quinta-feira, 27 de abril de 2023
segunda-feira, 2 de janeiro de 2023
A vida
Todas as paredes
As paredes de uma sala
São tristes
São feias
São sós,
Juntamente com as paredes
de uma sala
Habitam outras paredes
Com cor
Sem cor
Mas todas elas
Tal como as paredes de
uma sala
São tristes
São feias
E são sós,
Depois suspendem na
parede de uma sala
Que é triste
Parede de uma sala que
está só
E é extremamente feia
Um quadro
Um quadro sem nome
Um pedaço de tela
Aprisionado entre quatro
ripas em madeira
Um caixão?
Não
Um caixilho
O caixão serve para
transportar corpos
Ossos
Chagas invisíveis
O caixilho aprisiona um
pedaço de tela
Um pedaço de tela sem
nome
Feio
Muito feio
E triste
Muito triste,
E de que serve dar um
nome a um pedaço de tela
Aprisionado dentro de
quatro ripas?
Caixilho?
Sim
O caixilho
E qualquer que seja o
nome do quadro
Que está suspenso na
parede da sala
Parede da sala que é feia
Que é fria
E triste
Será sempre um pedaço de
tela
Dentro de quatro ripas
Também tristes
Também sós,
A casa que tem paredes
frias
E tristes
E sós
Que nas paredes da sala
Frias
E tristes
E sós
Têm no peito um pedaço de
tela
Também ela triste
Também ela só
Também ela fria
E uma janela
Só
E triste
E fria,
Em frente à janela
Uma árvore
Triste
Uma árvore fria
Só
Durante o dia
Poisam sobre a árvore
Pássaros tristes
Frios
E sós
Durante a noite
Sem que ninguém consiga
ver
Poisa a lua
E as estrelas,
A casa triste
Feia
E só
Tem lágrimas
Tristes
Feias
E sós
E tal como o pedaço de
tela
Aprisionado dentro de
quatro ripas
Não tem nome
Nem fome
Mas tem lágrimas
Tem um pedaço de tela
Tela muito fria
Muito triste
E só,
E quando a luz se
extingue na mão das estrelas
Este pedaço de tela
Aprisionado dentro de
quatro ripas
Tristes
E sós
Também se extingue
E este pedaço de tela
Não fala
Não come
Não bebe
Ou fuma
E este pedaço de tela é
apenas um pedaço de tela
Sem nome
Triste
Muito triste
E muito só,
E este caixão
(perdão, este caixilho)
É o único abraço que este
pedaço de tela
Muito só
Muito fria
E triste
Tem,
Quem mias de que um
triste e só caixilho
Para abraçar um pedaço de
tela
Tela muito fria
Tela muito feia
Tela muto triste…
E tal como o caixilho que
abraça uma tela
Uma tela fria
E triste
Uma tela só
Apenas uma mãe
Abraça o seu filho
Seu filho muito triste
Seu filho só
Muito só
E às vezes
Uma mãe
Pega em todos os
pedacinhos do seu filho
Aqueles pedacinhos que
jazem no pavimento da loucura
Coloca-os sobre a
mesinha-de-cabeceira
E aos poucos
Aos poucos devolve-o à
vida,
Não sou um pedacinho de
tela
Deram-me um nome
Não tenho um caixilho que
me abrace
Mas tive uma mãe
Mãe que pegou em todos os
meus pedacinhos
Os colocou sobre a
mesinha-de-cabeceira
E devolveu-me à vida
Tal como o fez pela
primeira vez.
Alijó, 02/01/2023
Francisco Luís Fontinha
segunda-feira, 5 de dezembro de 2022
Um quadro sem nome
Sou apenas um
quadro
Só e suspenso
numa parede
Fria e também
ela
Só,
Sou apenas um
quadro
Só e sem nome,
Não tenho nome
Porque o gajo
que me pintou
Um tal de “Fontinha”
Nem um nome me
deu,
Elas olham-me
Eu olho-as
Elas gostam de
mim
Eu gosto delas
E sinto-me tão
feliz…
Porque o gajo
que me pintou
Nem é olhado
Nem gostam dele,
Sou apenas um
quadro
Com cores
Rabiscos
Sombras
E palavras
invisíveis,
Sou apenas um
quadro
Só e suspenso
numa parede
Fria e também
ela só,
Tal como o gajo
que me pintou,
Frio e só.
Alijó,
05/12/2022
Francisco Luís
Fontinha
domingo, 27 de novembro de 2022
Um pequeno nome
Dêem-me um nome
Um pequeno nome
Dêem-me um pedaço de
terra
Para sepultar o meu nome
Um pequeno nome
Nome sem nome
Numa árvore com nome
Um poema sem nome
Um pequeno nome
Este meu pobre nome
Um nome
Para este retracto anónimo
O último pendura na
última parede
Fria e nua e sem nome
Um nome
Um pequeno nome
Dêem-me um nome
Para o meu corpo sem nome
Porque não tenho nome
Nem tenho uma parede para
pendurar o meu corpo
Sem nome.
Alijó, 27/11/2022
Francisco Luís Fontinha
sábado, 29 de outubro de 2022
Corpo silêncio
Escrevíamos no olhar da manhã
As tristes cores do
desejo
Porque nas paredes dos
teus lábios
Habitavam as lágrimas dos
tristes Invernos
E sabíamos que havia um
corpo suspenso na montanha (o teu corpo)
Alijó, 29/10/2022
(texto e quadro de
Francisco Luís Fontinha)