quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Espelho


(“Espelho” desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
A luz laminada da paixão
Quando desce os círculos do meu peito,
Perfura-me com as cinzentas palavras do “espelho” ensanguentado na loucura,
Silencio-me aos teus pés,
Sento-me nos teus braços,
Adormeço no teu olhar,
Vivo desenfreadamente com esta corda-de-mar prisioneira na minha garganta,
Sou sempre eu,
Aquele que habita esta rede de ossos camuflados pelo nevoeiro da manhã,
Aquele que esconde na boca as gaivotas das tristes marés de Inverno,
Sou sempre eu,
Aquele que escreve poemas no som da fogueira da saudade…
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 10 de Setembro de 2015
 

quarta-feira, 9 de setembro de 2015


Francisco Luís Fontinha - Setembro/2015

Vampiros da noite escura



(desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Esta cadeira onde te recordo
Acorrenta-me aos sonhos da noite escura,
Sobre a mesa-de-cabeceira… o livro que emagrece o teu corpo nas lâmpadas incandescentes do desejo,
Minto-te, meu amor,
Como te minto quando digo que sou filho da noite…
 
Não, não meu amor,
 
Não,
Não existe noite
E tão pouco sou filho dela,
 
Sabes disso meu querido,
 
Sabes disso…
Que amanhã recordar-te-ei como um pedestal em movimento,
Uma orquestra vagueando sobre o balcão de um bar…
 
Sabes disso meu querido,
 
Algumas pedras e gelo…
E um beijo nas velas de um veleiro,
Esperam que esta cadeira se sente…
Que esta cadeira se sente no meu colo,
E me beije…
Como beijam os vampiros da noite escura.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 9 de Setembro de 2015
 


terça-feira, 8 de setembro de 2015

Uma equação qualquer sem tempo para amar


Regressa a noite,

Depois… depois acorda a saudade embrulhada num lençol de linho,

As fotografias suspensas na parede da sala…

Cerram as janelas,

Desligam os interruptores do silêncio,

Brincam as vozes dos tristes alicerces que sustentam o meu corpo,

Pareço uma bailarina em busca dos holofotes do desejo,

Entre círculos e espelhados momentos angulares,

Eu…

Eu… eu me perco nos teus braços,

Deixei de desenhar sorrisos na alvorada,

Deixei de escrever palavras nos muros invisíveis da minha aldeia,

 

Deixei…

Deixei de pertencer ao limo envenenado na madrugada,

Tenho uma bandeira na mão,

Tenho na outra mão… nada,

Uma pedra,

Uma enxada…

Calcinada

Pelos ventos trigonométricos do amor,

 

Regressa a noite

E não tenho tempo para embriagar sonhos,

Não me importo de não ter sonhos,

Nome,

Cidade para habitar…

Regressa

E traz com ela outra noite,

Outro momento angular que me sufoca,

E sinto na minha algibeira o mar

Encalhado nos rochedos dos teus seios…

Pego na equação das tuas coxas

E construo um foguetão…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 8 de Setembro de 2015

Francisco Luís Fontinha - Setembro/2015

A clepsidra do desejo


Sabíamos que o tempo se masturbava na clepsidra do desejo,

Sentávamo-nos num ferrugento colchão de pregos em aço,

Pegava no teu corpo e desenhava pequenos círculos,

Que rodopiavam à volta do luar,

Das frestas do gesso embriagado, um sorriso, o nosso, o teu e o meu,

Como dois pássaros poisados na escuridão,

Como dois corpos em combustão…

A velha pensão gemia como gemiam os teus lábios olhando a ruela,

Na cidade mergulhávamos como mergulham as gaivotas,

E as gaivotas

Entranhavam-se nos teus seios,

Sabíamos que seria o último orgasmo da tarde,

Sabíamos que seria o último desejo do corpo,

E no entanto…

Estavas lá, sobre mim, parecendo o inferno voando em direcção à janela da noite,

Sabíamos,

Sabíamos que o tempo se masturbava na clepsidra do desejo,

Sabíamos que os poemas se escreviam nas tuas coxas,

E mesmo assim, querias mais, e além, e depois, e ontem, e amanhã…

Diluídos nos fluidos do sémen,

Nós dois órfãos da madrugada,

Dois esqueletos em busca do prazer desenhado na idade,

Víamo-nos no espelho da saudade…

Sem percebermos o significado da paixão.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 8 de Setembro de 2015

