quarta-feira, 23 de julho de 2014

Navalhas do sofrimento


Oiço das navalhas do sofrimento,
os teus beijos prometidos,

Lamento,

Oiço os teus anseios,
quando nos entra o mar casa adentro,
desço as escadas,
escondo-me nos teus lábios...
amo tanto o mar... que não consigo olhá-lo, tocar-lhe,
como não sou capaz de poisar a minha mão no teu luar...
e...
e simplesmente ficar lá, ela imóvel, prisioneira de ti,
e... e coitada da minha mão,
esponjosa, magra... cansada das palavras tristes,
das palavras... das palavras amargas,
e o movimento curvilíneo... em busca do teu coração,

O cofre com fechadura invisível,

Lamento,

Oiço das navalhas do sofrimento,
os teus beijos prometidos,
oiço-os e nada posso fazer,
lá fora está noite,
escuridão,
posso dar-me ao trabalho de procurar as tuas lágrimas,
nunca as encontrarei,
tão pouco sei se choras, se ris... se gritas... ou inventas árvores no recreio da escola,
e quanto a mim, nunca, nunca fui capaz de encontrar o que quer que seja,
porque sou desajeitado,
porque... as sombras do teu corpo habitam nas drageias do silêncio...
e há sempre um braço a proibir-me... de... de amar, de construir amores nas flores do amanhecer,

Tão longe, os teus sôfregos olhos perdidos na constelação AMAR,
o telescópio vagueia na eira da poesia,
e nem assim, e nem assim é possível observar os teus olhos...

Lamento,

O significado de corpo, agora é rocha vadia,
que caminha nas ruas com candeeiros de prata,
lamento...
ouvir das navalhas do sofrimento...
os teus beijos prometidos,
sofridos,
oiço-os e nada posso fazer,
apenas lamentar,

Que o cofre com fechadura invisível,
seja o teu coração protegido por um velho cubo de vidro,
aquário, peixe, avião... pá.. barco carregado de fantasias e travestis,
bares recheados de coquetes e marionetas envergonhadas,
alienados vizinhos que fumam cigarros de lata,
que o cofre se parta,
e morra...
como morrem os poetas,
como morrem os fantasmas... quando no relógio de pulso da solidão são quatro horas da madrugada,
nasci às sete horas e trinta minutos,
era Domingo...
e deixaram em mim as navalhas do sofrimento.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 23 de Julho de 2014

terça-feira, 22 de julho de 2014

O Cometa Amar


Não te mexas,
deixa poisar o Cometa Amar na Sombra do teu olhar,
não grites,
mantém-te imóvel nos lábios do entardecer,
não fales, não... não grites,
geme no salivar nocturno que acolhe o luar,
não te mexas, por favor!
Silencia-me como se eu fosse apenas e só o teu livrinho de cabeceira,
a tua almofada recheada com seios de verniz...
o espelho do teu quarto, onde dormes, sonhas... e... e brincas...
como uma menina mimada,
escondida na madrugada,

Não te mexas,
fala-me, ouves-me?
Não te mexas,
acaricia o cansaço dos meus abraços com o teu cabelo de cetim,
não grites,
por favor... não sejas assim...

Assim, como?
Assim... menina mimada,
menina com sabor a Musseque,
menina... menina bronzeada,

Não,
não te mexas,
escreve no meu peito de xisto tudo aquilo que te apetece fazer,
sei lá eu...
também não o sei, meu Amor, mas não te esqueças de nada,
escreve tudo, escreve...
mas... mas não te mexas,
escreve em mim, desenha em mim,
o mar,
o pôr-do-sol, ou... ou a saudade,
o poema mais belos da montanha do desejo,
escreve, não te mexas, escreve... escreve beijo,

(Assim, como?
Assim... menina mimada,
menina com sabor a Musseque,
menina... menina bronzeada).


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 22 de Julho de 2014

Divulga Escritor – Francisco Luís Fontinha

Divulga Escritor – Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Inventa-me


Inventa-me,
desenha no meu corpo as línguas de fogo que os teus lábios libertam,
escreve-me, escreve em mim as palavras proibidas, as palavras falseadas,
invade-me,
faz de mim uma equação trigonométrica,
soma-me, divide-me… e multiplica-me,
mas… inventa-me,
no pecado mais secreto do teu olhar,

Inventa-me,
no silêncio das madrugadas,
inventa-me no espelho onde escondes o teu rosto…
quando poisa a noite sobre ti,

Inventa-me nas catacumbas da insónia,
faz de mim a sombra mais bela do amanhecer,
inventa-me,
como flor,
como abelha…
inventa-me e acolhe-me na tua colmeia,
que eu seja o mel dos teus sonhos,
que eu seja… a tua invenção,

Inventa-me,
faz de mim pássaro, barco… ou… ou avião,
não tenhas medo de me inventar,
não, não tenhas medo de me amar,
inventando-me,
escrevendo em mim os números primos, ímpares… ou… ou pares,
inventa-me,
inventa-me sem chorares!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 21 de Julho de 2014

domingo, 20 de julho de 2014

As sanzalas embalsamadas!


Aos dias ímpares, as horas que me são roubadas por uma mão sem nome,
as sílabas disparadas pela espingarda das sanzalas embalsamadas,
o meu corpo não cessa no púlpito do cansaço, ele evapora-se, ele... ele transforma-se em zinco lamaçal,
há uma criança inventada, uma criança perdida na saudade...
aos dias ímpares, as horas malvadas,
que alimentam a dor,
que... que engolem todos os amanheceres,
e do meu corpo, apenas o coração de pedra ficou adormecido na eira da poesia,

Aos dias ímpares, o triste calendário envergonhado,
a desassossegada fantasia de um texto alienado, quando arde na fogueira da tua pele,
uma cidade nos espera, uma cidade em papel...

Aos dias ímpares, as horas, os minutos, e os... e os milésimos de segundo,
alguns em liberdade, e outros... e outros acorrentados a um envelhecido veleiro,
hoje não há vento,
hoje... hoje apenas a límpida tarde de pano a soluçar sobre as árvores do triângulo equilátero,
é este o meu Mundo?
ter uma cidade sem candeeiros em desejo,
ser filho de um desenho que o tempo apagou numa longínqua parede,
e contento-me com todos os dias ímpares, as horas que me são roubadas...

E a tua mão... e a tua mão, um dia, terá um nome, idade, raça, sexo... religião,

Aos dias ímpares, a geometria na doçura da caligrafia,
um poema morto, um poema descendo a calçada em direcção ao infinito...
e o meu corpo não cessa no púlpito do cansaço...

E o poeta permanecerá eternamente nas sanzalas embalsamadas!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 19 de Julho de 2014