quinta-feira, 26 de junho de 2014

Espelhos desventrados


Porque teimas em silenciar-me,
se amanhã não existo...

Porque não percebes que o meu corpo são pedacinhos de xisto,
milímetros de muro com sorriso para o rio,
porque dizes que as minhas palavras são cadáveres em movimento,
cabelos enrolados no vento,
esperando o acordar da madrugada,
espelhos esmigalhados com mãos de amar, espelhos... espelhos apodrecidos na calçada,

Espelhos desventrados,
esperando que a janela da insónia se abra,
e... e entre a claridade nos teus lábios,

Porque teimas em silenciar-me,
se amanhã não existo...

Se amanhã sou espuma,
cansaço,
e... e mar,
porque amanhã os pedacinhos de xisto que habitam no meu corpo...
são... migalhas,
pó,

Nada...
agulhas,

E... e não me esperes mais,
porque os muros... porque os muros depois de morrerem...
jamais renascerão para o teu desejo de me cansar,

Nada...
agulhas,

Se amanhã sou espuma,
cansaço,
e... e mar,

Se amanhã sou... se amanhã sou o teu amante disfarçado de luar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 26 de Junho de 2014

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Projecto de Livro (Ficção)

Noites de Mim – Francisco Luís Fontinha

Desejo não desejando


Desejo o coração de arroz doce que habita em ti,
desejo-te sabendo que é impossível desejar-te,
amo-te sabendo que...
é impossível amar-te,
acaricio-te sem te acariciar,
poema vagabundo,
texto de ficção não revisto,
palavras,
palavras de vidro espetadas nas tuas pálpebras de azoto,
desejo o coração, aquele que está encerrado na caixinha de vinil,
transparente como as lágrimas do luar,
perdidamente triste esperando o sol junto ao leito do rio,

Desejo não desejando,

Desejo o teu coração como desejo os versos de uma canção,
melódica,
poética...
apaixonada pelo agreste amanhecer dos dias sem madrugada,

Desejo não desejando,
desejar que me desejes, desejar que amanhã um relógio de pulso se canse,
e grite...
morra o tédio,

Desejo não desejando,

O coração de arroz doce que habita em ti,
os pedacinhos de saudade que voam sobre o Tejo adormecido,
desejo todas as pedras da calçada,
aquela..., aquela onde andei perdido,
desesperado,
quando cambaleava ao som de uma prostituta sem nome,
deitava-se e..., desejava-te não o sabendo,
havia lâmpadas no teu olhar,
havia livros nos teus braços,
nos seios teus de encantar...
Desejo não desejando,
que um dia apareças... apareças sem me avisar.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 25 de Junho de 2014

terça-feira, 24 de junho de 2014

ADEUS, ADEUS... ADEUS!


Este caixote que me enforca,
estas lâminas invisíveis consumidas pelo fogo,
a entranharem-se neste corpo amorfo,
e sinto os espelhos que habitam no meu cabelo a comerem as vozes da noite,
este caixote é uma prisão com grades de granito,
e dentro de mim, solta-se o grito,
uma revolta a alicerçar-se no luar,
antes da insónia abrir a janela dos sonhos,

Este caixote disfarçado de beijo,
estes tentáculos enrolados no meu pescoço,
que... que não me deixam respirar,
comer...
ou fumar,

Este caixote construído de sombras,
esta garganta iluminada pelos sons das melódicas cigarras,
este estúpido caixote, este parvalhão sorriso a escorrer calçada abaixo...

E... e acaba por morrer no mar,
este caixote de amar,
que me enforca, que me seduz... e ao mesmo tempo... e ao mesmo tempo me enlouquece,
como uma criança sem pátria,
como uma árvore sem terra,
sol...
este caixote que me enforca,
e escreve no meu corpo...

ADEUS, ADEUS... ADEUS!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 24 de Junho de 2014

Montes cinzentos...!


Porque me inquietas, sorriso lapidado dos montes cinzentos...!
sinto o abstracto silêncio navegar na tua pérola mão,
despeço-me da fogueira em solidão..., com aplausos, com... com infinitos beijos,
absorvo-te com a esponja do meu coração,
mas... mas... não sei que dia é hoje,
mas... mas não sei em que ano nasceste,
… e morreste,
montes cinzentos,

Porque me inquietas...

Noites ínfimas com sabor a desejo,
páginas muitas, algumas, algumas... sem palavras,
inquietas-me,
e foges como as amendoeiras em flor,

Porque teimas em desenhar no meu corpo borboletas,
e pássaros de papel...!
inquietas-me, tanto, tanto... tanto que tu me inquietas,
depois de descer o cortinado nocturno da dor,
depois de acordarem todos os marinheiros com odor a sabão...
inquietas-me,
e... e foges,
foges para os montes cinzentos.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 24 de Junho de 2014

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Três incógnitas e um corpo


Tens um X no espelho dos teus lábios,
há um Y no centro do teu peito, deslocando-se em pequeníssimos milímetros,
ora para a direita, ora para a esquerda,
depois, mais abaixo, no teu umbigo... o desgraçado Z, desnorteado, sem saber o que fazer,
como eu, um corpo deambulando entre a raiz quadrada da solidão,
e uma mísera folha quadriculada, feia, e abandonada,
gravitando em volta dos teus seios,
procuro-me nos três ponto algures no espaço do teu desejo,
peço-te um beijo,
e tu, tu respondes-me com uma equação sem solução,
e obrigas-me a rotações ímpares, sem local para aportar,
como os barcos recheados de quadriláteros,

O meu corpo ancora no Z que adormece no teu umbigo,
transforma-se em três eixos, sinto-me tridimensional, raivoso, animal,
esqueço as palavras, esqueço as equações...

(Impossível de resolver)

Lá fora chove,
e hoje o vento entristece as três incógnitas do teu esqueleto com odor a noite sem nome,
há um perfume em ti que me diz... (hoje não o conseguirás),
e não,
desisto desta equação,
desgraçado, eu, eu que não percebo o significado da matriz amar,
talvez transposta,
talvez... talvez mal-disposta,

(Impossível de resolver)

Escrevo números no teu olhar,
silencio-me quando de ti uma parábola acabada de nascer voa como uma gaivota sobre o mar,
os resultados começam a aparecer nas tuas mãos...
o X é igual a paixão...
o Y é igual a cansaço, porque desenhar-te... cansa, Ai como cansa!
e o Z é igual a amor sem saída, rua encerrada, edifício sem transeuntes...

(Impossível de resolver)?

Não,

A equação do teu corpo... tem solução...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 23 de Junho de 2014

domingo, 22 de junho de 2014

horrível... que és


deixas-me nervoso
odeio-te
canso-me das tuas palavras
e do teu sorriso

(horrível... que és)

não percebes que tenho asas
que sei voar...
que tenho sonhos
sonhos de amar...
cansas-me
e odeio-te...
e o teu sorriso
parece uma charrua a entranhar-se na terra agreste
miúdo burra
miúda... miúda sangria
cansas-me
e odeio-te... e odeio-te poesia

(horrível... que és)

insossa
ignóbil
estúpida

burraaaaaaaaaaaaaaaa....
deixas-me nervoso
odeio-te
canso-me das tuas palavras
e do teu sorriso
canso-me da tua rua
dos teus gritos enquanto voo sobre o planalto cinzento
fumo um cigarro
fumo...
recomeço
nada exijo
porque te odeio poesia

(horrível... que és).


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 22 de Junho de 2014