sábado, 14 de outubro de 2017


(…)

 

 

E...

Tão belo como as sandálias da infância... sonhadoras,

As tristes viagens ao cacimbo da infância, o sombreado rosto no pavimento térreo e sem nome, as mangueiras no retracto do meu avô, de machimbombo na mão, abria-se o portão de entrada, um beijo, infinitos abraços... e o sentar numa cadeira de vime,

O cansaço disfarçado de saudade, a tela do silêncio em pequenos suspiros de amor, o sexo mergulhado nas frestas do passado, a morte e a loucura, e uma equação irresolúvel, menstruada nas sílabas da madrugada, não sei o significado desta noite,

Faltam-me as palavras,

E os desenhos,

Faltam-me as palavras certas para a tua boca de verniz, e quanto aos desenhos

Uma porcaria,

Sem nexo, abstractos como o teu sorriso, e tristes como o final da tarde junto ao rio, O Tejo embriagado nos meus lábios, os esqueletos de palha ardendo na maré, e uma porcaria

Os meus desenhos?

E tu,

Uma porcaria como todas as porcarias da minha vida,

E tu,

A “Divina Comédia” ...

Entre as minhas pálpebras de arroz,

Nasce o poema no teu olhar, recomeçam as sagradas lâmpadas do fugitivo sem destino, imagino-me um transeunte sem identificação, Pátria... nasce o poema no teu olhar cambaleando lâminas de azoto e perpétuas flores em papel, as lágrimas da inocência impregnadas no teu rosto, sangrento, fulminantes palavras inscritas na alvorada,

Amanhã regressarei aos teus braços,

Não, não quero Deus nas minhas mãos, não...

Braços,

A alvorada inseminada na fala dos desassossegados orgasmos de plástico, a claridade sideral poisa sobre os teus seios, meu amor,

E o amor?

Braços,

Palavras,

O corredor embriagado de flores e árvores caducas, na algibeira um beijo e algumas migalhas de suor que só o teu corpo sabe desenhar em mim, abri a janela, puxei de um velho cigarro, a tosse, a idade da tosse... sobre os meus ombros,

Tens de deixar de fumar...!

Nunca,

(Navegas na morte, habitam em ti as saudades da partida, o regresso sem saída, absorto, infinitesimal adormecido numa lápide de sonho, partimos, chegamos, o frio entranhou-se-nos nos ossos, esquecemos as palavras, e todos os momentos, a loucura imaginária dos vinhedos escrevia nos rochedos... o xisto disfarçado de “Alimento para Cães”, as ruas inúteis, fúteis, onde ”putas e drogados” dormiam para fugirem ao vicio, a emigração dos corações de areia, a sedução, o prazer quando o teu corpo balançava na alegria, o sótão vazio, o telhado encravado nas ombreiras da paixão,

Amo-te, escreve ela todos os dias no espelho embaciado,

Amas-me?

O que é o amor, meu amor...

Palavras, poemas, poetas... & mortos sem cabeça, Amas-me? O que é o amor, meu amor...

Pedra, madeira...ou papel quadriculado,

Oiço

“Foda-se o amor”)

Nunca oiço, as tuas exclamações do prazer, e quando o teu corpo se desfaz em cinza, eu, sou absorvido pelos teus olhos, navego desde que cheguei, dentro de um caixote em madeira,

Alguns tarecos, fotografias e fios de sémen ainda por descobrir, os calções emagrecidos na madrugada, o desejo desenhado nas montanhas do “Adeus” ...

Até logo, meu amor...

E nunca,

O que é o amor, meu amor...

Os meus desenhos?

E tu,

Uma porcaria como todas as porcarias da minha vida,

Estes desenhos sem sentido, abstractos, doentes, malditos... sinto-o e finjo que ele não existe, não o quero ver, não me apetece falar com ele, amanhece nos teus braços e não me dou conta da liberdade das tuas mãos, das palavras dos teus lábios... e dos teus beijos geométricos,

A rima é de quem a trabalha,

Geométricas cintilações de cianeto, o azoto e os cigarros,

E tu?

Amanhã amar-me-ás como hoje?

Mas hoje... não existe, um caixote em madeira, alguns tarecos e meia dúzia de fotografias,

Todas,

Todas a preto e branco...

