foto de: A&M ART and Photos
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Esquilos, nozes em vozes, mamilos denegridos,
absortos, lábios lânguidos, corpos absolutamente sós, como eles, e
como nós, os vizinhos quando lhe batiam à porta em maciça madeira,
ele, ainda embriagado pela poesia não escrita, escondia-se,
fazia-se... morria, não percebendo depois, que tudo era a fingir,
acordava, voltava a dormir, deixou de sorrir, deixou de viver, não
queria passear-se pelas cansadas margens de um doente rio, vivia-se,
e ia-se vivendo, não sabendo, nunca, o horário penumbro das
amendoeiras em flor,
Descia-se,
Subia-se,
E chorava-se,
Esquilos vaidosos roendo nozes de brincar, fantasia,
histórias ao almoçar, sobre uma pequena mesa, de pedra, no quintal,
uma árvore e um pássaro, preto, bico amarelo,
Melro?
Melro, talvez, porque não?
Inchados, os pilares de areia que seguram as amarras
das tristes varandas com murchas flores, ao longe, a praia, o
silêncio, o corredio de machimbombos vomitando sonhos adormecidos
entre o Baleizão e o Mussulo, batiam-me à maciça madeira porta,
eu, eu escondia-me, ou simplesmente berrava
Não estou em casa, hoje,
E eles, elas, acreditavam..., tão parvos, e
continuava fingindo dormir, quando na verdade, eu, eu estava morto,
desde criança, morri, recordo-me vagamente, tinha alguns poucos, não
muitos, seis anos de vida, lembro-me como se fosse hoje, era
Setembro, brevemente começavam as vindimas
O que são vindimas, pai?
É o apanhar das uvas...
Uvas, o que vão uvas, pai?
Não percebia que as videiras
Pai, sim filho, o que são videiras?
Não percebia que as videiras davam uvas, que
existiam cachos, e lembro-me como se fosse hoje, era Setembro, quase,
quase começavam as vindimas, e lembro-me, morri, depois,
embrulharam-me num lençol de água salgada, permaneci assim cerca de
vinte e oito dias, era Outubro, caiam as folhas das árvores, e eu,
eu perguntava-me porque caiam as folhas das árvores,
O que são vindimas, pai?
É o apanhar das uvas...
Uvas, o que vão uvas, pai?
Não percebia que as videiras
Pai, sim filho, o que são videiras?
E pela primeira e última vez, eu, eu tive vergonha
de perguntar ao meu pai
Pai, porque caem as folhas das árvores?
Eu tive vergonha de perguntar ao meu pai se esta
terra era para sempre ou apenas para eu brincar, e começaram as
chuvas, e o frio, a geada e a neve, e eu, eu morto, fui ficando, fui
ficando... embrulhado num lençol de água salgada.
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó