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domingo, 8 de novembro de 2020

Uma equação de fé, no teu peito.

 

O fim de tarde, minha querida.

A cidade vomita palavras abstractas que só a tempestade sabe prenunciar.

As flores poisadas na tua lápide parecem lágrimas de pássaros esquecidos nas árvores de ontem,

Procuro por um corpo, nada encontro e, apenas uma esquina de luz, longe, bem longe, acorda das sombras onde te deitas.

Vai distante o teu olhar de bom dia pela manhã,

Erguem-se as abelhas da colmeia colorida pelo silêncio da despedida,

Um SIM, um NÃO, ou… um apenas talvez,

Se deita no teu peito.

Visito-te todos os dias,

Conversamos,

Falamos sobre poesia,

Pintura,

Falamos das tardes inquietas de Luanda… ao final do dia.

Nada me falta, minha querida.

Tenho tudo e, nada tenho.

Não me apetece abrir a ponta de entrada, para este cubículo desorganizado, entre livros e rochedos, mesmo assim, nunca consegui, depois de te despedires de mim, olhar o mar.

Abro a janela, o mar longínquo deseja-me como um louco e, ainda hoje, minha querida, tenho medo da (lhá).

Um pilar de areia cai sobre a calçada.

Lágrimas de papel vivem disfarçadas no teu rosto; hoje, não choras.

O sangue invisível que corria nas tuas veias, hoje, é apenas uma fina lagoa azul suspensa na tarde, nada mais, minha querida, nada mais…

Hoje és apenas uma equação de fé que deambula pela casa descalça;

O medo.

Amanhã, quem sabe, “O fim de tarde, minha querida”.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 08/11/2020

domingo, 6 de setembro de 2020

O livro

 

O sono. Construído sobre o teu corpo

Em cerâmica, veste-se de humildade,

Vive despreocupadamente na penumbra da noite,

Até que todas as luzes da ladeia se cansam,

E, também elas vão dormir na tua mão.

A saudade. Habita em mim o silêncio

Das tuas palavras, imagino-te pegando em mim,

Ao longe, depois de todas as sanzalas acordarem,

Depois de todas as palhotas lavarem o rosto nos teus cabelos.

O mar. onde te deitavas. Dormias como uma andorinha vadia,

Sentavas-te nos rochedos da sombra,

E, brincava com os meus calções recortados dos trapos abandonados.

Os sapatos. Não gosto deles.

Luanda. Ontem, lá, era feliz.

O hoje. Cidade esquecida no Oceano. A garganta vomita palavras

De ninguém, escritas na areia húmida da manhã,

Saltando de barco em barco,

De maré em maré,

Até que chegue o cansaço.

A noite. Agora. Apenas eu e, tu.

Todos os planetas morrem depois de acordarem, chove.

Chovem estrelas de falar.

A palavra. O livro.

Mais nada.

Mais nada, meu amor.

Apenas em mim, a loucura.

E, tanta saudade.

 

 

Francisco Luís Fontinha, 06-09-2020

domingo, 16 de agosto de 2020

As palavras do poeta

 

Das palavras frias e esquecidas

Emerge o sonho do poeta,

Das palavras cansadas, vadias,

Correm nas mãos do poeta.

Nas ruas desertas e frias,

Entre janelas e clarabóias perdidas,

Que dormem na cidade inventada.

O sonho do poeta,

Quando escreve na esplanada deserta,

Vêm os milhões de gritos,

Desejos,

Do poeta,

Entre beijos.

O dia.

Quando o poeta acorda,

Dança sob a chuva miudinha,

São palavras, do poeta,

Aquelas que ficam esquecidas,

Nos olhos da amante do poeta.

Beijo.

O beijo do poeta

Nos lábios pincelados do poema,

As rosas, os jardins do poeta,

Numa qualquer cama.

(Das palavras frias e esquecidas

Emerge o sonho do poeta)

O medo.

A sombra que mata o poeta,

Quando a cidade se esconde no mar,

Quando o poeta desenha o próprio mar,

Na lareira da noite,

Quando a noite abraça o poeta,

Quando o poeta morre no poema.

