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foto de: A&M ART and Photos
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A musicalidade das tuas mãos poéticas, sinto em
mim as teclas do piano onde poisas o teu silêncio, e mergulhas no
Sol e és levada para as nuvens invisíveis que habitam no meu peito,
a rua está deserta, e chove, e a lareira ficou acesa, há um
cadeirão pronto a receber-te e um livro esguio e macio para abraçar
a tua doce pele de chocolate,
Sinto-me criança envolta de farrapos e antigos
utensílios de cozinha, quero ligar o interruptor do amor, aquele que
há muito foi desligado pela intempérie do desejo e não consigo,
sou tão pequeno, sou tão baixinho... que não o alcanço com os
meus dedos de arame envergonhados pelo reumatismo e pela insónia de
procurar-te entre as fotografias e de nunca ser eu capaz de te
encontrar, sem
Atrasado?
Sempre ignorado, vergado, mergulhado nos lençóis
da infância quando apenas tínhamos um cobertor que servia para nós
os três, não havia divisões na nossa casa,
E apenas
Chita suspensa num cordel,
A vedação de nós, separados por milímetros de
estampados impregnados com cheiros do outro lado da rua, e uma
varanda, de vez em quando, agoniava-se com a nossa presença,
E apenas pássaros sobre o teu cabelo curto de
alfazema...
E apenas
Chita suspensa num cordel,
Sempre impermeável como um oleado telhado sobre a
velha estrutura em madeira, chovia-nos e às vezes parecíamos
candeeiros de parede esperando a mão de quem os acende, a chama era
ténue, e tremíamos como arbustos esperando o regresso do Tejo dos
tempos que nos visitava, entrava pela varanda, os primeiros dias
ficava à nossa espera até que um de nós lhe pegava e o trazíamos
para dentro, depois
E apenas
Chita?
Depois ele mesmo fazia as cerimónias da casa, subia
à varanda, ora fica a fumar o seu cigarro ora entrava logo após
regressar, e sentava-se no colo de um de nós, quase sempre fazia-o
no meu, talvez porque eu era o que mais saudades tinha dos tempos dos
barcos paquetes rasgando os Oceanos meninos das floreiras em
tristezas Primaveras,
Chita suspensa num cordel,
E apenas queríamos viver como todos os outros
viviam, e apenas esperávamos o regresso da vida condigna como todos
os outros a tinham, e apenas..., sentíamos o pulsar dos corações
da geada nos vidros estilhaçados, tínhamos janelas incompletas,
vazias, doentes, janelas com quadrados espaços onde tudo entrava
menos o calor e a saudade, tínhamos vergonha da vergonha quando em
nada tínhamos de nos envergonhar, e sabíamos que as escadas
graníticas, durante a noite, desapareciam, e ficávamos sem acesso à
rua, madrugada dentro
Sempre,
A chita?
Entravam, embriagadas como varões em aço esperando
a mão do operário especializado em ferro, e logo pela manhã, e
logo que fosse dia, deitávamos-lhe água a ferver, desaparecia-lhe a
embriaguez e o gelo e após alguns minutos voltávamos a ter escadas
de acesso à rua, chita suspensa num cordel, metralhadoras ouviam-se
em volta do chafariz junto à igreja, gorgulhos de felicidade
cresciam nos arrozais dispersos dos teus lábios de lânguida manhã
de Outono, e os outros besouros adormeciam na nossa varanda enquanto
não regressava o Tejo, e de cigarro na boca, e de pulseira no braço,
e de lenço ao pescoço...
Gargantilhas voando entre gafanhotos e portas de
madeira prensada, tristes e belas, e envergonhadas pelas janelas sem
vidros, e da casa
Sem paredes, nada, apenas
Chita?
E um cordel de medo a atravessar o espaço vazio de
nós...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 2 de Novembro de 2013