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quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Um gajo com mau feitio

 

Sou um gajo de mau feitio, pensava eu enquanto me entretinha a olhar o espelho convexo da noite, olhava pela janela,

Em voz alta,

Ela parecia ter saído dos banhos nas Termas de S. Pedro do Sul,

Em criança,

O livro comprado no Café Tavares, em frente ao rio, lia o sorriso dos patos bravos acabado de acordar e, mal sabia o que era a paixão.

Duas coisas eu já sabia; ser filho único e com mau feitio,

A noite trazia-lhe as mentiras das montanhas adormecidas, sexo só à noite, junto aos pinheiros e, ela sempre que acordava,

Ele,

Não sabia nada à cerca do ciúme. Tinha fome. Alimentava-me de cigarros adormecidos, café envenenado por uma cidade esquecida na tempestade e, debruçava-me no parapeito da forca, estendia a cabeça, colocam-me a corda no pescoço e, voava até ao infinito.

Morreu de quê?

A saudade da mãe, os dias intermináveis junto a um rio ancorado na neblina, folheava todas as fotografias e, nada a dizer; amanhã ele estará melhor.

O avô questiona-o se já tinha terminado a tropa e, com sorrisos embrulhados em mentira

Já, avô, já estou em casa.

Não sabia o que era a geada, tinha medo da neve e, pensava que as primeiras botas calçadas pertenciam às forças especiais de qualquer ramo das forças armadas. Feridas. Dor. Das mãos regressavam as aldeias em frieiras,

Calça as luvas, Luisinho!

Podia ter nascido em Trás-os-Montes, mas não era a mesma coisa.

Olhei este vosso, meu, Rio Douro. Mais tarde mostravam-me os encantos do Tua e, nunca mais chorei por ela.

Uma cidade abandonada, musseques engasgados no capim envelhecido, ao longe, o velho Zacarias, fumava pedras da calçada,

Tão lindos os mabecos!

Numas longínquas férias da Páscoa apaixonei-me por uma trapezista de um circo sem nome, no seu enlace,

Caminhei até às proximidades do Ujo, perdi-me,

E, talvez hoje fosse Presidente do Conselho de Administração do Circo sem nome, além, as gaivotas dormem nos braços das mães que espreitam as mãos nocturnas da montanha, chovia derradeiramente e, não havia nada a fazer; pelos vidros invisíveis das janelas regressava até mim o silêncio travestido de frio, a porta de entrada sempre aberta, alguém tinha furtado a fechadura e, em dias de geada, ao descer as escadas embebidas no fino oiro geada, tombava e, rebolava até ao chafariz.

Na praça. Da praça.

Fotografaram-me junto à Gricha, sentei-me em cima do burro e, tombei.

Todas as manhãs navegava nas gavetas da paixão, escrevia palavras nas paredes do quarto, levei nos cornos da minha mãe e, pedia ajuda ao meu pai: estava salvo. Mais um livro que trazia na algibeira, quase sempre adquirido na papelaria Grifo. O hiper dos anos 40, 50…, sentado na parte mais estreita do meu corpo, sentia o baloiço dos meus ossos contra a manhã, dias seguidos enclausurado nas paredes amarelas da hepatite.

À noite, percebia que de trapezista eu nada percebia, chegar um dia a Presidente do Conselho de Administração, pior ainda.

Sou um poeta.

- Novamente atrasado, Sr. Fontinha

Sou um gajo de mau feitio, pensava eu enquanto me entretinha a olhar o espelho convexo da noite, olhava pela janela,

Em voz alta,

Ela parecia ter saído dos banhos nas Termas de S. Pedro do Sul,

Em criança,

Foi o trânsito, meu Capitão, as mulas estavam furiosas.

O avô Domingos espetava pregos nos machimbombos, nos bolsos guardava a fotografia das filhas, mulher e netos, sem que eu percebesse, que junto a eles e a elas, habitava um ascendente que tinha nascido em Lisboa e era cocheiro. O meu bisavô.

Hoje, quase todos, pó.

Eu, transeunte modificado geneticamente, espero que acordem as ruas de Carvalhais.

Fui. Disse ele.

