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segunda-feira, 25 de novembro de 2019

As camufladas palavras do sonho


Roubaram-me o sono e os sonhos.

Roubaram-me a noite,

E todos os veleiros da marina.

Roubaram-me todas as palavras que tinha,

E não tinha,

E agora sinto a falta delas.

Roubaram-me os livros, a saudade, e a madrugada.

Hoje, nada tenho.

Roubaram-me a Calçada,

O rio,

E todos os Cacilheiros em viagem.

Roubaram-me as flores, as árvores e o meu próprio jardim…

Também ele, saqueado pelos piratas vestidos de negro.

Trouxeram-me a morte,

Adormecida em papel vegetal,

Num Sábado de Setembro,

Roubaram-me,

E se bem me lembro,

Ontem,

Nada me tinham roubado.

Roubaram-me as lágrimas, e todo o sofrimento.

Roubaram-me o alimento,

Das palavras gastas,

Entre parêntesis e pontos de interrogação.

Roubaram-me tudo.

Tudo.

Que hoje, sentido a falta da presença das palavras do sonho,

Não estou triste;

Mas roubaram-me os pássaros da minha cidade.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

25/11/2019

domingo, 11 de novembro de 2018


(…)

 

Os sete orgasmos do Mussulo, a liberdade sobre as palmeiras invisíveis que me atormentavam, como campânulas de sofrimento, ao deitar, o caixão que dançava deixou de o fazer, dificuldades com o cachê, dispensa de artistas e cadáveres de cera, um altar recheado de almas, tantas almas como os versos do sem-abrigo quando sentado numa cadeira apodrecida de um circo ambulante,

Quero ser artista, mãe!

Nem penses..., nem... penses...

Filho meu não é artista!

Nunca,

Nunca, mãe?

Os sete, juntos, e sós, no Mussulo era mais barato, a saia descaída, o soutien desenhado no peito

E...

Nunca, mãe?

Nunca,

Nunca

No peito uma flecha de sémen rodopiando no gelo do ringue de patinagem... o belo, a dança... e o corpo em pequenas rotações...

Os teus lábios acorrentados aos meus beijos embriagados pelo desejo, não o sinto, o vulcão da tua pele, não vejo o sorriso da tua mão, em vulcão, mergulhada nas palavras que o silêncio desenha na melancolia,

É falso,

O dia disfarçado de lápide, os outros destinos rejeitados pelo cacimbo, há uma fogueira no corpo da sinfonia do amor,

É falso,

O falso prazer, a liberdade to TEXAS e Cais do Sodré gingavam na penumbra salgada do abismo,

O querido, dança?

 

 

(…)

 

 

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 8 de junho de 2017

Nunca me encontrarás


Nunca me encontrarás porque eu sou a sombra,

Nunca me encontrarás junto ao rio a escrever nos teus lábios de Belém,

Nunca me encontrarás nos jardins de Belém…

Nem nunca me encontrarás abraçado aos braços da maré,

Nunca me encontrarás sentado a pensar em ti… porque, porque deixei de pensar em ti,

Hoje, nunca me encontrarás a desenhar nos teus lençóis os meninos a brincar na praia,

Porque a praia morreu,

Porque os meninos morreram,

Nunca me encontrarás enamorado pelo teu olhar,

Debaixo das nuvens envergonhadas dos finais de tarde,

Nunca me encontrarás enrolado nas tuas mentiras…

E batem à porta…

E espero que não me encontres neste circo ambulante,

Observando as árvores assassinadas pelos teus dedos…

Nunca me encontrarás nesta casa desajeitada e sem porta de entrada,

Que nem uma simples caixa do correio tem para receber as tuas cartas perfumadas,

Nunca me encontrarás a olhar o Sol… porque odeio o Sol,

Detesto o Sol.

Nunca me encontrarás passeando na rua atropelando automóveis famintos,

Tristes…

Tristes desencontros das ancoradas em flor…

Nunca me encontrarás nas tuas cartas nem no interior dos teus livros,

Porque não o quero…

Não quero ser encontrado.

Nunca me encontrarás.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 8 de Junho de 2017

domingo, 8 de maio de 2016

Confissões de um louco apito


Os comboios só apitam durante a noite para assustarem as estrelas,

As rectas paralelas em aço estendem-se até ao infinito, chegando lá, o comboio desaparece, entranha-se na noite e morre.

Encurvado nos socalcos levo comigo as curvas do Douro, lanço-me à água… estou farto das palavras que escrevo, estou fartos dos meus desenhos, como a vida que gira e não se cansa de cessar, parar sobre a ponte e suicidar-se sobre os rochedos da insónia.

