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sábado, 27 de maio de 2023

O pecado do corpo

 

Perguntávamos ao amor

Onde escondia o pecado do corpo

Perguntávamos a Deus

Onde escondia a equação do prazer

Do corpo

Em finíssimos uníssonos de gemido

Perguntávamos à paixão

Onde guardava os beijos da Primavera

 

Perguntávamos ao sono

Se o amor

Ainda escondia o pecado do corpo

O apetecido corpo

Que bem semeado

Por palavras…

Sorri em cada madrugada

 

Perguntávamos ao corpo

Se ele

O corpo

Ainda queria ser corpo…

Nas mãos do poeta louco

E tão pouco

Quase lá…

A noite inventa o corpo

Abraça-me

E dois pequenos corpos de luz…

Dão corpo

Ao pecado do corpo.

 

 

 

 

Luís Fontinha

27/05/2023

domingo, 26 de março de 2023

Ausência

 Habito neste corpo sem espaço,

Deste corpo ensanguentado

Quando a Primavera promete um abraço…

Neste corpo ausentado.

 

Habito dentro deste mar

Que transporto na minha mão,

Habito em todas as noites de luar,

Das noites onde procuro o pão.

 

Habito neste corpo sem nome,

Deste corpo sem identidade…

Habito dentro deste corpo em fome…

 

Da fome das palavras que deixarei de escrever.

Habito nesta ausência que traz a saudade…

Na saudade de morrer.

 

 

 

Alijó, 26/03/2023

Francisco

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Mil pedaços

 

Acordo

E sou mil pedaços

Pedaços do meu corpo

Que a tesoura da insónia

Durante a noite

Recortou em silêncio…

 

 

Alijó, 03/01/2023

Francisco Luís Fontinha

domingo, 1 de janeiro de 2023

A prisão do mar

 Da prisão

À da alma quando a vendes ao diabo

Na prisão de ventre

Da prisão dos braços

E das palavras que brincam nos teus braços,

 

A prisão sem pão

À prisão com pão

Tudo é prisão

Tudo

Tudo é uma prisão

Da prisão ao salário

Do salário às nuvens

A prisão do mar

Na prisão de um barco

Um barco preso no mar

Do mar sem salário,

 

A prisão da chuva

E do vento que transporta a chuva

Depois temos a prisão da lua

Do luar

E do corpo que dorme no luar,

 

À prisão do corpo

Quando este corpo semeia no teu peito

Uma prisão de silêncio

Numa prisão de desejo

E se o desejas

Prende-te ao desejo

Acorrenta-te às sombras que a noite deixa nos seios dela,

 

A prisão vaginal das manhãs sem poesia

À prisão do poema

Quando o poema

Dorme na tua cama

Dorme em cada dia,

 

E se a tua cama for um livro

Um livro com um só poema

Um poema

Uma mão

Quando te masturbas na madrugada,

 

Tudo

Tudo é uma prisão

Ou uma não prisão

De nada

Ou com tudo

Que a prisão aprisiona o teu pensamento,

 

A prisão de uma lareira

Quando um pássaro vadio canta à tua janela

E o pássaro sem pão

Pede-te que o libertes

Libertes da prisão

Na prisão deste mar,

 

A prisão dos teus mortos

Em uma prisão de fotografias

Na prisão de um álbum

À prisão numa pequena caixa de sapatos

Na prisão de uma lápide

Quando a lápide é uma prisão

De quatro pedras graníticas

Sem sol

Sem nada;

Uma prisão enganada.

 

 

 

 

 

Alijó, 01/01/2023

Francisco Luís Fontinha

sábado, 17 de dezembro de 2022

Destino

 Não morras no meu corpo,

Não suportaria mais mortes no meu corpo,

Não morras enquanto o dia é dia,

Enquanto o dia é um tapete de sombra.

 

Não morras no meu corpo,

Porque a morte é uma viagem sem destino,

E acredita que não me apetece viajar…

 

E tão pouco sei o que é o destino.

 

Não me morras,

Não me morras como morreram as minhas árvores,

Os meus pássaros,

E todos os meus barcos,

Não me morras neste corpo em silêncio,

Que o granito que transporto nos ombros

É tão pesado,

Tão pesado…

Que mal consigo voar.

 

E se um dia morreres no meu corpo,

Avisa-me; para que eu saiba que vais morrer.

 

Não. Não morras no meu corpo.

