sexta-feira, 29 de maio de 2015

Pincelado “adeus”


Do movimento pendular do sono

Oiço as tormentas sombras do teu silêncio olhar,

Perco-me no ondular medo que a equação da dor

Constrói numa velha ardósia,

Na rua sinto os automóveis esfomeados

Descendo calçadas,

Subindo escadas,

E chegando ao sótão…

As migalhas do sonho

Embrulhadas em velhos jornais,

Teias de aranha

E…

 

Nada mais,

 

Nada,

Mais,

 

Como ontem,

 

E lágrimas embalsamadas pelo relógio nocturno da miséria,

Abro a janela

E durante a noite o mar fugiu,

Como fogem as andorinhas

Em cada final da Primavera…

Sem um pincelado “adeus”,

 

Ou o regresso do mar à minha janela.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 29 de Maio de 2015

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Arcadas em flor


Podíamos falar da vida,

Podíamos recordar aquilo que se perdeu no tempo,

Algures no Oceano,

Podíamos falar…

Podíamos brincar

Nas palavras

Como fazíamos na sombra da seara dos olhos negros,

Podíamos,

Algures,

Hoje,

Amanhã…

Amanhã não o sei,

 

Se o teu álbum de fotografia sorri para mim,

É tão difícil desenhar-te um sorriso,

Meu amor,

Podíamos,

Podíamos brincar no Tejo com barquinhos em papel,

Papagaios coloridos…

Voando,

Voando,

Voando até se abraçarem no luar,

Podíamos sonhar,

E hoje,

E hoje não sonhos,

 

Nem Primavera,

E hoje

E hoje podíamos brincar no silêncio das arcadas em flor,

Apelidavam-nos de loucos,

Dois loucos que deixaram de poder,

Brincar,

Voar,

Sofrer

Ou deixar a planície entrar nas nossas mãos,

E podíamos,

Amanhã,

Ontem,

 

Mas hoje…

Não podemos falar da vida,

Não temos vida,

Palavras,

Sonhos

E migalhas,

 

Como se fossemos dois cadáveres putrefactos ao pôr-do-sol…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 28 de Maio de 2015

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Cidade em lágrimas


Os ossos envenenados pela paixão do desejo,

 

A poeira do cansaço

Entre envidraçados

E pilares de areia,

As lágrimas do incenso…

Fundeadas nos teus braços,

E não há maneira de acordar a madrugada,

Deito-me na cidade em lágrimas,

Sou absorvido pelos guindastes da solidão,

Os barcos,

O corpo sem coração…

Loucos

E poucos,

 

No calendário sem amanhecer,

Sinto-me um livro a arder

No centro do Tejo,

Sou abalroado pelos cacilheiros em papel,

Não tenho medo do silêncio,

E das casas sem telhado,

Não tenho medo das palavras

E dos desenhos não desenhados,

Os ossos

Masturbam-se no líquido pincelado do Adeus

Também ele… docemente

Envenenado pela paixão do desejo…

 

E amanhã

Uma cancela de sombra será derrubada,

Tomba,

E desaparece dos jardins onde poisam os teus cabelos,

 

E para quê?

 

O dizer

Sem o querer

Apenas porque estou sentado sobre um corpo sem coração…

E pum. Termina o dia. Apagam-se todas as luzes. E pum…

Docemente

Uma pomba dorme no parapeito da minha janela.

 

E pum.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 27 de Maio de 2015

terça-feira, 26 de maio de 2015

Sorrisos


Não oiço as camufladas sílabas do sono,

O corredor embrulha-se no sonho,

Transeuntes vestidos de sombra,

Correm,

Inventam sorrisos…

Como se fossem espelhos fendilhados,

Retractos de medo

Em cada parede,

Ou…

Ou em cada silêncio,

Não oiço…

E também eu… invento sorrisos nas pálpebras da dor.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 26 de Maio de 2015

segunda-feira, 25 de maio de 2015

O poema


O corpo morre

Embrulha-se nas palavras

E foge

Caminha na ausência do amanhecer

Senta-se

Abre um livro

Saboreia o poema

E sem o saber

O corpo

Levita

Saltita na montanha

Até o dia nascer,

 

Até o dia morrer…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 25 de Maio de 2015

domingo, 24 de maio de 2015

Tarde clandestina do silêncio


Em cada noite

A noite

Em desespero

Entre paredes

E o medo

Da noite,

 

Em cada noite

Ouvir

Sentir

De ti

E em ti

As palavras

Amargas

E belas,

 

Noites

Entre paredes

Descendo Calçadas

E veredas

Algumas verdes

Sonhos

Nos sonhos da Ilha

Outras verdes nos sonhos da ira,

 

