quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

labaredas de palavras

foto de: A&M ART and Photos

não tenho vida
como as outras pessoas
com vida...
agacho-me e sinto nos tornozelos o silêncio do capim em delírio
e aos beijos
sento-me e oiço as pontes invisíveis da solidão que esperam o regresso das gaivotas
os barcos
e os caixões de aveia
não tenho
e nunca tive
vida como as outras pessoas
com... vida desenhada num pedaço de papel e transcrita no espelho... da vida

não tenho vida
como as outras árvores plantada na vida
com vida...
desisto
e invento labaredas de palavras para alicerçar os cacos restantes da...
… da minha não vida
não tenho
não quero... capas de pano sobre os meus joelhos de tédio
havia uma mão enfeitada com a aurora boreal das madrugadas vãs
entre escadas e varandas
há janelas como também... sem vida
tristes tristes porque a vida não vive em pessoas como nós... em pessoas de pedra com olhos de noz


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 4 de Dezembro de 2013

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

mil beijos depois...

foto de: A&M ART and Photos

eu sabia que não voltava a ouvir o som estaladiço das tuas mãos sobre o meu peito
percebi quando se extinguiram todas as lâmpadas do silêncio que existiam debaixo da ponte dos sofrimentos
havia dor
havia dor masturbada na simplicidade da doença
havia morte que se entranhava nos ossos ocos da solidão
eu sabia
eu sabia que não voltava a sentir os teus mergulhados dedos nos meus amargurados lábios
e dos meus olhos
lágrimas
gotículas de suor que se desprenderam do icebergue da desgraça
o tecto de colmo
ruiu
como o teu corpo sobre uma cama de ferro em cinzento leito
havia beijos
havia cinzeiros de nicotina esperando o regresso da madrugada
eu sabia
eu percebia...
que nunca mais regressava
que era impossível acreditar nos límpidos anzóis de naftalina
eu dormia
eu fingia que dormia
mas não dormia
porque era impossível adormecer embrulhado a um cadáver de pano...
o cigano Moisés implantado sobre os colchões de areia das tempestades de xisto
e eu
e o tecto de colmo...
no pavimento térreo... esperando que te levantasses
esperando...
esperando que acordasses das malignas manhãs de poesia
mil beijos
um
apenas... um abraço... para te aconchegar antes de partires...
escreveste as últimas palavras escritas das vozes roucas da partida
e eu sabia
que... não voltava a ouvir o som estaladiço das tuas mãos sobre o meu peito...
e... mil beijos depois... acordaste para mim.



(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 3 de Dezembro de2013

segredo

foto de: A&M ART and Photos

o segredo transversal das caravelas de nariz curto
ouve-se dentro dos círculos verdes nos desejos andaimes das gaivotas embriagadas...
temos medo do segredo
medo que habitem na vizinha lareira os torneados espantalhos de pedra
o segredo existe
e vive
e dorme...
dorme docemente nas veredas nuvens da sinceridade...
o corpo em segredo estremece
tomba como sonâmbulos ouriços vomitando castanhas
vozes
e palavras em segredo
e palavras
palavras... em medo
o segredo segreda-nos os uivos do desejo poema entrelaçado na alvorada manhã...
escrevem-se as palavras no corpo
(o tal corpo em segredo)
sente-se o medo
e senta-se o medo nas cadeiras de praia sobre a branca areia do Mussulo...
sei que não percebes as minhas palavras de medo
como as outras
as palavras em segredo...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 3 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

come-a e vêem-se e vêm-se as limalhas do silêncio

foto de: A&M ART and Photos

o desespero da sorte
quando o furacão do infinito se entranha na morte
come-a e vêem-se e vêm-se as limalhas do silêncio à mão da solidão
a tristeza é uma palavra esquisita uma palavra incerta uma palavra sem coração
que habita nos corpos sãos e nos esqueletos invisíveis dos horários relógios enlouquecidos
o desespero da sorte
a sorte porque se desespera a vida
inventando noites frias
e rouquidão como companhia...
o dia
alicerça-se à retroversão dos comboios em movimento
morre-se e leva-nos o vento

a palavra tristeza
engasga-se nas ardósias tardes do xisto com portas de aço
o castigo aparece
e o corpo aloca-se na encosta da montanha vulcânica do cemitério da poesia...
farto-me
canso-me
findo-me... como o desespero da sorte...
...não tendo sorte (diz-me ele)

habito neste triste cubo de vidro
sou um aquário aquariano vestido de rio
sou uma ponte que engata gaivotas
ou... um lindo vestido negro que engata cigarros apaixonados
tontos e viciados
embriagados como os pássaros que poisam nos teus ombros
como a palavra tristeza...
alegre quando é de noite
e feia e velha... quando a lareira acesa se abraça ao fumo das campânulas envidraçadas
têm olhos de papel
têm e vêm acompanhadas de pulseiras em prata
como os coiratos da roulote da tia Adosinda...

