terça-feira, 31 de outubro de 2023

Poeta

 Podia ser muita coisa

Podia ser tudo

Prefiro ser eu,

Eu.

 

Podia ser poeta

Podia ser tantos poemas

Podia ser poeta, mas acabei por me ficar em Lanceiros dois,

Calçada da Ajuda,

Belém.

 

Podia ser o comboio,

Um popó topo de gama,

Podia ser uma bicicleta, triciclo com assento em madeira,

Podia,

Mas prefiro ser livro,

Prefiro ser lido, folheado,

Como se folheiam os livros,

Como se folheiam os poetas enforcados.

 

Podia ser muita coisa

Podia ser tudo

Prefiro ser eu,

Eu.

 

Eu, o mais ínfimo pigmento de tinta,

Eu, o mais pequenino de todos os poemas pequeninos que se escreveram até hoje…

Num livro, pequenino,

Podia ser muita coisa

Podia ser tudo,

Prefiro ser eu,

O louco travestido de Primavera,

O louco das finas tardes junto ao rio,

 

Zarpavam os barcos,

E eu, e eu podia ser marinheiro, comandante de navio,

Telefonista de um grande petroleiro,

Podia,

Eu.

 

Podia ser tanta coisa…

Tanta coisa que havia para eu ser…

E fiquei-me pelo poeta das noites embriagadas, das noites envenenadas pelo silêncio da espuma-estrela, ou da estrela-espuma…, que habitam a noite, que se vestem de noite,

Se cansam do dia, das marés, e fiquei-me pelo poeta desassossegado, em busca do mar, em busca da terra, queimada, e tanta coisa que havia para eu ser…

 

 

31/10/2023

Lábios amar

 Ilumina-se o teu cabelo

Com a luminosidade desta alegre lareira,

Brilha, o teu cabelo, como o sol da manhã,

Ilumina-se o teu cabelo

Com esta lareira em ebulição,

E da luz do teu cabelo,

Vejo a rua da alegria,

Vejo o silêncio quando mergulha no mar,

Quando o silêncio ilumina os teus lábios.

 

Quando o teu loiro cabelo

Se transforma em poesia,

Se veste de luz,

Se veste de dia,

 

Ilumina-se o teu cabelo,

Com a luminosidade desta alegre lareira,

Brilha, o teu cabelo, como a insónia luar…

Como a insónia madrugada,

Abraçada,

A luz do teu cabelo,

Na luz dos teus lábios amar.

 

 

31/10/2023

Pigmento de cor

 Morres-me enquanto poisa o silêncio

Sobre a caruma do meu corpo

Também ele

Em morte insónia

Morres-me a cada minuto

A cada segundo

Milésimo… de segundo do segundo

Que me morres

Morres-me enquanto cada pigmento de cor

Cai sobre esta folha de papel

E pergunto-me o que me interessa esta a folha de papel

Com pigmentos de cor

Se tu me morres

Se tu me habitas

Também eu

Em morte silenciosa

Morres-me enquanto o Outono caminha em direcção ao Inverno

Que traz o frio

Que traz o Inferno

De que me morres

Antes de acordar o luar

Antes de adormecer a chuva

No teu olhar

De que me morres com falta de ar.

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Lado negro

 No lado negro da lua

Onde todas as noites me vou esconder

Onde escondo este poema

E ele amua,

No lado negro da lua

Onde passo as noites a escrever…

Na companhia desta lareira em chama,

Na companhia do meu sofrer.

 

No lado negro da lua

Onde me vou sentar

Neste pedaço de pedra cinzenta,

De onde vejo o mar…

E um sorriso pela manhã que me alimenta…

No lado negro da lua…

Onde tenho todo o meu sonhar.

 

 

30/10/2023

Mussulo

 Ofereço-te esta flor

Que aos poucos acorda neste poema

Ofereço-te esta flor

Sabendo que na planície acorda o cacimbo

E o cheiro do capim

Poisa na minha mão.

 

Brinco contigo

Pequenino charco de lama e saudade…

Que às vezes salta para cima do zincado telhado do musseque…

Aos poucos me afasto

Aos poucos escondo esta flor

Para te a oferecer,

Quando acordar a manhã,

E depois de um beijo no teu ombro,

Poiso-a docemente nos teus lábios.

