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foto de: A&M ART and Photos
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dia 21
quarta-feira, 28 de Agosto de 2013
Prisão da Alegria,
Mãe,
Hoje não tivemos direito a almoço, um problema
qualquer na cozinha, segundo eles, mas a verdade é que ainda não
vimos nenhum dos guardas, estamos encerrados desde ontem ao final da
tarde, há um silêncio total à nossa volta, mete medo, abrimos o
postigo de acesso ao pátio e nem os pássaros se conseguem ouvir,
alguém nos disse que tinham desertado todos, juntamente com os
guardas, ao que tudo indica, estamos por nossa conta, começa a
chover, parecem pedaços de cinza, dizem que a cidade dos sonhos
arde, mas outros, outros dizem-nos que é o Governo que está a
transformar a Cadeia da Alegria em Cemitério da Tristeza, não o
posso garantir, mas a verdade, mãe
Fui aí para te visitar e disseram-me que estavas
com dor de cabeça, gripe penso eu, desculpa meu filho, desculpa...
já não consigo perceber muito bem o que me dizem, oiço mal, vejo
mal, e cada vez que te vou visitar há uma desculpa à minha espera,
talvez tenhas apanhado muito sol, talvez...
Olha, o mar que tínhamos pintado numa das paredes
da cela, desapareceu durante a noite, dizem que a culpa foi dos
incêndios das últimas semanas, parece que o Governo privatizou o
nosso mar, e agora, vê tu, o mar que tanto trabalho nos deus a
pintar
Não me digas, meu querido filho, não me digas que
foi comprado pelos Chineses...
Exactamente, exactamente mãe, como o sabias?
Não o sabia, não o sabia,
Estou esquecida, meu filho, tão esquecida que
deixei de perceber há quanto tempo estás ausente de mim, oiço mal,
vejo mal, dizem-me que estás bem, que estás a trabalhar numa Ilha
com muitas mangueiras, com muitos barcos, e que és muito feliz... é
verdade, meu filho?
Sim, sim mãe, aqui na Cadeia da Alegria somos todos
muito felizes, ou... éramos, porque depois de nos terem vendido o
mar... nada nos resta aqui, apenas um pequeno jardim deitado sobre um
corpo emagrecido, vendido em pequenas fatias pelo Governo, e dizem
que os pássaros e os guardas levaram as árvores, acreditas nisto,
mãe? Que País é este? Que... que transforma as Cadeias da Alegria
em Cemitérios da Tristeza..., diz-me tu, por favor?
Fui visitar-te e disseram-me
Que eu estava com gripe, é mentira mãe, é tudo
invenção deles...
E disseram-me que estavas bem, que tinhas o mar numa
das paredes da tua suite, que havia barcos, sonhos, sons, e palavras
Palavras? Quais palavras, meu filho?
Palavras, mãe, palavras de papel, acreditas nisto,
mãe?
E disseram-me que estavas bem, até que tinhas
engordado três quilogramas
Acreditas, mãe, acreditas que eu engordei três
quilograma?
Fui visitar-te, esperei, esperei, e ninguém para me
abrir a porta, e nenhum barulho, e ninguém a gritar, e ninguém a
ser chicoteado pelo chicote da insónia... e esperei, e esperei...
até que acordou a noite, até que
Que eu estava com gripe, é mentira mãe, é tudo
invenção deles...
Até que deixei de ouvir, até que deixei de ver,
até que fiquei sentada em frente à Baía de Luanda a imaginar
metralhadoras do outro lado da rua a vomitarem
Palavras, palavras de papel?
Sim, sim meu filho, a vomitarem... a vomitarem
palavras de papel.
(não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó