sábado, 4 de agosto de 2012

os voos nocturnos dos beijos

Implorei-te incessantemente que amasses as palavras construídas
incessantemente
que amasses as paixões sem cabeça dos meus cigarros
(rebentou o pneu da bicicleta)
e imaginavas-me como um pássaro
livre
e que voava até ao infinito
(rebentou o pneu da bicicleta e fiquei-me pelos socalcos do douro)
e voei e amei e voltei a voar e novamente desamei
construí sonhos de algodão
em pedaços de xisto
e pintei o sol nas miseras tardes de inverno

e quereis que eu tenha juízo?

Subi as cordas invisíveis do choro
e roubei uma rosa numa noite de Agosto
sentei-me no lago com cheiro a morgue
e aos poucos comecei a pegar na tua mão franzina
(e não peguei na tua mão)
desastradamente por engano dentro dos voos nocturnos dos beijos
peguei no livro que estavas a ler
imaginei-o como sendo a tua mão cor de malmequer

(Grande otário este gajo sem cabeça)

e quando pensava que tinha a mão dela dentro da minha
o pneu
o pneu estilhaçado
de socalco em socalco
de vinha em vinha
Implorei-te incessantemente que amasses as palavras construídas
incessantemente
que amasses as paixões sem cabeça dos meus cigarros...

mas a lua ficava tão longe!

O inventor do sono

Foi ele que inventou o sono
e os folhados de insónia do amor
foi ele que pintou as árvores no jardim da saudade
e também foi ele que construiu a noite

foi ele que desenhou pássaros de papel
nas árvores pintadas no jardim da saudade
foi ele que trouxe as palavras que viviam nos corações apaixonados
depois das tempestades de verão

foi ele que inventou o sono
de insónia do amor

foi ele que subiu as escadas até ao sótão das ruas de Luanda
sentou-se sobre uma pedra junto a um charco
olhou em redor os musseques
e desapareceu entre o fumo da fogueira da morte...

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Milimetricamente prisioneira dos teus olhos

Do sossego mísero cansaço de caminhar sobre a neblina da tua pele milimetricamente
prisioneira do espelho da casa de banho
os teus olhos mergulhados no desejo das flores imperfeitas
às nuvens de chocolate suspensas no púbis das tardes de outono
os livros
e as palavras
a terra húmida diluída nas veias da tempestade
abrem-se as portas da morgue
olhas o meu corpo sobre o mármore da infância
ao pequeno-almoço
a poesia da tua pele milimetricamente
prisioneira do espelho da casa de banho

oiço-te nas palavras
os livros
e as palavras

o arco da corda suspenso na árvore
que em jejum percorre a tua pele milimetricamente
prisioneira do espelho da casa de banho

termina a vida
e todos os males que infestam as florestas
olhas o meu corpo sobre o mármore da infância
ao pequeno-almoço
e uma gaivota não se cansa de chorar
sobre o meu peito
onde alguém durante a noite
plantou um embondeiro
com uma cabeça de vidro
e mãos de sonho
platonicamente me abraças
e escreves o meu nome na areia invisível da tarde.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

O papel de tristeza com cores de insónia

Ao som inconstante das estrelas poisadas no céu inexistente e falso
em papel de tristeza
com cores de insónia

o som da tua voz

os teus livros e papeis e momentos junto à ribeira
o som da tua voz
escrita na sombra que alimenta as gargantas da neblina
com cores de insónia
a memória
da escrita sem palavras no desejo do teu corpo em delírio
demito-me de teu amante ausente
eu abaixo assinado juro solenemente pela minha honra acariciar o teu corpo de alface
com olhos de morango
e mamas de chocolate
o som da tua voz
em delírio

o teu corpo voa nos píncaros emagrecidos da loucura
ao desejo impugnado pelas mãos calejadas da lua

sirvo-me da sombra que serve para esconder Marroquinos
prostitutas vestidas de marinheiro
e capitães de areia
sem estandarte nem coragem de suicídio
e dou-me conta de o meu corpo são duzentos e seis ossos com óculos de sol
e ao peito
o crucifixo de infância que mais tarde deixei numa loja de penhores
para
para comprar heroína e papel de alumínio
para fumar quando passavam os barcos
regressados de ontem
com partida para amanhã

puxo de um cigarro
e sirvo-me da sombra que serve para esconder Marroquinos
prostitutas vestidas de marinheiro
e capitães de areia
para alimentar o meu vício de contar pássaros durante a noite.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Completamente só penso eu

