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sexta-feira, 28 de julho de 2023

Dois morcões

 

Não vou falar mais contigo sobre a tristeza

Já estamos todos numa outra Galáxia

Não vou falar mais contigo sobre o vento

Sobre as acácias da minha infância

Não me importo

Olha

Sabes

Onde descobri que não estou louco

Não?

Não pai

Cansado

Muito cansado diz o nosso amigo

 

Não vou falar mais contigo sobre o AL Berto que às vezes te lia

E a mãe achava mais piada de que tu

Como sempre

 

Não vou falar mais contigo sobre a tristeza

Sobre a pedra cinzenta onde me sento

E escondo

O meu mar

Não falar mais contigo sobre os meus desenhos

Porque não me apetece

Porque não quero falar mais contigo sobre a tristeza

 

Não vou falar mais contigo sobre as fotografias que herdei de ti

E eu que sou poeta

Não tive nem um terço das donzelas que tu tiveste

E no entanto

E, no entanto, parecias um morcão

E quando estávamos juntos

Éramos dois morcões…

Dois morcões que eram apaixonados pela noite

E pelas mãos e pelos lábios

Da noite.

 

 

 

28/07/2023

Luís

domingo, 23 de julho de 2023

Abraço

 Podemos ter tudo

Quando não temos nada

Para alguns

O tudo é tudo

Para mim…

O tudo…

É um simples abraço.

 

Podemos ter cansaço

Tristeza vestida de cansaço

Podemos tudo

Quando não temos nada

Para alguns

O tudo é tudo

Para mim…

O tudo…

É o nada.

 

 

23/07/2023

sexta-feira, 21 de julho de 2023

Oito anos

 Por esta altura, conversávamos,

Tu,

Embrulhado na morfina,

Eu,

Eu embrulhado na tristeza.

Tu mentias-me,

E eu,

E eu mentia-te.

Tirando isso,

Conversávamos,

Tu dizias-me que já não podias ouvir os pássaros,

Eu levantava-me,

Às vezes,

Às vezes tropeçava num círculo de cansaço, e mandava calar os pássaros,

Ficavas tão feliz, quando deixavas de ouvir os pássaros!

 

Sentava-me, irritava-me, irritava-me ouvir os teus gemidos,

Levanta-me,

Vinha à rua,

Fumava um charro,

Pensava…

Em que pensava eu…

Voltava a entrar, sendo eu ateu, rezava…

Rezava para quando entrasse no quarto onde estavas…

Eu,

Eu não chorasse,

 

E Deus cumpriu.

(Deus é fixe).

 

Por esta altura, conversávamos…

De que conservávamos nós afinal…

Coisas simples,

Falavas do vento,

Dizias-me que para a semana já estarias em casa,

E eu,

Que sim, pois claro,

Sabendo tu que era mentira,

Sabendo eu,

Que não era a verdade;

Mesmo assim, não mentiste.

Menos de uma semana estavas em casa…

 

Oito anos, e conversávamos.

De que conversávamos, pai…

Começo a ficar esquecido,

Quase não me lembro das nossas conversas,

Conversávamos,

Tu embrulhado na morfina,

Eu enganando a tristeza com um charro e dois ou três maços de cigarros…

E lia-te poesia,

Lia-te AL Berto,

E acho que gostavas,

Tu sorris,

Eu sorria,

 

E às vezes,

E às vezes desenhava uma lágrima invisível…

Que apenas eu sabia as suas coordenadas para mais tarde a localizar…

 

Depois,

Depois conversávamos,

De quê, pai,

De que conversávamos nós…

Do tempo,

De nós,

Sei lá, pai,

Conversávamos,

Para te alegrar, sabendo que gostavas de pássaros,

Vestia-me de pássaro,

Desenhava danças esquisitas em teu redor,

Dava-te um beijo…

E escondia-me na sombra das mangueiras.

 

Conversávamos, de quê…

E o quê.

Oito anos, por esta altura, conversávamos.

Eu escrevia-te cartas,

Fingia que estava em Lisboa,

Tu com a pedra que estavas…

Acreditavas,

E sorrias,

Como uma criança sentada num baloiço.

 

E conversávamos, pai, de quê,

O quê.

Conversávamos,

Às vezes,

Às vezes desmaiava,

Mais tarde,

Acordava num outro quarto, numa outra pensão…

E dou conta que não era o teu corpo,

Naquela cama,

Mas sim…

O corpo de uma mulher,

Ela, sela sorria-me,

E tu,

Ausente num outro corpo,

Sorrias, também.

Depois gritava por ajuda,

E percebia que afinal…

Todo o teu silêncio…

Devia-se ao descanso, enquanto a morfina escrevia no teu rosto

O último poema da tarde,

Eu sorria-te,

E tu,

Em silêncio; sonhavas.