 

Oferece-to esta flor

Logo que termine o poema

Como se os meus poemas tenham um fim,

Começo, e morte.

Como se os meus poemas

Fossem um pedacinho de terra fértil

Em pequenos sorrisos depois das chuvas.

Ofereço-te esta flor

Que aos poucos acorda neste poema

Ofereço-te esta flor

Sabendo que na planície acorda o cacimbo

E o cheiro do capim

Poisa na minha mão…

E ao longe, aceno ao Mussulo.

 

 

30/10/2023

domingo, 29 de outubro de 2023

Fim-de-semana

 São simples, os nossos fins-de-semana,

São tão simples, meu amor…

Deixamo-nos ir ao som da lareira,

Os teus olhos, abraçam os meus olhos,

Os meus lábios, escrevem, os meus lábios escrevem nos teus lábios,

E do luar do teu sorriso,

Recebo o silêncio do meu desejo.

 

São simples, os nossos fins-de-semana,

Tão simples como os poemas que te escrevo…

E vou começar a deixá-los sobre a almofada,

Tão simples, são os nossos fins-de-semana,

Deixamo-nos ir ao som da lareira,

E só regressamos de madrugada,

E regressamos um só corpo; o meu corpo e o teu corpo são apenas um corpo.

 

Depois, muda a hora e a puta da noite vem mais cedo,

Não fosse isso, meu amor, não fosse isso e os nossos fins-de-semana eram tão simples…

E tão lindos,

Nos braços destas flores em pequenas lâminas de luz que da lareira brotam…

E são tão simples, meu amor, são tão simples.

 

Depois, mais logo, leio-te “Flor de Fumo” de Nadia Anjuman…

E aí sim, temos a perfeita simplicidade da vida,

De ser feliz,

De abraçar os teus lábios na madrugada,

E perceber que sou apenas uma palavra que fugiu de um qualquer poema…

De uma qualquer sebenta de um adolescente apaixonado…

 

São simples, os nossos fins-de-semana,

São tão simples, meu amor…

Deixamo-nos ir ao som da lareira,

E esquecemo-nos que estamos abraçados ao beijo.

 

 

29/10/2023

 


 


Poetiza

 Poetiza-me com os teus lábios nos meus lábios

Mulher do meu sonhar

Palavra que a manhã lança ao mar,

Poetiza-me com as tuas mãos

Acariciando o meu rosto poético,

Poetiza-me menina das madrugadas

Quando desenho o beijo no teu ombro

E perco-me no teu pescoço,

Como um menino mimado,

Como um menino de ti,

 

Poetiza-me com toda a tua força,

Com todo o teu saber,

Poetiza-me com as palavras que te escrevo,

Com as palavras que semeio no teu seio,

Poetiza-me com os teus lábios nos meus lábios,

Com a tua boca na minha boca,

 

Poetiza-me todos os dias,

A todas as horas,

Em todas as noites,

Quando te abraço,

Quando me perco em ti,

Quando me perco neste salgado mar de inocência,

Poetiza-me nesta canção de Outono,

Com folhas lapidadas,

Das árvores,

E dos pássaros…

 

Poetiza-me com os teus lábios nos meus lábios

Mulher do meu sonhar

Palavra que a manhã lança ao mar,

Poetiza-me com as tuas mãos

Acariciando o meu rosto poético,

 

Poetiza-me com o teu cabelo poisado no meu peito,

Poetiza-me na insónia da noite,

Da insónia em desejo,

De pegar na tua mão…

E morrer,

Poetizado pelos teus lábios de mel.

 

 

 

29/10/2023

 


sábado, 28 de outubro de 2023

Do silêncio voz que te oiço

 Oiço a voz do silêncio

Que me traz a madrugada

Disfarçada de noite

Em noite ensonada

De nada

Amanhã um beijo nos teus lábios

Depois

Oiço a voz do meu relógio

Que me diz

Que me grita;

Amanhã são horas de sonhar.