Não são reais as fotografias onde habito
e percebi que eu pertenço a um álbum
onde apenas o meu rosto abre-se aos silêncios
dos olhos camuflados do nitrogénio

percebi quando folheio as páginas emagrecidas dos aniversários em tristeza
que aquele miúdo com ar aparvalhado
deitado num carrinho de bebé
não sou eu
(ranhoso sem cabelo e chorão)
não sou eu
que cresci dentro de um álbum completamente só

(Não são reais as fotografias onde habito
e percebi que eu pertenço a um álbum
onde apenas o meu rosto abre-se aos silêncios
dos olhos camuflados do nitrogénio)

completamente só penso eu
porque nunca me lembro de dar a mão a quem quer que seja
ou
ou simplesmente a afagar o cabelo de uma árvore em silêncio

e acorda a noite
e a noite me afaga o cabelo
e a noite me ouve
e a noite me deseja
entre palavras cigarros e garrafas de vodka
e o papel de parede da insónia
nunca me esquece
e antes de eu adormecer
dá-me um beijo simplesmente no rosto que nunca foi meu
e vive
e vive dentro de um álbum de fotografias
com alguns pedacinhos de cola

e percebo que o mar
o mar e percebo
e percebo que nunca existiu o mar
e que eu não sou aquele ranhoso
raquítico
chorão
tinhoso
na fotografia com um crucifixo ao peito...

terça-feira, 31 de julho de 2012

Blogue Cachimbo de Água em destaque

amores e desejos cansados

Desenhei o teu nome
na areia finíssima do Mussulo
e sentava-me a olhar o teu sorriso
sobre a crista das ondas
desenhei barcos
inventei árvores e pintei pássaros no lugar das estrelas
construí amores e desejos cansados
sem sentido
e escrevi e escrevi e escrevi...
e escrevi as palavras sem jeito
que nunca gostaste e detestas
e desenhei o teu nome

e o vento levou
levou toda a areia da praia
e fiquei ausente
e sem os barcos de papel

e na crista das ondas
hoje
hoje brincam árvores de fumo
com folhas de silêncio.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

(e não sei amar)

Vivo entre quatro paredes invisíveis
construídas pelo vento
sou metade pássaro
sou metade peixe
(e não sei amar)
e nunca percebi as (mulheres)
confesso
confesso que me é mais simples resolver uma equação diferencial
do que
do que olhar as manhãs de inverno da janela do palheiro onde habito
do que
resolver uma integral tripla

confesso
(e não sei amar)
as cintilações da álgebra linear e geometria analítica
matrizes
confesso que muito mais simplificadas
do que
do que algumas mulheres
(e não sei amar)

as flores
e as noites à espera das sílabas lunares
em rotações complexas
elípticas

o que interessam os protões
electrões
buracos negros
galáxias
deus
se o céu nocturno é tão lindo...

o que me interessa se a água é uma molécula
composta por dois átomos de hidrogénio
e um
e um átomo de oxigénio...

se elas (as moléculas) simplesmente saciam a sede
e refrescam as mãos húmidas das palavras
em telegramas ínfimos ausentes no cadáver da floresta abandonada
(e não sei amar)

dizem
dizem-me que nunca soube amar

e
e fico triste.