 

Acordava a noite em ti,

Dentro de mim, perdi a conta às noites,

Aos dias…

Tanto faz, como diz o AL Berto,

(as calças que me deram hão-de ajustar-se ao meu corpo)

Pura verdade, pai,

E de quê,

Conversávamos nós,

Enquanto eu e tu olhávamos o Mussulo,

Pegavas na minha mão…

E voávamos…

E voávamos, pai.

 

Por esta altura, conversávamos,

Tu,

Embrulhado na morfina,

Eu,

Eu embrulhado na tristeza.

Tu mentias-me,

E eu,

E eu mentia-te.

Tirando isso,

Conversávamos,

 

Num dos poucos momentos da tua lucidez,

Confessei-te que estava a ler o último livro do Lobo Antunes,

Olhaste-me,

Sorriste-me,

E disseste-me que em breve ficaria maluco,

Depois,

Fechaste os olhos,

Gesticulavas qualquer coisas com as mãos…

E voavas,

Voavas,

Depois,

Depois aterravas num aeródromo qualquer,

Sem vigia,

Próximo do mar;

Pegavas-me na mão…

E confessavas-me que dentro do mar…

Que dentro do mar moram os sonhos.

 

E conversávamos,

De quê,

E o quê,

Talvez…

O pequeno silêncio…

Disfarçado de gente,

Tanta,

Que mente,

Eu mentia-te,

Tu,

Tu mentias-me.

(e éramos tão felizes, dentro daquele quarto)

 

 

 

21/07/2023

Francisco Luís Fontinha

Gaivotas

 Gaivotas tristes,

Tristes num Tejo sem ninguém,

Ausente,

Sem gente,

Gaivotas tristes,

Cacilheiros enjoados,

Às vezes,

Em círculos de sono,

E desaparecem no pôr-do-sol.

 

Gaivotas tristes,

Triste num Tejo sem ninguém,

Que espera o vento,

Que antecipa o regresso da noite,

E da noite erguem-se as primeiras balas de alegria…

Dum Tejo sem ninguém,

Com gaivotas tristes,

Tristes gaivotas,

Perdidas durante o dia,

Na ânsia que um beijo em poesia…

Atravesse o Tejo,

O Tejo sem ninguém,

Ausente,

Sem gente.

 

Gaivotas tristes,

Tristes num Tejo sem ninguém,

Frio e escuro,

Sem estrelas e sem luar,

Gaivotas tristes,

Tristes a gaivotas que não sabem voar.

 

 

 

21/07/2023

Francisco

quarta-feira, 19 de julho de 2023

Machimbombo de esperança

 Somos o quê, pai,

Morremos de quê, pai,

Somos o que nos vestem,

E do pouco que sobra, o quê, pai,

Quando um machimbombo de esperança brincava no teu olhar,

E de quê,

Somos o quê, pai,

Somos a Lentidão de Kundera?

Ou a piquena dos chocolates…

Do poema A Tabacaria do senhor Álvaro de Campos,

E de quê, pai,

Os chocolates.

 

No entanto,

Eu,

Tu,

Ele,

Ela,

Nós…

Todos mentíamos,

Tu mentias-me,

Eu mentia-te,

Ela desconfiava,

Menos uma mentira,

 

E o quê, pai,

O que somos, pai,

Somos o pão,

Somos o poema,

Somos a poesia,

E, no entanto,

Eu mentia-te…

E tu tinhas a perfeita consciência que estavas a ser aldrabado,

O teu filho, malabarista, artista e poeta…

Inventava estórias no teu sorriso,

Falso sorriso,

E depois,

E de quê, pai,

E esqueci-me do perfume das tuas acácias…

 

Somos o quê, pai,

Somos átomos que pensam,

Átomos que amam,

Que morrem…

E nascem,

E de quê, pai, o que somos, pai,

Depois, durante a noite, desenhava o teu cabelo, com o meu olhar…

E era lindo…!

Eu ficava esquecido numa cadeira fantasma,

Mais cansado do que tu, pois tu estavas com uma grande pedrada de morfina, e feliz,

Tu falavas-me de pássaros,

Eu, inventava pássaros,

Perguntavas-me se era dia,

Noite…

Depois arrependias-te…

Deixa lá, tanto faz… não tenho pressa,

 

Nem eu, o quê, tinha pressa,

De quê, pai, o quê…

Que somos.

 

 

19/07/2023

terça-feira, 11 de julho de 2023

Nuvens em teu cabelo

 Não fiques triste,

Se o dia acordou cansado,

Não fiques triste,

Se as nuvens poisarem em teu cabelo,

Não fiques triste,

Quando nos teus olhos crescerem lágrimas…

Não fiques triste,

Não fiques triste,

Se a tua manhã está ensonada,

Não fiques triste…

Porque um dia,

Um dia terás o Sol em tua casa.