 

 

 

 

 

Alijó, 17/12/2022

Francisco Luís Fontinha

Corpo sonâmbulo

 Em que rio te escondes

Corpo sonâmbulo das vagabundas noites

Mestre das palavras

Feiticeiro dos dias de neblina,

 

Em que corpo habitas

Cansado menino sem esperança

Melodia das manhãs de Inverno…

Que corpo é este

Que transporto

Que nada me diz

Quando desce a lua sobre o meu cabelo,

 

Não sei em que corpo te escondes

Se tens um corpo para te esconderes,

 

Sonâmbulo amigo

Amigo que procuras as espadas

E te suicidas com elas,

 

E te libertas das canções envenenadas pelo silêncio

Teu corpo

Meu corpo

Menino sem Pátria

Menino das sandálias e dos calções;

Teu corpo

É o meu corpo

E tu

Meu querido corpo sonâmbulo

Abres a mão

Abres a mão e esperas que cada pingo de chuva

Seja apenas uma palavra…

 

Nada mais do que uma palavra

Uma palavra disfarçada de pingo de chuva.

 

 

 

 

Alijó, 17/12/2022

Francisco Luís Fontinha

domingo, 27 de novembro de 2022

Um pequeno nome

 Dêem-me um nome

Um pequeno nome

Dêem-me um pedaço de terra

Para sepultar o meu nome

Um pequeno nome

 

Nome sem nome

Numa árvore com nome

Um poema sem nome

Um pequeno nome

Este meu pobre nome

 

Um nome

Para este retracto anónimo

O último pendura na última parede

Fria e nua e sem nome

Um nome

Um pequeno nome

 

Dêem-me um nome

Para o meu corpo sem nome

Porque não tenho nome

Nem tenho uma parede para pendurar o meu corpo

 

Sem nome.

 

 

 

 

Alijó, 27/11/2022

Francisco Luís Fontinha

sábado, 19 de novembro de 2022

Clitóris da insónia

 O oiro dos teus olhos

Em cada palavra escrita

Em direcção às alegres nortadas

Dos pobres jardins de prata

Termina o corpo

Nas tuas mãos incendiadas pelo clitóris da insónia

Perco-me neste livro

Que escrevi

Escrevo

E queimo mesta fogueira de medo

A cidade morre-me

A cidade cansa-se da minha sombra

E encontro os círculos do desejo

Nos teus lábios de silêncio

E sei que as minhas cartas são poeira

Sombra destes pobres ossos

À janela da água salgada que alimentam o teu cabelo

E dizem-me que amanhã

As árvores pertencerão às dízimas lâminas deste corpo em combustão

Como toneladas de sucata na lareira da paixão.

 

 

 

 

 

Alijó, 19/11/2022

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Máscara

 Há-de chegar a tua máscara

Com o nome do meu corpo

Há-de chegar à tua boca

A minha máscara

Com o meu nome.

 

Há-de chegar

à minha boca

Os meus lábios

As minhas palavras

Há-de chegar o Inverno.

 

Há-de chegar o poema

Um corpo vestido de poema

Em poema

O teu corpo silenciado pela minha boca

Sem espaço o vento que te ergue atá à lua.

 

Há-de chegar ao meu corpo

O teu poema

Do meu corpo

Há-de chegar

O suicídio das palavras em poema.

 

Há-de chegar a tua máscara

Com o meu nome

No meu corpo

A abelha que transportas na mão

Há-de chegar a chuva.

 

 

 

 

 

Alijó, 18/11/2022

Francisco Luís Fontinha

Uma mão mergulhada no fogo

 Este corpo que me transporta

O meu corpo

Um corpo que se esqueceu do nome

Um corpo com duzentos e seis ossos

Uma mão mergulhada no fogo

 

Uma bola de fogo

Este corpo

O meu corpo

O teu corpo

Um corpo onde habitam homens

 

Um corpo onde habitam mulheres

Crianças

E ossos

O meu corpo

Uma pequena bola de fogo

 

Que incendeia

Que se move

Tem massa

Paixão

Ama

 

Um corpo envenenado

Um corpo apaixonado

Em grito

No grito

Deste corpo

 

Um pedaço de aço

Um corpo que voa

Que chora

Que dorme

Um corpo que corre

 

O meu corpo

Uma pequena bola de fogo

Um corpo que vive no sol

Brinca na lua

O meu corpo entre corpos

 

Um corpo só

Um corpo sem amigos

Um corpo entre corpos

Um corpo

Este corpo que detesta o meu corpo

 

O corpo em fogo

Dentro do fogo

Na tua boca

O meu corpo

Onde escrevo

 

O meu corpo

Um corpo sem sentido

Na tua sombra

Entre corpos

Deste corpo

 

O meu triste corpo

Dentro do teu corpo

Onde bebo

Onde fumo

O teu meu corpo.