Partiram, levaram o miúdo dos calões e o caixote em madeira,

Alguns tarecos, pouca coisa e fotocópias de fotografias envenenadas pelo silêncio, na algibeira, o amor, o desejo do mar, dos barcos e das coisas

Simples?

 

 

 

(…)

 

 

(não revisto)

Francisco Luís Fontinha – Alijó

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Outono em flor


O corpo pincelado de noite,

Quando da noite regressam as barcaças do Inferno,

Não trazem destino,

Como no Inverno,

O menino…

O menino recheado de luz e incenso verbo,

Lá fora chora uma flor,

Um pequeníssimo poema morre de dor…

E o menino em febre, cansado da flor,

Deita-se sobre o orvalho imaginado pelo seu progenitor,

Prometo conquistar todos os ossos do teu corpo,

Prometo desenhar no teu corpo a sombra da revolta,

E que nunca mais volta,

Às escadas do sofrimento.

Oiço o teu lamento,

Os teus gritos contra os cortinados da Primavera…

Oiço o Outono na tua mão tão bela,

Quando a barcaça,

Em passo acelerado,

Bate contra os rochedos da desgraça…

E o menino,

Coitadinho…

No chão sentado.

domingo, 8 de outubro de 2017

Radiografia


Radiografia de tecidos envergonhados,

Trapos vagabundos no telhado pendurados,

A caligrafia cessante nas palavras imaginárias,

Do louco amante…

Nas tardes acorrentadas,

 

O silêncio dos teus ossos suicidados

Na noite desassossegada,

 

Os corpos mutilados,

E a tristeza dormindo na madrugada,

 

Radiografia de tecidos envenenados,

Tristes livros assassinados,

Palavras ensanguentadas

Como acontece a todos os corpos rasurados…

Na clemência das palavras.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 8 de Outubro de 2017

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Ficavam sempre pendurados nas mangueiras


O vento emagrece os ossos pincelados na Ressonância Magnética, a chuva miudinha alicerça-se-lhe no cabelo prateado do Outono, aos poucos caem as folhas no pavimento térreo das lágrimas invisíveis, aconchega-se contra o espelho suspenso há anos no quarto, e vê a fotografia de um condenado à morte, sofre, chora… e brinca com as pétalas das drageias que lhe envenenam o corpo, os ossos partem-se como veleiros à deriva no Oceano sem nome, sempre só, ele deita-se na cama desengomada e dorme ao sabor da tempestade encarnada, vomita as palavras nocturnas que lhe correm nas veias, e para assassinar o tempo vai até à casa de banho fumar um cigarro,
Escreve “merda” na vida, desenha sombras nas sombras da vida, e tenho medo da partida, o só, o desajeitado das palavras encostado a uma esplanada esperando o engate do final da tarde, lamenta-se,
Lamento-me, não sei o que fazer enquanto os ossos de ontem enfraquecem os ossos de hoje, respira fugazmente, pega nas lâminas da manhã e esconde-se no rio…, lamento-me nos dias em que sou possuído pelo medo, lamento-me quando abro um livro e ela,
Hoje não consigo respirar, as palavras voam como voa o meu cabelo quando os pássaros mergulham na minha mão e adormecem, não consigo, queria dormir, quero dormir, quero brincar no quintal e fazer-te um papagaio em papel, daqueles que eu te fazia,
Lembras-te?
Ficavam sempre pendurados nas mangueiras, entre o Sol e a alegria da juventude, e o vento?
O vento emagrece os ossos pincelados na Ressonância Magnética, e os teus braços abraçam-me na solidão vagabunda do planalto, olho a montanha, olho-me no teu espelho,
E tão velha…, e tão sonâmbula das noites sem dormir.



Francisco Luís Fontinha
06/10/2017

sábado, 30 de setembro de 2017

Carta aos pássaros


O invisível sono nas pálpebras tua dor, os beijos inventados pelos teus lábios nas gélidas noites de Inverno, o latido de um cão, solitário, na rua das traseiras, os teus lençóis suspensos na madrugada, enquanto nas minhas mãos crescem pedacinhos de esperança, serei capaz de cuidar de ti?