Oiço o grito da aranha no cansaço da madrugada,

Sei que habita um rosto no espelho do meu quarto e certamente que não é o meu, porque nunca o vi, apenas em pequenos tragos de saliva ao pôr-do-sol,

Quero expulsá-lo de lá…, mas não tenho força para tal; parto o espelho?

Quebro-o até que o rosto se transforme em mim? Ou este será o meu rosto depois da minha morte?

Os comboios só apitam durante a noite, fiz muitas viagens, muitas noites sem dormir, entre apitos e soluços, entre estações e apeadeiros desconhecidos, entre gritos e gemidos, até desaguar em Santa Apolónia pelas sete horas da manhã, as ruas acabavam de acordar, os sem-abrigo levantavam-se para o invisível pequeno-almoço, e eu, e eu fumando cigarros para não adormecer,

Mas acabava sempre por cerrar os olhos e passar o dia entre os cortinados da escuridão e os sons melódicos do trânsito, a loucura, cruzava os braços e punha-me a contar os automóveis que passavam por mim, depois separava os que eram homens e os que eram mulheres, as crianças à parte… e assim passava o dia.

Regressava a noite e eu tinha vendido o sono ao Diabo, saía na companhia de desconhecidos, entrava em todos os bares até adormecer sobre qualquer banco de jardim, e enquanto dormia, sentia, sentia os apitos do comboio…

Tudo isto está escrito e sepultado em três caixotes de cartão,

Confesso que nunca mais os abri, não tenho coragem para os abrir…

Papeis, fotografias, poemas, e fantasias…, mas para quê remexer o passado e este está morto, e enterrado no meu peito.

Os perfumes intactos, uma velha rosa dentro de um livro, intacta, e a minha vida pedaços de farrapos em construção, hoje uma pequena vitória, amanhã uma grande derrota…

 

Amanhã faz vinte e dois anos que deixei a heroína…

Uma grande vitória.

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 8 de Maio de 2016

sábado, 7 de maio de 2016

Ausento-me de ti na noite


Era forçado pela pressa das coisas. O silêncio imaginário da manhã quando pegavas na minha mão ao desaparecer no meio dos transeuntes da cidade perdida,

Escondia-me das sombras dos aciprestes,

Porque assim, pensava eu, estaria mais protegido das estrelas, mas não estava.

A noite era uma aventura,

Eu preferia ler, e tu, e tu preferias passear, que confesso, que confesso não me apetece nada caminhar apenas por caminhar,

Se ao menos caminhasse em direcção ao Luar… era forçado pela pressa das coisas,

Tens de fazer isto, amanhã tens de fazer aquilo…

Chega. Detesto receber ordens de arbustos e munto menos de ti.

Sou feliz assim, confesso.

Não dou nem recebo ordens,

Sou livre, voo na companhia das gaivotas ao final da tarde junto ao Tejo,

Depois poiso em Belém,

Acorrento-me às amarras invisíveis da maré,

Olho os veleiros em atropelos sem que ninguém lhes valha…

Como a mim,

Nem palavras nem poesia,

Nem os livros me deixam adormecer quando tu, depois de caminhares em círculos, cansada, dormes, eu olho-te e finjo não te ouvir, prefiro ausentar-me na noite, e regressar quando já o dia bate na janela do nosso quarto,

Descerro a lápide do desassossego, não encontro nela o meu nome…

Deixei de pertencer aos humanos visíveis das avenidas laminadas pela escuridão,

Tenho no peito um fantasma, um falso coração que em vez de amar…

Bate, bate sem parar…

E um dia vai parar,

E nesse instante serei o homem mais feliz do Universo,

A minha morte; as coisas cessam, e deixam de ter pressa,

E deixam de ter graça.

E eu, e eu serei apenas eu…

Uma carcaça.