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

O calcinado olhar

“Fodias-me” com todas as letras do alfabeto, espetavas-mas no meu corpo calcinado pela madrugada desalinhada, imprimias no meu olhar a poesia emagrecida do silêncio, e nunca ouvi de ti
- Amo-te,
E nunca ouvi de ti um único lamento, uma sílaba prisioneira nos meus tristes lábios, uma grade imaginária pertencendo ao terceiro esquerdo, amo-te,
- Nunca a ouvi de ti, pertencias aos míseros esqueletos da solidão, às flores fotografadas numa noite imaginária, algures em cinco de Setembro, e sabia que o dia nasceria contigo nos meus braços, não, não diria que…
- Amo-te,
Porque não, meu amor, se junto a nós habita a escuridão dos olhos pintados numa parede envelhecida pelo tempo, pelos insectos, pela paixão de
- “Fodias-me”,
Regressava o circo, embrulhava-me nos palhaços como uma criança se embrulhava no esqueleto cobertor, tinha frio, tinha fome e tinha a saudade duma terra esquecida sobre uma secretária, “fodias-me”
- Na noite, “foder ou não foder ou ser fodido”, tanto faz, neste mundo, neste Universo em pedaços de suicídio, escondia o cortinado do prazer, desenhava orgasmos nos teus seios
- Sem o saber, queria ser o paquete que me trouxe de Luanda, queria ser o capim em soluços derrubado pela fúria do sonho, amo-te, sem o saberes,
“Fodias-me” na Ponte para Eternidade, “fodias-me” enquanto eu lia Fernão Capelo Gaivota, sem nome, sem idade, sem casa ou paixão para abraçar, e no entanto, “fodias-me” com todas as letras do alfabeto, espetavas-mas no meu corpo calcinado pela madrugada desalinhada, imprimias no meu olhar a poesia emagrecida do silêncio, e nunca ouvi de ti, o sono, novamente o sono, o sonho, novamente o sonho…e o esquecimento, novamente o esquecimento…
 
(………………)

Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Setembro de 2015

domingo, 6 de setembro de 2015


Francisco Luís Fontinha - Setembro/2015

Madrugada lapidada


E se o mar me levasse para o seu imaginário mais secreto…!

O dia transforma-se em noite,

O vento veste-se de chuva,

Fina, miudinha…

Frágil o olhar da serpente envenenada pela paixão,

O luar morre nas mãos de uma andorinha,

Dá-lhe beijos na face mais longínqua do Universo,

Cansa-se e deita-se sobre o meu corpo em travestido xisto,

Não sei se quero,

Ou se existo nos teus lábios de madrugada lapidada,

E se o mar me levasse…

E se o mar me levasse na tua jangada…!

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 6 de Setembro de 2015


Tenho a sensação que pintei a pior “merda” da minha vida…
Amem-se e sejam felizes…
Francisco Luís Fontinha – Setembro 2015