A serpente da dor…

As lágrimas envenenadas do teu sangue, as límpidas madrugadas sem destino camuflada pelo sofrimento, os ossos rangem, o cabelo voa em direcção ao mar, e longos silêncios de pequenos muros de xisto nos separam, o dia, a longínqua noite, a claridade das sombras dispersas no teu corpo,

Serei capaz? As nuvens desencontradas nas frestas do cansaço, as pequeninas sílabas de dor comestíveis nas nocturnas avenidas do sonho, e o maldito sono embriagado saltitando de casa em casa, e tu, e tu aconchegada ao meu ombro, sempre sonâmbula, e embrulhada num cobertor de medo…

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 30 de Setembro de 2017

domingo, 24 de setembro de 2017

Os pássaros…


Os pássaros, mãe…

Poisados no teu frágil cabelo, vomitando vozes nas tuas mãos enquanto lá fora o Outono se veraneia junto aos Plátanos da saudade,

Os sons melódicos dos teus ossos quando a madrugada não acorda, por preguiça, por nada… ou por tudo,

O sono, o sono que te alimenta e te transforma em esqueleto desempregado, lutando contra a dor, e o sofrimento…

Os pássaros, mãe…

Junto ao rio esperando a tua sombra, e os teus beijos,

Os pássaros desesperados, os pássaros envenenados de químicos complexos alvorando as tuas veias… e nada nem ninguém a brincar na eira,

Os pássaros, mãe…

Descendo os socalcos, dando curvas infinitas num cadeirão estático, morto, uniformemente acelerado, o seno, o co-seno alicerçado aos teus pulsos de verniz… como as serpentes do anoitecer,

Como eu odeio os teus pássaros, mãe…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 24 de Setembro de 2017

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Tela invisível


Penso em ti,

Pareces um desenho cansado numa tela invisível,

Sofres em silêncio para eu não perceber,

Finges que o mar habita o nosso quintal,

E que está tudo bem…

Claro que não está tudo bem…

O trânsito é infernal dentro dos nossos corações,

As ruas são estreitas, pequeníssimas…

Como as ruas de brincar dos brinquedos das crianças,

Choras,

Choras na escuridão para que eu não perceba…

Mas sabes que eu dou conta de tudo,

Conheço o teu cabelo quebradiço,

Conheço o teu rosto de granito e xisto…

Em direcção ao rio,

Penso em ti…

E não sei o que será de mim sem a tua presença…

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 19 de Setembro de 2017

sábado, 9 de setembro de 2017

Poema sofrido


Uma fotografia para recordar o teu sorriso

Nas manhãs incompreendidas do sofrimento,

Uma lápide onde desenho a tua dor…

Quando amanhece em mim, e, e no infinito vives amargurado,

E sem alimento,

Uma enxada prisioneira no tempo,

Quando aos socalcos regressa o meu corpo cansado…

E vivo ancorado

Neste mundo sem juízo,

 

Alegra-me saber que estás feliz,

E percebes a minha dor…

 

No entardecer do poema sofrido,

 

Uma fotografia,

Cansada da vida,

Uma imagem prateada…

Nas mãos de uma esferográfica,

 

Uma canção esquecida…

Na garganta de uma criança.

 

Não sei o que te dizer!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 9 de Setembro de 2017

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

7 de Setembro


Tão triste…

As palavras que escrevo

No teu rosto sofrido,

 

Tão triste…

Ser viajante sem regresso

No teu barco perdido.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 7 de Setembro de 2017

domingo, 27 de agosto de 2017

Coração de pedra


Todas as torres têm vertigens,

Nos teus olhos brincam as searas encantadas da tarde,

Ultraje, viagem desassossegada ao infinito,

No medo, no cansaço de te perder nos lençóis da dor…

Como uma serpente acorrentada, só, dentro de casa,

O feitiço obscuro das tuas mãos, além o indesejado coração de pedra…

Triste, e frio como a geada,

Suspenso em cada madrugada,

 

A fotografia prateada, esquecida em cima da secretária, os livros enervam-me, e oiço o cantar das personagens antes de nascer o dia,

A morte traz a noite, a noite constrói a dor, e o sofrimento alimenta-se das tuas pálpebras de granito,

 

Serei o teu guardião das noites mal dormidas, o esqueleto de xisto que habita no teu peito, sempre ofegante, sempre engasgado pelo sonâmbulo cacimbo,

E na sanzala há uma esfera límpida de carvão…

Como são todos os cigarros que me acompanham,

Sinto a despedida,

Sinto a partida…

 

Até que um dia nascerá o sol, e tudo são apenas más recordações, papéis velhos e alguns trapos de Inverno,

 