(a esta “merda” uns chamam de vida
outros... de... não ter sorte...
… eu... eu chamo-lhe de morte...
porque a morte é uma tristeza sem sorte...
… é um rio sem vida)


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 2 de Dezembro de 2013

domingo, 1 de dezembro de 2013

sem-nome

foto de: A&M ART and Photos

não tínhamos nome
perdemos-nos na idade enquanto poisava no tecto do desejo a saudade
inventávamos estórias com pequenos paus de fósforo
aqueles...
que sobejavam dos cigarros perdidos na madrugada
não dormíamos
e não tínhamos nada...
cama
roupa
ou comida
lavada
não tínhamos nome
(morada
idade
sexo
não éramos nada comparados com os tristes cortinados das alvoradas sem tempestade)
percebíamos nada de poesia
tínhamos medo da literatura
e durante a noite...
dormíamos embrulhados às personagens que tínhamos lido quando ainda existia em nós a tarde junto ao candeeiro cinzento do jardim nocturno dos abismos rochedos de néon
os sexos mergulhavam na ponte metálica das treliças mãos que o desejo deixava em nós...
calculávamos o momento fletor das nádegas tuas quando lá fora uma equação de tédio
sem nome como nós
também
perdia-se nas sanzalas dos olhos verdes
o medo absorvia-nos
e a morte aos poucos
comia-nos como come os marinheiros de ombros sombreados nos petroleiros do fantasma envidraçado...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Dezembro de 2013

sábado eu só sempre aqui além como uma serpente

foto de: A&M ART and Photos

sábado
os caixões da insónia silenciados na parada dos sonhos
os ventos longínquos das manhãs que dormiam na tua mão
não mais dormirão
evaporaram-se como pequenas gotículas de suor depois da tempestade
solidão
palavra desconhecida que o meu corpo absorve como mandíbulas metálicas
os olhos cansam-se como se cansam as pernas de cristal dos azulejos brancos
sempre
desde que partiram as gaivotas teus abraços para destinos inventados
viagens sem limite

sábado
a solidão
eu só
sempre
os caixões da insónia
a serpente
e mente
ela
ele
as ruas numeradas que habitam a cidade dos reumáticos assentos de prata
fidelidade
feliz

infeliz
o sábado
à saudade
aplique depois de seco
mergulhar supérfluamente como Dálias em jardins de pedra
e eu minguado
e eu
eu triste
porque sábado
eu

(apenas eu
como uma cadeira onde te sentas e sinto a tua pele...)


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo. 1 de Dezembro de 2013

anti-horário

foto de: A&M ART and Photos

um silêncio de sombras perfumadas emagrece na solidão noite desencantada
ouvem-se-lhes as palavras suspensas no armário do cansaço
a parede estremece
desloca-se no sentido anti-horário
e a cabeça tomba sobre o laminado pavimento de vento

há palavras proibidas
e proibidas flores habitam os jardins dos solstícios envenenados
um silêncio de nada
em nada na cama da madrugada
há sombreadas manhãs não perfumadas e perfumadas sombras

sombras sombreadas que as mãos esquecem
aquecem
e dilatam-se como a pólvora alvorada dos sinos em desalinho
e se eu pudesse
e se eu quisesse... escreveria a última palavra sombreada...

a palavra curta
desalinhada
a palavra das palavras sombreadas
a palavra desabitada... quando acorda o luar numa janela estilhaçada
escreveria... AMO-TE... e mais nada


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Dezembro de 2013

sábado, 30 de novembro de 2013

O amor das pedras cinzentas...