 

 

 

 

Alijó, 18/11/2022

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Cacimbo

 

Deixei de sentir

Este corpo que me transporta

Já não sou nada

Deixei de sentir a melodia das palavras

Deixei de comer

 

E de olhar as madrugadas

Deixei de viver

Debaixo deste velho cacimbo

De palmeiras invisíveis

E de mares angustiados

 

Deixei de olhar estas velhas fotografias

De ossos

E de rostos envenenados pelo silêncio

Deixei de sentir

Sentir as cores da madrugada

 

Deixei de perceber

O segredo das pedras cinzentas

Deixei de me olhar

Quando este espelho de insónia

É a saudade que lamentas

 

Deixei de beber estas lágrimas que dormem na fogueira

Quando este poema que me assassina

Brinca nesta pobre lareira

Deixei de sentir

Sentir este corpo que me transporta

 

 

Alijó, 16/11/2022

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Instante

 Cada instante

É uma estrela em movimento,

Nesse instante

Há um corpo que poisa sobre o silêncio,

Em cada silêncio,

Há um pequeno instante,

E um corpo que se ergue

Contra medo,

 

Em cada instante

Desperdiço o instante anterior,

Aquele em que o meu corpo

Poisava sobre o silêncio,

Mas agora que deixei de ter instantes,

E tenho movimento,

Posso dizer que sou uma velha estrela…

De cada instante.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 30/09/2022

sábado, 22 de janeiro de 2022

A sebenta


 

O teu corpo;

A sebenta onde adormeço o poema cansado,

Onde deito os beijos desejados,

Entre o espaço abraçado,

Entre os versos envenenados.

 

O teu corpo;

Engraçado,

Equação sem nome

E que brinca no caderno quadriculado,

No cansaço sem fome,

 

Do cansaço aguentado.

O teu corpo desejado

Que caminha sobre o mar,

É o teu corpo argamassado,

Argamassado nos poemas de amar.

 

 

Alijó, 22/01/2022

Francisco Luís Fontinha

domingo, 19 de dezembro de 2021

Menino traquina

 

Desço o teu corpo

Até encontrar a fina madrugada.

Na tua pele de amanhecer,

Habita a fogueira enamorada,

Das palavras de escrever,

Nas palavras de brincar,

 

Desço o teu corpo

Maré de mar,

Rocha incandescente a arder,

Rocha amorfa que não sabe falar,

Falar sem querer,

Querer que lá longe, lá longe zarpar

 

Para a lua a crescer.

Desço o teu corpo ancorado

Na minha mão desleixada,

Que pertence a este corpo envenenado,

Envenenado pela madrugada,

Desço o teu copo,

 

Até às profundezas do amanhecer,

Cidade assassina,

Cidade a arder;

Onde brinca um menino traquina,

Desço o teu corpo,

Teu corpo de sofrer…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 19/12/2021

sábado, 4 de dezembro de 2021

Mulher

 

Mulher,

Silêncio que se despe em mim,

E mergulha na noite em papel;

A ousadia de viver,

Vivendo neste jardim,

Jardim a crescer,

Junto a este hotel.

 

Mulher,

Canção envenenada, palavra em revolta.

Mulher, criança mimada,

Mimada à minha volta.

 

Mulher,

Flor silêncio que se despe em mim,

Da noite em combustão,

Mulher,

Mulher de mim,

De mim, corpo paixão.

 

Mulher,

Corpo vestido de morte,

Cansaço desta montanha apagada,

Morte de má sorte,

Sorte em ser geada.

 

Mulher,

Que te vestes de mulher,

E ousas ser outra mulher.

Não te vistas,

Nem te ouses.

Mulher é mulher,

É poema,

Verso enfeitado,

Mulher é flor;

Não o sejas porque alguém o quer,

Porque mulher

É chama,

É livro envenenado,

É palavra e é amor.

Mulher,

Mulher é mulher,

Mulher é flor,

Mulher é amor.

 

Mulher,

Silêncio que se despe em mim,

E mergulha na noite em papel;

Mulher,

Não queiras ver o meu jardim,

Jardim de mulher,

Mulher

É amor,

É flor;

Mulher

É mulher,

Mulher é palavra semeada,

Mulher,

Mulher é livro, mulher é batel,

Mulher é poesia encantada,

Mulher,

Mulher é mulher,

Mulher de geada.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 4/12/2021