Os versos,

As rosas das mãos do poeta,

São prosas,

São palavras…

São o fumo da montanha.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 16/08/2020

sábado, 20 de junho de 2020

Hoje


Não tenho pressa de caminhar.
Não tenho na mão a pedra filosofal.
Não. Não percebo este rio a chorar.
Quando o cansaço laminado da manhã, sofre, vomita as palavras de Inverno.
Não tenho nos livros as tuas mãos quando o amanhecer acorda,
Não sei quantas pedras, hoje, tenho para atirar à tua sombra.
Não tenho a madrugada para chorar.
Não tenho as lágrimas para desenhar,
No chão abandonado pelo silêncio.
Não tenho a noite para dormir.
Não tenho o dia para sorrir.
Não. Não sei se hoje é dia para correr,
Chorar,
Ou morrer.
Não tenho as letras do teu sorriso,
Quando o sol ilumina os candeeiros do sofrimento.
Não tenho as imagens do mar,
Salvado pelo amanhecer.
Não tenho as sandálias dos pequenos alicerces da cidade dos Deuses.
Não. Não tenho pressa de caminhar.
Não me digam que hoje posso subir à montanha da despedida.
Não o vou fazer.
Porque hoje,
Hoje não tenho tempo para morrer.
Hoje não é o tempo da partida.



Francisco Luís Fontinha
20/06/2020

sábado, 30 de maio de 2020

A terra


A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é ula lágrima,

Nos lábios do mar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é silencio,

Que não se cansa de trabalhar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é amor,

É desejo no ar,

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é a cidade,

A cidade do madrugar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

Ai terra meu amor,

Amor de amar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra são palavras,

Palavras de falar,

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra na madrugada,

A terra do Luar,

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é ula lágrima,

Nos lábios do mar.







Francisco Luís Fontinha

Alijó, 30-05-2020

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Cidade sem nome


És as asas dos meus sonhos.

Os lábios pincelados da minha janela,

És a canção do meu sorriso,

Poema sem jeito, barco, barcaça, caravela,

És o silêncio da minha cidade,

Palavras semeadas na minha aldeia,

És o Sol sem juízo,

Nas noites de Primavera.

És a voz trémula dos sinos em descanso,

O mar calcetado pela esperança,

És o Rossio em demanda,

Passeando na calçada,

És gaivota,

Madrugada.

És a fala amestrada

Das noites choradas,

Beijo na despedida,

És o corpo ausente

Das varandas envenenadas

Pelas abelhas do nada.

Pelas abelhas da Ira.

És o oiro,

Verso em construção,

És o mar salgada da insónia,

Quando absorve o teu corpo na alvorada.

És rochedo,

Medo,

Palavra brava…

És a janela,

A porta,

Da cidade sem nome,

Que privilegia as flores do cansaço.

És rio,

Riacho,

És o calendário da insónia,

Nome,

Morada,

Das ruas em ebulição.

És o vento em aflição,

Bandeja de esplanada,

És tudo.

Não és nada.

És beijo e desejada.





