O teu corpo quando
absorvido pela perspectiva cavaleira do desejo,
a tua pele tracejada
nas ruelas da minha solidão,
sinto-te porque
existe à minha volta uma lanterna de silêncios,
sinto-te porque em
ti crescem as héderas nocturnas da cidade das sílabas,
e cruzam-se as
palavras nos comboios que descem a montanha do amor,
há rochedos
enfeitados com pálpebras de papel amarrotado,
olhares que me
aprisionam e me transformam em apitos de suor,
na areia da insónia
alguém desenha beijos,
e o sonho os leva,
leva-os... até deixarem de ser beijos,
depois, depois os
beijos ressuscitam a aparecem como algas imperfeitas que o medo
alimenta,
o corpo flutua na
morte clandestina do homem com rosto de triângulo,
e um dos catetos
abra-se à hipotenusa,
Na lapela, um nome,
ilegível, gatafunhos...
apelidei-o de “o
senhor anónimo”,
cerca de quarenta
anos, apátrida, e marinheiro de profissão,
O teu corpo, pouco
ou nada me interessa,
embrulhado em
geometria... apenas sobressaem os segmentos de recta do cansaço,
o barco onde
trabalho e habito... há muito deixou de ter flores e cartas com
corações...
a palavra “amo-te”
não faz sentido, não pertence ás marés por onde navego,
peço que regresse o
vento,
e vem a tempestade,
peço a tua pele
tracejada... e sou apedrejado por crianças em fúria, como se eu
fosse o culpado pela tristeza das lâminas da madrugada,
e não tenho onde me
esconder,
precisava apenas de
um pedaço de pano,
um cortinado
envenenado,
o teu corpo, pouco
ou nada me interessa,
comparado com a
multidão de sombras que me acorrentam ao cais dos tentáculos de
néon.
Francisco Luís
Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 24 de
Julho de 2014