terça-feira, 7 de outubro de 2014

Hoje


Hoje,
hoje um dia perfeitamente de “merda”,

tudo parece desabar sobre os meus ombros,
chove,
hoje,
hoje estás triste,
hoje,
hoje estás ausente...

hoje,
hoje percebi que em breve partirás,
e hoje...
eu, e hoje, eu sem paciência para as palavras,
odeio... as palavras,
odeio a arte de escrever,

odeio a literatura,
odeio a pintura,

hoje,

hoje...

hoje odeio a noite,
e os esconderijos nocturnos da solidão,
hoje,
hoje um dia sem memória,
hoje um dia sem história,
hoje... hoje sinto-me um prisioneiro das sombras do infinito...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 7 de Outubro de 2014

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O vampiro


O vampiro ensanguentado
é filho de um quadrado,
à noite, coitado, adormece empoleirado no cansaço,
e pela madrugada, acorda vestido de roseira,
nunca conheceu a mãe,
apenas existe uma fotografia pendurada no espelho do amanhecer,
e ao longe, e ao longe uma fogueira...
e no centro da fogueira... palavras que ele recusa ler,
é destemido, e é solitário,
o vampiro ensanguentado desiste de observar os plátanos
e os anzóis de papel, senta-se junto ao rio...
e sonha com os barcos de vidro,

apanha com a mão os pedacinhos mais frágeis do vento,
sorri, sorri porque acredita no luar,
o vampiro... ensanguentado...
é filho de um quadrado,
e detesta as tempestades de amar,

não sei, não sei se ele vai ler estas palavras...

terá de apagar a fogueira,
ir ao seu centro...
e das cinzas,
ressuscitar os corações de sofrimento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 6 de Outubro de 2014

domingo, 5 de outubro de 2014

Rio sonâmbulo


Aqui, pareço um tresloucado corpo volátil,
um rochedo impregnado de saudade,
aqui, sou uma montanha sem árvores,
uma ribeira sem poesia,
aqui, pareço uma equação trigonométrica sem solução,
um círculo,
o quadro... semelhante a uma prisão,
aqui, todos os pássaros são loucos,
aqui, todas as mulheres são em papel crepe,
e voam,
e partem...
aqui,
aqui, há um rio sonâmbulo que apelidaram de “DOR”,
e não há barcos com olhos verdes...
porque aqui, aqui, eu pareço um tresloucado corpo volátil,
que espera o regresso das mãos trémulas do teu sofrimento...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Outubro de 2014

sábado, 4 de outubro de 2014

Montanha do adeus


Em meu redor os grãos de areia do deserto,
as serpentes de vidro que trepam as árvores do meu quintal,
ao longe sei que existe uma praia,
morta,
triste,
embrulhada nos lençóis do sofrimento,
minto,
finjo sorrisos quando apenas são desenhos abstractos,
palavras amorfas e escritas por um louco,
e no meu corpo suspendem-se os tentáculos da dor,
um carrossel de chocolate que assombra os lábios do mendigo,
não sei porque existo,
porque minto,
porque vivo... porque me escondo...
e no meu corpo... a montanha do adeus em desespero.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 4 de Outubro de 2014

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Saudade


Prometeste-me uma jangada de saudade
desenhaste em mim uma rua sem saída
de uma qualquer cidade,

naquela madrugada de solidão
parti...
voei em direcção ao infinito
naquela madrugada sofri
gritei
não
não chorei
porque a jangada prometida
se afundou nas tuas mãos
trémulas
mergulhadas na dor
suspensas no transatlântico de cartão,

havia palavras na tua face esbranquiçada
palavras que de nada me servem
porque... porque o sofrimento é uma calçada
porque o sofrimento é um rio sem nome,

prometeste-me uma jangada de saudade...

e o teu corpo parece desfazer-se em pequenas migalhas de suor
há uma livro para ler...
há um livro para escrever,

prometeste-me uma jangada de saudade...
e apenas tenho o teu rosto envelhecido
distante
desorientado...
como eu
perdidos na sanzala do Adeus!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 3 de Outubro de 2014

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Estas palavras


Estes versos não são teus,
não existem palavras para saciares os teus desejos,
anseios... e medos,

Não há mar sem rochedos,
nem barcos sem marinheiros...
estas palavras são beijos,

São torpedos...
veneno esponjoso que alimenta a garganta da dor,
estas palavras... estas palavras não são as palavras de amor!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 2 de Outubro de 2014

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Piano amar...


Dos espinhos melancólicos da insónia,
oiço-os,
como se eles tivessem um corpo,
ou... ou vestissem-se de palavras ainda não escritas,
entranhadas no papel amarrotado da madrugada,
oiço-os...
os sons melódicos do piano amar...
domesticado,
livre...
dos espinhos melancólicos, as ditas canções anónimas com sorriso de alecrim,
o cansado beijo suspenso nos lábios da pianista...
livre... até que desaparece no seio das linhas paralelas da solidão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 1 de Outubro de 2014

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Entardecer


Movediças lajes de areia
que transportam o meu corpo até ao entardecer
este feitiço não cessa de arder
e este cansaço parece desgovernado
como um barco
ou um coração apaixonado...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 30 de Setembro de 2014

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Castelo das areias brancas


Dormíamos sobre os limbos nocturnos da paixão,
existia entre nós uma canção melódica,
cansada de descer a calçada,
havia nos teus olhos a melancolia do amanhecer,
tal como os pingentes que o orvalho constrói nos teus seios...
dormíamos,
sem sabermos que ainda podíamos voar em direcção ao infinito castelo das areias brancas,
não sabias que eu era um transparente boneco de incenso,
dentro de uma caixinha em madeira,
só, só como as palavras embainhadas na espingarda da loucura,
dormíamos, dormíamos e construíamos papagaios em papel...
e da rua absorvíamos os esqueletos magoados do amor.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 29 de Setembro de 2014

domingo, 28 de setembro de 2014

Amanhecer amar


Se eu voasse
não atravessava o Oceano para em ti poisar...

se eu voasse
não me levantava deste banco de silêncio
com mãos de pérola adormecida
não gritava
não... não chorava
porque as palavras são searas de insónia sobre um papel queimado,

um punhado de trigo
voando
sonhando...
na planície dos corpos embalsamados,

se eu voasse
não atravessava o Oceano para em ti poisar...

não escrevia
não lia...
não
não acreditava no amanhecer amar!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 28 de Setembro de 2014