
à noite, coitado, adormece empoleirado no cansaço,
e pela madrugada, acorda vestido de roseira,
nunca conheceu a mãe,
apenas existe uma fotografia pendurada no espelho do amanhecer,
e ao longe, e ao longe uma fogueira...
e no centro da fogueira... palavras que ele recusa ler,
é destemido, e é solitário,
o vampiro ensanguentado desiste de observar os plátanos
e os anzóis de papel, senta-se junto ao rio...
e sonha com os barcos de vidro,

apanha com a mão os pedacinhos mais frágeis do vento,
sorri, sorri porque acredita no luar,
o vampiro... ensanguentado...
é filho de um quadrado,
e detesta as tempestades de amar,

não sei, não sei se ele vai ler estas palavras...

terá de apagar a fogueira,
ir ao seu centro...
e das cinzas,
ressuscitar os corações de sofrimento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 6 de Outubro de 2014

domingo, 5 de outubro de 2014

Rio sonâmbulo


Aqui, pareço um tresloucado corpo volátil,
um rochedo impregnado de saudade,
aqui, sou uma montanha sem árvores,
uma ribeira sem poesia,
aqui, pareço uma equação trigonométrica sem solução,
um círculo,
o quadro... semelhante a uma prisão,
aqui, todos os pássaros são loucos,
aqui, todas as mulheres são em papel crepe,
e voam,
e partem...
aqui,
aqui, há um rio sonâmbulo que apelidaram de “DOR”,
e não há barcos com olhos verdes...
porque aqui, aqui, eu pareço um tresloucado corpo volátil,
que espera o regresso das mãos trémulas do teu sofrimento...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Outubro de 2014

sábado, 4 de outubro de 2014

Montanha do adeus


Em meu redor os grãos de areia do deserto,
as serpentes de vidro que trepam as árvores do meu quintal,
ao longe sei que existe uma praia,
morta,
triste,
embrulhada nos lençóis do sofrimento,
minto,
finjo sorrisos quando apenas são desenhos abstractos,
palavras amorfas e escritas por um louco,
e no meu corpo suspendem-se os tentáculos da dor,
um carrossel de chocolate que assombra os lábios do mendigo,
não sei porque existo,
porque minto,
porque vivo... porque me escondo...
e no meu corpo... a montanha do adeus em desespero.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 4 de Outubro de 2014

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Saudade


Prometeste-me uma jangada de saudade
desenhaste em mim uma rua sem saída
de uma qualquer cidade,

naquela madrugada de solidão
parti...
voei em direcção ao infinito
naquela madrugada sofri
gritei
não
não chorei
porque a jangada prometida
se afundou nas tuas mãos
trémulas
mergulhadas na dor
suspensas no transatlântico de cartão,

havia palavras na tua face esbranquiçada
palavras que de nada me servem
porque... porque o sofrimento é uma calçada
porque o sofrimento é um rio sem nome,

prometeste-me uma jangada de saudade...

e o teu corpo parece desfazer-se em pequenas migalhas de suor
há uma livro para ler...
há um livro para escrever,

prometeste-me uma jangada de saudade...
e apenas tenho o teu rosto envelhecido
distante
desorientado...
como eu
perdidos na sanzala do Adeus!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 3 de Outubro de 2014

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Estas palavras


Estes versos não são teus,
não existem palavras para saciares os teus desejos,
anseios... e medos,

Não há mar sem rochedos,
nem barcos sem marinheiros...
estas palavras são beijos,

São torpedos...
veneno esponjoso que alimenta a garganta da dor,
estas palavras... estas palavras não são as palavras de amor!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 2 de Outubro de 2014

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Piano amar...


Dos espinhos melancólicos da insónia,
oiço-os,
como se eles tivessem um corpo,
ou... ou vestissem-se de palavras ainda não escritas,
entranhadas no papel amarrotado da madrugada,
oiço-os...
os sons melódicos do piano amar...
domesticado,
livre...
dos espinhos melancólicos, as ditas canções anónimas com sorriso de alecrim,
o cansado beijo suspenso nos lábios da pianista...
livre... até que desaparece no seio das linhas paralelas da solidão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 1 de Outubro de 2014

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Entardecer


Movediças lajes de areia
que transportam o meu corpo até ao entardecer
este feitiço não cessa de arder
e este cansaço parece desgovernado
como um barco
ou um coração apaixonado...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 30 de Setembro de 2014

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Castelo das areias brancas


Dormíamos sobre os limbos nocturnos da paixão,
existia entre nós uma canção melódica,
cansada de descer a calçada,
havia nos teus olhos a melancolia do amanhecer,
tal como os pingentes que o orvalho constrói nos teus seios...
dormíamos,
sem sabermos que ainda podíamos voar em direcção ao infinito castelo das areias brancas,
não sabias que eu era um transparente boneco de incenso,
dentro de uma caixinha em madeira,
só, só como as palavras embainhadas na espingarda da loucura,
dormíamos, dormíamos e construíamos papagaios em papel...
e da rua absorvíamos os esqueletos magoados do amor.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 29 de Setembro de 2014

domingo, 28 de setembro de 2014

Amanhecer amar


Se eu voasse
não atravessava o Oceano para em ti poisar...

se eu voasse
não me levantava deste banco de silêncio
com mãos de pérola adormecida
não gritava
não... não chorava
porque as palavras são searas de insónia sobre um papel queimado,

um punhado de trigo
voando
sonhando...
na planície dos corpos embalsamados,

se eu voasse
não atravessava o Oceano para em ti poisar...

não escrevia
não lia...
não
não acreditava no amanhecer amar!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 28 de Setembro de 2014