terça-feira, 17 de junho de 2014

Os sarcófagos semáforos de aço


A terra fértil arrebata-se nos meus ossos de vidro,
sou forçado a fugir deste esconderijo de granito, e vadio,
tratam-me como um esqueleto de adorno, à mercê dos olhares felinos da montanha escuridão,
à noite, poucas vezes, desce a mim o silêncio frio,
encurralado num velho muro em xisto laminado,
a terra... cobre-me,
ninguém me apanha, pensava eu, quando ainda havia estrelas no teu olhar...
mas... puro engano, o amor não se esconde, o amor liberta-se das profundas águas que tens nos teus lábios, um deserto utópico, infinito...
e cansado de viver nas imagens a preto-e-branco,
haverá vida nas tuas mãos?
E à terra o que pertence à terra,
os teus cíclicos beijos de amanhecer doentio, invisíveis... travestidos de cidade iluminada,

(às vezes, poucas, acredito que és a madrugada)

Um holofote de néon poisa nos teus seios de menina mimada,
pareces distante, enferma, pareces... as flores depois de lapidadas,
como os diamantes que escondem as tuas lágrimas...

(o papel-químico transforma-se em almoço, lanche e jantar...)

E vives,
e sonhas...
E... e morres nas almofadas da tempestade,

A terra fértil arrebata-se nos meus ossos de vidro,
dizem que sou o mendigo rico, dizem que sou o cadáver apetecido pelos bichos dos sarcófagos semáforos de aço,
(E vives,
e sonhas...
E... e morres nas almofadas da tempestade)
não existem palavras, frases, sons, em ti, em mim... no próximo luar,
e não existe um ontem que eu te possa recordar...
ninguém à minha espera quando regresso das tuas coxas,
solitário, amargurado... perdido... grito; FODA-SE O VERBO AMAR!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 17 de Junho de 2014

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Lanternas cinzentas


Há silêncios que lutam enquanto dormes, e sonhas,
há mãos que se cruzam, mãos que rezam...
há silêncios que tu não entendes,
palavras escritas na escuridão,
há silêncios que labutam, que gritam... que morrem...

Há cabelos que se despedem do amanhecer,
cabelos brancos, cabelos frágeis, e mãos que rezam,
há silêncios que não te esquecem,
que nunca te ignoram,
cabelos loucos, cabelos que namoram,

Há...
talvez...
um poemário à tua espera,

Há silêncios dentro do teu armário,
e crucifixos embrulhados em cinzentas pálpebras,
há as tuas palavras,
que acredito, não acredito...

Mas que tento acreditar!
Há luzes que brilham, luzes que são engolidas por embarcações enjoadas,
lágrimas, e tristes madrugadas,
poesia, poesia... nos teus cabelos suicidados...
há silêncios...

E... e adormecidos soldados.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 16 de Junho de 2014

domingo, 15 de junho de 2014

O vazio

foto de: Stéphane Spatafora Photographe

O vazio,
e falsas esperanças mergulhadas no buraco da solidão,
o vazio que se traveste de dor, o silêncio que embrulha o sofrimento,
este rio que são as tuas mãos, perdidas no musseque anónimo da paixão,
as crianças saltam até agarrarem as flores que habitam o tecto da noite,
vazio, sisudo... sentido proibido de amar,
o vazio imprevisto, descontínuo... o vazio agreste dos olhos da estátua de granito,
há sombras que embriagam os teus seios de porcelana e eles, eles a construir sorrisos desde...

(desde o último luar)

O amor,
também ele, vazio,
pobre,
ângulo obtuso quando alimentado pelo púbis da madrugada,

(hoje não corações, hoje não beijos – a esplanada recheada de vampiros)

O vazio,
homem rude, homem dos sete ofícios, o homem mendigo que descobriu a falsa esperança,
o fantasma,
o vazio dos telhados que a cidade ignora, despreza, que a cidade... não quer,

Que cidade é esta?

Vazia,
sem pessoas, sem imagens, sem..., sem nuvens,
o sombreiro carnívoro que devora todas as palavras que a tua pele transpira,
gotículas de poesia descendo o teu corpo, até que a falsa esperança ilumina o teu cabelo,
e sei que deixou de viver,
hoje... nada, a cidade provocadora, a cidade dos teus suspiros,
uma porta que se encerra, e morre, e levita,
a lanterna do Adeus, sempre acesa, sempre pronta a suicidar-te com os beijos de alvenaria cansada,

(hoje, hoje não)

Que cidade é esta?

(desde o último luar)

Que deixei de amar a espuma dos espelhos de amanhecer,
e sem o perceber,
descobri que a falsa esperança... que deixei de amar, não existe mais,
o vazio, o vazio corpo da sílaba encarnada...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 15 de Junho de 2014

sábado, 14 de junho de 2014

Gaivota “AMAR”

(para Oumara Moctar Bambino)


Não me encontro neste labirinto de palavras,
precisava de uma lanterna invisível, pequeníssima e frágil,
uma lanterna que me guiasse quando viajo nos olhos de gaivota “AMAR”,
perco-me, desejo-me e desejo-te, quando te transformas em mar, e eu,
e eu, eu me transformo em neblina sem som, em carcaça encalhada...
não me encontro, não, não existe no teu sorriso uma canção,
(oiço o Oumara Moctar Bambino)
(Feliz porque o oiço)