Sem o saber

Nas palavras mortas embalsamadas e castanhas

Nuvens de prata

Na boca

Louca

Dos bairros em lata

E nada

E nada a atormenta…

 

Ela lamenta

A perda do livro

Na fogueira do corpo

Em brasa

Em chamas…

De nada,

 

De nada interessa saber

O calendário da noite

Que a noite engole

E come

Como um homem

Sentado à beira do rio

Desce

Sobe

Morrer

Afogado

Na tarde clandestina do silêncio

Do silêncio amargo…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 24 de Maio de 2015

De imaginar…


Não mereço

O

O teu preço

O que significam as palavras

Os livros

Os poemas

Os poetas…

Quando a vida

É

Quando a vida é tão curta


Prostituta,

 

Sempre

Ele

Sempre ele em luta

E labuta

Na vida que é “puta”

Sem perceber a beleza dos teus lábios,

 

Meu amor,

 

Sem perceber as lágrimas

Do meu olhar

Meu amor,

 

Sem vista para o mar,

 

Não mereço

A tua mão no meu rosto

E é lindo

E pareço

Que esqueço

O Agosto

Dos nossos fictícios encontros

Nas palavras

Entre palavras

Meu amor

Meu amor

Dentro de ti,

 

Sem vista para o mar,

 

Sem casas

Ou ruas

Para conversar,

 

Sobre ti

Em ti

Meu amor,

 

Sem vista para o mar

O silêncio da tua boca

Argamassada no espelho da dor

Sem ti

Meu amor

Em ti

A dor

O medo

Das coisas impossíveis

E possíveis

De

De imaginar,

 

E de… e de acreditar.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 24 de Maio de 15

sábado, 23 de maio de 2015

Por ti


Não sei o que sinto

Enquanto vivo e respiro

Pareço uma máquina

Em pedra adormecida

Sem vida

Triste

E esquecida

E nesta vida se ontem chorei

Não o sei

E nesta vida se ontem sorri

Não o sei

Por ti,

 

Ali

E aqui…

Nesta casa

Neste Universo sem palavras

Não há conversas

Sem… sem lágrimas,

 

Não sei o que sinto

Quando me embrulho num lençol de mar

Com barcos

Gaivotas

E ossos… e ossos para recordar

Não sei o que sinto

Sem vida

Triste

Ali

E aqui

Por ti

Por ti…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 23 de Maio de 2015

Sem morada


O amor das pedras

Quando as pedras são pessoas

E as pessoas

Pedras

Sombras

Noite

Clara

Escura

Negra

A paixão

Das pessoas

Das pedras

Boas

Voar

Sobre

Voar sobre os telhados de vidro

E sonhar com pássaros em papel

O fumo

Do teu olhar

Regressa aos meus lábios em sono

A alegria

De chorar

Porquê

Se amanhã

Voar

No mar

Sobre o mar

Das pedras

Boas

Voas

Tu

Voar…

Voar sobre o meu peito de xisto

E ao longe

Socalcos

E luz

Entre candeias

E palavras

De nada

Obrigado

O poema ama

É vida

É viver

Em nada

Com nada

A morte

A morte ensanguentada

E sem morada

Nem chegada…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 23 de Maio de 2015

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Vento invisível no teu olhar


Começo a ficar cansado destes corredores, do metro de superfície e das árvores, enquanto fumo, nem consigo ouvir os pássaros; ou já não existem pássaros, ou não querem falar comigo.

 

Sinto-me entalado entre o meu corpo de sombra e o silêncio,

Caminho na estrada da solidão

Na ânsia de encontrar a noite,

E pergunto-me…

Porque não é sempre noite?

Não regressam a mim

Nem os pássaros,

As árvores,

E apenas vivo com o medo poisado nos ombros,

Fingir,

Sorrir a cada sorriso,

Sem vontade de o fazer,

 

Sem vontade de sorrir

E viver,

Nas árvores,

Nos penhascos pintados de Primavera,

Quando é sempre tempestade,

Esta cidade,

Esta terra sem memória,

Cintilações nos meus braços

Das lágrimas envenenadas,

Conversar…

Chorar…

Ai os pássaros,

 

Ai as árvores,

Em sentido proibido,

Sem saída,

A minha rua,

A minha casa,

A minha estadia… por aqui, e ali…

 

Esqueci a minha morada,

Perdi todas as minhas palavras

No mar,

No rio

De sangue,

E sem vontade de falar,

E sem vontade de brincar

Nas árvores,

E com os pássaros,

Nos pássaros,

Abros a janela do meu peito…

E adormeço embrulhado no vento invisível.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 22 de Maio de 2015