sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

flores de papel

foto de: A&M ART and Photos

acreditava que habitavas as perfumadas flores de papel
tínhamos dentro de nós uma aldeia em combustão
sentíamos os impulsos das revistas sobejantes dos quiosques de cartão
líamos coisas desinteressantes
coisas... coisas supérfluas que depois de mortas
acreditavam
como eu acreditava
que habitam nas flores perfumadas de papel
os velhos espantalhos de vidro
com chapéu de palha
uma árvore rangia
e sentíamos-lhe o rosnar dos pulmões nas ardósias tardes dos cigarros em delírio...
livros com desenhos abstractos
e palavras inacessíveis à nossa voz
as mãos tuas traziam às minhas mãos de xisto esmigalhado as tristes sílabas da madrugada
acreditava
acredito?
não mais... que existem dias de tédio
horas de sofrimento
relógios de pulso cancerosos porque alguém os decretou como tal...
as horas passam
os dias afundam-se no cais transversal das salinas em pastel...
livros
com... abstractos desenhos e pedaços de pólvora seca para deitarmos na lareira das lágrimas encarnadas
o jornal acaba de morrer
no caixão poucas ou nenhumas fotografias a preto-e-branco para alicerçarem o esqueleto à madeira de mogno
eu acreditava
acreditava nas tuas minhas mãos de porcelana envenenada e no entanto o relógio...
o cabrão do relógio... também ele morre
também ele... foge de nós como todos os homens de pedra do jardim dos angustiados camafeus
a lareira recorda-nos as fogosas noites de neblina
embrulhados na vodka da Ajuda
descíamos a Calçada... e nada
gritávamos... e nada
e a ponte dilacerada... adormecia
e sonhava que... acreditava nas perfumadas flores de papel


