segunda-feira, 1 de junho de 2015

E o mar tão longe…


Percebia nos teus lábios

A distância do mar,

Não existiam no teu olhar

As caravelas nocturnas do silêncio,

Acariciava-te os cabelos

E via em ti uma criança,

Sentada debaixo da melancólica sombra da árvore esquecida,

A tarde fugia-nos em direcção ao Tejo,

 

E o meu corpo levado pelo vento…

 

Regressavam as estrelas de papel,

Ouvíamos os tentáculos do sono em constante pulsar,

Adormecíamos

No desespero luar…

 

E o meu corpo,

Voava como o lençol do amanhecer

Entre a partida e o regresso de um novo sonho,

 

Percebia nos teus lábios

A distância do mar,

 

E o mar tão longe… meu amor!

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 1 de Junho de 2015

domingo, 31 de maio de 2015

Negro espelho da alvorada sem destino


Este negro espelho

Abraçado à solidão do cansaço

O sonho embainhado nos alicerces da noite

Como se a noite fosse o cobertor

Protector

Da alegria

Não sentida

A vida a escoar-se montanha abaixo

E o rio enforcado no socalco esquecido pelo homem

Dos sonhos

Entre sonhos

A poeira das fotografias,

 

Abandonadas

E perdidas,

 

Este negro espelho

Sem coração

Que o dia entristece

E aquece

Na lareira da dor,

 

E há uma fogueira no meu peito

E há um esconderijo nos meus braços

Prateados

Das doces pálpebras do destino,

 

O menino,

 

Este negro espelho

Espantalho do sofrimento

Que só o sono consegue alimentar

E na lareira da dor

As cinzas parcas dos eléctricos

A cidade ignora-me

Mas não me importo com as cidades

Os rios

O mar

Os barcos

O menino…

Perdido na esperança de acordar.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 31 de Maio de 2015

Hoje e só hoje


Hoje, apetece-me ver-te,

Escrever no teu corpo silencioso

O significado da paixão,

Hoje,

Agora,

Apetece-me…

Escrever-te,

Sem demora

E na hora,

Convencer-te

Que só a noite nos transforma em luar

E a solidão sem aroma…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 31 de Maio de 2015

sábado, 30 de maio de 2015

Sítios & sítios


Este sítio está morto

E mortas se sentem as minhas palavras

Este sítio deserto

Amargo

Incerto

Está morto

Cansado

Este sítio está morto

Este sítio é um rochedo de insónia

Estampado no rosto do amanhecer

Este livro

Este sítio

 

Mortos

Mortas

Incertas

Certas

Certas noites me ignora

Certas noites

Não muitas

Chora…

 

Este sítio em constante sofrer

Quando o corpo range como os gonzos da madrugada

Não há sorrisos

Não há gestos

Certos

Incertos

Sítios

Mortos

Vivos

Homens

Esqueletos

De vidro

 

E se partem

E se partem

Todos os sítios mortos

Não mortos

E vivos…

 

Vivos

Mortos-vivos

 

E sítios… sítios amargurados.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 30 de Maio de 2015

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Pincelado “adeus”


Do movimento pendular do sono

Oiço as tormentas sombras do teu silêncio olhar,

Perco-me no ondular medo que a equação da dor

Constrói numa velha ardósia,

Na rua sinto os automóveis esfomeados

Descendo calçadas,

Subindo escadas,

E chegando ao sótão…

As migalhas do sonho

Embrulhadas em velhos jornais,

Teias de aranha

E…

 

Nada mais,

 

Nada,

Mais,

 

Como ontem,

 

E lágrimas embalsamadas pelo relógio nocturno da miséria,

Abro a janela

E durante a noite o mar fugiu,

Como fogem as andorinhas

Em cada final da Primavera…

Sem um pincelado “adeus”,

 

Ou o regresso do mar à minha janela.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 29 de Maio de 2015

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Arcadas em flor


Podíamos falar da vida,

Podíamos recordar aquilo que se perdeu no tempo,

Algures no Oceano,

Podíamos falar…

Podíamos brincar

Nas palavras

Como fazíamos na sombra da seara dos olhos negros,

Podíamos,

Algures,

Hoje,

Amanhã…

Amanhã não o sei,

 