Francisco Luís Fontinha

Alijó, 08/05/2020

quarta-feira, 11 de março de 2020

Os pássaros do amor


O tempo silencia os teus lábios de cereja adormecida,
Quando a nuvem da manhã,
Poisa docemente no teu sorriso;
Há palavras na tua boca,
Que absorvo com saudade,
E, nada me diz, que amanhã será uma manhã enfurecida pela tempestade.
Subo à sombra do teu olhar,
E, meu amor,
O cansaço da solidão deixou de acordar todas as manhãs.
Fumamos cigarros à janela,
Dentro de nós um volante de desejo,
Virado para a clarabóia entre muitas janelas,
Portas de entrada,
Escadas de acesso ao céu,
E, no entanto, o fumo alimenta-nos a saudade,
Porque lá longe,
Um barco de sofrimento, ruma em direcção ao mar.
É tarde,
A noite desce,
O holofote do silêncio, quase imparável, minúsculo, visto lá de cima,
Ruas, caminhos sem transeuntes, mendigos apressados,
Vagueando na memória.
STOP. O encarnado semáforo, cansado dos automóveis em fúria,
Correm apressadamente para Leste,
Nós, caminhamos para Oeste,
E, nunca percebemos as palavras que as gaivotas pronunciam,
Em voz baixa,
Com os filhos ao colo,
Sabes, meu amor?
Não.
Amanhã há palavras com mel para o almoço,
Dieta para o jantar,
E beijos ao pequeno-almoço;
Gostas?
Das nuvens da manhã?
Ou… dos pilares de areia que assombram a clarabóia?
Nunca percebi o silêncio quando passeia de mão dada com a ternura,
De uma tarde junto ao rio,
Ele, folheia um livro,
Ela, tira retractos aos pássaros,
E, porque te amo,
Também vagueio,
Junto ao rio,
Sem perceber o meu nome,
Que a noite me apelidou,
Depois do jantar,
Numa esplanada de gelo.
O ácido come-me, a mim, às palavras, como a Primavera,
Num pequeno quarto de hote,
Entre vidros,
Livros,
Palavras,
E, desenhos.
(aos depois)
Nada.
Brutal.
Os comprimidos ao pequeno-almoço.
Fim.
Amanhã, novo dia, nova morada, beijos,
Cansaços,
Abraços,
E, portas de entrada.
O amor é luz.
O amor são flores, árvores e, pássaros.
E pássaros disfarçados de beijos.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
11/03/2020

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

As sombras do silêncio


Acordava do sono emagrecido,
O homem da nuvem embriagada,
Cansado,
Perdido,
E, reclamava,
E, gritava,
A palavra enfeitiçada.
E, hoje, nas camufladas ruas da cidade esquecida,
Embrenhado na poesia, a canção do adormecido,
O homem, cansado, denegrido,
Escreve sem ânimo,
Desiludido…
Dos alicerces envergonhados.
Rezam pela sua alma,
Coitado,
Sem nome,
Degolado pela tempestade,
O homem, o mesmo homem, o cansado,
Pegas nas palavras da reza em seu poder,
Desorganiza-se,
Veste-se de negro,
Negro, negrito, negrinho,
Como o gato do vizinho,
Dançando na eira das espigas adormecidas.
As sombras do silêncio,
A alvorada da sinfonia que jaz na ribeira,
O rio, em delírio,
O rio, desconectado da vida,
E, corre,
E, dorme,
Nas almas do mar.
O mar tudo engole, e, tudo mastiga,
Pessoas, lixo, palavras, o vento…
Uma laranja, sofre,
E, vive,
E, morre,
Dentro da laranja adormecida.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
24/02/2020

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Depois, a maré ensanguentada, morre de alegria.


O regresso nunca mais.
A terra húmida, depois das lágrimas da tarde,
Ficou lá, no outro destino do menino dos calções.
Todas as sombras, choram, ditam palavras aos esqueletos de silêncio,
Que as mãos, trémulas, seguram, enquanto cai a noite,
O corpo, levita, desassossega na madrugada,
Sente-se o vento, negro, prateado, nos lábios do Diabo,
O regresso…
Nunca, nunca mais,
Porque a solidão namora as flores em papel, do jardim imaginário.
E o menino, com o tempo, cresceu.
Um relógio de luz, quando acorda o menino,
Alicerça-se nos braços lânguidos que o espaço alimente,
Dos calções, nada, nem a cor se aproveita,
Talvez, as árvores, as árvores plantadas por ele,
Hoje, nada, como os calções,
Pedaços em madeira, trapos, lágrimas desajeitadas…
Tudo, tudo morre, naquela terra prometida.
O mar, enfurecido, sacia-se nas rochas metamórficas do cansaço,
Um barco, espera pelo menino dos calções,
Estaciona-se junto à cidade,
Homens, marinheiros, mulheres, sem fazerem nada,
Espera que regresse o menino,
De longe,
De nada,
Ninguém.
O regresso nunca mais,
A terra húmida, depois um finíssimo fio de nylon,
Procura na multidão da cidade, o menino prometido,
Da terra sonâmbula,
Que o viu perder-se,
No meio do capim.
Machimbombos tropeçam nas finas lâminas da saudade,
Porque apesar de tudo, sempre, o menino, viveu na saudade,
De regressar, um dia,
À sua cidade.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
03/02/2020