sábado, 5 de setembro de 2015

Pensão ruína



(desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Mastigava as palavras nocturnas do sono,
Enquanto do outro lado da rua,
Alguém,
Alguém gemia,
Uma rosa nua?
Uma pétala de rosa tua?
Alguém,
Enquanto eu dormia,
Alimentava-se dos meus sonhos entre círculos e triângulos rectângulos,
Acariciava os catetos,
Beijava a hipotenusa,
E enquanto eu dormia,
Alguém,
Alguém vestido de musa…
Nua a rosa,
Pétala a tua,
Mastigava as palavras nocturnas do sono,
Desenhava na ardósia negra do sentido proibido
Os teus seios mendigando o meu peito,
Nunca,
Nunca tive jeito,
Vontade…
E alguém,
Sem eu saber,
Entranhava-se nos meus tristes ossos,
Alguém,
Alguém gemia,
Do outro lado da rua,
E eu,
E eu sentia,
A lua,
O mar agachado nas tuas coxas silenciadas pela amargura,
Tanto tempo perdido,
Em pequeníssimas folhas de papel quadriculado,
Chorava e gemia,
Do outro lado da rua…
O poeta suicidado,
Uma rosa nua?
Uma pétala de rosa tua?
Alguém,
Enquanto eu dormia,
Roubava-me a tela da agonia…
Acorrentava-me às paredes pinceladas de bolor…
Colocava sobre as minhas pálpebras um cubo de gelo,
No meu cabelo,
Uma rosa,
Tua,
Uma tua rosa nua,
Sem sentido,
Os livros que li,
As palavras que escrevo e escrevi,
Não,
Não eram para ti,
Porque alguém,
Não sei quem,
Injectava-me nas veias finas lâminas de saudade,
Cerrava os olhos, fingia estar vivo quando os barcos da alvorada subiam as escadas da sufocada pensão,
E eu,
E alguém…
Gritava,
Chorava,
Sem saber a razão,
Do poeta suicidado
Subir e descer as escadas da pensão,
Quando a pensão estava deserta,
Morta,
Sem janelas,
Sem cortinados nas janelas…
E todas as portas,
Também elas,
Todas,
Todas mortas,
E alguém,
Não sei quem,
Inventava fotografias para eu folhear…
Enquanto a pensão,
Enquanto a pensão se afundava no meio da rua,
Mesmo em frente ao meu cadáver descarnado pelo tempo,
Havia vento,
Havia lágrimas nos lábios do vento,
E alguém,
Sem saber porquê…
Ou razão…
Deixava o meu nome nas ruinas de uma pensão.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 5 de Setembro de 2015
 


sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Bala de tinta florescente



(desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
“Sábados,
Domingos…
… E feriados,
Lamentamos,
Estamos encerrados”,
 
No pólen amanhecer
Cresce uma abelha em flor,
É disparada contra o coração
Uma bala de tinta florescente,
E de espingarda na mão,
Aquele louco transeunte…
Senta-se sobre a invisível espuma do mar,
Lamentamos,
O amor encontra-se encerrado para remodelação…
A paixão…
Afogada numa caixa em cartão,
Segue viagem, e não regressa a este cais ambulante,
 
“Sábados,
Domingos…
… E feriados,
Lamentamos,
Estamos encerrados”,
 
Apaixonados!
 
Não sei se vos diga o que sinto…
Porque nada sinto,
É estranho,
Saber que amanhã não vai acordar a madrugada,
É estranho,
Perceber que amanhã uma rosa embalsamada…
Acordará no estômago de um velho livro,
E o amor… e o amor é um gajo “fodido”.
 
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 4 de Setembro de 2015
 



Francisco Luís Fontinha - Setembro/2015

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Calçada da Ajuda


(Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Habito numa cidade de abutres,
Manhã cedo, ao acordar, percebo que sou apenas uma sombra misturada com outras sombras como eu,
Não sei se dormi, não sei se estive toda a noite a sonhar,
Perdi o cheiro do mar,
E a paisagem dos Oceanos de vidro,
Olho, olho para o Céu…
E todas as estrelas de papel… voam em direcção ao Luar,
Peço às abelhas entranhadas no mel, ajuda,
Desço a Calçada,
E Ajuda, não ajuda…
A regressar a noite aos meus braços pincelados de ferrugem,
E Ajuda, não ajuda… sobe um Cacilheiro a dita Calçada.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 3 de Setembro de 2015
 
 
 

O ausentado


(desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Este labirinto de asas entranhadas na soalheira tarde sem ninguém,
O corpo mergulha na eira granítica, ouvem-se os sussurros das paredes lapidadas pela mão do humilhado,
O sol deixou de sorrir,
Cerrou a boca,
Trocou o olhar com o luar,
Trocou a solidão pelo cansaço da náusea ambígua da claridade,
É fina a sua pele,
Gotículas de suor sobrevivem à chuva miudinha da noite,
As palavras escritas nas pálpebras da saudade…
Envelhecem,
E escondem-se no cinzento amanhecer sem horário,
Este labirinto de asas… sem ninguém,
Ausentes da madrugada,
Tristes como as folhas de uma árvore em busca da morte,
O vento leva-as para o outro lado da cidade,
Escurecem em ti os meus lábios viciados,
O humilhado deserto…
Acorrentado aos vapores do silêncio amedrontado pelas tardes sem ninguém,
Não preciso de nada…
Humilhado,
Ausentado,
Estou vivo,
Respiro…
E fumo os cigarros absorvidos pela paixão.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 3 de Setembro de 2015