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domingo, 4 de dezembro de 2022

Poeta morto

 Sou o comandante

Deste navio fundeado

No poço da morte

 

E enquanto escrevo e pinto

Este velho navio

Sem rumo

Olha as estrelas que brincam no fundo do mar

 

A manhã incendeia-se nos teus olhos

E mesmo assim

A tristeza ergue-se contra a montanha

Onde habitam as palavras do poeta morto

 

Coitado do poeta morto

Nu

E deambula pelas ruas da cidade

Sem saber como receber cartas

Sem saber se amanhã escreverá um novo poema

Ou se um novo poema o escreverá a ele

E a Terra não parará de girar

Como as árvores que crescem em direcção ao Sol

 

Sou o comandante

Deste navio fundeado

No poço da morte

Quando este vosso poeta

Voa sobre os cubos de vidro

Que aprisionam a paixão das almas mortas

 

E mortas que estão

Não sonham.

 

 

 

 

Alijó, 04/12/2022

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Poemas em flor

 Não durmo

Meu amor

 

Não posso dormir

Quando tenho nas mãos

A seiva envenenada dos poemas em flor

 

Não durmo

Meu amor

 

Como dormem os peixes e os pássaros

As árvores e as folhas das árvores

Não durmo

Como dormem as estrelas e o luar

Não durmo

 

Meu amor

Não durmo

 

E se um dia os meus poemas morrerem

Eu vou dormir

Vou brincar

Saltar sobre as sebes do meu quintal

Se um dia

Se um dia acordar no teu peito

 

Vou trazer o mar para os teus lábios

E transportar o silêncio para o teu olhar

 

Não durmo

Meu amor

E se eu dormir

 

Acorda-me para ver o primeiro sol da manhã.

 

 

 

 

 

Alijó, 02/12/2022

Francisco Luís Fontinha

Ícaro

 Ícaro me leva

Nos seus braços

Para os teus braços,

 

Ícaro me leva

Ao sol dos teus lábios,

No sol dos teus abraços,

 

Do sol dos meus cansaços,

 

Ícaro me leva

Me leva e não me tragas,

 

Ícaro me leva,

Me leva até à lua,

Até à tua lua,

Lua,

Em ti,

Nua…

 

Ícaro me leva,

Me leva Ícaro ao sol,

E não me tragas nunca.

 

 

Alijó, 02/12/2022

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

O Sol de amar

 Nem sempre temos o sol dentro de nós;

Às vezes, chora,

Outras, sorri,

Às vezes levanta-se da cadeira junto ao mar,

E revolta-se,

 

Às vezes, às vezes, chora,

Às vezes grita,

Às vezes quer ser o vento,

Outras, a chuva,

Às vezes quer voar,

 

Às vezes, às vezes, morrer,

Às vezes o Sol não quer chorar…

Mas de tantas vezes que chora,

Às vezes, às vezes,

Às vezes o Sol quer amar.

 

 

 

Alijó, 21/11/2022

Francisco

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Os cobertores do silêncio

 Nunca percebi o que fazem estes crucifixos suspensos nas feias paredes desta espelunca com clarabóia para a cidade, depois do sexo, quase sempre, um cigarro se suicidava no segundo andar e do quarto ao lado, em pequenas frases de final de tarde, chegavam-me os tristes gemidos dos corpos embebidos no fenol da solidão. Pela janela entreaberta, regressavam as dálias e margaridas que alguém esqueceu na paragem do autocarro.

Desenha-me!

Escrevo-te deste alegre silêncio sabendo que tens na janela do teu olhar as sombras que dormem sobre mim, escrevo-te deste longínquo continente para que percebas que enquanto estes crucifixos habitarem esta espelunca, e quando me pedes para desenhar-te,

Invento as larvas que roubam as palavras que semeio no teu peito, e nunca vais perceber porque fugiram as acácias da minha mão.

Alegra-te meu rapaz,

Amanhã há caracóis.