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Teorema da loucura


Deus, não gosta de mim.
Os pássaros, criados por Deus, também não gostam de mim.
Não acredito em Deus, nem nos pássaros criados por Deus.
A tempestade, em mim, costuma ser passageiras,
Alguns segundos, ventos ciclónicos, e chuva miudinha…
Também ela, obra do criador.
Debato-me com o trágico sentimento de perda,
Quando as palavras se ausentam,
Quando os livros, recheados de palavras, também se ausentam.
Deus, não gosta de mim.
Pudera.
Se não acredito em Deus, também ele, não deve gosta de mim, acreditar em mim,
Mas, não preciso que alguém acredite em mim,
Os desenhos acreditam em mim?
Os desenhos criados por Deus, que me criou, e eu duvido.
A cidade ferve,
A moça corre apressada para os braços de Deus,
Abraça-a, beija-a, como se amanhã existisse uma ribeira fora do leito, em direcção ao mar.
Deus criou as palavras,
Os versos,
A mentira,
A despedia,
A morte,
A rebeldia…
Deus, parece-me indiferente às palavras, palavras criadas por Deus.
O campo, ao longe, verdejante, desparece nos lábios de Deus…
E, os pássaros, filhos de Deus, à procura das abelhas,
Picam-me,
Aleijam-me,
Mas nada é mais doloroso que a morte.
A morte, a má-sorte, e companhia limitada,
STOP,
Em frente, marcha,
Cruzamento,
GNR ao comando,
Automóvel desgovernado,
Nas mãos de Deus.
IRRA.
Não.
Não. Ponto.
Palavras. Mortas. À nascença.
Deus, Deus é Deus, criado por Deus.
FIM.
Tudo ao molho e fé em Deus.
Todos os homens, são pássaros?
E os pássaros?
São homens?
E o burrinho?
Que faz o burrinho dentro do poema?
Porque hoje é 22 de Janeiro,
Porque Deus criou o calendário…
Não.
Não.
Talvez amanhã!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
22/01/2020

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

As mãos de uma criança


Perde-se no tempo o sonho da saudade.
Invento coisas, pequenas frases suspensas nos cortinados da solidão,
E, ao longe, a camuflada madrugada em desespero.
Dizem que ela, a tempestade,
Vem alicerçar-se nas janelas do silêncio,
Como um livro desempregado, só, triste…
Invento coisas.
Perde-se no tempo o sonho da saudade.
O alegre canino, que habita nas sombras desta velha cidade,
Corre em direcção ao mar,
Veste-se de veleiro vadio,
E zarpa sem ninguém dar conta da sua ausência.
Fico triste, vê-lo partir como partem os pássaros para a outra margem,
Sem destino,
Sem rumo,
Rodopiando dentro do vento,
Canções de chorar.
Levita o cansaço da noite,
Quando o dia já pertence ao passado,
Morre nas mãos de uma criança,
E jamais acordará em mim.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
20/01/2020

domingo, 8 de dezembro de 2019

A fome da saudade


Trago em mim a fome da saudade.
Não sei quem sou, nesta cidade deserta,
Cansada da verdade.
Trago em mim a fome da tristeza,
Quando o vento se alicerça nos teus lábios.
Trago em mim o silêncio da noite,
Quando um livro perdido, se levanta, e avança contra a escuridão.
Trago em mim o sofrimento do desejo,
Como uma cancela escondida pela geada,
E na montanha, tenho escondidas as lágrimas da calçada.
Trago em mim a morte,
A dor,
E o sonho de adormecer no teu colo.
Trago em mim a saudade,
A fome,
A vaidade.
Trago em mim a felicidade,
De um dia, voar,
Nas tuas mãos,
No teu sonhar.
Trago em mim a fome de sofrer,
Dentro de um relógio indignado com o tempo.
Trago em mim a fome de escrever…
Escrever palavras de alento.
Trago em mim a fome de ser,
Ser quem não sou,
Que sou ser,
Invisível,
Nesta Galáxia complexa da noite.
Trago em mim o prazer,
O sonho,
A vontade de viver.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
08/12/2019