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 7 de Maio de 2016

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

É tão fácil odiarem-me aqui


O tempo cessou de vomitar

As horas os minutos e os segundos

Estou só

Aqui

Converso com um invisível copo de uísque

Recordamos os momentos passados junto ao Tejo

O embriagado soldado

Subindo a Calçada da Ajuda

Com o Doutor Vijago debaixo do braço

Não sei se o tempo me quer

Ou se eu quero o tempo

Estou só

Aqui

Neste convés sem janelas

Neste mísero abraço

Aqui

Estou só

Converso com todos os fantasmas da noite

Reparo que um deles odeia-me

É tão fácil odiarem-me

Aqui

Olhando o sonífero luar nos términos da insónia

Sou pobre

Nada telho para te oferecer…

Apenas beijos e livros

Coisas insignificantes

Sem destino

Quando menino dormindo na sombra das mangueiras

O musseque fervilhava de paixão

Havia sexo

Orgias

Orgasmos

E gemidos

África é um Paraíso

Sem nome

Sem morada física

Como eu

Aqui

E só

Escrevendo parvoíces

Coisas que ninguém lê

Palavras

Palavras

Palavras do Diabo

Sem dono

Sem ser amado

A felicidade acorda nos teus lábios

Framboesa das manhãs sonolentas

Dos castiçais amedrontados do templo do amor

As aventuras das crianças pretas meus irmãos também

A morte regressava-lhes de vez em quando

E sorriam

Cantavam

Beijavam-me como se beijam os Coqueiros nas fotografias

E o tempo cessou de vomitar

As horas os minutos e os segundos

Estou só

Aqui

Só…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

terça-feira, 8 de Novembro de 2015

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Calçada da Ajuda


(Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Habito numa cidade de abutres,
Manhã cedo, ao acordar, percebo que sou apenas uma sombra misturada com outras sombras como eu,
Não sei se dormi, não sei se estive toda a noite a sonhar,
Perdi o cheiro do mar,
E a paisagem dos Oceanos de vidro,
Olho, olho para o Céu…
E todas as estrelas de papel… voam em direcção ao Luar,
Peço às abelhas entranhadas no mel, ajuda,
Desço a Calçada,
E Ajuda, não ajuda…
A regressar a noite aos meus braços pincelados de ferrugem,
E Ajuda, não ajuda… sobe um Cacilheiro a dita Calçada.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 3 de Setembro de 2015
 
 
 

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Cais dos náufragos imaginários


Voltarei

Um dia

A este porto de náufragos imaginários,

Venderam os ossos à escuridão

Trocaram a alegria pela tristeza…

E parecem tão felizes como eu,

Desenho-os na minha mão

Enquanto lá fora

Lágrimas em papel caiem sobre a calçada íngreme da solidão,

Sofro

E tenho medo da paixão,

Voltarei

Um dia

A este porto de náufragos encalhados na fina insónia do corpo,

Saberei porque durmo nesta cama de água salgada…

Saberei porque vivo nesta roldana enferrujada pelas nuvens da manhã,

Ao acordar,

Não estás,

Pertences aos ventos do Tejo…

Entre um beijo de despedida

E petroleiros acorrentados aos jardins de Belém,

Voltarei

Um dia

E este porto…


Sem ninguém,

Voltarei

Um dia

Sem saber o significado de regressar aos teus braços,

Esqueci o odor do teu perfume,

Esqueci a fúria do teu ciúme…

E esqueci a janela do teu olhar

Diluída numa folha amarrotada pelas montanhas da saudade…

Voltarei

Um dia

A este porto de náufragos...

Sem remetente,

Ausente de ti.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 18 de Agosto de 2015

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Cartas não escritas…


O pecado que o amor confere à paixão

Impregnado numa imagem sem som

Dactilografada

Nos teus dedos

À tua boca

A minha boca

O barro incendiado pela alegria das campânulas de luz

Nu

O corpo

Seduz

O corpo seduz a alegria do poeta

Fugir não adianta

 

Não há sítio onde me possa esconder

Nu

O corpo

Seduz

Os homens

Tombando numa parada militar imaginada

Pelo silêncio da tua pele

O sangue fervilha na ribeira ardósia das cansadas sestas

Dentro de casa

O nome gravado na parede da sala

A falsidade manhã

Em despedida

 

Até mais… meu amor

O Tejo embriagado nas tuas sílabas de medo

Belém na minha algibeira

Tormentosa

E vazia

(as gajas não querem gajos tesos)

Eu sei

Meu amor

Que tínhamos encerrado as janelas do prazer

O café esperava-nos

E nunca percebi o teu cheiro

Cheiravas a incenso

 

Alguns livros

E àquele sorriso de inocência

Depois

A tempestade

A chuva disfarçada de má sorte

(as gajas não querem gajos tesos)

Eu sei

Meu amor

No eterno cemitério da fantasia

Sinto-o quando recordo a tua morte

E visito a tua lápide

Meu amor

 

Sem palavras

Fotografia

Esquecida entre uma cruz em madeira

Cabras

O pasto cinzento dos teus gemidos

Ele

Alicerçava-se aos carris do inferno

Beijavam-se

E extinguia-se o dia no sótão da literatura

Sabes

Meu amor?

