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quinta-feira, 16 de março de 2017

Pálpebras de xisto


Saboreei a paixão convexa do desejo
Percorri os caminhos esconderijos do sofrimento
Como os livros que escrevi
E os que não quero escrever…
Saltei a ponte do esquecimento
Num voo frenético nunca antes alcançado
Em direcção ao mar
Em direcção ao abismo
Senti no corpo o peso do amanhecer
Senti nas mãos a enxada da vergonha
Descendo socalcos
Saltando montanhas desenhadas…
E as palavras
As palavras do sono inventando pálpebras de xisto
Como se inventam os rios
Quando cai a noite sobre a escuridão.


Francisco Luís Fontinha
16/03/17

domingo, 25 de dezembro de 2016

Lua encarnada


Minha lua encarnada

Subjacente aos lábios da madrugada

Doce manhã ao acordar

Sempre que o meu corpo sente

O cintilar da maré…

O sofrimento da alvorada

Minha lua

Meu amante desesperado

Nas ruelas íngremes da solidão

Minhas mãos ensanguentadas pela escuridão

Nos jardins suspensos do teu olhar

E deixei para ti o meu mar

E deixei para ti o meu coração

Desenhado numa rocha

Que a cidade absorve

Nas tristes e belas calçadas…

Minha lua encarnada

Meu silêncio de nada

Oiço do teu sorriso o sofrido amanhecer

Que em cada poema acordam

E se deitam

Como cadáveres de pano…

Como cadáveres sem viver.

 

 

Francisco Luís Fontinha

25/12/16

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Ribeira assassina


Espero-te junto à ribeira assassina

Como se fosse um cadáver enfeitado

Meia dúzia de ossos putrefactos

Esperando o regresso do coveiro

Das tranças da menina

A lareira coberta de cactos

E miudezas sem rima…

O corpo desfalcado

Nas mãos do oleiro

Primeiro

O ventrículo desajeitado

Que tenho no meu peito

Ai… ai menina esse olhar

Sentado na escrivaninha…

A semear palavras

Palavras de escrever

Apetece-me chorar

Apetece-me esconder…

Confesso-me… sem jeito

Nem paciência para habitar o silêncio do amanhecer

Que morre ao nascer…

Que morre sem querer.

 

 

Francisco Luís Fontinha

09/12/16

quinta-feira, 21 de julho de 2016

pobreza


vadios lábios

que a porcelana inventa

nas manhãs sem madrugada,

minha garganta degolada

pelas lâminas do xisto amanhecer…

o meu corpo lamenta

o silêncio de envelhecer

sem acreditar nas palavras de escrever,

vadios lábios

filhos da noite envenenada…

a corda suspensa numa árvore abandonada

alicerça-se ao meu pescoço…

 

e sou fatiado pela alvorada…

 

na tua boca enrolada

a língua artificial da pobreza

que vive e alimenta o meu olhar,

o orvalho sobre a mesa…

e dos pratos vazios… a sopa que traz o mar

e os barcos da tarde magoada…

 

e sou fatiado pela alvorada…

 

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 21 de Julho de 2016

terça-feira, 19 de abril de 2016

Sentido desespero


A ponte desesperada.

O silêncio amargurado das velhas esplanadas

Caindo do Céu como serpentes de aço

Voando sobre o cansaço

Das velhas madrugadas,

Morro de medo que apareça a tua mão no meu peito,

Fico sem jeito

E deixo de sentir a alvorada,

A ponte desesperada,

A ponte enigmática sobre o rio da solidão,

O peito na mão

Sem mão,

Esperada vaidade dos alicerces da cidade,

A ponte, desesperada; a infinita sombra do sufoco,

A chuva dos dias envergonhada pelas cintilações do medo,

E eu, e eu vou partir.

Vou deixar este caderno e esta esferográfica de carvão…

O meu testamento,

A minha vontade,

A garganta desafinada

Quando desce sobre mim a brisa do amanhecer,

Sinto o frio da saudade,

Sinto o calor do desejo

Na espuma dos dias ambíguos,

Ausentes de mim.

Atravesso o desassossego.

Morro enquanto lêem o poema da tristeza

Que atravessa a ponte

Dos transeuntes embriagados,

Sinto o fumo do teu corpo

Neste velho sótão sem nome,

Ao longe vejo a ponte desesperada,

E tal como eu, em frente ao espelho, também um desesperado apaixonado,

Um velho caixão de sombra

Descendo a calçada da morte,

Então a ponte está desesperada?

Ponte. O desespero da carnificina dos cadáveres cerâmicos,

Cacos, pedacinhos de algodão

Rompendo pelo sótão adentro.

A ponte desesperada,

O silêncio na ponte

Enquanto o meu corpo sente…

O desespero da ponte.

 

Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 19 de Abril de 2016

domingo, 27 de março de 2016

o silêncio suor na penumbra palavra em destruição


a destruição da alma

na abóboda silenciosa da manhã

um suspiro

a ausência do teu corpo

neste manchado lençol de prata

a ausência do teu corpo

neste imensurável destino menino

a sinfonia da saudade

encastrada nos ossos da alvorada

sinto-me um cadáver inventado pelo sonho

sussurro-te as palavras mágicas da sombra

sussurro-te as palavras mágicas do Adeus

e desapareço na ténue lentidão do sorriso

amo-te destruição da alma

conflito íngreme da solidão

estou só

muito só

que nem tempo tenho para abraçar os barcos em regresso

que trazem promessas

riquezas

brincadeiras de criança

a bandeira do amanhecer

hasteada nos teus braços

a insónia amestrada no palco do circo

o frágil miúdo

inacabado

ausente

e apaixonado pela cidade

inventei amores

inventei desamores

inventei milhões de iões

beijando electrões

inacessível inculto dos comboios da noite

vou com o circo

amo o circo

e as montanhas de Lisboa

amo o circo

e as montanhas de Luanda

barcos

o engate do miúdo numa noite de copos

invade-me o sono

o silêncio suor na penumbra palavra em destruição

não tenho ossos

sonhos

noite

não tenho nada

meu amor

nada

 