 

Oiço a voz do silêncio

Dos teus lábios em palavras que recebo

Permitindo-me afoitar esta lareira

Nos intervalos de minha infame-glória

Viver acorrentado às primeiras lágrimas da manhã…

 

E dormir nos teus braços.

Azáfama das tuas mãos no meu rosto dorido

Às vezes triste

Às vezes sofrido

Quando oiço pela manhã

Quando recebo a noite…

A voz do silêncio,

 

Oiço a voz do silêncio

Que me traz a madrugada

Disfarçada de noite

Em noite ensonada

De nada,

Esta velha jangada

Em pedra lapidada

Durante a noite

Quando os nossos corpos se fundem

E formam a mais ínfima partícula do desejo

Da voz do silêncio

No silêncio de viver.

 

 

28/10/2023

Mundo

 Este mundo onde habito

E não me apetece habitar

Neste mundo onde caminho

E não me apetece caminhar,

Tão pouco, ver o mar.

 

Este mundo desalinhado

Podre e triste,

Frio e escuro,

Este maldito mundo apedrejado…

Deste mundo nunca visto,

 

Neste mundo desejado.

Este mundo onde habito

E não me apetece habitar,

Onde crianças morrem,

E os adultos…, e os adultos são proibidos de sonhar.

 

 

 

28/10/2023

Noite de mim

 Encosta o teu olhar

Ao meu olhar,

Abraça-me, abraça-me clandestinamente

Como se eu fosse um foragido,

Um condenado por um qualquer pequeno delito,

Enquanto me sacio com esta lareira,

Que me ilumina, que nos ilumina…

Quando mais logo, quando mais logo regressar a noite…

E a noite nos beija,

Nos beija sibilinamente,

 

Abraça-me, encosta o teu olhar

Ao meu olhar,

Abraça-me clandestinamente,

Enquanto todos os pássaros dormem,

E a noite se veste de poema.

Abraça-me e encosta o teu olhar

Ao meu olhar,

Abraça-me enquanto a lua poisa nos teus seios…

E o luar,

E o luar escreve em ti… amo-te,

Dos teus olhos de mar,

Como eu,

Clandestinamente.

 

 

28/10/2023

Lábios de mel

 Desenho o fatídico beijo nos teus lábios de mel

Dos teus lábios poéticos

Do dia que não quer acordar

E no meu peito

Sinto os teus olhos de mar,

 

Desenho o beijo

Em teus lábios de mel

Manhã sonolenta

Manhã quase perfeita

Nas tuas doces mãos de seda,

 

Nas tuas doces mão de feiticeira

Quando desenho o beijo

Transparente

Leve como um pequeno suspiro

Quando inventas um sorriso,

 

Desenho o beijo

O fatídico beijo

Em teus lábios de mel

Nos teus lábios em desejo

Por palavras,

 

Sombras nos teus lábios

Beijo envenenado que desenho

Em teus lábios de mel

Em teus lábios de purpura insónia…

Quando a insónia é uma caverna de prazer.

 

 

28/10/2023

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Flor do meu jardim

 Pareces um anjo do meu sonhar,

Flor do meu jardim,

Poesia

Do meu dia,

Pareces uma estrela-do-mar

Quando dormes assim,

Embrulhada no perfume da insónia,

Pareces um anjo do meu sonhar,

Pintura da madrugada,

Pareces uma flor,

Uma flor do meu jardim…

Que nunca se cansa de te olhar.

 

 

27/10/2023

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Nos teus lábios

 Aos poucos, a mesa ficou vazia,

Aos poucos, a casa ficou vazia,

Tal como eu, só…

Aos poucos, davas-me a mão,

E aos poucos,

A mesa voltou à azafama de outros tempos,

E a casa,

Novamente em alegria.

 

Aos poucos, pensava que enlouquecia,

Aos poucos, acreditava que era impossível voltar a voar…

Aos poucos, com a tua mão,

Aos poucos me fui erguendo,

Aos poucos tropeçando…

E hoje és o meu poema e a minha canção…

Aos poucos vou desenhando sorrisos na manhã,

E escrevendo beijos nos teus lábios.

 

 

26/10/2023

Os teus olhos

 São os teus olhos, meu amor,

São os teus olhos que iluminam este túnel frio e escuro,

Que alguém apelidou de vida.

