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sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Tudo o que não sinto


Não sinto o odor

das pedras onde te deitas

e dormes,

não sinto a dor

quando as tuas mãos melódicas

me tocam e envenenam,

não sinto o amor

que habita no teu peito

rompendo a alegria da madrugada,

não sinto a cor

do teu olhar

quando desce a noite nos teus lábios…

e uma película de mar,

não sinto o suor

das plantas do meu abismo

quando o silêncio envelhece no teu corpo…

e um poema morre no veleiro sem navegar.

 

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 23 de Setembro de 2016

sábado, 7 de maio de 2016

Ausento-me de ti na noite


Era forçado pela pressa das coisas. O silêncio imaginário da manhã quando pegavas na minha mão ao desaparecer no meio dos transeuntes da cidade perdida,

Escondia-me das sombras dos aciprestes,

Porque assim, pensava eu, estaria mais protegido das estrelas, mas não estava.

A noite era uma aventura,

Eu preferia ler, e tu, e tu preferias passear, que confesso, que confesso não me apetece nada caminhar apenas por caminhar,

Se ao menos caminhasse em direcção ao Luar… era forçado pela pressa das coisas,

Tens de fazer isto, amanhã tens de fazer aquilo…

Chega. Detesto receber ordens de arbustos e munto menos de ti.

Sou feliz assim, confesso.

Não dou nem recebo ordens,

Sou livre, voo na companhia das gaivotas ao final da tarde junto ao Tejo,

Depois poiso em Belém,

Acorrento-me às amarras invisíveis da maré,

Olho os veleiros em atropelos sem que ninguém lhes valha…

Como a mim,

Nem palavras nem poesia,

Nem os livros me deixam adormecer quando tu, depois de caminhares em círculos, cansada, dormes, eu olho-te e finjo não te ouvir, prefiro ausentar-me na noite, e regressar quando já o dia bate na janela do nosso quarto,

Descerro a lápide do desassossego, não encontro nela o meu nome…

Deixei de pertencer aos humanos visíveis das avenidas laminadas pela escuridão,

Tenho no peito um fantasma, um falso coração que em vez de amar…

Bate, bate sem parar…

E um dia vai parar,

E nesse instante serei o homem mais feliz do Universo,

A minha morte; as coisas cessam, e deixam de ter pressa,

E deixam de ter graça.

E eu, e eu serei apenas eu…

Uma carcaça.

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 7 de Maio de 2016

quarta-feira, 23 de março de 2016

janela amar


o relógio nunca cessa de chorar

as lágrimas do mar parecem pálpebras envenenadas

nos socalcos da saudade

o rio esconde-se nas umbreiras do silêncio

como se fosse a fera amestrada do vento

sem sorrisos de vida

nas espalmadas marés do sono

o relógio vive

escuta os meus lamentos

enquanto lá fora alguém sofre

levemente andando pela cidade de algodão

e inventa sonhos

e pede-me pão

nunca se cansa de chorar

este triste relógio de corda

não sente a dor

não sente a morte

daqueles que partem e deixam de ouvir a Primavera…

e levam no coração uma pedra

do infinito abismo de habitar uma calçada

um corpo estranho

imbecil

e velho

o relógio nunca cessa de chorar

alegre

nas noites sem dormir

abre a janela amar

toca no cortinado amor

e envelhece esperando que o tempo o venha buscar

até que uma qualquer tempestade o obriga a parar…

 

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 23 de Março de 2016

domingo, 13 de março de 2016

Recordar


Recordo o sono levado nos teus braços

Quando a manhã terminava de acordar

Recordo o cansaço

E a sinfonia do Adeus

Que escondeste no mar…

Recordo-te sem me recordar

O teu nome

Recordo-me sem me recordar

O teu sorriso

Do amar

Do amor

Enraizado no esplendor altar

As abóbodas do silêncio

Quando prisioneiras dos teus lábios

E um pedacinho de Paz

Leva o teu corpo para o abismo

Entre rochedos de medo

E beijos de nada

Recordo

O sono

Levado

Os teus braços nas trincheiras amarguradas…

Sem tempo para me abraçar

Ou uma fingida despedida.