foto de: A&M ART and Photos

Ofereceu a bala inseminada com as impressões digitais do poema em construção, poisou os cotovelos sobre a iluminada folha de papel com meia dúzia de palavras, leu e releu e puxou o gatilho da caneta de tinta permanente sobre a secretária em pinho, voaram sobre a biblioteca todas as gaivotas de porcelana que permaneciam entre os livros e outras bugigangas, aos poucos, como silêncios de um pêndulo cansado, foram cessando as agonias do homem poeta da caneta de prata, uma bala silenciada adormecia-se como flores numa jarra, dentro dele apenas se ouviam as esquina de luz do espelho prateado,
A saudade submergiu do corpo caído sobre a secretária, ouvias as minhas preces como quem escreve um livro infinito, uma estória que só termina quando duas rectas tristes e sós se encontram
No infinito,
Dizem-me, eles,
A saudade é filha da balda da caneta de prata, as palavras morreram como morreram os teus sorrisos e como morreram as tuas caricias e como morreram as tuas mãos sobre o meu peito em feitiço... e como morreram
Quem quem morreu?
Como morreram os fantasmas dos roseirais de Luanda, e há uma filme escondido nas paredes de um casebre, na parede traseira uma placa com a inscrição de “FIM” aparece
Desaparece
E morreram os teus lábios nos meus lábios quando entrelaçados nos meus cabelos as lições de piano, o som melódico das teclas borbulham nos alicerces da madrugada, ofereceu a bala e suicidou-se com a caneta de prata
Sentia o cheiro intenso da tinta derramada nas alvenarias como desenhos abstractos que os teus olhos inventaram nas prateleiras velhas, nas prateleiras caducas, morreram os teu seios nos meus lábios, morreram as tuas cintilantes pálpebras nos cadeados de estanho, e ouvia-te das lágrimas os aplausos nas cantigas dos rabugentos e enferrujados barcos,
O aço é um corpo só, velho, flácido... o aço vive cambaleando suaves beijos em desleais palavras em mendigas sílabas de verdes olhos procurando a noite reconstruída e morreram os teus dedos que procuravam em mim
Quem quem morreu?
A bala, procuravam em mim a caneta de prata o suicídio fictício das palavras,
Quem quem morreu?
A bala, procuravam em mim as sombras desnorteadas das tardes de Segunda-feira, e eu, eu sabia-o, admitia-o... que um dia, tu, a bala e a caneta de prata... invadiriam o meu silêncio, um dia, tu, eu, que um dia, tu, a bala e a caneta de prata... invadiriam o meu sofrimento de lírio apaixonado, deitado sobre a secretária da
Saudade?
Que morreram as tuas peugadas absorvidas pelo meu pesadíssimo corpo em aço, só, velho, flácido... o aço vive cambaleando suaves beijos em desleais palavras em mendigas sílabas de verdes olhos procurando a noite reconstruída e morreram os teus dedos que procuravam em mim
Quem quem morreu?
A saudade,
(só, velho, flácido... o aço vive cambaleando suaves beijos em desleais palavras em mendigas sílabas de verdes olhos procurando a noite reconstruída e morreram os teus dedos que procuravam em mim)
Quem quem morreu?
Quem quem morreu?
O amor das pedras cinzentas...
FIM.


(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 30 de Novembro de 2013

cigarros embalsamados

foto de: A&M ART and Photos

salivas-me as serpentes de fogo do relógio nocturno da escuridão
havíamos construído o pêndulo do desejo
que ficou no centro do vulcão teu beijo
às derramadas sílabas que a paixão enfurece
emagrece a montanha branca das ribeiras desertas
abraças-me em longos ramos de cetim
que escondem as janelas do quadriculado caderno das madrugadas embainhadas nos pulmões das aranhas de silício castanho
salivas-me as velhas cinzas dos cigarros embalsamados
e sinto-lhes o cheiro dos esqueletos de palha quando mergulham no rio dos Luares apaixonados
uma gaivota poisa nos teus seios de cartão
e sinto-te prisioneira das amarras vagabundas nas ruelas envergonhadas
salivas-me e deixo de ouvir os teus brincos telintarem nas lâminas dos veados negros
uivam os lobos do teu orgasmo
entre geadas e plumas num bar desgovernado quando me salivas as palavras prometidas então...
a púmice enrola-se nos sabres de luz teu corpo de orvalho
a alvorada estrelar das amêndoas com chocolate derretem-se nos teus lábios que me salivam as vozes íngremes desvairadas que o Inverno inventa nas lareiras do orgulho
tenho medo de ti
como sempre o tive quando vinham na minha direcção os eléctricos e as marés de sémen dos homens apátridas que a tempestade recriou no cenário da vaidade
sinto-lhes o cheiro a vodka quando atracam nos meus ombros sombreados
e pareço um transeunte mendigo de fotografia na lapela
um doente mental diplomado
descendo e subindo
escadas corpos medos
e salivas-me como se eu fosse uma rosa encarnada a envelhecer numa jarra falseada...



(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 30 de Novembro de 2013

um homem sem versos

foto de: A&M ART and Photos

a alegria doirada das gaiolas de silício
permaneço intacto dentro deste amargo cubículo
invento amores como a tempestade desenha ventos nas paredes do silêncio
e espera-me o sacrifício da solidão
entre quatro velhas paredes caquécticas
reumáticas
envelhecidas meninas
como serpentes diabólicas nas algibeiras da madrugada
sou teu cumplicie
sou teu... amante desembargado dos tristes alicerces nocturnos em meandros pronomes...
sou um texto sem alma sem coração sem palavras lindas como teus lábios malignos dos solstícios envergonhados

sou uma palavra não escrita
sou um buraco negro esquecido no frio Universo
um buraco de minhoca
um homem sem versos

sou uma paixão envergonhada
alvorada como a alegria doirada das gaiolas de silício
um cordel voando sobre os telhados do desejo
um papagaio entranhado nos teus seios...
a alegria perde-se nas profundezas ranhuras do púbis em delírio...
sou uma paixão
um livro sem palavras
um homem sem versos
reumáticas
envelhecidas meninas
como serpentes diabólicas nas algibeiras da madrugada
sou teu cumplicie

não sou nada.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 30 de Novembro de 2013