sábado, 2 de maio de 2015

O amor entre parêntesis no Rossio


Ouvíamos os tímidos limites da solidão

Como se eles pertencessem aos adormecidos fantasmas

Dos telhados de vidro

Não existiam janelas no teu peito

Nem sol no teu cabelo

Não havia um único rochedo de lágrimas

Que nos abraçasse sem querer nada em troca

Fomos engolidos pela paixão

Como são engolidos todos os pássaros

Pelas ingrimes tempestades de areia

O tecto deslizava encosta abaixo

Sentados na sombra

Trocávamos beijos

Por palavras

E palavras

Por nada

Nem ninguém

Em nossa casa

Vazia

E só

Regressávamos e apenas uma ténue luz nos esperava

De língua afiada

Lambia-nos envergonhadamente

Como quem desenha telegramas

Nos muros de xisto da paixão

O amor entre parêntesis no Rossio

O ponto de interrogação

(que tem o ponto de interrogação, meu amor?)

O ponto de interrogação massacrado pelas amarras do abismo

E mesmo assim

Queríamos voar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 2 de Maio de 2015

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Pérfidos orgasmos de prata


“Mãe, as pedras falam?

Um dia, um dia… meu filho!”

 

O silêncio adormecia em ti

Como adormecem todas as tristezas

Dos dias insignificantes

Entre poesia

E viagens ao desconhecido

Tínhamos todas as imagens do sono

Habitava em nós o cansaço

E a solidão da noite

Ouvíamos o ranger da janela

Em pérfidos orgasmos de prata

O silêncio das coisas inacessíveis

O sexo desacreditado

Numa cama de um qualquer hospital

As lágrimas

Nas janelas

Para…

O mar, mãe?

Um dia, um dia… meu filho!

No poço da penumbra

Os teus braços engasgados no medo

O amor

Quando inventado na madrugada de papel

E deixamos perder o luar

Amanhã, mãe, amanhã as pedras falam?

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 1 de Maio de 2015

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Das minhas tristes palavras…


O significado da paixão

De todas as noites


Encerrado entre cinco paredes

Um pavimento

E tecto

Aluga-se

Meu amor

Barato

Farto das palavras

E do sindicato

Todos os Domingos

Feriados…

E… Domingos

Lembro-me de ti

Meu amor

Da carroça de bois

Penhorada ao silêncio

Das ervas

E

Dos cheiros

A morte alimenta-me

Sinto-a perto de mim

Como sentia o cheiro a “puta”

Quando…

Lisboa

Cais do Sodré

Fome

Não fome

E literatura

Farto-me

De ti

De mim

E deles

O significado da paixão

Pintado na parede da solidão

As palavras reduzias ao pó da insónia

Cresce

A

Noite

Em ti

Meu amor

Das palavras

E palavras

Limitada

Angola à vista

Apenas no mapa da infância

Meu amor

As sílabas apaixonadas do teu corpo

No meu corpo

O inferno

A chuva

Outra vez…

A paixão

O ódio das tristes tardes no jardim

Outra vez o jardim

E o beijo

Outra vez a vida

E o desejo

Em ti

Das minhas tristes palavras…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 30 de Abril de 2015

quarta-feira, 29 de abril de 2015

O covarde


Viajo nas tuas mãos

Andorinha selvagem

Sem poiso

Agreste

Na sombra da viagem

Peço-te o beijo da despedida

Não o queres

E rejeita-lo como se fosse uma faca de sangue

No corpo da paixão

Ignoro a tua ausência

Não percebo porque existem ruas desertas

Mulheres

Mulheres sem nome

Galgando a penumbra madrugada

Sem sossego

Sem

Sem nada

Viajo dentro de ti

À boleia do desejo

A sagrada noite vestida de lentidão

Sem

Sem nada

Amanhece

Cresces entre os desassossegos da liberdade

Trocas o beijo prometido

Por

Ausência

Falta de tempo

Porque amanhã

Tenho de trabalhar…

E eu

E eu amanhã tenho de escrever-te

Dizer-te

Dizer-te o que nunca tive coragem de o dizer

(covarde)