Cansei-me das tuas cartas não escritas…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 16 de Abril de 2015

domingo, 12 de abril de 2015

As lagartas da insónia


Sinto-te

Nesta jangada invisível

Do sofrimento

O cansaço

À palavra

Na tua mão

Entre cidades

Rios

Pontes

Os olhos

Fundeados nos rochedos da solidão

O prateado silêncio


Nas paredes do sono

O poema inventado

Pela árvore adormecida da tristeza

Sinto-te misturada nas ardósias tardes de Primavera

Não chove

Há nos teus lábios

O sorriso do luar

E os sonhos

Do mar

Lá longe

Perdido

Nos sofridos barcos de esferovite

Os peixes e as gaivotas

Poisadas no teu corpo

Alimentado pelo meu olhar

Voas

Foges

Levantas-te de madrugada

E regressas ao endereço desconhecido

Devolvida por endereço insuficiente

A noite

E

As estrelas de papel

Sinto-te

Nas arcadas manhãs em liberdade

Sinto-te nas sanzalas esquecidas

Sobrevoando o capim da memória

A casa distante dos teus braços

As janelas do teu cabelo

Sós

Nós

Entre socalcos

E

E marfim

Ao pequeno-almoço

Sinto-te

Nos horários ensanguentados do pêndulo amortecido

Uma lagarta de aço

Em curvilíneas convulsões

O medo

O amor aprisionado ao medo

De partir

Regressar

Sem bagagem

Sós

Numa eira sem asas

Esperando o acordar das estátuas

As lagartas da insónia

Os muros amarelos de um triste Calçada

O estuário dos teus seios contra as marés de prata

Sinto-te

E sinto-te nas páginas em branco

Do ciúme

Teu

Amanhã

Sinto-te

Sentir-te

Nos lençóis da paixão

Como sentia em criança os palhaços nas mangueiras do meu quintal…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 12 de Abril de 2015

Ouves-me Meu amor?


Ouves-me

Meu amor?

Os pássaros e as flores

Têm sonhos…

Amam

São amados

Brincam nas calçadas de luz

Recheadas de flores

E promessas

A vida parece-me um cadáver

Ensanguentado

Tão frio

Meu amor

Tão frio…

O teu corpo imaginado

Que só o espelho do meu quarto

Consegue projectar

No teu olhar

Flácidas manhãs

Meu amor

Canções de cansaço

Descendo a Calçada da Ajuda

Tropeçava em ti

Meu amor

E caia junto ao rio

Completamente

Meu amor

Embriagado pelas palavras do teu silêncio

Adormecido

Tristes

Ausências

Sem

O destino

O menino

Dos calções

Galgando marés de inferno

Ao pequeno-almoço

Torradas

Leite

Café

O barco

Cambaleando na solidão do vazio

Demoradas veias de argamassa

As construções erguiam-se até a Céu

Sentia todas as manhãs

O cheiro das palavras

Tão frias

Como o teu corpo

Meu amor

Do mármore cancerígeno

O teu sorriso vestido de esperança

O dia estava tórrido

E

Tombava no pavimento das lágrimas

A parada

Uma velha espingarda

Meu amor

Os pássaros e as flores

Sonham?

Amam?

Se apaixonam

Como

Nós

Meu amor?

Como sei se me amas

Se ouves todos os dias os meus poemas

Embalsamados nas ruelas da Ajuda

O frio

Teu

Corpo

Em viagem

Em gravitação

Os lençóis impregnados de desejos

Rodas dentadas

E parafusos

Os moldes

E as equações

Embrulhadas no cemitério da vaidade

Meu amor

A vida

Depois

Da morte

A vida depois da morte?

Acreditas?

Meu amor…

Os guindastes das dores de cabeça

As guitarras brincando numa eira

Longe

De ti

Que

Não

Sei

Se

Existes

Existes

Meu amor?

Como será a alvorada em Marte

Meu amor!

Descia

Descia

E

Tu

Subias

Subias

Descia

Acordava em Cais do Sodré

Trazia uma lápide de sono

Na testa

Amo-te

Ouvia-se dos paralelepípedos da razão

Os uivos do cão

Havia sempre um gajo pronto a engatar

E outro

Meu amor

E outro sempre pronto para ser engatado

Os beijos

Meu amor

Subíamos a Calçada até às cinco da madrugada

Descíamos até ao Tejo

Tu

Suicidavas-te

Depois

Eu

A olhar-te

Como hoje

Sem ninguém…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 12 de Abril de 2015