domingo, 29 de julho de 2012

Arte de navegar


Um muro de silêncio separa-me do mar
invisível
com ondas de sabão
e marés de açúcar

oiço as mentiras da minha vida
(e percebo que o teu mar não entra pela janela [AL Berto]
e daqui até ao dia14 de Janeiro...
portanto eu desconfio que se disser mar em voz alta
o mar não vai entrar pela janela)
não existe o mar
nem existem as palavras que me escrevem
nos lençóis de linho com corações de mel
e amêndoas de chocolate
e eu escondia-me dentro do infinito

não existem as estrelas penduradas
no tecto da tenda do circo da noite
onde se cruzam e entrelaçam mãos ensanguentadas de poemas
e lábios de mentira
não existe o amor
a paixão
o mar não existe e é impossível escrever nas cordas do ciúme
onde habitam os mortos sem coração.

sábado, 28 de julho de 2012

O poema de gelo

O tesão da palavra tesão
em busca do pénis flácido da noite
entre os joelhos da melancolia
o poema do gelo
esquecido la lareira de carvão
com as sílabas de orvalho
e a vagina de geada adormecida nos braços da puta da morte
mesmo à porta de entrada do quarto direito

(entre os muros curvilíneos do outono)

a vizinha do quarto esquerdo
que não me deixa dormir
oiço-lhe os gases e o rosnar da clarabóia
oiço-lhe os orgasmos fictícios que inventa quando percebe que eu estou em casa
e quero dormir
e sei que faz de propósito
que mais poderia ser?
Oiço-lhe todos os gemidos das frestas das quatro paredes de gesso
e das flores da amoreira
à deriva no silêncio do tecto do corredor
palavras de tesão
nas janelas do quarto esquerdo

vejo os barcos à janela
e a vizinha que teima em não me deixar dormir
em voos nocturnos para os caixotes de Odivelas
com pedacinhos de dedos de diamante negro

(acreditei em todos os barcos que vi
sobre as palmeiras da Baía de Luanda)

palavras de tesão
ardem nas algibeiras camufladas
em bocas
e coisas de poucas

título
para o poema de gelo
(precisa-se de trabalho)
às palavras sem tesão
difíceis de sobreviver à noite de Lisboa
um homem com calças aos quadradinhos
e óculos de fundo de garrafa de vodka
ontem
nos cigarros miseráveis dos barcos com gengivas dentro de rimas
os sexos das manhãs de amanhã
suspensos na varanda do quarto esquerdo
a puta da morte


no tesão das palavras
e das rimas que constroem o poema de gelo.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

e dizem dizem que o texto termina no ponto final

Entre os parêntesis da miserável vida que tenho
cultivo no livro das memórias palavras de incenso
e rosas vermelhas cansadas de que as olhem e desejem
cansadas como algumas mulheres
rosas para serem olhadas
e ficarem esquecidas numa jarra de vidro
ou de cristal
e a mulher é para ser manuseada e amada
como as tardes de primavera junto ao mar dos pontos de interrogação
dizem que sou louco
pobre
muito pobre

mas tenho um barco
e o mar é só meu
dizem

dizem que as rosas são lindas
dizem que sou louco
pobre
muito pobre

deixem as mulheres serem amadas
e manuseadas como as rosas vermelhas

e dizem
e têm medo de me mostrarem
e dizem
dizem que as rosas são lindas
dizem que sou louco
pobre
muito pobre
e por essa razão tenho de viver na clandestinidade...

e dizem
dizem que o texto termina no ponto final
(nos meus texto não coloco ponto final)
e dizem
dizem que nunca terminam
como as rosas que vivem dentro dos livros
e que roubei num jardim de Agosto
com os olhos de amêndoa
e os lábios de maré salgada
gostavas do mar
e das árvores
e dos pássaros do inverno

e dizias
e dizias que eu era pobre
muito pobre
tal como hoje
como ontem
e como amanhã o serei
sempre
sempre eternamente pobre
(fala baixinho para ninguém te ouvir... XIU...).