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 6 de Dezembro de 2013

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

não dormem mas... também não sonham

foto de: A&M ART and Photos

Tristemente invadido pelas análises clínicas dos perfumados jardins das jangadas embebidas em cianeto e outras
Escadas?
Palavras, não o sei, não o consigo perceber, talvez este verso alimentado pela inveja encontre dos triângulos dos dias tristes as algas masturbadas dos rios envenenados pelo doce odor da paixão, do cinismo...
As escadas...
Nunca tive Sábados, e à Sexta-feira tínhamos Açorda de Marisco, pão, vinho e sobremesa,
A sério?
Tristemente invadido pelos machimbombos da insónia, escondia-me de ti, debaixo da mesa no quintal das bananeiras, mangueiras e outras … eiras
Carvalhais,
Sexta-feira,
Eles não sabiam que tínhamos almoçado, traziam-nos coisas estranhas, comíamos tardíssimo porque acreditávamos que havia fantasmas que roubavam a comida dos pobre, e as tuas mãos abraçavam-se à minha cintura rechuxuda, hirta... fria como a geada de hoje à noite, e dizias-me que todas as árvores são como os pássaros quando são velhos...
Não voam, não voam mas também não andam, não bebem... e também não pagam, e também,
As escadas?
Sexta-feira,
Tristemente...
Aquele beijo que ficou esquecido sobre a mesa-de-cabeceira, aquele sorriso impregnado na vidraça estilhaçada da janela com fotografia para o quelho, aquele abraço perdido dentro dos cobertores da inocência, aquele beijo, aqueles teus lábios em pétalas que o desejo sobejou das tardes perdidas, aqueles livros poeirentos abandonados na estante do corredor, aquele teu alicerçado seio sobre a minha solidão, claro... imortal na cama em tardes de neblina, imortal no jardim dos clandestinos Domingos...
Sábados à tarde,
Sexta-feira à noite,
Aquele beijo, aquela melodia adormecida sobre os abajures da melancolia, aquele dia com palavras de luar, aquela madrugada com talheres em prata, e corpos, corpos de nata...
E ouvíamos o beijo esquecido das gaivotas em cio, e ouvíamos os tristes carris da liberdade mergulharem nas montanhas de papel como lagartas e outros bichos, coitados
Procurando,
Coitados...
Caminhando..., o beijo esquecido das gaivotas em cio, procurando as cinzas do casebre abandonado depois de partirem todas as árvores do destino que acompanhavam as alegres palavras comedidas pelas mãos de giz... aquele divã onde te deitavas, e eu, eu sobre ti entranhava-me nos teus gemidos invisíveis dos xistos borboletas em voos de andorinha, coitados...
De nós...
Deles...
O beijo esquecido das gaivotas em cio, o barco apodrecido no cais que alguém pintou nas paredes do velho bar de marujo embriagado, dizes-me que não, e eu, eu sinto-me dentro de ti como se eu fosse o teu feto indesejado, aquele que não queres, nunca quiseste... a gaivota dilacerada nas velhas nuvens de oiro... imortal no jardim dos clandestinos
Domingos...
Sábados à tarde,
Sexta-feira à noite,
E não bebem, e não pagam, não dormem mas... também não sonham,
As escadas?
Tristemente tristes, tristemente... sós, sós, talvez só às vezes tristemente sós...
O beijo dilacerava-se, o beijo derretia-se como chocolate, a Açorda de Marisco, uma simples sopa de hortaliça, pão e o vinho, tudo pela módica quantia de
Os beijos pareciam migalhas de pão abandonadas sobre a mesa de ébano, cheirava a naftalina, a toalha pertencia aos objectos escondidos como as pratas que deixaram de existir desde eu criança, como as porcelanas e todo o marfim, tínhamos falido, e vivíamos como Príncipes imperfeitos vestidos de carrancudos criados sem ofensa para vossemecê meu grande amigo
As escadas?
E pela módica quantia de dois beijos e uma sexta-feira...
Açorda de Marisco, uma simples sopa de hortaliça, pão e o vinho, tudo a estrear, excepto o vinho, que esse, esse já era em quarta ou quinta mão,
Sexta-feira, amanhã, a estrear, o beijo esquecido das gaivotas em cio, o barco apodrecido no cais que alguém pintou nas paredes do velho bar de marujo embriagado, dizes-me que não, e eu, eu sinto-me dentro de ti como se eu fosse o teu feto indesejado, aquele que não queres, nunca quiseste... a gaivota dilacerada nas velhas nuvens de oiro, e eu, eu inventado Açordas de Marisco, sopa, pão... e o vinho, e o vinho parecendo água depois das tempestades de...
Sexta-feira, Sábado, e Sexta-feira temos
Açorda de Marisco... e vinho, e vinho, tristemente... só. Só.
(onde está a sobremesa, raios?)


(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 5 de Dezembro de 2013

cinzas ruelas o amor

foto de: A&M ART and Photos

as cinzas em ruelas
misturam-se no teu dúctil corpo de silício castanho
sei que deixaste de me ouvir depois das ferrugentas pontes de solidão dormirem nos teus lençóis de adormecidas nuvens brancas
senti pela primeira vez a dor
o sofrimento...
… o medo de perder as palavras que um dia deixarei para ti sobre a lápide do desejo
as cinzas
vão voar sobre os cortinados de nylon como cordas que aprisionam barcos às cidades de madeira
as cinzas
espalha-se sobre as tuas peugadas
vozes e lábios de cetim nas amoreiras janelas dos habitantes do jardim onde nos sentávamos...
… e dormíamos como sonâmbulos esqueletos apaixonados.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 5 de Dezembro de 2013

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

labaredas de palavras

foto de: A&M ART and Photos

não tenho vida
como as outras pessoas
com vida...
agacho-me e sinto nos tornozelos o silêncio do capim em delírio
e aos beijos
sento-me e oiço as pontes invisíveis da solidão que esperam o regresso das gaivotas
os barcos
e os caixões de aveia
não tenho
e nunca tive
vida como as outras pessoas
com... vida desenhada num pedaço de papel e transcrita no espelho... da vida

não tenho vida
como as outras árvores plantada na vida
com vida...
desisto
e invento labaredas de palavras para alicerçar os cacos restantes da...
… da minha não vida
não tenho
não quero... capas de pano sobre os meus joelhos de tédio
havia uma mão enfeitada com a aurora boreal das madrugadas vãs
entre escadas e varandas
há janelas como também... sem vida
tristes tristes porque a vida não vive em pessoas como nós... em pessoas de pedra com olhos de noz