Eu sei

Sempre o fui

E sempre o serei…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 29 de Abril de 2015

terça-feira, 28 de abril de 2015


Sabíamos que o tecto da saudade

Deslizava sobre o silêncio da morte

O homem acabava de pertencer…

… de pertencer à solidão

Havia na madrugada

Panfletos de insónia

Voando contra o luar

Amanhã saberei porque morrem os pássaros

E as abelhas do inferno

Como nascem as lágrimas no teu sorriso

Sabíamos que o tecto

Morto

Salivando barcos a vapor

E pequenas marés de enxofre

E sabíamos

E não conseguimos acordar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 28 de Abril de 2015

domingo, 26 de abril de 2015

O espelho


Esta vida em crescentes cansaços

a pele iluminada na ira do vulcão

como sempre

esboçando nos tentáculos orgasmos dos homens

este amor

meu amor

um computador

novo

(ao menos

enquanto estiver com ele

não penso em ti...)

como quando desenho noites

nos teus lábios

no espelho da cidade que nunca sorri...

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 26 de Abril de 2015

sábado, 25 de abril de 2015

No teu corpo em STOP


as hastes virtuais do cansaço alimento

tenho no corpo as sentinelas do abismo

pensando bem

amanhã perguntarei ao corredor envidraçado

se...

se a Primavera é isto...

a porcaria caligrafia dos voos nocturnos da paixão

o exilado amor

acorrentado às primeiras páginas de um livro

as tormentosas sílabas do adeus

caminhando junto à praia

a morte constituída arguida das sombras em flor

o prisioneiro eu


sempre só

meu amor

amor meu


sou uma árvore sem sorriso

um esqueleto de letras

cambaleando na noite dela

nunca tive a noite

meu amor

sentia-me disforme

ambíguo

sonâmbulo das viagens clandestinas

no teu corpo em STOP

Pára tudo

meu amor

as pessoas

os carros

as pessoas e os carros

embrulhados em perfume de luz

vou

e acredito não voltar mais

para quê?

meu amor...

regressar aos teus braços...

 

Francisco Luís Fontinha - Alijó

Sábado, 25 de Abril de 2015

sexta-feira, 24 de abril de 2015

O envidraçado corredor alimentado por fotografias e pensamentos, olho as fotografias, e sinto os pensamentos no corpo, sento-me, e levanto-me, caminho sem destino, volto a sentar-me, e levanto-me, durmo, tantas vezes que o cansaço me absorve, que figura
Os esqueletos de luz passam, e
Que figura, embriagado por uma cadeira, não sonho, invento bonecos de palha no silêncio da dor, e a morte mesmo ao seu lado…
Perdi-me em ti, meu amor, não sei quando acordará a manhã e tu, cá, vestida de insónias sobre a minha campa de palavras, o envidraçado, de vez em quando, sorri
Odeio o riso, odeio a luz e a noite, odeio as cidades e os rios e o mar,
Os barcos,
O que têm os barcos, meu amor,
Corpos,
Mortos,
Desenhos na caligrafia, os desenhos embrulhados às poucas palavras,
Nunca
Lhe
Ouvi
Uma apalavra
Nunca lhe ouvi uma palavra, disse-me ela enquanto tomávamos um café
O cigarro,
Apagado,
O dia terminado, sem que eu tenha alcançado as ruínas dos teus ossos, a cada sílaba retirada
Um ai,
O cansaço das árvores enquanto dormem, as pedras minúsculas do teu olhar, pregadas, à parede sem saberem que o dia nunca existiu
O meu irmão António
O dia nunca existiu, tu, tu nunca exististe, ela nunca existiu nem ele e ela alguma vez tenham existido,
Confusão, as tuas palavras, confusão, meu irmão, a nossa vida
Desgraçada,
António, amanhã vais ao terreiro e trazes meia dúzia de cigarros, três ou quatro fósforos… e fugimos, para longe, meu irmão, para longe, lembras-te, quando pedimos à mãe que nos levasse ao circo…
Não gostavas de circo, não gostavas de nada nem de ninguém, não pertencias a esta vida, o agora, o antes, porque o depois
Circo, António,
Porque o depois torna-se o agora e o agora transforma-se em ontem, e onde estiveste ontem, António,
No circo, no circo,
Do envidraçado, não via nada, nada, apenas esqueletos de luz…
 