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Os socalcos do cansaço

Cansado desta “merda” toda...
do jantar sobejaram as espinhas de miséria
e a varanda da insónia desdestrói-se sobre os socalcos do cansaço
e cresce em mim a vontade de desistir de todos os sonhos
e de todos os jardins onde me sentei e escrevi com o meu olhar
poemas de “merda” no troco das árvores com inércia e pedacinhos de musgo nos braços
ler
escrever
amar
(foder
nas palavras embriagadas da noite)
e das marés sem luar

(cansei-me das janelas isósceles
e das portas rectângulos sem memória
do seno de trinta graus
ou das tangentes fictícias à meia-noite)

oiço os apitos invisíveis
dos barcos imaginários
que galgam a seara da tristeza
mergulhada no vento da noite escura

cansado
cansado do jantar
cansado
cansado do amor das palavras
cansado
cansado dos livros que adormeço
cansado
cansado dos livros que leio
e dos cachimbos
cansado
cansado da vergonha
de ser um miserável ou um fantasma sem cabeça

quando os barcos de verdade
regressam do banco de jardim frente aos correios (já falecido)
e trazem nos olhos as cerejas da adolescência...

terça-feira, 24 de julho de 2012

Janela triangular

Sobre a almofada do amor
dorme o abandono e a escuridão
voam as palavras de incenso
para a desconhecida mão
em flor
com perfume a silêncio
e vergada nos cortinados triangulares
das tardes de pulsações e desejos
dos lençóis com sabor a haxixe
procura o amor
impregnado de piolhos alquimistas
nos verdejantes lábios do sono

descem as ruas em ruína
com o destino de morrerem afogadas
nas lágrimas da despedida
sobre a almofada do amor
a madrugada com escadas para o sótão da solidão

abro a janela triangular
e arremesso-me de encontro ao vento
e curiosamente
e curiosamente começo a voar

e curiosamente
e curiosamente na almofada do amor
dorme o abandono e a escuridão
da madrugada com escadas para o sótão da solidão...

(voltarei a fumar)

segunda-feira, 23 de julho de 2012

O esqueleto da nuvem de prata

O esqueleto da nuvem de prata
e lágrimas de papel
nos olhos
uns Ray Ban
que lhe davam um certo ar de ajeitado
fazendo-o parecer um esqueleto verdadeiro
de finíssimas famílias
e no entanto
não passava de uma nuvem de prata
com poeira de ossos
e lentes BL...
vivia num mundo inventado

e amava loucamente uma pedra
onde se sentava a olhar o rio
onde passeavam os barcos
e poisavam as gaivotas

e amava loucamente uma árvore
uma árvore de verdade
com coração de verdade
e amor de verdade

e lágrimas de papel.

domingo, 22 de julho de 2012

Quatro paredes de cianeto

Das quatro paredes de cianeto
onde habita o amor inventado
nas quatro palavras murmuradas
do amor embrulhado em pedaços de jornal
e sorrisos de prata
das quartas-feiras com chá melancólico
e abraços invisíveis
ao meu corpo
indesejado
das quatro paredes
em tectos de solidão
palavras de cianeto

o meu corpo desgraçado
suspenso no vidro ténue do fim de tarde
entre o suicídio dos barcos
e a alegria da minha partida para longe
sem destino
sem regresso

que feliz o amor
que vive dentro de quatro paredes de cianeto...

sábado, 21 de julho de 2012

Lívida a morte das palavras

Lívida a morte das palavras
do amor prometido
no amor proibido
a paixão lenta em decomposição
o corpo putrefacto nos olhos azuis da manhã
que voa em direcção ao mar,

o amor morre
e nas lívidas palavras prometidas
cresce a planície da solidão
onde vivem pássaros sem coração
e homens sem cabeça
que procuram as luzes das manhãs azuis,

lívida a paixão
do lívido amor
que me esquece no centro da cidade
e há no amor proibido
a paixão lenta em decomposição
e há
do meu amor
as palavras lívidas,

palavras
sem cabeça
sem nome
lívida a morte
do amor prometido
e há
e há paixões de merda
e amores sem cabeça
das palavras lívidas
e há
e há amores de merda
do amor proibido.

quarta-feira, 11 de julho de 2012


Por razões de ordem pessoal vou deixar de escrever e de publicar o que possa vir a escrever no meu caderno preto; poderá ser breve ou eternamente. Tudo irá depender do estado do mar nos próximos meses...

Obrigado

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