São os teus olhos, meu amor,

São os teus olhos que me servem o pequeno-almoço do desejo,

De olhar os teus olhos.

 

São os teus olhos, meu amor,

O primeiro poema da manhã, mesmo quando a manhã se esquece de acordar,

E os teus olhos me abraçam,

E os teus olhos me lançam ao mar…

São os teus olhos, meu amor,

São os teus olhos o primeiro ramo de flores que recebo, pela manhã,

 

 

 

26/10/2023


 Como dizia a minha mãe…, seja o que Deus quiser.

Diáfana maré

 Silêncio

Tuas mãos em meu rosto

Tuas mãos abraçadas ao meu coração

Teus lábios de Agosto

Quando o mar se veste de canção,

 

Silêncio

Quando o mar é a luz do meu amanhecer

E dos teus olhos recebo a manhã em despedida

Que não se cansa de crescer

Que não tem medo da partida,

 

Silêncio

Tuas mãos em meu rosto

Teu sorriso embriagado em maré diáfana

Meu silêncio desgosto

De ver partir a manhã profana.

 

 

 

26/10/2023

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Círculo de luz

 Quando te ris e desenhas no meu olhar

Um círculo de luz com olhos verdes,

Quando te ris e escreves no meu olhar,

Amo-te,

Quando te ris, meu amor…

E poisas no meu rosto,

A tua mão,

E eu, aprisiono-a e finjo que durmo…

E finjo que os meus olhos são o mar.

 

 

25/10/2023

Teu beijo

 Sento-me nesta cadeira fria

E cinzenta

Sento-me nesta cadeira em solidão

Que lamenta

A flor-cardo que afugenta do coração

O medo que sentia,

 

De me sentar

Nesta cadeira

Escura e fria

Parecendo o remorso de uma ribeira,

 

Sento-me nesta cadeira

E pela janela olho a manhã em despedida

Que corre calçada abaixo em correria

Não percebendo que nesta cadeira

Habita o sonho da partida

Em direcção à fogueira,

Em direcção ao nada,

 

Nesta cadeira fria e escura e sem madrugada

Sentada

Sobre mim a forca da alvorada

De corda na mão e silêncio nos lábios

Me aponta a caneta para escrever

O meu último desejo;

Escrever até morrer,

E morrer em teu beijo.

 

 

25/10/2023

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Oração

 Suplico-te senhora que ilumines o meu caminhar

E o de minha amada,

Que me alegres o dia

E a noite de sonhar…

E me tragadas a cada madrugada,

A mim e à minha amada,

Poesia para nos alimentar.

 

Suplico-te senhora que ilumines o meu caminhar,

Que com a luz do teu olhar

Me tragas os olhos do mar

E o sorriso do luar.

 

Suplico-te senhora que ilumines o meu olhar,

Que construas na minha mão

Uma jangada,

Suplico-te senhora do meu iluminar

Que me dês a mim e à minha amada

Todas as palavras do mar…

Para te oferecer esta oração…

 

 

24/10/2023

domingo, 22 de outubro de 2023

Imaginação

 Encosta a cabeça ao meu ombro

Imagina que a lua poisa nos teus lábios

Imagina que o mar…

… que o mar brinca nos teus olhos,

 

Encosta a cabeça ao meu ombro

Imagina que o sol corre juntamente com o vento…

No teu cabelo,

Imagina que todos os pássaros cantam para ti

E que todas as manhãs

São manhã de algodão-doce,

 

Imagina o silêncio escondido na tua mão

Quando imaginas acariciar o meu rosto,

Também ele, imaginado por um louco,

Imagina que as gaivotas são filhas da preia-mar…

E que todos as estrelas-do-mar,

São imaginadas pela tua boca,

 

Que imagina o beijo

Encosta a cabeça ao meu ombro

Imagina a lua,

Imagina o sol,

Imagina a noite imaginada por um poeta,

Quando te despes vagarosamente…

E eu,

E eu imagino-te nos meus braços,

Baloiçando,

Até que depois ouvimos os gritos do mar…

 

 

22/10/2023