foto de: A&M ART and Photos
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És a única bagagem que sobejou da viagem ao teu
meu corpo gourmet embebido em pequenas framboesas e gotas de
champanhe, trazíamos no rosto as telas do louco pintor que habitava
na rua onde passeávamos todas as noites antes de deitarmos o mar no
leito da saudade, eu pegava nele ao colo, em poucos metro de viagem,
deitávamos-lo sobre uma deserta cama com lençóis de Pôr-do-Sol e
finas tiras do adormecido miolo que o pão em molho de beijos
vagabundos que dos lábios teus saltitavam até de encontro aos
vidros da pequena janela
Embaterem e destruírem-se como bolas de sabão,
Ouvíamos o ruído em cacos vidros caírem sobre a
ruela com a garganta apertada, sentia-se na respiração o ofegante
grito do cansaço, caírem como pedaços de papel em colorida cinza,
e confesso que
Não gosto, e detesto,
Que entre em mim a noite mendiga, travestida,
enfeitada com cartão e velhos cobertores que antigamente alimentavam
lindos cortinados suspensos na janela da sala onde habitava o piano
da tia Adosinda, onde permanecia ainda, penso eu que
Não gosto, e detesto,
Que me digam o que tenho ou não de fazer, que os
espelhos me olhem e me ordenem
Olha lá pá... tens de desfazer essa barba,
Olha lá pá... tens de cortar esse cabelo,
Olha lá pá...
Penso que sobrevivia sozinho, e não precisavas de
esconder debaixo da mesa as chaves do sótão da rua das flores, e
não precisavas de trazer no rosto as minhas pobres telas, e não
precisavas de retirar todos os cortinados e oferece-los aos mendigos
da rua contígua que agora utilizam como cobertores
Cantigas, lérias... olha agora cobertores...
Olha lá pá... tens de desfazer essa barba,
Olha lá pá... tens de cortar esse cabelo,
Olha lá pá...
Não, não gosto, e detesto,
(és a única bagagem que sobejou da viagem ao teu
meu corpo gourmet embebido em pequenas framboesas e gotas de
champanhe, trazíamos no rosto as telas do louco pintor que habitava
na rua onde passeávamos todas as noites antes de deitarmos o mar no
leito da saudade, eu pegava nele ao colo, em poucos metro de viagem,
deitávamos-lo)
Lembras-te de mim, miúda?
Provavelmente já não te lembras do pintor que
trazia no rosto as sujas telas e os tristes papeis como argamassa do
muro da solidão, eras tão nova, que
Não, não gosto,
Que confesso,
Que
Lembras?
Que foi a última vez que tive na mão o beijo da
cidade dos embebidos marinheiros que chegavam em pequenos grupos aos
teus braços, ainda pensei plantar-me junto ao rio, ainda pensei
Ainda gostas de mim?
Gostar, o que é gostar?
Que ainda pensei transformar-me em ponte, em aço de
preferência, esticava os braços, juntava as duas margens, ou
Cantigas, lérias... olha agora cobertores...
Olha lá pá... tens de desfazer essa barba,
Olha lá pá... tens de cortar esse cabelo,
Olha lá pá...
… ou
É triste
É triste ser peixe e viver dentro de um minúsculo
aquário de peneirento vidro com perfume made in China, depois
chegavas a casa, corrias os cortinados, entrava em nós a luz ténue
da madrugada, abrias o piano, e começavas a tocar para mim...
Ou...
Tão triste, tão, ser peixe em trinta e seis suaves
prestações... e sem juros.
(Não revisto . Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 29 de Agosto de 2013
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