Tudo cessa,

Como cessam as cordas da forca antes do enforcado se despedir da mãe.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 27 de Agosto de 2017

sábado, 26 de agosto de 2017

O homem invisível


Dizem que sou o homem invisível,

Sentado numa mesa invisível,

Desenhando na sombra quatro cadeiras invisíveis…

Estou numa esplanada invisível,

Num bar “Mercado” … também ele… invisível,

 

Solto-me das amarras de vento,

Liberto-me das searas perpendiculares ao quadrado da hipotenusa…

Brinco com um velho copo de uísque,

E o invisível homem cresce na praia da areia branca,

Está noite, meu amor,

Tenho nas mãos os três livros invisíveis que me ofereceste pelo Natal…

E sinto que todos os Natais são invisíveis…

 

Tenho saudades do meu pai,

Abraço a minha mãe durante a tempestade, somos fortes, e vamos resistir a este caos invisível…

 

Sabes, meu amor…

 

Nunca poderás beijar este homem invisível,

 

Filho das cavernas,

Homem dos barcos de papel navegando no Oceanos invisível da madrugada risível,

Agacho-me, sento-me no teu colo, meu amor, e tenho medo dos furacões com olhos de serpente, e tenho medo de perder-te neste bar invisível.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 26 de Agosto de 2017

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

O sono utópico


Não sei o que te diga,

O sono utópico na displicência da ignorância,

Cansaço, muito, agreste e triste,

Triste e alegre do cansaço absorvido no dia sem fim…

Conto os segundos, conto os minutos… e perco-me nas horas mortas, sem destino, nas palavras, e, e nas searas envergonhadas,

Desconfio que fui atropelado por um poema sem nexo, idade… ou cidade,

Dispo a farda, poisa a arma de papel sobre a secretária, pego novamente na arma e disparo… e sinto a cabeça cravada no espelho do quarto,

Estou parvo, hoje, cansado, hoje, farto das palavras, e farto dos livros,

Não sei o que te diga,

O sono,

O tédio,

Casa assombrada e a arder de febre,

E o sofrimento nas mãos…

(estou parvo, hoje, meu amor).

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 24 de Agosto de 2017

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

O exilado corpo da paixão


Vivo exilado neste corpo cansado,

Tenho as rugas do desejo estampadas nas mãos calejadas pela velha e imaginária enxada,

Os socalcos lá longe, dormem profundamente na sombra de um rio,

Navego em ti, minha querida, até que regresse a morte e te leve para longe,

Imagino-me sem ti, um grande desassossego, uma longínqua e inerte sentido de não liberdade,

Perdido na cidade, esquecido na paragem do eléctrico, só, sem ninguém…

 

Sei que um dia vamos estar todos juntos… mas isso, mas isso é quando?

 

O rosto cremado na lixeira da paixão,

A sombra enigmática do sorriso ao acordar, distintas portas de saída…

E da rua, o silêncio fumarento dos cigarros envenenados pela tua dor,

 

Vivo,

Sou um exilado da solidão,

Entre pássaros e as abelhas desgovernadas do teu coração,

 

E amanhã será um novo dia, de luta, e da pele incinerada do abismo…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 23 de Agosto de 2017

domingo, 20 de agosto de 2017

As árvores dos teus braços


Navego nos teus alicerces de prata,

Sinto o término do dia, é triste, meu amor, a despedida da luz vadia…

Quando tenho nos braços o cansaço da solidão, meu amor,

Navego sem destino, desorientado, sem leme… nem rumo certo,

Trago no peito a lança cravada pela noite, meia-noite aqui, meu amor,

E das sanzalas de veludo o cheiro dos meninos brincando na areia…

A prezada manhã enraivecida pelo tédio, o sol distante de nós,

E lá ao fundo os barcos de papel…

Navego nos teus alicerces de prata,

Sonâmbulo nocturno das cavernas,

E dos pequeninos charcos de incenso… voando em direcção ao rio.

Escrevo-te todos os dias, minha sombra de parede,

Olho-te no espelho da tarde, e sabes, meu amor, amanhã mais um dia de tristeza,

Carregado de sangue nas algibeiras da coragem,

Amanhã, meu amor, amanhã entras pela janela e correrás dentro de mim…

Líquido da madrugada, fantasma da alvorada…

Navego,

Acesso ao teu coração…, e observo um cadáver de lata lutando contra um braço de mar…

Esperança, a distância dos perfumados destinos, assim, assassinados pelo tempo, escuro, deserto, e áspero…

E as árvores tombam nos teus braços, meu amor, tombam nos teus braços.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 20 de Agosto de 2017

terça-feira, 15 de agosto de 2017

Palavras em lágrimas


Porque choram as palavras, meu amor!

