terça-feira, 25 de junho de 2013
segunda-feira, 24 de junho de 2013
Como será o Outono?
foto: A&M ART and Photos
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Fazes sentido depois de rasurada, destruída, tu,
uma apenas folha de papel, sem nada a tapar-te o corpo desnudo, de
pele flácida, como a madrugada, como o amanhecer, antes de acordarem
as palavras, e de te vestires convenientemente para saíres à rua?
Pergunto-me
Pergunto-te camuflada dentro das gavetas da minha
velha secretária, em alguns pontos dela, o caruncho a procurar-te, e
não te encontra, abro-lhe as gavetas, a primeira, a seguir, a
última... e tu, tu não estás presente, apenas uma fina poeira...
Fazes sentido viveres em mim? Tu? Folha de papel
amarotada, esquecida, às vezes, amachucada e deitada no caixote de
rede entrelaçada, claro que não meu querido, claro que não, nunca
serás o que eu fui, e nunca foste o que eu serei, depois, depois de
partirem as andorinhas, depois caírem todas as folhas das árvores
da nossa terra (será que ainda temos terra?), não sei... eu não
tenho a certeza de ter uma Pátria única, una, sinto-me a tua folha
de papel, rasurada, destruída, amachucada... nas tuas mãos, quando
começa a noite e me tocas na face oculta, escondida, como as sombras
dos candeeiros de naftalina, procuro-me dentro das tuas gavetas,
encontro bugigangas, coisas mais parecendo objectos adquiridos por ti
quando visitavas a Feira da Ladra, e nada trazias dentro de ti, e
nada existia entre nós, eu, uma simples folha de papel, e tu, uma
doce e bela caneta de tinta permanente,
Pergunto-me
Como será o Outono?
Gostava de ser como tu, não me preocupar com as
palavras, não me preocupar com a saudade, o amor e a paixão,
desistir de ti, ser apenas eu, uma caneta, uma triste caneta, sem
letras, tinta, solitária como as janelas viradas para o quintal onde
habitam roseiras, cravos e hortelã... o aroma do pericão, e a
tranquilidade da tarde quando sinto que tu desististe de mim e te
lanças, ao caixote de rede entrelaçada, amachucada, rasurada,
triste, branca, branca... como a lua acordada em noites de luar,
gostava de ser como tu, não saber ler, escrever, contar, um dois
três quatro cem quinhentos, ser um andante na algibeira dos
mendigos, e pergunto-me?
Valeria a pena?
Claro que não, claro que sim, não sei, talvez,
Como será o Outono de amanhã?
Talvez, não o sei, e não fazes sentido depois de
rasurada, amachucada, depois de amarrotada, feita um bola, lançada à
lareira, como fazíamos aos cortinados na casa de Favarrel, depois,
depois..., valeria a pena escrever em ti? Não, claro que não...,
talvez, amanhã, talvez ontem, talvez nunca, claro, percebo
perfeitamente,
Tu, uma simples folha de papel,
Eu, uma triste caneta de tinta permanente...
Não, não quero, não preciso... das tuas flores.
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Pedes-me “silêncio” e eu escrevo “silêncio” nos teus lábios de noite
foto: A&M ART and Photos
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Sombras de ti dentro do espelho cansado
em mim
saboreando livros invisíveis com odor
a melancolia
um espaço vazio sombrio e escuro
entranha-se-te fazendo em ti a
escultura linear da insónia
pedes-me “silêncio” e eu escrevo
“silêncio” nos teus lábios de noite vaiada pela lua imaginária,
Pedes-me “amor”
e eu não sei escrever “amor” no
teu corpo tridimensional vagueando pelo espaço-tempo
e buracos de minhoca
invento-te nas paredes do fazedor de
versos
um transeunte doente com palavras
apodrecidas,
Malcriado inocente nas bocas verticais
de um triângulo rectângulo
pedes-me para escrever “hipotenusa”
nos olhos do tua tangente
perco-me de ti
e não escrevo “hipotenusa” junto
ao cateto das tuas coxas de cristal
escrevo-a no seno da tua saudade...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
domingo, 23 de junho de 2013
Tenho-os dentro do meu esqueleto os antigos panfletos manuscritos, rasurados, nojentos, tenho-os, mesmo antes do nascimento do amor
foto: A&M ART and Photos
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Sinto-me como um panfleto manuscrito, rasurado em