Não me encontro e perco-me nos teus lábios, meu Amor sonâmbulo,
sou um ponto algures no espaço, em rotação,
sei que das tuas lágrimas crescem gaivotas de “AMAR”,
gaivotas lindíssimas, gaivotas com sabor a mel,
gaivotas..., gaivotas de papel,
como silêncios embebidos nas nocturnas madrugadas sem nome,

Insignificantes, estes braços que te abraçam,
estes olhos que te absorvem como as tempestades de paixão,
sou quase engolido pelo teu coração,
feliz... feliz porque o oiço, porque... porque a música dele é poema vadio, é poema rebelde,
porque o oiço, porque a sua música me provoca uma translação,
e voo, e voo... até aos sonhos do Tejo,
não me encontro, não tenho medo das tuas coxas quando ele entra em nós, e somos dois pássaros em suspensão, brincando nos lençóis da tua pele, e voo...
até me cansar,
e voo... voo para te encontrar,
gaivota, minha gaivota de “AMAR”
minha gaivota com sabor a Aurora Boreal...
… minha gaivota irreal,

(oiço o Oumara Moctar Bambino)
(Feliz porque o oiço)

Não me encontro, e só te observo em sonho,
imagem transparente dos espelhos embriagados,
não, não me encontro, não... não no centro das palavras,
objectos, cacos, cacos e carcaças apodrecidas...
e esqueletos doirados das tardes intermináveis,
tardes em que o teu corpo era poesia...

POESIA NUA DESPIDA... POESIA, POESIA EM DESPEDIDA.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 14 de Junho de 2014

sexta-feira, 13 de junho de 2014

O esconderijo da Lua


Toco-te,
estilhaças-te como o espelho da velha cristaleira,
depois, depois entra o mar nas tuas veis de nylon,
toco-te, e finjo ser um barco esquecido nas tuas mãos,
em silêncio, em silêncio para que ninguém perceba que no meu corpo habitam porcelanas em cacos,
alguns sons metálicos, melódicos, alguns... alguns ciclónicos ventos,
perguntas-me como é o amanhecer quando lá longe a Lua se esconde na montanha do desejo,
e eu, eu sem jeito, não sei responder,
entretenho-me a construir beijos num velho muro em xisto,
preguiçosos,
doentes,
toco-te e sinto, a claridade do teu olhar a entrar na caverna do Adeus,

(Ai como eu sofro...! Oiço-o enquanto alicerço as minhas pernas ao cansaço)

Querias o amor, e eu, eu dei-te o amor...
daí sobejaram os segmentos de recta da tua boca,
e deixaste alguns círculos de chapa nos cortinados da madrugada,

(Ai...! Oiço-o...)

E deixei de o ouvir,
afogou-se num poço de luz,
e...
e reapareceu quando um menino de bibe descobriu que existia noite depois do dia,
toco-te, e estilhaças-te nas escadas sem rumo,
desgovernadas,
loucas, loucas e apaixonadas...
Consegues imaginar a paixão de uma escada?
Claro que não, claro que não...
dizes-me,
que... que as escadas não se apaixonam,
que as pedras, os cacos de porcelana... nunca existiram,

(Ai como eu sofro! Oiço-o... na sua voz roufenha... São pássaros, menino, são pássaros... pássaros de cristal)

O caraças

Toco-te e finges orgasmos de coloridas flores,
toco-te, toco-te e... estilhaças-te como o espelho da velha cristaleira,
morres,
desapareces no interior da alvenaria ensonada,
lá fora, nada, nem uma locomotiva para te recordar,
um rio, um Cacilheiro embriagado, nada...
lá fora, toco-te,
toco-te e acordo...

Ai... ai como eu sofro, menino! Não..., não tenho sorte nenhuma.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 13 de Junho de 2014

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada

foto de: A&M ART and Photos

Não acredito nos teus cabelos, são voláteis, são versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada,

Um dia, qualquer dia, todas as árvores do meu jardim se transformarão em desejo,
das suas folhas, cairão palavras,
coisas,
pedras,
cabelos, vidraças... todas... estilhaçadas,

Todas perfumadas,
não acredito, e tenho medo à noite vestida de insónia,
todas elas, todas mesmo..., um dia, qualquer dia..., cairão na tua mão,
como granizo envenenado pelo silêncio dos teus beijos,
como barcos defuntos no cemitério do prazer,

Não acredito nos teus cabelos,
e quando sinto a presença do teu corpo, percebo que não existe corpo,
apenas uma montanha de sombras,
apenas..., e nada mais do que isso, porque, porque tu nunca tiveste corpo,
porque..., porque tu não existes!

Se não existes,
se não tens corpo...
como poderás ter beijos em silêncio..., como?

Ah... e a tua boca?
Sem palavras, sem lábios, sem... sem comestíveis corações de papel,
ao jantar,
uma colher de sopa misturada com algumas insignificantes carícias...
e..., e uma flor semeada no teu ventre de cristal,

(Não acredito nos teus cabelos, são voláteis, são versos de amor encurralados numa vidraça estilhaçada)

Tínhamos cartas que os anos 90 engoliram numa tarde de Agosto,
nas folhas apenas alguns desenhos,
um alucinante odor a paixão,
e..., e tudo se perdeu, e tudo... tudo mesmo, morreu numa noite de Novembro...
Viva a solidão! Viva esta vida sem vida... Viva, vivendo, sem cartas com odor a “paixão”,

(ouvem-se sílabas de areias no teu olhar)

E a luz da minha biblioteca, ténue como as minhas mãos, despede-se de mim com um sorriso de incenso.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 12 de Junho de 2014