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domingo, 19 de agosto de 2018

Camarada das noites perdidas…


O que eu estranho na tua voz,

Os musseques de Luanda, ao longe, a praia e o mar…

Sinto o velho capim embrulhado nos meus braços,

Assobios,

Abraços,

Sinto no meu corpo o sorriso dos mabecos, enfurecidos pela tempestade,

Chove, a água alicerça-se no meu peito,

Estou morto, nesta terra sem fim,

Dilacerada como um cancro de chumbo poisado no meu sorriso…

A morte é bela,

E passeia-se pela minhas mãos.

 

Ouves-me? Camarada das noites perdidas…

 

O que eu estranho na tua voz,

O silêncio das flores,

As raízes do cansaço em frente ao espelho, sinto e vejo… o susto,

O medo de adormecer no teu colo,

Meu cadáver de lata,

Recheado de lâmpadas encarnadas…

 

Ouves-me? Camarada das noites perdidas…

 

A jangada laminada,

O sorriso de uma pomba, correndo a Calçada,

E no final da tarde,

Antes da alvorada,

Uma pedra se parte, arde na minha mão, como uma faca de sombra…

Cravada no corpo.

 

Assobios,

Abraços,

 

Enquanto eu o que estranho na tua voz,

São as sílabas do desespero.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 19/08/2018

sábado, 29 de novembro de 2014

Em desespero


A arte em desespero
que cresce no meu peito de vidro
há nas minhas palavras sorrisos de vento
e...
e segredos de nada
a arte em desespero que esta terra alimenta
o sofrimento da alma quando o livro se esquece de acordar
e cresce
no meu peito de vidro
a insónia do mar
e a tempestade de viver...
inventando espelhos inanimados

que só o corpo consegue fazer

a arte em desespero
na cidade dos enlatados lábios
o amor quando aparece...
e sem o perceber
em desespero
as minhas mãos evaporam-se na neblina assassina
não o quero
prefiro o invisível sapateado das amendoeiras em flor
a arte
em desespero...
a arte em desassossego
que o desespero pinta no olhar do pintor...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 29 de Novembro de 2014

sábado, 4 de outubro de 2014

Montanha do adeus


Em meu redor os grãos de areia do deserto,
as serpentes de vidro que trepam as árvores do meu quintal,
ao longe sei que existe uma praia,
morta,
triste,
embrulhada nos lençóis do sofrimento,
minto,
finjo sorrisos quando apenas são desenhos abstractos,
palavras amorfas e escritas por um louco,
e no meu corpo suspendem-se os tentáculos da dor,
um carrossel de chocolate que assombra os lábios do mendigo,
não sei porque existo,
porque minto,
porque vivo... porque me escondo...
e no meu corpo... a montanha do adeus em desespero.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 4 de Outubro de 2014