determinados centímetros quadrados de área, sinto-me uma pulga
vagueando no interior do pêlo fiel amigo meu canino, escondo-me das
luzes, escondo-me dos paralelos desconformados, defeituosos,
alicerçados a um passado que nunca, nunca existiu em mim um mar
verdadeiro, silencioso, com ondas coloridas, calmas, docemente
cinzentas como as flores do teu olhar, sento-me e esqueço-me da tua
existência como mulher, criança, menina mimada, sempre em revolta,
a brincar, às vezes, dentro da minha oca cabeça, recheada, a minha
oca cabeça, com papel de parede floreado, que me servirá para
alimentar o medo do quarto onde me deixam adormecer, deixavam? Também
o desconheço, o ignoro, penso nas mãos dele e tenho-lhes medo, medo
de ser acariciado como uma rosa quando acorda no jardim em desejados
corações de incenso,
Tenho-os dentro do meu esqueleto os antigos
panfletos manuscritos, rasurados, nojentos, tenho-os, mesmo antes do
nascimento do amor, em mim, recordo a primeira paixão, talvez fosse
o mar, o meu primeiro amor, ou... as mangueiras, ou... o meu fiel
amigo chapelhudo, ou o abraço do velho Domingos quando regressava a
casa, abria-me os braços... e eu, entrava dentro dele, até ao dia
seguinte, até ser novamente manhã,
Lembro-me das tuas carícias, recordas-me tu em
apenas três imagens, três simples desenhos inventados por ti numa
noite de desenhos com literatura e vodka, ouvíamos “Dire Straits”
sentados numas cadeira com uma estrutura flácida, como o sexo em
noites de embriaguez, deitavas a cabeça no meu ombro, e voávamos
sobre um Lisboa acabada de descobri, eu imaginava-te dançando sobre
uma mesa num bar em Cais do Sodré, tu, não me imaginavas mas sabias
que eu era um panfleto manuscrito, rasurado, como a montanha quando
nascem os pássaros e a olham pela primeira vez, sorriem e
exclamam...
Amo-o,
As tintas alimentava-te,
Amo-a,
Também, vestia-se de tela, e do corpo cresciam
raízes pedestais em cúbicas cidades de areia, dançávamos como se
não existissem madrugadas de poesia, como se não existissem rosas
no jardim do amanhecer para alimentar-te os lábios pincelados de
encarnado sangue, fluidos derramavam-se-te como espelhos em
pedacinhos de luz, que reflectiam nos tectos das noites ausentadas, e
percebia-se figuras não geométricas nos teus lençóis de insónia,
Hoje,
Amo-o,
As tintas alimentava-te,
Amo-a, o cansaço equacionado em triplas integrais
numa ardósia junto à pastelaria onde comíamos os fabulosos pasteis
de nata, Belém, a nossa casa, um relvado infinito de sombras, de
braços entre beijos e sonhos, as árvores despiam-se e deitavam-se
connosco, éramos muitos, muitas, o quê?
Amo-o, dizias-me tu enquanto te masturbavas no
espelho invisível da noite, e no entanto, reconhecia os meus
desenhos no teu corpo bronzeado, escuro, como os livros acabados de
arder sobre as tuas coxas de silício, e ias à janela, e
desaparecias como desaparece o fumo dos cigarros que hoje não
fumo...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
O homem de papel
foto: A&M ART and Photos
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Tão só como as andorinhas em papel
que brincam na tua mão exagerada
as migalhas do xisto mendigo correndo
montanha abaixo
e depois
as carícias que a tua pele de neblina
inventam no meu corpo de Primavera,
Vejo a névoa que os teus olhos
alimentam à roldana das horas
voando entre finas esparsas manhãs com
chocolate em pó...
dos ponteiros do meu relógio sem pulso
uma deslumbrante doentia pulsação
esmorecendo nos finais de tarde
e entra-me o rio no meu corpo de
madeira,
Encharca-me o peito
e sinto a inundação do meu coração...
coitado
… à deriva como uma barcaça
perdendo as letras do nome
em cada esquina da cidade com as
sombras árvores em silêncios nocturnos
e eram assim os meus dias aprisionado
em ti não o sabendo,
Em mim perdido como um charco de lama
derretido no musseque da lentidão
desce a noite
cobrem-se-me as pálpebras com as
palavras de ti
vagueando no cansaço espelho do
guarda-fato o meu destino imaginário
….............