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 4 de Dezembro de 2013

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

mil beijos depois...

foto de: A&M ART and Photos

eu sabia que não voltava a ouvir o som estaladiço das tuas mãos sobre o meu peito
percebi quando se extinguiram todas as lâmpadas do silêncio que existiam debaixo da ponte dos sofrimentos
havia dor
havia dor masturbada na simplicidade da doença
havia morte que se entranhava nos ossos ocos da solidão
eu sabia
eu sabia que não voltava a sentir os teus mergulhados dedos nos meus amargurados lábios
e dos meus olhos
lágrimas
gotículas de suor que se desprenderam do icebergue da desgraça
o tecto de colmo
ruiu
como o teu corpo sobre uma cama de ferro em cinzento leito
havia beijos
havia cinzeiros de nicotina esperando o regresso da madrugada
eu sabia
eu percebia...
que nunca mais regressava
que era impossível acreditar nos límpidos anzóis de naftalina
eu dormia
eu fingia que dormia
mas não dormia
porque era impossível adormecer embrulhado a um cadáver de pano...
o cigano Moisés implantado sobre os colchões de areia das tempestades de xisto
e eu
e o tecto de colmo...
no pavimento térreo... esperando que te levantasses
esperando...
esperando que acordasses das malignas manhãs de poesia
mil beijos
um
apenas... um abraço... para te aconchegar antes de partires...
escreveste as últimas palavras escritas das vozes roucas da partida
e eu sabia
que... não voltava a ouvir o som estaladiço das tuas mãos sobre o meu peito...
e... mil beijos depois... acordaste para mim.



(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 3 de Dezembro de2013

segredo

foto de: A&M ART and Photos

o segredo transversal das caravelas de nariz curto
ouve-se dentro dos círculos verdes nos desejos andaimes das gaivotas embriagadas...
temos medo do segredo
medo que habitem na vizinha lareira os torneados espantalhos de pedra
o segredo existe
e vive
e dorme...
dorme docemente nas veredas nuvens da sinceridade...
o corpo em segredo estremece
tomba como sonâmbulos ouriços vomitando castanhas
vozes
e palavras em segredo
e palavras
palavras... em medo
o segredo segreda-nos os uivos do desejo poema entrelaçado na alvorada manhã...
escrevem-se as palavras no corpo
(o tal corpo em segredo)
sente-se o medo
e senta-se o medo nas cadeiras de praia sobre a branca areia do Mussulo...
sei que não percebes as minhas palavras de medo
como as outras
as palavras em segredo...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 3 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

come-a e vêem-se e vêm-se as limalhas do silêncio

foto de: A&M ART and Photos

o desespero da sorte
quando o furacão do infinito se entranha na morte
come-a e vêem-se e vêm-se as limalhas do silêncio à mão da solidão
a tristeza é uma palavra esquisita uma palavra incerta uma palavra sem coração
que habita nos corpos sãos e nos esqueletos invisíveis dos horários relógios enlouquecidos
o desespero da sorte
a sorte porque se desespera a vida
inventando noites frias
e rouquidão como companhia...
o dia
alicerça-se à retroversão dos comboios em movimento
morre-se e leva-nos o vento

a palavra tristeza
engasga-se nas ardósias tardes do xisto com portas de aço
o castigo aparece
e o corpo aloca-se na encosta da montanha vulcânica do cemitério da poesia...
farto-me
canso-me
findo-me... como o desespero da sorte...
...não tendo sorte (diz-me ele)

habito neste triste cubo de vidro
sou um aquário aquariano vestido de rio
sou uma ponte que engata gaivotas
ou... um lindo vestido negro que engata cigarros apaixonados
tontos e viciados
embriagados como os pássaros que poisam nos teus ombros
como a palavra tristeza...
alegre quando é de noite
e feia e velha... quando a lareira acesa se abraça ao fumo das campânulas envidraçadas
têm olhos de papel
têm e vêm acompanhadas de pulseiras em prata
como os coiratos da roulote da tia Adosinda...

