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foto: A&M ART and Photos
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Escondes-te do mar, dentro do mar, existe à tua
volta um túnel hiperbólico, ausente do vento de nordeste,
escavam-se na rocha as palavras por dizer, proibidas, emagrecidas,
escondes-te e desces e desces e desces,
dentro do meu corpo,
Sou o teu hospedeiro, o eterno viajante, sem
bagagem, sem luvas, e na algibeira, poucas, as migalhas de sílabas
para matar a saudade de escrever, quando a vontade há muito foi
embora, agora, ficou, tu, a ausência de pessoas, de beijos, a
ausência de calendários, como que existissem nas paredes em ruínas
das almas que vagueiam pela cidade, corações, amor, desilusão,
poucas vezes me confesso no espelho junto ao contentor de lixo, uma
vezes cheio, outras, ultimamente, vazio, penumbro, escuro, e fundo,
peço um copo com água e açúcar, fico estável,
não saudável, hirto, consigo caminhar sobre a espuma nocturna dos
desejos masculinos, pensões de vinte e cinco euros, escadas em
madeira, terceiros andares, quartos andares, pessimamente, os sótãos,
difíceis para quem sofre do reumático, e quando se alcança a
janela que dá para um telhado de oxigénio, existo, perco o pouco
fôlego e desisto quando percebo que todos os corpos são corpos,
apenas carne, ossos, e desejos, e dos tais beijos, desisto, perco-me,
subo e subo e subo... até abraçar o teu corpo infinito enrolado em
rectas paralelas e círculos de luz, tenho olhos verdes, e tu
dizes-me que sou tímido, não sei, talvez, a primeira vez senti um
frio na espinha, quando percebi que o comboio vinha na minha
direcção, acordei repentinamente, interrompi o sonho, e até hoje,
procuro-o... apaixonei-me por ele, e pelas loucas locomotivas com
paragem em Cais do Sodré, um dia, eu, percebi que quase morrias nas
minhas mãos, apenas porque tinhas esquecido de encerrar os
cortinados de lona dentro do caixote de madeira, subo, subo até
dizer chega, por hoje, baste de sacrifícios, de loucuras, de tesões
sem palavras, nada
Entre nós,
o mundo acabou?
E sempre me respondeste que o mundo não acaba,
nunca, eterno, efémero, como as gargantas dos espelhos saltitando
das roseiras metáforas que a tua boca transpira,
acabou, terminaram as filmagens das últimas cenas,
o eterno fim quando lá do cimo, víamos, abraçados, mão com mão,
lábio com lábio, o recomeçar de um novo mundo, novas carruagens,
novos viajantes, estes, sem bagagem, sem papeis de parede nos
quartos, e que melhor quarto para dois, três ou... quatro, amantes,
do que uma parede em gesso forrada com frestas, um crucifixo sobre a
cabeceira, duas almofadas perfumadas com picos de bafio e hálito a
teia de aranha, a chuinga colada sobre a mesa-de-cabeceira, e os teus
gemidos travestidos de noite
Vagueando eu,
sobre os jardins inconsolado da marginal, sóbrios,
eu, débil e triste, a tua partida em partida, os pedaços da tua
pele sobre o meu peito cansado, recordando cigarros e imaginando, um
dia, ser também como tu,
Filho da noite, sou, comíamos, bebíamos...
vagabundo tu,
O mundo acabou?
eu, débil e triste, a tua partida em partida, os
pedaços da tua pele sobre o meu peito cansado, recordando cigarros e
imaginando, um dia, ser também como tu, uma mala de viagem dançando
de mão em mão, dormindo de quarto em quarto, não ter dono, não
ser de ninguém, caminhar e subir, caminhar e subir, e subir... e
caminhar sobre as tuas nádegas de areia,
O mundo acabou? Filho da noite, sou, comíamos,
bebíamos...
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha