no
rochedo da saudade vive o teu meu coração repatriado
escondíamo-nos do amanhecer quando todas as estrelas cessavam de brilhar
quando sentia o teu sorriso no espelho da paixão
comestíveis beijos insufláveis desciam das árvores em solidão
no rochedo da saudade
vivia
amava
e comestíveis beijos com esqueletos de prata
no rochedo da saudade vive o teu meu cansaço
quando tínhamos noites intermináveis sentados num banco de jardim
conversávamos sobre tudo e sobre nada
e sentia o brilho do teu olhar
como uma donzela tela
pincelada com acrílicas cores
depois tínhamos a sombra dos plátanos
de livro na mão
liam-nos poemas
escrevíamos-lhes poemas
sentados num banco de jardim...
e imaginávamos à nossa frente o palpitar do rio furioso por ter perdido o mar
víamos veleiros pintados na claridade da aurora boreal em comestíveis chamas de
suor
liam-nos poemas
escondidos caracteres minúsculos sobejavam das rosas de papel
e diziam-nos que a lua amava o silêncio
como nós
um piano vadio brincava no soalho da biblioteca
e tínhamos acabado de regressar das montanhas alicerçadas às gaivotas
desgovernadas
sentadas
como nós
num simples banco em madeira
e liam-nos poemas
e escrevíamos-lhes poemas como se fossem migalhas de pão depois do
pequeno-almoço...
não acordávamos porque a noite embriagava-nos com palavras
textos
e comestíveis beijos
e poemas
por comestíveis pinceladas acrílicas saborosas que os teus lábios iluminavam
e víamos o rochedo da saudade
chorar
e pigmentos sólidos de vento balançavam nos teus cabelos de limalha
incandescente...
não sabíamos que existia a teoria da relatividade
e desconhecíamos a trigonometria
pensávamos que os círculos eram mulheres deitadas
nuas
sobre a geométrica cama com lençóis de porcelana
e lá
no teu peito
os rochedos da saudade vomitando cinza de velhos cigarros como poemas
envenenados pelo ciúme...
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Outubro/2017