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 13 de Março de 2016

domingo, 10 de janeiro de 2016

Sinfonia da loucura


Não acredito,

Meu amor,

Que as tuas noites ingrimes

Sejam o teu desejo,

Porque não tens desejo,

Porque desejo-te não me desejando,

Como as obscuras noites de Inverno,

Como as tristes planícies do Alentejo,

Camufladas pelos teus beijos,

Não acredito, meu amor,

Na geometria,

Na física

E na sinfonia da loucura,

Pareço-te um prisioneiro,

Na cancela do adeus,

Esperando os circunflexos odores da madrugada,

Perdi a alma,

Perdia a minha amada,

Não,

Não acredito na minha infância,

Nunca tive infância,

Amor,

Amar,

Desamar…

A flor,

O guindaste da solidão

Submerso na minha mão,

Só e só…

Não acredito,

Meu amor,

Nas jangadas de vidro

Que se deitam na nossa cama,

Que nunca a tivemos,

Imaginária

Dentro da cabeça de um louco,

Tu,

Eu,

Nós…

Na loucura das sílabas amordaçadas,

O pedestre menino enrolado nas finas folhas do prazer,

Os vigaristas poetas

Roubam-me a poesia,

Roubam-me as palavras,

E eu,

Eu… acorrentado aos teus lábios,

Em papel crepe,

Vermelho,

O cansado abutre

Vestido de alegria,

O cansado abutre

Vestido de dia,

Não,

Não meu amor,

Não acredito nos teus lençóis

Nem nas tuas mãos à volta do meu pescoço,

Fingida manhã,

Triste manhã do meu acordar,

E morrer,

Sem saber a amar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

domingo, 10 de Janeiro de 2016

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Simplifiquei o cansaço, libertei-me das tuas garras e hoje consigo voar…


Simplifiquei o cansaço,

Libertei-me das tuas garras e hoje consigo voar…

Sou livre de amar,

Sou livre de ser amado,

Ou nada das duas, é-me indiferente,

Simplifiquei o desejo,

E hoje é muito mais fácil desejar…

Ser desejado,

Ou nenhuma das duas,

É-me igual,

Indiferente,

Mortal,

O salto para os teus longínquos e proibidos braços,

Estou só, alguns livros e nada mais,

Simplifiquei tudo…

Só não consigo simplificar o amor,

Tão difícil amar…

Amar aquele que nos ama,

Tão difícil amar…

Aquela que nos ama…

Simplifiquei o cansaço,

As noites mal dormidas

Por motivos de preguiça,

O abraço,

Mortal

O salto para o teu olhar,

Fico cego,

Absorvido pelas insígnias do destino

E afins,

Simplifiquei o cansaço,

Libertei-me das tuas garras e hoje consigo voar…

 

Só.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

segunda-feira, 28 de Novembro de 2015

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

mulher do meu saber


sofrer

morrer na vaidade da vida

quando a vida é uma vaidade desmedida

sofrer

sonhar e sofrer

mergulhar o corpo na clandestinidade da saudade

vivida

sonhada

sofrida

sofrer e morrer

na vaidade da vida

quando o sonho pertence à saudade

ser

não sendo o ser perfeito

aquele que todos querem que eu seja

um tonto

um desnorteado

sem o saber

absorto

mergulhado no sofrer

sofrendo

não ser

a abelha amestrada do silêncio

a gaivota da solidão sobrevoando a montanha

não o tenho

o amor

e a paixão

de amar

e ser amado

pelos pássaros da madrugada

ao amanhecer

o prazer

de fundir o meu corpo no teu

um só

um corpo

dois destinos

e três maços de cigarros

amanhã

não sendo

sendo o dia da despedida

a carta sem remetente

à deriva

a diva

mulher do meu saber

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

quarta-feira, 11 de Novembro de 2015

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Carta a um fantasma


Percebia-se nos teus olhos o esconderijo da noite,

Tínhamos entre nós uma parede invisível e um cortinado em veludo,

Percebia-se nos teus olhos o cansaço das manhãs sem rumo,

E enquanto clareava o esconderijo da noite, sabias que seria o último beijo,

A última palavra,

O último adeus…

O último livro, o último eléctrico para o abismo,

Lisboa continua viva, fervilha, e os jardins onde te sentavas deslumbraram a tua ausência,