E, nunca mis regressou à cidade da saudade.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 12/08/2021

segunda-feira, 9 de março de 2015

Vultos nocturnos


Sinto as tuas lágrimas no espelho da manhã
como campânulas de luz embriagadas pelo silêncio
roubaram-me a esplanada e as cadeiras onde me sentava
e...
percebia quando passavas apressadamente
que o dia não tinha acordado
pálpebras cerradas
corredores escuros onde te escondias
quando regressava a noite
e...
percebia...
as vozes da saudade dentro de um cubo de vidro

os vultos nocturnos embrulhados na morte
como flores em decomposição
perdem o perfume
e a pele começa a envelhecer
transformam-se em cinza
cigarros a arder
cigarros procurando avenidas de voo
enquanto o fumo se distrai a observar o rio
transatlânticos
marinheiros de homens
engatados pelas árvores de um qualquer jardim
de uma cidade em construção...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 9 de Março de 2015

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Vinhedos sombreados


Inventei-te numa noite de solidão,
escrevi o teu nome fictício numa muralha de xisto
que a tempestade tombou,
havia no teu olhar socalcos cansados
e vinhedos sombreados
de... paixão...

Havia na tua mão
uma carta por escrever,
e lá dentro...
um beijo,
um beijo desenhado no meu sorriso
com lágrimas de sofrer,

Inventei-te numa noite de solidão,
abri os cortinados e olhámos as estrelas de papel crepe...
havia luar nos teus cabelos
e neblina cinzenta nas tuas pálpebras de adormecidos rochedos,
e quando me abraçaste... a cidade morreu,
como morreram todas as cidades onde habitámos,

hoje, somos dois esqueletos vadios...
vagueando pela embriagada poesia de um louco,
dois pássaros sem árvores para poisar...
hoje, somos dois esqueletos vadios... sem Oceano para navegar,
e esperamos,
impacientemente que acorde a madrugada.

(e hoje... nada me apetece escrever...)



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 3 de Dezembro de 2014

sábado, 2 de agosto de 2014

Vinhedos da saudade


Olhaste os vinhedos da saudade,
percebeste que dentro deles, eu, eu deambulava como um sorriso de vento,
chamaste aos meus olhos, olhos de desgovernar,
e às minhas pálpebras, e às minhas pálpebras apelidaste-as de cansaços do mar,
não tinha mãos para te acariciar,
não tinha braços... não tinha braços para te abraçar...
nem cores para te pintar,
olhaste os vinhedos da saudade, e percebeste que eu era um rio sem nome,

Uma cidade sem coração,
uma tempestade,

Olhaste os vinhedos da saudade,
escreveste na ardósia da tarde os versos de amar,
percebeste que dentro deles, eu, eu habitava como uma flor carnívora,
que te absorvia entre os horários nocturnos do desejo,
sem lábios para te beijar...
uma cidade sem coração,
uma tempestade,
um homem vivendo no corrimão com vontade de caminhar...

Uma cidade sem coração,
uma tempestade,
olhaste os vinhedos da saudade,
e percebeste que o amor são socalcos olhando um rio,
o mesmo rio sem nome,
que um dia decidiste que eu seria até morrer...
um rio encurvado entre os seios das montanhas madrugadas,
um rio..., um rio apressado no corpo de uma enxada.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 2 de Agosto de 2014

segunda-feira, 26 de maio de 2014

marinheiro naufragado


acordar sobre o titânio amanhecer
pegar nas tuas mãos de andorinha selvagem
agarrar o mar
se possível
esconder o mar na tua algibeira de cartão

sentir os teus braços no rio que corre dentro de mim
acariciar todas as rosas das tuas pálpebras de marinheiro naufragado
descansar sobre o teu peito
beijar-te
simplesmente beijar-te... gaivota adormecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 26 de Maio de 2014

domingo, 25 de maio de 2014

Noite de tempestade


Dentro de ti, as palavras que oiço,
as frases incompreendidas depois de poisarem nas tuas ténues mãos de areia,
os sítios proibidos,
a montanha escondida nas tuas pálpebras,
dentro de ti, o silêncio,
a ansiedade de partires...
o rio que desce pelo teu corpo até se entranhar nos alicerces da cidade,
a mesma cidade que te absorveu numa noite de tempestade...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 25 de Maio de 2014

sábado, 24 de maio de 2014

Folha esquecida


Sentia-me aconchegado nos teus braços,
regressava a noite ao teu olhar,
e percebia que no meu corpo habitavam beijos de insónia,
lençóis de porcelana entranhavam-se nas tuas pálpebras de luar,
sentia-me envergonhado,
triste...
sentia-me aconchegado,
como se tu fosses um cobertor recheado de poesia,

Um livro não lido,
uma folha esquecida sob a mesa-de-cabeceira,
uma ribeira,

Sentia-me aconchegado nos teus braços,
adormecia,
e... e sonhava,
ouvia,
ouvia os pássaros,
escrevia,
escrevia nas tuas coxas as palavras proibidas,
as palavras... sentidas,