E enquanto estes crucifixos habitarem esta espelunca, o teu filho não saberá que nos barcos, um dia, o pai escondeu as escadas de acesso ao sótão, depois, tínhamos de caminhar até à estação mais próxima,

Estou grávida,

Ontem,

E víamos o sol a esconder-se na montanha,

Pensas em quê?

Amanhã, filho…

E sabíamos que aquela montanha tinha no peito o maior luar de Agosto, depois desenhava-te enquanto o teu corpo se escondia nos cobertores do silêncio, e imagina, quando percebeu que ia ser pai, puxou de um cigarro e em pequenos sorrisos,

Adormeceu na paragem do autocarro,

O machimbombo afrouxou, e num passo de esgrima, ficou acorrentado até aos dentes, nos braços, trazia as cordas com que às vezes utilizava para subir à montanha, e desta, conseguia ver o filho deitado sobre a cama rabugenta e infestada se sémen que da tarde tinha adormecido sem compreender que alguns milímetros têm vida, como os pássaros, como as dálias e as margaridas,

Sorrisos teus até aos lábios.

Olhou-os e benzeu-se. E víamos o sol a esconder-se na montanha, pensas em quê?

Amanhã, filho…

Em gritos, que não pensava, que não sabia onde tinha esquecido os cigarros prateados e que às vezes utilizava para carregar a espingarda da insónia, mas depois lembrou-se que dos milímetros silêncios do filho, tinha escutado o uivo do Ujo, até que a morte os levou para aquele triste e caquéctico sótão, onde além deles, habitavam borboletas, ratazanas e teias-de-aranha…

Somos só nós a partir de hoje,

E o pôr-do-sol deixará nos teus olhos as estórias das noites junto ao rio, e o cansaço acorrentou-o à ponte metálica que hoje dorme neste labirinto de livros, e nas pálpebras descobriu as insónias da manhã,

Um dia, um dia descerão dessa parede recheada de frestas todas as fotografias que deambulam pela casa, e esse milímetro de vida,

Somos só nós a partir de hoje e algumas teias-de-aranha,

Finou-se ao décimo quinto dia.

Amanhã, filho…

Nunca percebi o que fazem estes crucifixos suspensos nas feias paredes desta espelunca com clarabóia para a cidade, mas sei que lá longe há um rio que nos olha e nos quer levar para o mar.

E no mar, far-se-á homem como todos os milímetros de vida.

 

 

 

Alijó, 18/10/2022

Francisco Luís Fontinha

(ficção)

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

A janela do teu olhar

 Quando abres a janela

Do teu olhar,

E um lençol de lágrimas

Poisa na vidraça da manhã,

Não te apoquentes,

 

Há dias de chuva

Onde um lindo sol está a brilhar,

Há dias frios,

Dias quentes…

Quando abres a janela

 

Do teu olhar,

E num lindo dia de sol,

Trazes contigo as lágrimas

Que poisam na vidraça da manhã,

Lembra-te do mar…

 

Sempre em movimento,

Sempre acorrentado às marés…

e… amado por todos,

e sempre a sonhar.

E se um lençol de lágrimas

 

Poisa na vidraça da manhã,

Fica tranquilo, porque há sempre um poema

Na tua mão,

Um poema proibido,

Um poema de um lindo dia de sol…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

17/10/2022

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Nuvem granítica da saudade

 

Às vezes, o sol parece uma nuvem escura,

Fria,

Às vezes, o sol parece um sonho,

Um jardim florido.

Às vezes, as palavras parecem uma tempestade,

Um dia estupidamente feio.

Às vezes, o mar é uma ilha,

Outras,

Um corpo cansado,

Às vezes, o sol parece uma fogueira,

Ou um poema recheado de nadas.

Às vezes, eu sou o sol,

Outras,

Sou a nuvem granítica da saudade…

Às vezes, temos o sol pincelado de noite.

Às vezes, temos a noite pincelada de sol…

Às vezes, o sol parece uma nuvem escura,

Fria e cinzenta.

Às vezes, o sol é um pássaro,

Uma flor esquecida na avenida.

