O poema dorme nas pernas
da laranja.
As pernas da laranja,
quando acordam, adocicam as palavras escritas pelo poeta,
Quando a mulher do poeta,
é a própria laranja.
Sou, por vezes, apedrejado
por energúmenos, mas não me importo.
Sou simples, como todas
as palavras do poema.
Amo o poema,
Sou amado, como a amante
do poeta, ama o poema e,
Todas as noites,
Uma laranja abre as coxas
recheadas de sombra,
Lá fora, fios de geada
brincam com a caneta do poeta,
Porque sendo ele, às
vezes, apedrejado, continua a fabricar palavras quando cai a noite.
A caneta do poeta,
apaixonou-se pela amante do poeta;
Podia ser trágico, podia
ser infidelidade… mas o que os separa são apenas palavras,
Gritos ao ouvido que ela
tanto adora.
Acabaram-se os cigarros.
Sobre a mesa da sala, um volume de cigarros espera-o, como o espera a caneta, o
papel e, os ouvidos da amante que ele a todos os momentos lhe sussurra; AMO-TE.
Poderia escrever-te a todas
a horas, minutos, segundos, ou nunca te escrever.
As palavras invisíveis
são as mais apetecidas, são escritas no silêncio entre o sono e o sonho.
São como a geada; leves,
tranquilas, doces até.
O poema dorme nas pernas
da laranja.
E se a laranja é as coxas
da amante do poeta, como se apelidará o seu saboroso sumo, dúctil nas manhãs de
Inverno?
Saltita.
Brinca na areia branca da
manhã os esqueletos da noite passada,
Pequenas ranhuras nas
paredes do cubículo que acesso ao sótão; sempre quis ter um sótão imaginário,
apenas para mim.
Um sótão onde poderia
brincar, escrever, pensar e, manusear a laranja.
Francisco Luís Fontinha,
Alijó-19/01/2021