quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Carruagem da saudade


Nada me resta neste condomínio fechado,

Esculpido nos muros com esqueletos de xisto,

Brinco com uma bala em direcção à morte,

Sinto o peso da tua mão poisada no meu ombro,

Pareço uma janela sem cortinado dançando ao som do vento,

Este navio em pequenos círculos,

Quadrados,

Parábolas loucas na ardósia da tarde,

Imagino-te vestida de rosa doirada,

Imagino-te sentada na clareira da madrugada,

Triângulos de insónia

Adoçando o teu olhar de andorinha,

E nada, nada me resta nesta montanha suicidada…

Perdi as árvores, perdi as rochas e a sombra das árvores,

Tenho dentro de mim um hipercubo doente…

Não tem coração,

Tenho dentro de mim os fios de nylon das redes transparentes do sonho,

E não tenho sonhos para te descrever,

Invento sonhos,

Invento personagens nas finas lâminas do desejo,

Invento, imagino-te sem nome, e nada… me resta… e nada me resta neste condomínio fechado,

Não me interessa se tens no sorriso um lençol de linho, não me interessa se tens nos lábios os socalcos afogados no Douro,

Não me interessa se navega no teu ventre um barco Rabelo…

Ou uma bandeira sem Pátria,

E nada,

Deixei de amar os livros, deixei de pertencer aos tristes mendigos da cidade em combustão,

Deixei de amar o amor, deixei de amar o mar… e as palmeiras filhas do mar,

Agora, sento-me numa velha esplanada, escrevo o Tejo sobre a simples mesa de plástico,

Pego num café, puxo de um cigarro envenenado pela tua boca,

E escondo-me da luz, e escondo-me das imagens prateadas projectadas nos alicerces da memória,

Fujo, escondo-me, e nada…

Apenas lágrimas confusas descendo o meu rosto de granito,

Grito,

Grito como se eu fosse uma noite de luar,

Grito como se eu fosse um comboio desgovernado…

Contra a carruagem da saudade.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 26 de Agosto de 2015

Dentro de um livro



(Francisco Luís Fontinha – Agosto/2015)
 
 
Conheci-te numa noite de aniversário,
Percebi que havia uma janela no teu sorriso
E uma clarabóia no teu olhar,
Depois… depois perdi-me nesta cidade apaixonada,
Vesti copos de uísque,
Bebi vestidos de chita,
Fumei poemas junto aos teus seios,
Mergulhava na plataforma irracional dos teus braços,
Escrevia nos teu beijos as palavras que nunca consegui escrever no papel amarrotado,
Desenhava no meu espelho as gotículas ínfimas do teu suor,
Afagante desejo,
Descerrava a porta dos teus cabelos,
 
Lapidava as tuas coxas no meu silêncio…
E acordava junto aos teus lábios,
 
Tão feliz… tão feliz meu amor,
 
Este poema sem nome,
Ouvindo a tua voz esquecida dentro de um livro,
Agachada na madrugada,
Este poema pobre,
Mendigo…
É a réstia das carícias fabricadas dentro de um rio,
Esquecia-me de ti, meu amor,
Sonhava com melódicos sons que apenas a morte sabe descrever,
O último grito,
Gemido…
A dor
Do teu prazer.
 
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 26 de Agosto de 2015
 


terça-feira, 25 de agosto de 2015


Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

Fotografia das palavras


Desenho o sono na almofada do sofrimento,

Pego nos sonhos…

E espalho-os sobre a areia límpida da terra queimada,

Que saudade do cheiro da infância

Correndo no Mussulo,

Que saudade da chuva e do cacimbo…

As mangueiras voavam sobre mim,

Inventava palhaços de pano e triciclos de papel,

O vento embrulhava-se neles,

Eu acorrentava-me às mãos do silêncio,

Desenho,

Desenho o sono na almofada do sofrimento,

Pego nos sonhos…

E escrevo-te estas palavras que roubei às tuas fotografias,

Depois veio a tempestade,

O sono que era apenas um desenho, hoje, hoje é um amontoado de destroços baloiçando no mar,

O barco que nos trouxe morreu,

Os marinheiros, alguns, alimentam-se da sombra num qualquer engate na cidade das gaivotas,

Os cigarros do Tejo… esperam o meu regresso,

E um dia, e um dia regressarei aos teus braços, meu amor.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 25 de Agosto de 2015

segunda-feira, 24 de agosto de 2015


Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015


Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

A esfera da saudade


Palavras para o amor

Que ama as palavras,

Os beijos incendiados nos lábios das estátuas,

Os cabelos dançando no jardim coberto de espuma,

Os bancos em madeira sentados sobre os meus joelhos,

E ao longe, o silêncio do desejo construindo lágrimas de algodão…

Sinto nas minhas veias a esfera da saudade

Caminhando sobre uma lâmina de cartão,

É tão triste esta cidade,

É tão triste a solidão,

Palavras para o amor

Que ama as palavras,

As belas, as belas e todas as outras… belas,

São palavras,

São elas que me alimentam e iluminam quando regressa a noite do teu olhar,

São elas que me abraçam quando o vento bate no meu peito…

Alicerçam-se a mim,

E eu, e eu fico sem jeito,

Só, só neste jardim,

Eu, os bancos em madeira e as estátuas de alecrim…

E no final da tarde tudo é embrulhado no mar,

Zarpamos em direcção ao infinito,

Bebemos copos de sofrimento

Para não enjoarmos…

E esta ondulação enlouquece-me,

E faz deste barco uma jangada de tédio…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 24 de Agosto de 2015

Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

domingo, 23 de agosto de 2015


Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

Os muros invisíveis da alma


Inventaram este suicídio para me acorrentarem aos muros invisíveis da alma,

Trouxe da vida as palavras e a noite,

Trouxe da noite

A luz incandescente dos corpos suspensos na alvorada,

Não tenho medo da solidão,

Nem medo de sofrer,

Não tenho medo da fogueira madrugada…

Brincando na minha mão,

Acaricio-te o rosto envenenado pela dor,

Inventaram-me este suicídio para me roubarem o sono

E as montras iluminadas da cidade,

Caminho abraçado ao vento…

Caminho procurando as montanhas sonolentas da paixão

Que só tu sabes onde se escondem,

Que só tu sabes o seu nome,

Inventaram-me este suicídio para me acorrentarem aos muros invisíveis da alma,

Vestiram-me de mendigo,

Venderam-me na “Feira da Ladra”…

E hoje pareço o luar alimentado pela tristeza,

E hoje pareço um amontoado de ossos envergonhados

Esperando o varredor nocturno do silêncio,

Esta cadeira onde te sentavas…

Parece um rochedo recheado de lágrimas,

Uma praia encalhada nas tardes de papel celofane

Onde apenas tu brincavas,

E da noite…

Trouxe também o embriagado olhar com que me olhavas.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 23 de Agosto de 2015

Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

sábado, 22 de agosto de 2015


Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

O mendigo das palavras


Pedido nesta avenida

Recheada de cacos e velharias,

Mendigando palavras,

Fumando cigarros imaginários,

Perdido,

Achado,

Escrevendo no teu rosto poemas envergonhados

Que só tu

Consegues perceber…

A vida parece um carrossel enferrujado,

O teu corpo fundeado no meu peito

Como se fosse uma serpente de tristeza,

Perdido,

Achado,

Na algibeira alguns sorrisos de riqueza…

Mas tu sabes que nunca quis ser rico,

Mas tu sabes que nunca quis ser nada…

Apenas me apete estar qui,

Sentado,

À tua espera…

Como um barco que regressa do Ultramar

Trazendo gaivotas

Caixotes poucos…

E recordações em pedaços de papel,

Perdido nesta avenida

Recheada de insónia

E sonhos inventados por uma criança,

Hoje, hoje aqui sentado…

Espero-te sem saber se vens

Ou se pertences às lápides da madrugada,

Não me importo com as fotografias rasgadas

E deixadas nos braços do vento…

Perdido,

Achado,

Aqui… como um rochedo sem coração.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 22 de Agosto de 2015

Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Falsa partida


Partirei sem desenhar o meu nome na alvorada fantasma da vida,

Partirei sem deixar uma sombra deitada na manhã,

Partirei sem vontade de regressar,

Partirei como um sonâmbulo ambulante pernoitando de festa em festa,

Nos lábios do luar,

Partirei descendo a avenida

Que me levará até ao esconderijo da agonia,

Partirei apaticamente para o outro lado da rua,

Sentar-me-ei até que o meu corpo desfaleça,

Tudo esqueça,

A doença,

A amargura

E a tristeza,

Partirei deixando um prato de sopa dormindo em cima da mesa,

Falarei baixinho,

Dócil…

Para ele não me ouvir,

Só me faltava a mim

Levar comigo um prato de sopa,

Uma colher…

E um pedaço de pão

Para alimentar a solidão,

Assim… não saberei partir…

Partirei sem levar os livros,

As músicas mais desejadas,

Partirei deixando na fogueira todas as cartas,

Todas as palavras,

Que nunca deveria ter escrito…

Partirei,

Partirei vestido de pedinte,

Cambaleando contra os candeeiros da saudade,

Não, não vou levar comigo a felicidade…

Porque partirei de livre vontade,

Ao amanhecer,

Sem ninguém saber,

Partirei,

Partirei e deixar-me-ei envelhecer…

Até morrer.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 21 de Agosto de 2015

Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015


Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015 

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Infinitos Oceanos de luz


Não há drageia

Nem poesia que me valha,

Entrelaçávamos as mãos nos infinitos Oceanos de luz,

Caminhávamos como crianças sobre as pedras invisíveis da carícia,

E tu olhavas-me quando eu ficava transparente,

Simples,

E ausente,

Voava abraçado às gaivotas,

Fotografava com o meu olhar os barcos de papel

Em velozes corridas contra o vento,

Um dia, despareci da tua sombra…

Subi os degraus do desejo,

Alicercei-me às tuas coxas salgadas…

E sentia os teus ossos na margem do rio onde nos sentávamos,

Tive medo,

Porque descia a noite sobre os nossos ombros,

E quando acordava a noite…

Ficávamos agachados junto aos beijos hipnotizados,

Dormíamos,

Dançávamos à janela com retractos para o Tejo,

A ténue velhice levava-nos para as ilhas rochosas da solidão,

Hoje…

Pareço um pedaço de aço

Esquecido numa qualquer sucata,

E espero,

E espero o regresso do forno…

E novamente serei um esqueleto nas mãos dos infinitos Oceanos de luz,

E espero… espero pela tua mão iluminada.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 20 de Agosto de 2015

Francisco Luís Fontinha - Agosto/2015