(a esta “merda” uns chamam de vida
outros... de... não ter sorte...
… eu... eu chamo-lhe de morte...
porque a morte é uma tristeza sem sorte...
… é um rio sem vida)


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 2 de Dezembro de 2013

domingo, 1 de dezembro de 2013

sem-nome

foto de: A&M ART and Photos

não tínhamos nome
perdemos-nos na idade enquanto poisava no tecto do desejo a saudade
inventávamos estórias com pequenos paus de fósforo
aqueles...
que sobejavam dos cigarros perdidos na madrugada
não dormíamos
e não tínhamos nada...
cama
roupa
ou comida
lavada
não tínhamos nome
(morada
idade
sexo
não éramos nada comparados com os tristes cortinados das alvoradas sem tempestade)
percebíamos nada de poesia
tínhamos medo da literatura
e durante a noite...
dormíamos embrulhados às personagens que tínhamos lido quando ainda existia em nós a tarde junto ao candeeiro cinzento do jardim nocturno dos abismos rochedos de néon
os sexos mergulhavam na ponte metálica das treliças mãos que o desejo deixava em nós...
calculávamos o momento fletor das nádegas tuas quando lá fora uma equação de tédio
sem nome como nós
também
perdia-se nas sanzalas dos olhos verdes
o medo absorvia-nos
e a morte aos poucos
comia-nos como come os marinheiros de ombros sombreados nos petroleiros do fantasma envidraçado...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Dezembro de 2013

sábado eu só sempre aqui além como uma serpente

foto de: A&M ART and Photos

sábado
os caixões da insónia silenciados na parada dos sonhos
os ventos longínquos das manhãs que dormiam na tua mão
não mais dormirão
evaporaram-se como pequenas gotículas de suor depois da tempestade
solidão
palavra desconhecida que o meu corpo absorve como mandíbulas metálicas
os olhos cansam-se como se cansam as pernas de cristal dos azulejos brancos
sempre
desde que partiram as gaivotas teus abraços para destinos inventados
viagens sem limite

sábado
a solidão
eu só
sempre
os caixões da insónia
a serpente
e mente
ela
ele
as ruas numeradas que habitam a cidade dos reumáticos assentos de prata
fidelidade
feliz

infeliz
o sábado
à saudade
aplique depois de seco
mergulhar supérfluamente como Dálias em jardins de pedra
e eu minguado
e eu
eu triste
porque sábado
eu

(apenas eu
como uma cadeira onde te sentas e sinto a tua pele...)


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo. 1 de Dezembro de 2013

anti-horário

foto de: A&M ART and Photos

um silêncio de sombras perfumadas emagrece na solidão noite desencantada
ouvem-se-lhes as palavras suspensas no armário do cansaço
a parede estremece
desloca-se no sentido anti-horário
e a cabeça tomba sobre o laminado pavimento de vento

há palavras proibidas
e proibidas flores habitam os jardins dos solstícios envenenados
um silêncio de nada
em nada na cama da madrugada
há sombreadas manhãs não perfumadas e perfumadas sombras

sombras sombreadas que as mãos esquecem
aquecem
e dilatam-se como a pólvora alvorada dos sinos em desalinho
e se eu pudesse
e se eu quisesse... escreveria a última palavra sombreada...

a palavra curta
desalinhada
a palavra das palavras sombreadas
a palavra desabitada... quando acorda o luar numa janela estilhaçada
escreveria... AMO-TE... e mais nada


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Dezembro de 2013