sexta-feira, 22 de maio de 2015

Vento invisível no teu olhar


Começo a ficar cansado destes corredores, do metro de superfície e das árvores, enquanto fumo, nem consigo ouvir os pássaros; ou já não existem pássaros, ou não querem falar comigo.

 

Sinto-me entalado entre o meu corpo de sombra e o silêncio,

Caminho na estrada da solidão

Na ânsia de encontrar a noite,

E pergunto-me…

Porque não é sempre noite?

Não regressam a mim

Nem os pássaros,

As árvores,

E apenas vivo com o medo poisado nos ombros,

Fingir,

Sorrir a cada sorriso,

Sem vontade de o fazer,

 

Sem vontade de sorrir

E viver,

Nas árvores,

Nos penhascos pintados de Primavera,

Quando é sempre tempestade,

Esta cidade,

Esta terra sem memória,

Cintilações nos meus braços

Das lágrimas envenenadas,

Conversar…

Chorar…

Ai os pássaros,

 

Ai as árvores,

Em sentido proibido,

Sem saída,

A minha rua,

A minha casa,

A minha estadia… por aqui, e ali…

 

Esqueci a minha morada,

Perdi todas as minhas palavras

No mar,

No rio

De sangue,

E sem vontade de falar,

E sem vontade de brincar

Nas árvores,

E com os pássaros,

Nos pássaros,

Abros a janela do meu peito…

E adormeço embrulhado no vento invisível.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 22 de Maio de 2015

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Quadriculado destino


Tumultuosos riscos de luz

Sobre a pedra adormecida do luar

Não há vento

Nem há mar,

 

Que alimente

Esta gente

Sem tecto

Sem… sem maré para abraçar,

 

E este triste barco

Fundeado no teu corpo de espuma,

Não há vento

Nem há mar,

E da bruma,

Apenas uma sombra entre palavras e cidades obscuras,

Deambulo nas desertas ruas

Que os teus lábios escondem,

 

Esta gente

Sem tecto

Sem… sem maré para abraçar,

 

E no entanto,

 

Ninguém o consegue parar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 21 de Maio de 2015

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Acorrentado


Imagino-te embrulhado no sono,

Brincas nos sonhos da dor

Como se fosses uma gaivota em voo rasante,

Consciente

Que nunca mais regressarás,

Às minhas palavras,

Às ruas de Luanda,

E aos Musseques de sorriso zincado,

Imagino-te deitado

Acreditando que ainda és capaz de voar,

Mas…

Meu querido,

 

As tuas asas estão tão frágeis como um telhado de vidro,

E os teus braços tão pesados como um rochedo em decomposição,

Putrefacto,

Húmido como o cacimbo da tua imagem,

Perdida numa qualquer paragem,

Sentes o ruído do machimbombo,

Tens medo dele

Como eu tinha medo do mar,

E hoje

E hoje estou acorrentado à paixão,

Do mar,

E da tua mão…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 20 de Maio de 2015

terça-feira, 19 de maio de 2015

Os teus braços


Os teus braços aqui ao lado,

Parecem serpentes esfomeadas

Esperando as palavras da noite,

Ambos sabemos que as palavras não regressarão nunca,

Como nós,

Impossível regressarmos de onde partimos,

Complicada

Esta vida de marinheiro sem embarcação,

Complicada

Esta vida de transeunte sem cidade,

Ou livro, ou cais…

Para aportarmos,

 

Falta-nos tudo

E tudo temos,

 

As crateras e os peixes,

O silêncio e a madrugada,

Embriagados destinos

Com sabor a nada,

 

E os teus braços

Mesmo aqui ao lado,

Serenos,

Deitados…

Ouvindo os apitos dos comboios encurvados no Douro,

O rio

Sofre,

O rio

Sente

Os teus braços…

Nos meus braços

Afogados.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 19 de Maio de 2015

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Sombras de uma qualquer cidade


Coloridas pétalas de sono

Sobre o teu corpo embebido na gelatinosa alegria do amanhecer,

A sinfonia da madrugada

Em desespero,

Sem saber

Que a noite não acordará mais,

 

O mar

Envolto nos cabelos das andorinhas,

Os barcos cansados,

No teu peito,

E o tempo alimenta o teu sorrir,

E ouvem-se em ti

As lágrimas de partir…

Nas palavras de fugir,

 

Coloridas pétalas de sono

Procurando abraços

E telhados de vidro fumado,

O dia prisioneiro ao triste calendário,

E o teu corpo

Pincelado pelo orvalho,

 