 

 

quinta-feira, 6 de julho de 2023

Floresta

 

Escondo-me na floresta dos silêncios

Onde aprisiono as palavras da madrugada,

Levito pelas sombras em silêncio

Que brincam nesta floresta

Como uma árvore cansada…

Em busca do pôr-do-sol,

 

Encosto-me às sombras do silêncio

E procuro a solidão da noite,

E procuro a minha alma

Que vendi noutros tempos…

A um triste caixeiro-viajante,

 

Escondo-me na floresta da tristeza

Nas garras de um prometido luar…

Enquanto uma estrela cinzenta,

Em lágrimas…

Procura no silêncio onde me escondo,

Desta floresta dos silêncios…

As tristes minhas madrugadas,

 

Escondo-me dos dias,

Das horas dos dias…

E que a morte regresse…

Para levar para longe,

Este poeta que há em mim…

E todos os poemas que escrevi…

Acreditando

Que da floresta dos silêncios

Um dia… um dia nascerá a saudade,

 

E quando o poeta morrer,

Se Deus quiser que seja breve…

Na floresta dos silêncios

Ficarão as minhas palavras,

E um pedacinho do mar que tanto amei…

E que antes de morrer…

Prometo odiar

E inventar nestas árvores invisíveis…

O sonho de uma criança,

No sonho das lágrimas que a insónia transforma em poesia.

 

 

 

 

06/07/2023

Francisco

quarta-feira, 5 de julho de 2023

Círculo

 Dentro deste pequenino círculo,

Sinto-me uma estrela em autodestruição…

Aprisionado,

Acorrentado…

 

Dentro deste pequenino círculo,

Sinto o meu corpo minguar…

Até que um dia,

Quando acordar,

Serei apenas uma sombra;

Uma sombra nos braços do mar,

 

Dentro deste pequenino círculo,

Que dorme na lareira da tristeza…

Pareço o poeta enforcado…

Na solidão e na incerteza…

 

 

 

05/07/2023

Bragança

terça-feira, 4 de julho de 2023

Estranha forma de amar

 

Quando me baptizaram

Uma maluca qualquer

Que certamente já morreu

Felizmente,

Pegou-me ao colo

Deitou-me no altar de Nossa Senhora de qualquer coisa…

E comecei a desenhar círculos rodando sobre mim próprio,

Depois…

Concluiu…

O menino tem a vida cortada;

Logo aí…, não gostei.

 

Anos mais tarde

Sentado sobre esta triste pedra cinzenta

Acredito que sou telecomando por um ser estranho

Que me ama muito

Que me deseja muito

E acima de tudo…

Não quer a minha morte…

O prazer desse ser estranho

É…

É ver-me sofrer;

Dia após dia…

Noite após noite.

 

E se eu tivesse sido amigo do Pacheco

E se o Pacheco estivesse vivo…

Provavelmente eu seria o maior filho da puta que ele conhecia…

Para realçar a esse ser estranho…

Que…

Tudo aquilo que faça…

Nunca

Nunca fará com que eu desista

Porque vou ser

Porque vou ser o maior filho da puta que possa existir...

E já agora….

Odeio-te ser estranho.

 

 

 

04/07/2023

sábado, 1 de julho de 2023

Beijo

 Peço ao teu sorriso de mármore envergonhado

Que escreva na palma da minha mão

Uma palavra,

Peço aos teus olhos de fogueira envenenada

Que escrevam na palma da minha mão

Uma palavra,

Peço aos teus lábios de mel…

Que não escrevam na palma da minha mão…

Uma palavra,

Peço aos teus lábios de mel…

Apenas um beijo

Um beijo na palama da minha mão.

 

 

 

01/07/2023

Francisco

O poeta da desgraça

 Querem lá saber do coitadinho

Do triste coitado

Do louco

Que de tudo

Tem pouco,

 

Querem lá saber das estrelas

Quando o tolo

Do coitadinho

Desenha sorrisos de lama

Nas mãos da madrugada,

 

Coitado dele…

Coitado

Do triste coitadinho

Do coitadinho

Coitado

Aqui… aqui deitado,

 

Coitado

Do triste coitadinho

Do poeta da desgraça

Que espera o comboio no apeadeiro

Que não passa

Com rumo a Santa Apolónia,

 

Coitado

Dele

Do coitadinho

Do minguo poeta sem destino

Coitadinho

Do coitado

Deste pobre menino…

 

 

 

1/7/2023

sábado, 17 de junho de 2023

Amanhã

 

Não sei, meu amor,

Não sei se amanhã vou acordar…

Não sei se alguém,

Não sei,

Se alguém um dia…

Se alguém um dia terá coragem para me recordar,

 

Não sei, meu amor,

Não sei de que servem as noites de luar…

Quando as noites são frias,

Quando a noite se veste de inferno…

E os dias…

E os dias parecem não terminar.

 

 

Luís

17/06/2923