segunda-feira, 2 de março de 2015

Os silêncios da geometria

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Sentia-me opaco
indigente
afogado nos silêncios da geometria
sentia-me um texto
um... um transeunte
calcinado pelo desassossego da luz
e dos esqueletos vestidos de luz...
sempre que acordava
pensava que me tinha esquecido de acordar
as palavras
e o vento
levando os meus braços para o mar
Março
e cá estamos
desesperados
e velhos
no cansaço inventado pela Primavera
quase lá
as gaivotas em telepatia com os meus sonhos
os barcos ancorados no meu peito
e um debilitado relógio de pulso
em saltos
na calçada do “Adeus”
porque a morte é cega
porque o vício é o vício
dos livros
e dos desenhos
à mercê dos morcegos
e dos murganhos...
a eira em chamas
e os cigarros enlouquecidos nos lábios de uma aranha
acreditam?
em saltos
na calçada do “Adeus”
porque a morte é cega
e eu... e eu... sentia-me opaco.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 2 de Março de 2015


domingo, 1 de março de 2015


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Podíamos ancorar as estes versos, permanecermos impávidos das celestes lágrimas do Universo, Saudade? Caminhei, sentei-me sobre as quatro sombras da preguiça, sofri, sonhei, aprendi que o amor é um cubículo sem janelas,
Junto ao mar,
É tão lindo, o mar, mãe...
Os barcos e as jangadas de silêncio, os embriagados corpos dançando no texto, encerra-se o livro, e morre o escritor,
Um poema...
Palavras, sons, imagens, barcos, marés... sucata amaldiçoada pela fresta do luar, a astronomia e a matemática, dormem, saciam-se nas metáforas da insónia, corpos, nus, entre eles... o sexo desenhado em cada esquina, a porta do quarto rangia, gemia, e sabíamos que ninguém nos ouvia,
Orgia?
De palavras e de poesia,
Um poema?
Negro, opaco, sem corpo nem cabelo, morto, fictício... mas pouco, pouco, como os dias à tua espera...


(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó

morte envergonhada

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


não inventes nomes
detesto nomes
ruas
e cidades
das palavras
os orgasmos sentidos
dos livros
as palavras dos orgasmos sentidos...
o silêncio
a morte envergonhada
à minha porta
sem prazer

crescer
voar sobre os telhados desanimados
tristes
e... e cansados
não inventes nomes
moradas
idade
sexo
para quê?
quando há na madrugada uma mistura gasosa de sílabas e vogais enlouquecidas
fumadas
e... e sentidas

as palavras
que inventas
e comes
em cada alvorada sofrida...
não inventes imagens de verniz
que a chuva absorve
em cada tempestade
trazida
por um homem
louco
ou... partida
ou apátrida loucura do homem em cada tempestade... trazida.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Março de 2015


Hoje, Domingo, Março, primeiro dia...


Não quero ser como tu,
uma cratera de palavras,
invisíveis,
e mortas,
não,
não quero pertencer às tuas mãos,
não,
não quero poisar no teu peito envenenado pelo silêncio de pedra,
e às vezes, sem o saber, escondo-me na tua sombra,
como um rio amachucado,
dentro de uma folha em papel...
como um rio engasgado nos rochedos da melancolia,
hoje, Domingo, Março, primeiro dia...
de quê?
da tristeza?
ou... ou do inferno entardecer vestido de cidade...
ruas,
automóveis enlouquecidos correndo até ao mar,
avenidas e ruelas,
Março,
primeiro dia...
não,
não quero ser como tu...
um calendário pendurado numa das quatro paredes do abismo,
sem coração,
sem pálpebras de nada quando acendes a luz e a literatura voa nos nossos corpos,
somos dois pontos esquecidos no espaço,
um buraco negro,
corremos em direcção à estrela mais próxima...
e acordam as cinco primeiras canções das estátuas de pedra,
há no teu olhar as sete imagens da seara do sono,
e dos sonhos vejo os transeuntes procurando a sombra do pôr-do-sol,
estás triste, hoje,
primeiro dia,
Março,
e sem o saber... hoje é Domingo...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Março de 2015
(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Beijou-me literáriamente, sorri, levantei o olhar em direcção às palavras de amar, não tive coragem de abraçá-la com as vogais e as consoantes do poema, alegremente imaginava-me um transeunte sem identidade, nos sonhos aparecias vestida de melancolia, as fotocópias e as fotografias, sem identidade, nome, palavras de amar
Amanhã?
Não o sei, percebi que as pálpebras do desejo habitavam nos nossos corpos de cinza, perdia-me nos teus braços como se perdem as gaivotas nos cacilheiros da saudade, palavras, palavras enigmáticas em construção, o corpo minguava na escuridão, o monstro das quatro cabeças dançando nos meus ombros, sentia-me uma circunferência sem olhar, sem... sem um corpo para aportar, a saudade
Sentidas,
Os triste silêncios da minha infância saltando os muros da Primavera, as amendoeiras em flor, as andorinhas apaixonadas, e eu
Sentidas,
A saudade que os meus braços abraçavam,
Saudade?
Caminhei sobre as pedras sonolentas da literatura, cansei-me dos teus poemas e da “merda” dos teus desenhos,
Sentidas?
Sem identidade...