Às vezes, temos o sol,

Às vezes, o sol tem-nos a nós.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21/02/2022

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

As sombras do silêncio


Acordava do sono emagrecido,
O homem da nuvem embriagada,
Cansado,
Perdido,
E, reclamava,
E, gritava,
A palavra enfeitiçada.
E, hoje, nas camufladas ruas da cidade esquecida,
Embrenhado na poesia, a canção do adormecido,
O homem, cansado, denegrido,
Escreve sem ânimo,
Desiludido…
Dos alicerces envergonhados.
Rezam pela sua alma,
Coitado,
Sem nome,
Degolado pela tempestade,
O homem, o mesmo homem, o cansado,
Pegas nas palavras da reza em seu poder,
Desorganiza-se,
Veste-se de negro,
Negro, negrito, negrinho,
Como o gato do vizinho,
Dançando na eira das espigas adormecidas.
As sombras do silêncio,
A alvorada da sinfonia que jaz na ribeira,
O rio, em delírio,
O rio, desconectado da vida,
E, corre,
E, dorme,
Nas almas do mar.
O mar tudo engole, e, tudo mastiga,
Pessoas, lixo, palavras, o vento…
Uma laranja, sofre,
E, vive,
E, morre,
Dentro da laranja adormecida.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
24/02/2020

sábado, 7 de dezembro de 2019

Não sei


Não sei!
Não sei o que é adormecer,
Sorrir,
Sonhar,
Ou simplesmente viver.
Porque tu existes, e vais partir,
O Sol acordar,
Não sei que sei que chorei!
Ninguém quer saber,
Nem importa o que vamos fazer,
Se faz Sol ou está a chover,
Ou corremos sem correr…
És flor adormecida,
Muito bela e querida…,
Manhã submersa esquecida
Á procura da vida.
Pétala de ternura
Eterna brancura,
Olhar cansado com bravura,
Que se despedaça de grande altura…
Não sei!
Não sei o que é voar,
Viver,
O que são electrões,
Pensamentos metalúrgicos ao acordar,
Treliças que quero esquecer.
Fundem-se protões,
E de tanto te olhar…, me cansei!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Para publicação

sábado, 5 de outubro de 2019

Livro salgado


Se eu pudesse, dava-te o Sol.

Se eu pudesse, eliminava de ti todas as tristezas…

Se eu pudesse, dava-te a lua e o luar.

Se eu pudesse, oferecia-te o mar…

Embalsamado.

Escrito por palavras.

Num livro salgado.

Ai se eu pudesse, meu amor!

 

Ai se eu pudesse!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

05/10/2019

sábado, 5 de maio de 2018

Sinfonia


Sentia-me obtuso com a tua simplicidade dos jardins adormecidos; uma flor poisa ruidosamente no teu rosto. O acordar!

Sentia-me confuso com o silêncio dos teus lábios, flácidos, cansados das minhas pobres mãos,

O sono.

Sentia-me perdido na seara da solidão,

Quando os pássaros escreviam palavras na eira, era Verão, e a candeia perdia-se sobre a mesa do esquecimento,

Me levanto,

E pego no Sol.

Me levanto,

E pego no silêncio que traz o Sol,

Sentia-me uma pomba quando o teu corpo desleixado aterrava no meu olhar,

Uma réstia de alegria,

Uma sinfonia para brincar…

E ouvia desenfreadamente os sons da alvorada.

Como eu queria ser criança…

 

 

 

Alijó, 5 de Maio de 2018

Francisco Luís Fontinha

domingo, 27 de agosto de 2017

Coração de pedra


Todas as torres têm vertigens,

Nos teus olhos brincam as searas encantadas da tarde,

Ultraje, viagem desassossegada ao infinito,

No medo, no cansaço de te perder nos lençóis da dor…

Como uma serpente acorrentada, só, dentro de casa,

O feitiço obscuro das tuas mãos, além o indesejado coração de pedra…

Triste, e frio como a geada,

Suspenso em cada madrugada,

 

A fotografia prateada, esquecida em cima da secretária, os livros enervam-me, e oiço o cantar das personagens antes de nascer o dia,

A morte traz a noite, a noite constrói a dor, e o sofrimento alimenta-se das tuas pálpebras de granito,