Se o teu álbum de fotografia sorri para mim,

É tão difícil desenhar-te um sorriso,

Meu amor,

Podíamos,

Podíamos brincar no Tejo com barquinhos em papel,

Papagaios coloridos…

Voando,

Voando,

Voando até se abraçarem no luar,

Podíamos sonhar,

E hoje,

E hoje não sonhos,

 

Nem Primavera,

E hoje

E hoje podíamos brincar no silêncio das arcadas em flor,

Apelidavam-nos de loucos,

Dois loucos que deixaram de poder,

Brincar,

Voar,

Sofrer

Ou deixar a planície entrar nas nossas mãos,

E podíamos,

Amanhã,

Ontem,

 

Mas hoje…

Não podemos falar da vida,

Não temos vida,

Palavras,

Sonhos

E migalhas,

 

Como se fossemos dois cadáveres putrefactos ao pôr-do-sol…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 28 de Maio de 2015

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Cidade em lágrimas


Os ossos envenenados pela paixão do desejo,

 

A poeira do cansaço

Entre envidraçados

E pilares de areia,

As lágrimas do incenso…

Fundeadas nos teus braços,

E não há maneira de acordar a madrugada,

Deito-me na cidade em lágrimas,

Sou absorvido pelos guindastes da solidão,

Os barcos,

O corpo sem coração…

Loucos

E poucos,

 

No calendário sem amanhecer,

Sinto-me um livro a arder

No centro do Tejo,

Sou abalroado pelos cacilheiros em papel,

Não tenho medo do silêncio,

E das casas sem telhado,

Não tenho medo das palavras

E dos desenhos não desenhados,

Os ossos

Masturbam-se no líquido pincelado do Adeus

Também ele… docemente

Envenenado pela paixão do desejo…

 

E amanhã

Uma cancela de sombra será derrubada,

Tomba,

E desaparece dos jardins onde poisam os teus cabelos,

 

E para quê?

 

O dizer

Sem o querer

Apenas porque estou sentado sobre um corpo sem coração…

E pum. Termina o dia. Apagam-se todas as luzes. E pum…

Docemente

Uma pomba dorme no parapeito da minha janela.

 

E pum.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 27 de Maio de 2015

terça-feira, 26 de maio de 2015

Sorrisos


Não oiço as camufladas sílabas do sono,

O corredor embrulha-se no sonho,

Transeuntes vestidos de sombra,

Correm,

Inventam sorrisos…

Como se fossem espelhos fendilhados,

Retractos de medo

Em cada parede,

Ou…

Ou em cada silêncio,

Não oiço…

E também eu… invento sorrisos nas pálpebras da dor.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 26 de Maio de 2015

segunda-feira, 25 de maio de 2015

O poema


O corpo morre

Embrulha-se nas palavras

E foge

Caminha na ausência do amanhecer

Senta-se

Abre um livro

Saboreia o poema

E sem o saber

O corpo

Levita

Saltita na montanha

Até o dia nascer,

 

Até o dia morrer…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 25 de Maio de 2015

domingo, 24 de maio de 2015

Tarde clandestina do silêncio


Em cada noite

A noite

Em desespero

Entre paredes

E o medo

Da noite,

 

Em cada noite

Ouvir

Sentir

De ti

E em ti

As palavras

Amargas

E belas,

 

Noites

Entre paredes

Descendo Calçadas

E veredas

Algumas verdes

Sonhos

Nos sonhos da Ilha

Outras verdes nos sonhos da ira,

 

Sem o saber

Nas palavras mortas embalsamadas e castanhas

Nuvens de prata

Na boca

Louca

Dos bairros em lata

E nada

E nada a atormenta…

 

Ela lamenta

A perda do livro

Na fogueira do corpo

Em brasa

Em chamas…

De nada,

 

De nada interessa saber

O calendário da noite

Que a noite engole

E come

Como um homem

Sentado à beira do rio

Desce

Sobe

Morrer

Afogado

Na tarde clandestina do silêncio

Do silêncio amargo…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 24 de Maio de 2015