Esqueleto infeliz,

Em vidro,

Os cacos,

 

Os grãos de areia descendo a calçada em direcção ao rio,

Percebia-se nos teus olhos o esconderijo da noite,

O silêncio da vaidade,

A loucura por objectos caros, raros, coisas imbecis…

Que só mulheres como tu… sabem apreciar,

Coisas imbecis…

 

Fúteis, como tu, fútil, mimada, menina das searas envenenadas na solidão das paredes pintadas,

Percebia-se no luar o teu olhar,

O outro luar, a outra avenida sem saída…

O outro olhar,

Não o teu,

Porque esse… vendeu-se por migalhas,

E evaporou-se num Sábado de neblina,

Entre transeuntes e feirantes,

Velharias e vigaristas,

Chapéus de palha…

E perfumaria pirateada,

Que alguém como tu, fútil, consegue odiar.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 15 de Outubro de 2015

domingo, 30 de agosto de 2015

Próximo amanhecer


Não espero nada do próximo amanhecer,

Não sei se amanhã haverá amanhecer…

Não sei se estarei acordado para o ver,

No próximo amanhecer

Quero estar junto ao mar,

Desenhar na maré o rosto do silêncio,

E escrever,

Sentar-me sobre uma pedra imaginária,

Olhar-te sem te ver…

No próximo amanhecer,

Escreverei palavras no teu olhar?

Não o sei…

Não o sei sem sofrer,

Não o sei…

Não o sei sem te amar!



Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 30 de Agosto de 2015

quinta-feira, 12 de março de 2015

os livros


ausento-me deliberadamente das sombras envergonhadas
que habitam os socalcos da saudade
sou um ninho de cacos
e pequenas películas de silêncio
pela madrugada
oiço a tua voz aprisionada nas frestas deste cubículo
há entre nós um espelho cansado
e triste
ausento-me dos teus lábios
e perco-me nas palavras sem nome
como as ruas da tua cidade
ou da tua aldeia

o musseque
fervilha
transpira poesia
e o teu cabelo suspenso numa fotografia
tão distante
o mar
e as marés de sono
que me embrulhavam
hoje
não mar
não sono
nada

amar
amar
amar as flores e os desenhos embalsamados
correr montanha abaixo
deitar-me sobre ti
apenas
o peso das nuvens pinceladas de alfazema
a aceleração
acorrentada a uma equação
a física
a matemática
e... e amar

nada
os separa
os fios de sémen perdidos no cacimbo
o cachimbo em brasa
lúcido
de braços abertos
e abraça-me
e beija-me
como se beijam todos os livros
folheados
e no entanto
ausento-me deliberadamente das sombras envergonhadas...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 12 de Março de 2015

sábado, 31 de janeiro de 2015

Beijos em flor

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Roubaste-me o sorriso nocturno dos beijos em flor
pegaste nas minhas palavras e transformaste-as em solitárias andorinhas
depois
trouxeste a Primavera
e o amor
do poema
de amar o poema
e sentir no peito as equações do destino...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 31 de Janeiro de 2015


domingo, 28 de dezembro de 2014

Não tempo para amar

(desenho de Francisco Luís Fontinha - Alijó) 



Não tenho tempo para amar...
como se para amar fosse necessário tempo,
ser amado,
pertencer ao vulcão das tempestades,
não sentir
sentindo...
o desejo das palavras,
o significado das cidades de gelo,

não tenho tempo para ser amado...
o amor é um rochedo construído de velhos farrapos e alguns pedaços de aço,
o amor são esqueletos de papel...
no coração de uma mulher,

não tenho tempo para amar...
como se para amar fosse necessário tempo,
ser amado,

os sítios proibidos dos rios do teu ventre,
o medo de amar-te...
quando eu sou apenas uma imagem,
tão velha... tão velha como os candeeiros das ruelas viciadas,
tão velha... como as ruas da minha infância,
o triciclo em queda livre,
a sombra das mangueiras poisadas no meu sexo...
e eu, e eu sem tempo para amar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 28 de Dezembro de 2014


Os poemas ao fim da tarde


Os poemas ao fim da tarde
este mesquinho silêncio
quando entra pela janela
e lá fora
um barco em espera
esquelético
cansado
farto do mar...
os poemas ao fim da tarde
com fome de matar
a voz do teu clitóris em tristes soluços na madrugada
os poemas ao fim da tarde... são poemas de nada,
poemas... poemas de amar
o estranho invisível quadrado com sorriso de vidro
há nas palavras a força da revolta
o corpo em lágrimas
que só a cidade...
que só a cidade consegue absorver
os poemas ao fim da tarde
o vento de sémen contra uma árvore
e os pássaros dos teus cabelos
brincando na seara
entre pedras e enxadas
sempre... sempre, sempre que um relógio acorda... e ninguém sabes onde habitam “os poemas ao fim da tarde”.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 28 de Dezembro de 2014

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Jardim de transeuntes


As manhãs são límpidas tristezas
Que só o vento consegue abraçar,
Parar no semáforo e olhar a rosa mais bela
Do jardim de transeuntes em movimento,
Tem no sorriso a bandeira da paixão
E nos lábios…
A doçura inseminada das palavras,
Do vermelho…
O verde verdade
Da esperança…
As manhãs são límpidas tristezas
Que vergam o frágil esqueleto da cidade,
Não tenho tempo para desenhar
A saudade na mão de quem me espera,
Não tenho vontade de abrir a janela
Deste quatro latas cansado,
As manhãs são límpidas tristezas
Que só o vento consegue abraçar,
São rosas transeuntes suspensas no mar…
São palavras ignoradas,
Sombras deitadas na estrada,
As manhãs
São… límpidas tristezas
Sem tempo para amar…



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 9 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Escuridão


Não quero amar-te
sou um exíguo caixão de espuma
onde habita o meu corpo de silêncio
não quero amar-te
porque sou filho da bruma...
e tenho na mão o sonho de voar
não quero amar-te
sou um exíguo caixão de espuma
com janelas voltadas para o mar
não
não quero amar-te
sabendo que o amor é uma canção sem palavras,
sem vida
quando a frenética cidade se evapora na escuridão...
amar-te seria uma tempestade
ou... ou um vulcão,
não quero amar-te
porque há nos meus poemas pedaços de morte
e rochedos de cartão
não
não quero amar-te
enquanto existir em mim a solidão...



Francisco Luís Fontinha
Alijó, 24 de Novembro de 2014

sábado, 22 de novembro de 2014

Sem sentido - “A merda de um poema”


Queima o filme negro da tua vida,
ensina aos teus ossos as boas práticas de comer,
sem nunca mencionares o nome da despedida,
nem na rua invisível do teu corpo,
imagina o vento fatiado abraçando-se aos teus seios,
escrevendo neles...
Amo-te...
sem gaguejares,
sem medo de chorar,
os abutres cardumes da insónia
que se alicerçam aos teus cabelos de luar,
queima o filme negro da tua vida... como quem pronuncia pela última vez a palavra amar!



Francisco Luís Fontinha
Alijó, 22 de Novembro de 2014

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Desintegração


Desintegro-me na desilusão das imagens adormecidas
pareço um velho palhaço gritando para a multidão
palavras
e canções
e noites perdidas,

Viagens enigmáticas com odor a madrugada
rios embriagados correndo nas minhas veias
dilatadas
tristes
tristes como as lágrimas da calçada,

Desintegro-me sem o saber
enquanto sonho nas planícies lunares
desintegro-me lentamente como o vento nas tardes de liberdade
recebo uma carta... lá dentro habita a saudade...
e desintegro-me nas palavras por escrever,

As rosas que disparam sorrisos encarnados
o oceano levitando nas mãos de alguém que é amado
o barco do desejo... navegando
navegando nos cortinados da mentira...
e desintegro-me nos planaltos prateados,

Há no teu olhar rochedos vadios comendo mendigos engravatados
das tuas pálpebras ancoradas
despem-se os seios da manhã sem despertador
maldito relógio que nunca morre...
e todas as luzes poisam nos ombros dos alegres desgovernados...




Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 20 de Novembro de 2014

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Equação do desejo


Quando a equação do desejo se perde na escuridão
e há uma incógnita sonolenta embrulhada na ardósia da tarde
nada a fazer
esperar
ou... ou chorar
ou... ou escrever,

Quando a equação...

É um pedaço de chuva alicerçada à tempestade
o xisto envenenado reaparece nos socalcos em fuga
nada a fazer
olhar o mar
ou... ou inventar palavras de amar
ou... ou desenhar o sorriso da Garça sem o saber,

Quando a equação...
… quando a equação te faz sofrer.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 17 de Novembro de 2014

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Rochedos da infância


O vigilante nocturno olha-me e alicerça-se aos meus braços,
sinto-lhe o esqueleto enferrujado a caminhar no meu peito,
ofegante,
alimenta-se dos meus velhos ossos com odor a madrugada sem luar,
peço-lhe um desejo...
e... e nada posso desejar,
o vigilante nocturno é como uma âncora de luz sobre as minhas pálpebras envergonhadas,
que as flores seduz...
e aos jardins oferece poemas,
e... e palavras de amar,
o amor enfurece as árvores sem folhas,
nuas como as gaivotas ao entardecer...

Depois acorda o silêncio vestido de cidade,
e eu sem saber o que fazer,
os comboios saltitam dentro dos carris desalinhados,
os comboios parecem corpos a arder...
há cinzas laminadas de sangue no sonífero poético,
alucinações desorganizadas em grande multidão,
uns que choram,
e outros... e outros que choram por prazer,
e sem perceberem...
há uma placa de zinco onde habita uma ponte,
nunca conheci o seu nome,
nunca vi um sorriso nas suas treliças,

Têm fome as estrelas de papel que brincam no tecto da minha aldeia,
lêem pedaços de nada e alguns cubos de sombra,
escrevem na incandescente memória o álcool sobejante da noite passada...
ressuscitam os outros vigilantes e demais arruaceiros sem gabardina,
e o meu corpo de aço... tomba sobre o ombro de um transeunte desconhecido,
a cidade é uma seara sem espigueiros,
desalojadas enxadas em luta conta a pobreza...
têm fome as estrelas e os planetas,
mendigos travestis correndo montanha abaixo,
e suicidam-se nos rochedos da infância...
triste, triste esta vontade de escrever...
sabendo que nem às pedras pertenço!




Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 5 de Novembro de 2014

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Seara da insónia...


Esqueci o meu nome enquanto dormia nesta seara de insónia,
levemente me batia,
o vento inanimado...
cansado de trabalhar,
esqueci o meu nome nos livros da paixão,
desenhei corações nas entranhas da solidão,
esqueci o meu nome nas ruas de uma cidade,
também ela,
também... também eu...
sem nome,
sem... sem idade,
na calçada da liberdade,

Caminhei sobre o amarfanhado mar,
como um vampiro em chocolate,
deitei-me no chão,
dormi na seara da insónia...
esqueci o meu nome nas estrelas de cartão,
não sei se estou vivo...
não sei... não sei se hoje há vertigens na minha mão,
enquanto embriagado me encosto ao xisto muro,
não seguro,
o perfume silêncio em volta dos teus seios de rochedo cinzento,
não me calo...
não... não me contento,

Esqueci o meu nome nas andorinhas de veludo,
voei como voaram os meus sonhos...
hoje... apenas pedaços de sombra,
e aço enferrujado,
não me calo, não... não tenho medo do amor impossível,
esqueci o meu nome,
esqueci...
nas arcadas do infinito,
não seguro,
não... não me contento...
e no entanto,
sou feliz sem nome... sou feliz sem estória...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 29 de Outubro de 2014