 

Serei o teu guardião das noites mal dormidas, o esqueleto de xisto que habita no teu peito, sempre ofegante, sempre engasgado pelo sonâmbulo cacimbo,

E na sanzala há uma esfera límpida de carvão…

Como são todos os cigarros que me acompanham,

Sinto a despedida,

Sinto a partida…

 

Até que um dia nascerá o sol, e tudo são apenas más recordações, papéis velhos e alguns trapos de Inverno,

 

Tudo cessa,

Como cessam as cordas da forca antes do enforcado se despedir da mãe.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 27 de Agosto de 2017

sexta-feira, 30 de junho de 2017

Viver

Que sobre o amor nada tenho a dizer,
Saboreio a vida com prazer,
Todos os dias ao acordar,
Danço, escrevo e consigo navegar
Nos teus braços de manteiga,
Aceito,
Amo,
Percorro caminhos obscuros da maternidade…
Tenho em mim a saudade,
Da verdade,
Da sabedoria de nada saber…
A não ser…
Que a morte existe,
Persiste…
Persiste em me atormentar,
Navego no teu colo nascer do sol,
Quando o tempo se esquece de mim,
Tenho o teu jardim,
Desenhado,
Desenhado num caderninho…
Num caderninho dentro de mim,
Que sobre o amor nada tenho a escrever,
A não ser,
Viver.


Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 7 de junho de 2017

(a mim?)


Rareiam por aqui as esquinas de luz do teu corpo,

Forço um beijo de sombra que habita no meu quarto,

Desenho nele a solidão de um final de tarde…

 

E sei que não voltarei mais.

 

(a mim?)

 

A ti, a mim e a esta terra que me acorrenta e mata,

A esta terra que me aprisiona desde criança

Como se eu fosse um Tiranossauro REX descendo a montanha do “Adeus”,

E lá longe a longínqua caneta enterrada no granito abraço,

(queres cerejas?)

Não. Não gosto de cerejas…

Olha! Olha, as laranjas do nosso quintal já são comestíveis,

Tão doces, tão doces como as tuas queridas mãos enfeitadas por flores, arbustos e lábios lacrimejantes, opiáceos livros de poesia poisados na nossa janela,

Quando a rua está deserta.

Não te entendo!

Não precisas de me entender…

 

Amanhã vais dizer que sou um vagabundo cambaleando pelos plátanos com leves folhas doiradas de tristeza,

A sátira perdida que apelidava o meu transeunte corpo de chocolate…

Com o calor…

Derrete. Morre.

 

E sei que não voltarei mais.

 

(a mim?)

 

Á vida. Não voltarei mais à escrita de estórias desalojadas numa quinta-feira à tarde, quando os miúdos regressam da escola e tu estás sentada na varanda a fazer pássaros de papel,

 

Tudo.

 

Ou nada.

 

O que importa é estar vivo…

 

Desde que nasce o Sol até ser noite.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 7 de Junho de 2017

quarta-feira, 11 de maio de 2016

Retalhos


A vida é construída de pequenos retalhos,

Corpos em geada

E orvalhos,

Farrapos entre velharias

E trapos,

A vida pertence ao luar,

Quando de um suspiro

Grita em mim o mar,

E num sorriso

Tu sentias

O sabor do madrugar,

Que a vida, construída de pequenos retalhos… consegue abraçar,

 

Cansado, não respiro,

E insisto na vida sem despertar,

 

Os livros,

As palavras esmagadas no silêncio da alvorada,

O corpo cessa de respirar,

Levita

Madruga

E inventa barcos de brincar,

 

A vida é construída de pequenos retalhos,

Corpos em geada

E orvalhos,

Gente simples dormindo na calçada,

Meninos de sombra que desenham na mão o sol,

Aldeias sós, homens confundidos com aldeias sós…

A vida atrapalha,

Esmaga a penumbra madrugada,

E a canalha

Toca com os lábios

O rio entre rochedos

E brinquedos,

 

Cansado, não respiro,

E insisto na vida sem despertar…

 

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 11 de Maio de 2016