Quando
criança, tinha um baloiço com vista para o mar,
Todas
as manhãs,
Depois
de me sentar e, depois de acariciar uma pétala de rosa em ténues sombras de
saudade, imaginava-me correndo para dentro do mar, ao longe, um pequeníssimo
barco em papel acenava-me e depois
Todas
as manhãs, a tristeza vinha buscar-me para mais tarde, junto ao farol, eu e
ele, atritávamos pedras contra o farol,
A
praia deserta, morna e morta,
Depois
outras crianças como eu, vestidas de camuflado, brincavam com espingardas de
capim, o berro dos mabecos esfomeados, a caneta atirava-se contra a pequena
ranhura na folha em papel, colorida, encarnada de pequeníssimas gotas de suor,
A
carta regressava da Metrópole, trazia fracas notícias, a mãe tinha falecido de
tédio, numa tarde, só na aldeia, morreram várias dezenas de mães, todos
faleceram de tédio,
Saudade?
Também,
descia a Mutamba, depois por uma breve passagem pelo Baleizão, uns pedacinhos
de gelado brincavam na minha mão, tinha sono, tinha fome e, saudade,
O
farol recordava-me a sombra do meu pai quando estacionado debaixo dos
coqueiros, hilariante, brincava com o desconhecido, como se ele se alimentasse,
tal como eu, da saudade,
O
frio de Agosto junto ao Mussulo, da noite traziam-me pequenas palavras que eu
aproveitava para embrulhar em pequenas estrelas que durante o dia ia recolhendo
enquanto dormiam junto às mangueiras, lá
Tinha
uma morada, trazia sobre os ombros a enxada recheada de lágrimas e, mesmo
assim, era feliz,
Devagar,
Saudade?
O
silêncio quando não era silêncio, disfarçava-se de silêncio, dentro de casa, o
mar calmo dos finais de tarde, contra os rochedos da insónia, um poema
desgovernado pensava sempre que depois da chuva
Tenho
fome, mãe,
O
cheiro intenso da terra queimada, os machimbombos abraçavam-se como se fossem
amantes antes do início da secção de matiné do cinema Império, a ressonância do
sono quando batia na saudade,
Morreram
de medo, pela perda dos filhos,
E,
o mar galgava as janelas do veleiro imaginário,
O
baloiço, aos poucos, morreu de cansaço, o pendulo desfalecia a cada movimento
contra o vazio e, iluminava-se nas distâncias longínquas das marés de neblina,
Pegava
em duas pedras de gelo e, depois de juntar uma porção de sombra, todas as
gaivotas vinham morrer em terra; é assim a vida, das pessoas que morrem de
saudade,
Como
o baloiço,
Todas
as tardes,
Farto
de me acompanhar nesta terra de ninguém.
Todas
as manhãs.
Francisco
Luís Fontinha
Alijó,
27/06/2021