E o teu corpo… também ele uma pétala colorida,

Sem vida,

Sem vaidade,

Como eu,

Como ele,

Sombras de uma qualquer cidade,

Umas vezes olhando o céu,

Outras… outras brincando na claridade.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 18 de Maio de 2015

domingo, 17 de maio de 2015

O fim

Tudo está perdido, o túnel da escuridão é absorvido pelo sofrimento dos ossos em pó, há uma janela no teu olhar, um solstício fictício das madrugadas dos outros,
- Os homens entre quanto paredes de nada, cinco fios de tristeza, e
Tudo,
Tudo parece desabar sobre a minha sombra, sou aniquilado pelos beijos da madrugada, não sofro, não sei sofrer ou chorar,
Tudo,
- Os homens escondidos dentro do cubo da incerteza, a luz, e a beleza, os homens acorrentados aos sonhos,
- Tudo?
Não o sei, tudo está perdido, os panfletos do sofrimento, ardem nos teus alegres momentos na Baía de Luanda, ontem eramos felizes, e hoje
Os homens, mergulhados nas arcadas da morte, vestidos de pigmeus assalariados, o trabalho, o sonho
Tudo?
Perdeu-se,
Hoje,
Como se perdem todas as gaivotas do Tejo, entre petroleiros e amores clandestinos, ela ama-o…
Ele…
Ama-a em segredo,
As viagens, o medo, o medo de perder, e de ser perdido,
Ele…
Chora, suspende-se nos lábios sem sorriso, sem cor, mortos e abstractos, sem perceberem que dentro de um livro habita a prostituta da desilusão, a tristeza,
- Tudo e todos?
Os homens, os meus e os teus, quadriculados beijos entre equações de amor…
 
(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 17 de Maio de 2015


Entre o silêncio e a dor…


Finjo que não pertenço à tua vida,

Esqueço,

E não o mereço,

Enquanto dormes saboreando as cinzas invisíveis da dor,

Esqueço,

E apareço,

Nas escadas ingrimes do sofrimento,

Não alimento a dor com o nascer da madrugada,

Que amanhã…

Que amanhã não sei se vai acordar,

Finjo,

Esqueço,

 

Estas tristes sílabas doentes

Fundeadas nos braços de um rio,

Sem nome,

Porque os meus rios não têm nome,

Não têm idade,

Sexo,

Ou…

Ou… ou religião,

A cor da pele não me interessa,

Esqueço

E não mereço,

Os teus lábios ressequidos pelo abismo dos rochedos de cartão,

 

E amanhã,

Se a madrugada acordar em ti,

Esqueço,

E desapareço,

Das noites infinitas do teu triste olhar…

Que só o mar consegue perceber,

 

E

 

E desenhar.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 17 de Maio de 2015

Os pássaros da minha infância


Vejo-te partir,

Sem o sentir,

Vejo-te partir…

E faltam-me as palavras para te acompanhar,

Para te fazerem sorrir,

E voares como os pássaros da minha infância,

Vejo-te partir,

Na ausência,

De nunca,

De nunca regressares,

Ao meu livro,

Ao meu poema,

 

Vejo-te partir da minha poesia…

Como uma fera,

Ou uma pena,

 

Enquanto desce a noite sobre os teus ombros de pó.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 17 de Maio de 2015

sábado, 16 de maio de 2015

Sem sonhos…


Sinto nestas palavras

O tecto nocturno do sofrimento,

Uma sombra de luz,

Sobre ti,

Acariciando o teu corpo

Inventado por mim,

E mesmo assim,

Não estou feliz,

Não me apetece olhar o rio,

Nem os socalcos desesperados,

Ler, escrever ou desenhar,

Sobre ti,

O corpo emagrecido das tempestades de silêncio,

Voas como uma invisível folha,

Sem asas,

Nem… palavras,

Eu,

Sinto nestas palavras

A ardósia tarde da loucura,

Estranhamente… só,

Sempre só,

O vento,

E a chuva,

O medo,

E a paixão,

Escondidos no coração do amor…

Sem sonhos,

Sem… sem Nação!

Amor invisível


Falta-me qualquer coisa,

Sem razão,

Acredito na morte do amor

E da paixão,

Dos pássaros

E do cacimbo,

Pego melodicamente no meu cachimbo,

Sabes, meu querido…

O amor é uma “merda”,

Uma farsa

E uma mentira de trapos,

Como o nosso olhar

 

Em dias de transeuntes embriagados,

Descendo a Calçada

E fundeados no rio,

Gritam,

Gritam pela liberdade do corpo,

Gritam pela ambiguidade dos beijos

E das caravelas em flor,

O imperfeito,

Amor,

Paixão,

Deslumbramento,

Enterro

 

E…

E a separação,

Madrugadas em papel,

As milícias do cansaço

Subindo as escadas da tristeza,

Penso,

E acredito,

Não aguento mais…

Não sinto as palavras

Nem percebo os teus desenhos no espelho do meu quarto,

Não tenho janelas, em mim,

Meu amor invisível…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 16 de Maio de 2015