terça-feira, 8 de setembro de 2015

A clepsidra do desejo


Sabíamos que o tempo se masturbava na clepsidra do desejo,

Sentávamo-nos num ferrugento colchão de pregos em aço,

Pegava no teu corpo e desenhava pequenos círculos,

Que rodopiavam à volta do luar,

Das frestas do gesso embriagado, um sorriso, o nosso, o teu e o meu,

Como dois pássaros poisados na escuridão,

Como dois corpos em combustão…

A velha pensão gemia como gemiam os teus lábios olhando a ruela,

Na cidade mergulhávamos como mergulham as gaivotas,

E as gaivotas

Entranhavam-se nos teus seios,

Sabíamos que seria o último orgasmo da tarde,

Sabíamos que seria o último desejo do corpo,

E no entanto…

Estavas lá, sobre mim, parecendo o inferno voando em direcção à janela da noite,

Sabíamos,

Sabíamos que o tempo se masturbava na clepsidra do desejo,

Sabíamos que os poemas se escreviam nas tuas coxas,

E mesmo assim, querias mais, e além, e depois, e ontem, e amanhã…

Diluídos nos fluidos do sémen,

Nós dois órfãos da madrugada,

Dois esqueletos em busca do prazer desenhado na idade,

Víamo-nos no espelho da saudade…

Sem percebermos o significado da paixão.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 8 de Setembro de 2015

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