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 27 de Março de 2016

sábado, 26 de março de 2016

os meus livros


(com amor para a minha mãe um feliz aniversário)

 

amo os meus livros

e os teus olhos de madrugada mimada

amo a vida construída de janelas

e de portas de entrada

amo o teu corpo camuflado pelas ervas daninhas do amanhecer

amo as palavras de escrever

e os versos de chorar

amo os barcos

os rochedos vestidos de barcos

amo o mar

e as planícies do sofrimento

amo o vento

que não quer regressar

amo os meus livros

e os teus olhos

e os livros dos teus olhos

e os olhos dos teus lábios

amo

amo sem ser amado

pelas palavras

e pelos teus olhos de madrugada mimada

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 26 de Março de 2016

terça-feira, 22 de setembro de 2015

O espelho da paixão


Sentíamos a liberdade do vento dançando sobre os nossos corpos em desejo,

Um sótão recheado de livros gemeia, e da janela ouviam-se alguns sussurros insolentes, tristes, como serpentes mergulhando no peito da noite,

O rio que caminhava nas nossas veias saltitava nas luzes do prazer,

Uma clarabóia em delírio alicerçava-se aos teus seios, olhava-a, e via o luar em lágrimas, como se fosse esta a nossa última noite,

Amanhã não vens, e nunca mais existiram fotografias minhas no espelho da paixão,

Morri,

Não o sei…

Ou… ou talvez não,

Deixei de sentir a liberdade,

Deixei de pertencer aos sonhos em papel químico, e hoje sou apenas uma sombra escondida nas coxas do poema,

Senti, vivi o teu corpo misturado nas marés cinzentas da madrugada,

Não sei, meu amor,

Não sei se voltarei a olhar-te…

É que os meus olhos cerraram-se e apenas consigo imaginar os barcos agachados no Oceano amanhecer.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 22 de Setembro de 2015

sábado, 19 de setembro de 2015

Amanhecer envergonhado

 
(Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Sento-me
E sinto o amanhecer envergonhado,
Poiso sobre a lâmina da solidão
E oiço o cansaço da cidade em construção,
Amo,
Não sei se sou amado,
E não amo…
As palavras que escrevo sem vontade de o fazer,
Estou vivo,
Aqui,
Sentado… e sinto o amanhecer envergonhado,
Dentro do mar a arder…
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 19 de Setembro de 2015
 

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Bala de tinta florescente



(desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
“Sábados,
Domingos…
… E feriados,
Lamentamos,
Estamos encerrados”,
 
No pólen amanhecer
Cresce uma abelha em flor,
É disparada contra o coração
Uma bala de tinta florescente,
E de espingarda na mão,
Aquele louco transeunte…
Senta-se sobre a invisível espuma do mar,
Lamentamos,
O amor encontra-se encerrado para remodelação…
A paixão…
Afogada numa caixa em cartão,
Segue viagem, e não regressa a este cais ambulante,
 
“Sábados,
Domingos…
… E feriados,
Lamentamos,
Estamos encerrados”,
 
Apaixonados!
 
Não sei se vos diga o que sinto…
Porque nada sinto,
É estranho,
Saber que amanhã não vai acordar a madrugada,
É estranho,
Perceber que amanhã uma rosa embalsamada…
Acordará no estômago de um velho livro,
E o amor… e o amor é um gajo “fodido”.
 
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 4 de Setembro de 2015
 


sábado, 30 de maio de 2015

Sítios & sítios


Este sítio está morto

E mortas se sentem as minhas palavras

Este sítio deserto

Amargo

Incerto

Está morto

Cansado

Este sítio está morto

Este sítio é um rochedo de insónia

Estampado no rosto do amanhecer

Este livro

Este sítio

 

Mortos

Mortas

Incertas

Certas

Certas noites me ignora

Certas noites

Não muitas

Chora…

 

Este sítio em constante sofrer

Quando o corpo range como os gonzos da madrugada

Não há sorrisos

Não há gestos

Certos

Incertos

Sítios

Mortos

Vivos

Homens

Esqueletos

De vidro

 

E se partem

E se partem

Todos os sítios mortos

Não mortos

E vivos…

 

Vivos

Mortos-vivos

 

E sítios… sítios amargurados.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 30 de Maio de 2015

segunda-feira, 25 de maio de 2015

O poema


O corpo morre

Embrulha-se nas palavras

E foge

Caminha na ausência do amanhecer

Senta-se

Abre um livro

Saboreia o poema

E sem o saber

O corpo

Levita

Saltita na montanha

Até o dia nascer,

 

Até o dia morrer…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 25 de Maio de 2015

sábado, 24 de janeiro de 2015

Círculos de papel


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


sentíamos o peso do clítoris amanhecer
suspenso nas telhas de vidro do silêncio
tínhamos nos braços o suor das palavras
consumidas pelo fogo da paixão
havia um abraço de luz
nas verdejantes lápides da solidão
e apenas um finíssimo orgasmo de iões brincavam nas pálpebras da escuridão
havia o medo de não regressar
estávamos em círculos de papel
quando do espelho corpo em evaporação
uma gaivota soletrava os gemidos da maré...
os barcos arrependidos choravam como choram as crianças em flor.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 24 de Janeiro de 2015