Um livro não lido,
uma folha esquecida sob a mesa-de-cabeceira,
uma ribeira,

O mar,
o mar quando se escondia nos teus seios de Primavera,
acordava o marinheiro sem pátria,
havia uma bandeira,
uma... uma casa que voava,
sentia-me aconchegado... nos teus braços,
os alicerces de uma cidade inventada,
em papel, uma casa do tamanho dos teus lábios...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 24 de Maio de 2014

quinta-feira, 8 de maio de 2014

palavras dos teus olhos


não sei se vais conseguir
não sei se as minhas palavras podem ser escritas nos teus olhos
não sei se as tuas mãos são uma tela
ou um muro envergonhado...
... não sei porque queres fazer-me acreditar que há madrugadas de estanho
não sei porque há cortinados nas tuas pálpebras
negros
tão negros como a própria noite
não sei se vais conseguir...
não sei se te levantarás do imaginário sofá de trapos
tão antigo como os livros que leio
tão estranho como as palavras... as minhas palavras escritas nos teus olhos.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 8 de Maio de 2014

sábado, 3 de maio de 2014

poema de ninguém

foto de: A&M ART and Photos

embainhas-te no meu corpo como uma bala perdida
há na tua mão a espingarda do desejo
oiço entre as sombras e os sons metálicos
pigmentos do teu olhar envidraçado na cidade do feitiço
às tuas pálpebras de pergaminho
vêm a mim as insignificantes flores da paixão
das tuas palavras
as lágrimas da solidão
sem medo
rompem a montanha das árvores de papel
há luz na cabana
e uma cama que nos espera...

(estarás vivo, meu poema de ninguém!)

há dentro de ti uma janela
um telheiro com odores de Carvalhais
um velho espigueiro aproxima-se do teu coração
e entre as frestas das ripas em madeira cansada...
os teus beijos
como nuvens de espuma
saltando
e brincando na eira
cruzo os braços
e espero o regresso do paquete teu corpo
há âncoras de sémen nas palavras da madrugada
e uma flor deita-se nos teus seios de silêncio.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 3 de Maio de 2014

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Sílaba louca

foto de: A&M ART and Photos

A mágica sílaba louca
da ardósia tua boca
desenhando
escrevendo
construindo palavras nas pálpebras do sono,

A mágica sílaba louca
correndo à fonte a água pouca
saltitando
sonhando
as madrugadas de veludo em seu tão distinto trono,

A mágica sílaba louca
como nunca ninguém a viu nas manhãs sem touca
humedecendo
comendo
os censurados cobertores do absorto mono...

A mágica sílaba louca
sabendo que terminaram todas as rimas do silêncio em poupa
a cabeça dançando
e os braços... e os braços abraçando
as insígnias maleitas do desejo nono.


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 14 de Janeiro de 2014

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

pálpebras de cereja

foto de: A&M ART and Photos

apetece-te recortar os sobejantes pedacinhos de tecidos que a vida nos deixou
insistes e desistes
hesitas
recomeças vagueando sobre a sala de jantar com a tesoura da solidão em riste
embrulha-la cuidadosamente nas sombras inquinadas dos desenhos sem tecto
e nas paredes vãs dos teus olhos de avelã...
simples teias de aranha esperando o sopro do teu sorriso
um pequeno movimento transatlântico descai e avança contra as âncoras do desejo
sinto-te mergulhar nas clandestinas veias dos cadáveres cerâmicos da desajeitada cozinha...
apetece-te recortar-me porque imaginas-me como um pedacinho de tecido
negro
com pálpebras de cereja

hesitas
insistes e desistes
recomeças vagueando nas estrelas cansaços dos divãs de xisto
desces socalcos
sobes penedos envenenados com os teus lábios de sabor adocicado...
voltas a descer e hesitas
insistes e desistes
acordas cedo quando ainda dormem todos os medos que a madrugada inventa
às vezes pareces um candeeiro à minha espera
no fundo das escadas
aproveitas o vão da insónia
para recordares os beijos molhados das húmidas noites de navegação interstelar...

vadio sinónimo de mim quando gritas o meu nome
apetece-te recortar-me como o fizeste aos sobejantes pedacinhos de tecidos que a vida nos deixou
hesitas
insistes e desistes
gritas
gritas
gemes como ravinas infestadas de ratazanas coloridas
um pelotão de fuzilamento vem direito a nós
tu... eu...
hesitamos
gritamos
fingimos que somos filhos do mar

… e morremos...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 25 de Novembro de 2013