(ficção)
Francisco Luís Fontinha - Alijó
Sexta-feira, 24 de Abril de 2015


Gaivotas de espuma…


Enquanto escrevo

Acredito no esboço do beijo

Deitado

Sobre o esquiço do cansaço

As palavras entre lábios de esperança

E bocas de amargura

Deitado

Submerso

Ele

Enquanto dorme

Submersa ela

Enquanto deambula na cidade

E vê nas sombras

A verdade

A mentira disfarçada de verdade

As lágrimas

No esconderijo do silêncio

Caminho desesperadamente sobre as pedras inanimadas da solidão

Não percebo o sofrimento

Nem… nem o reencontro de alguém

Com o espelho da madrugada

Não acredito

Em nada

Nada

Na

Da

Amanhã

As sílabas magoadas dentro de um livro escuro

A capa em cor de noite

Com pedacinhos de algodão

Lá dentro

Habitam pessoas

Casas

Ruas

Nuas

Nu

As

E amanhã

Caminho

O livro escuro

Encerrado

Para descanso do pessoal

Reabrimos…

Nunca

Nun

Ca

Os cigarros espalmados nos alicerces do passado

Não

Não sei

Talvez

O dia seja desejado

Ou…

Ou…

Deitado

Sobre o esquiço do cansaço

As palavras entre lábios de esperança

E bocas de amargura

E não consigo olhar o envidraçado olhar

Das gaivotas de espuma…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 24 de Abril de 2015

O corredor


Solidifica-se o corredor da esperança

Sinto as vergastadas palavras

Do sofrimento

Alimento-me de poemas

Meu amor

(meu amor inventado)

Vê tu

Poemas

Sei que todas as tempestades

Morrem

Como o amor

Solidifica-se o corredor

Sento-me

E durmo

Não sonho meu amor

Imagino transeuntes brincando na areia

Folheando peles cintilantes

E namorados invulgares

Tanto sofrimento

Meu amor

Perceber que a vida

É a vida

Um segundo apenas

No teu relógio

A madrugada sobressai nas límpidas telas dos beijos encarnados

Imaginava-te penumbra como a noite

Com asas

E voavas…

O infinito adeus

Quando tu

Sentado

Me abraças

Gosto de ti

Gosto de ti como se fosses o meu preferido livro de infância

Aquele com desenhos de estanho

As curvas

Uma pulseira nos teus lábios

O marfim

A morfina andorinha pregada ao teu texto

Escrevo com odor

Sem pensar

Que tu

Meu amor

És inventada

Inventada

Uma boneca de sorrisos

Um cortinado em linho

Suspendido

Crucificado ao amanhecer

Existes

Meu amor?

Porque são desertas as ruas da nossa cidade

Do nosso bairro

Da nossa infância

Os primeiros beijos desenhados num velho Castanheiro

As castanhas entranhavam-se nos teus seios minúsculos

A morte

Meu amor

És inventada

Uma carta nunca escrita

Secreta

Anónima…

… Amo-te

Meu amor…

Adormecida cancela da escuridão

Sei que tu…

Partirás para o Inverno

Não importam os teus álbuns fotográficos

Porque

Meu amor…

Perdi a paciência para te amar

Meu querido

Como é o sofrimento?

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 24 de Abril de 2015