 

Neste silêncio cubículo guardo o meu corpo embalsamado pelo tempo,

Sinto o abraço das palavras tristes quando as lágrimas da paixão brotam do sorriso sol,

Sento-me no teu colo, beijos incandescentes nos teus lábios em flor…

Me resigno enquanto me é permitido,

Fujo de ti, escondo-me numa esquina de luz em ciúme,

E tenho na mão direita o fogo do teu peito,

A morte vem, oiço-a na montanha branca onde habitam os teus braços cansados,

E sei que as palavras choram, por ti, por mim, meu amor…

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 15 de Agosto de 2017

domingo, 13 de agosto de 2017

O silêncio dos mortos


Tenho medo da tua imensidão,

Da fúria das tuas mãos quando o vento se agacha no chão…

E pede perdão,

 

Pára,

Escuta o silêncio dos mortos, e dos sonâmbulos abandonados,

Ergue-te e cresce na floresta dos vivos,

Enquanto a cidade se prostitui nos horários nocturnos da madrugada,

Pára,

Escuta o silêncio dos mortos, e dos pássaros envenenados,

E da paixão,

A húmida terra lapidar do desassossego…

 

E crava no peito uma canção,

Abraça o coração…

 

Das falésias adormecidas.

 

Tenho medo da tua imensidão, e dos acrílicos desenhos desgraçados.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 13 de Agosto de 2017

sábado, 12 de agosto de 2017

Palavras sós


Palavras!

Enigmas suspensos na madrugada,

O farol avariado, os barcos cerram os olhos, e escondem-se na neblina,

Palavras a arder,

Palavras escritas no fogo da paixão,

Quando a saudade morre devagarinho…

Os poemas despem-se das palavras,

Os livros adormecem sem os poemas,

E o papel amarrotado da tua pele… sedução encantada,

Palavras!

Tristes versos abraçados a tristes noites de Verão,

Sentidos pêsames, a partida para o outro lado do Universo,

E as estrelas amarguradas em fuga para o Infinito,

Verbo,

Os latidos desorganizados dos teus gemidos… quando o rio se suicida nos rochedos,

Em transe,

A ausência delas quando eu sentado espero pela alegria,

Ressequida,

Mortas todas,

As pedras que te atiro…

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 12 de Agosto de 2017

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Calçada imaginária (Ajuda)


Se o mar entrasse pela janela e me levasse…!

 

Fim de tarde,

Começa a noite das camélias enlouquecidas,

Visto-me de mendigo…

E caminho pela cidade abandonada,

 

Se o amor mata… não o sei!

 

Nunca vi ninguém morrer por causa do amor,

É uma treta a saudade dos cavalos selvagens,

Quando poisam sobre a calçada imaginária,

 

Se a morte é felicidade… quero ser infeliz!

 

E morrer ao teu lado.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 11 de Agosto de 2017

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Sombras de papel


Minha querida Mirian,

 

 

A pureza dos teus lençóis de prata enganando o meu rosto carcomido pelo teu sorriso,

Recordo os teus beijos aprisionados aos meus,

Quando tínhamos a janela aberta e entrava em nós a fragância do Sol que nos abraçava nocturnamente,

Poisavas o teu cabelo nos meus seios suados pela tristeza da tua partida,

Ouvíamos música, entrelaçávamos os dedos como duas crianças num qualquer jardim,

Brincando com pequeninas pedrinhas de sombra,

Sabes, meu amor,

Deixei de ler os teus versos,

Deixei de abraçar as tuas palavras como fazíamos no Inverno, quando abraçávamos o vento regressado das estátuas de luz,

Deixei de pertencer às tuas coxas desenhadas nos círculos de desejo, ao longe a árvore que nos escondia da tempestade,

Deixei de viver, meu amor,

Apenas finjo caminhar sobre a areia molhada da tua pele…

E ambas sabíamos que um dia tudo terminaria… a trágica morte das nossas sombras de papel.

 

Beijos

 

 

 

Viviane

Alijó, 10 de Agosto de 2017