/(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 1 de Março de 2015


sábado, 28 de fevereiro de 2015

as sombras do amanhecer


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


não inventes nos meus sonhos
a embriaguez da despedida
o silêncio pincelado de luar
quando ainda não existe luar na tua mão
não inventes
sonhos
viagens sem regresso
viagens sem partida
há dentro deste corpo
todos os alicerces da melancolia
há no teu olhar
as palavras da madrugada
sem fantasia...
e não sei porque me sento nesta pedra
esperando o esqueleto de papel
há muito esquecido na floresta
sem amor
sem paixão de saltar as sombras do amanhecer
e sempre que quero
não sei onde habitam os teus lábios
comestíveis beijos
não
inventes
sonhos nos meus sonhos sem vida...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 28 de Fevereiro de 2015

Crianças de luz


Não penso
não imagino as palavras semeadas nos relvados da saudade
não penso
não durmo
acreditando nas marés de vidro
descendo da montanha
imagino...
riscos suspensos na alvorada
crianças de luz gritando pela liberdade
e nada
nem ninguém
nas ruas desta cidade.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 28 de Fevereiro de 2015

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Os outros, o monstro das quatro cabeças brincando dentro de mim, saltava à corda, subia aos pinheiros pintados em papel cenário..., e havia sempre um pigmentado sorriso nos seus lábios, era Sexta-feira, daquelas Sextas-feiras que iluminam as imagens a preto e branco, o sono, a agonia de olhar o mar desenhado numa das paredes do quarto, escuro, ainda boiava a noite nas veias da adrenalina constelação do amor, aquele amor inventado apenas para adormecer na poesia, nada mais do que isso...
Isso o quê, meu amor!
Os outros, o monstro
Batem à porta,
Livros, livros nas mãos cardume do carteiro, assine aqui se faz favor, assinei, foi-se embora, escondido no arvoredo comecei a acariciar o envelope, lá dentro percebia-se que alguém existia para me abraçar, daqueles abraços trigonométricos, sabes?
Sei, os outros, o monstro, a perfeita nostalgia ,sebes de papel laminado voando sobre o jardim
O gajo passou-se, dizem...
Que sim, livros, Isso o quê, meu amor! Batem à porta, e falou comigo.



(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 27 de Fevereiro de 2015

insónia da noite


as palavras amaldiçoadas do teu poema
moribundo
sem personagens nem cidades floridas
os teus sonhos encantados
masturbados na triste insónia da noite
quando a noite deixou de existir
e hoje
apenas um cortinado de fumo
sem olhar
sem alma
se tens alma no teu amar...
se tens olhar na tua alma de brincar...
e as palavras de chorar
as fechaduras do teu peito
e as janelas dos teus seios
sem fotografia para o mar
se há olhar na tua alma
então este barco não é sucata
nem monstro da infância
se há alma no teu amar
porque existem correntes em aço
que me aprisionam a este muro em xisto...
com lábios em desejo
desejando a insónia da noite...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 27 de Fevereiro de 2015
Os teus lábios acorrentados aos meus beijos embriagados pelo desejo, não o sinto, o vulcão da tua pele, não vejo o sorriso da tua mão, em vulcão, mergulhada nas palavras que o silêncio desenha na melancolia,
É falso,
O dia disfarçado de lápide, os outros destinos rejeitados pelo cacimbo, há uma fogueira no corpo da sinfonia do amor,
É falso,
O falso prazer, a liberdade to TEXAS e Cais do Sodré gingava na penumbra salgada do abismo,
O querido dança?
Fumo,
É falso,
São falsas, os textos a beleza e o amar, quando o amar pertence aos clandestinos eternos sonos dos Narcisos de prata, o pilar central do orgasmo mergulhada entre duas árvores,
Amar, amor,
Ao fundo os homens calcetando labaredas em poesia adormecida... é falso, que o amor morra nas planícies salgas do deserto...



(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 27 de Fevereiro de 2015