tão só,
tão só,
As andorinhas em papel ardendo na
lareira dos teus seios
submersos no meu peito
se ainda o tenho
porque não o sinto
porque... também eu transformei-me em
homem de papel...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
sábado, 22 de junho de 2013
Lábios de cereja
foto: A&M ART and Photos
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Trazias-me os solstícios dentro da
boca em lábios de cereja
tão doce e bela
a cereja envenenada pelo silêncio de
ti procurando pedaços de mar
em marés enroladas livremente no teu
pulso acorrentado ao meu indesejado
coração de fina areia em pálpebras
de cristal,
Sei que te transformas em luz
e te perdes nas imagens nocturnas das
fotografias sem versos
quando te envio versos ao domicílio
esquecendo-em que vives em mim
não me pertencendo... porque voas como
os pássaros e és de papel,
Apenas sinto o teu corpo na distância
de um milímetro linear
ao fundo da calçada
o rio
e a destreza das tuas lâminas faciais
com pergaminhos bolor
e uma flor passeia-se na palma da tua
mão,
Beija-me como te imploro dos desenhos
nas paredes invisíveis que dividem
os dias e os beijos infinitos
à janela de ti as coisas orgânicas
transformadas em húmus beleza
que sobeja da tua pele derramada canção
em pétala madrugada
poisava-te a mão se tu existisses em
mim como eu existo de ti,
Trazias-me os... em lábios de cereja
sentavas-te no meu colo e pacientemente
afagava-te o loiro cabelo em pincéis
de veludo
corrigindo rugas imaginárias da tua
inexistente bronzeada caligrafia
sobre o teu seio socalco em círculos
dentro do Tejo teu púbis...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
sexta-feira, 21 de junho de 2013
O colorido poema tridimensional submerso sobre a falsa areia
foto: A&M ART and Photos
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Praia, mar, sol... poesia, corpo, poético entre os
raios coloridos do nocturno desejo, o colorido poema fantasiado de
arraial círculo que em noites de Verão rompem na aldeia como
lâmpadas sobre o tecto silêncio da pele saboreada pelas sombras de
mim,
Louco, ele, ela, as coisas compostas e as não
compostas,
O colorido poema tridimensional submerso sobre a
falsa areia, as conchas de plasticina alicerçam-se aos tentáculos
da solidão, há uma mulher em fuga, esconde-se debaixo da palmeira
do largo S. João, ouvem-se ainda réstias de migalhas que sobejam da
boca dos pássaros esfomeados, transformados em lenços de papel, da
algibeira, a mulher em fuga, guarda uma chave, e não sabe, e nunca
conseguirá saber... que porta se abrirá...
De entra, poderá ser uma porta de saída, dizem-me
que todas as portas servem para entrarmos, e sairmos, ou para alguns
se suicidarem, conforme o meu vizinho do rés-do-chão direito,
coisas tão simples, que nós, às vezes, os vizinhos, complicamos,
com a amizade, me despeço de ti até sempre, e nunca
Nunca mais apareceu junto aos arbustos onde existia
um granítico banco com escotilha para o Tejo, livrai-nos senhor
destes abutres esganiçados pela carne apodrecida, esperando as
árvores tombarem, ainda vivas, correndo pelos corredores da insónia,
Tenho a fome do prazer entre palavras e cristais
líquidos, transparentes como a pele escaldante da musa inspiradora,
sobre o sofá, de livro na mão e ouvido encostado à parede de
gesso, do outro lado, dois corpos transpiram, desejam-se, e ouvem-se
os gemidos do cansaço, um, dentro do outro, como o cimento cola a
suspender azulejos brancos numa parede enferrujada de um velho
cacilheiro, havíamos de descobrir o silêncio enquanto fazíamos
amor
Foram as suas últimas palavras antes de descobrir
que a caixa em madeira onde dormia, não era um quarto a sério como
o da prima Augusta, mas sim, e só, a caixa de fósforos do tio
Augusto, coincidência, hoje percebemos que nas equações
diferenciais existem beijos disfarçados de loucos corpos, tórridos,
de loucas, sebentas com capa de cabedal, e o amor, fazíamos-lo junto
às prateleiras que hoje, quase todas, vazias, mortas, e nunca mais
senti durante a noite aqueles passos trôpegos sobre o meu tecto, e
nunca mais ouvi o telintar dos talheres esquecidos dentro de pratos
em falsa porcelana, faiança milagrosa que serviu para sobrevivermos
durante alguns meses, e nunca mais, senti, o clique... do interruptor
da sala de jantar,
E assim, deixamos de ouvir o raiar da noite,
E quando se enfureciam, elas, entravam-nos pela
janela como se fazia nas ruas antes de acordar o Verão, puxávamos
os lençóis da neblina e começávamos a sonhar com poesia
dissimulada em corpos tórridos...
Sem nuvens,
E assim, deixamos de ouvir o raiar da noite, sem
nuvens, como dizíamos, azulejos brancos numa parede enferrujada de
um velho cacilheiro, havíamos de descobrir o silêncio enquanto
fazíamos amor...
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
quinta-feira, 20 de junho de 2013
Suspenso numa árvore de cartolina colorida
foto: A&M ART and Photos
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Tudo é tão pouco dentro de mim
quando vejo este meu navio enferrujado
mergulhar
suspenso numa árvore de cartolina
colorida
cansado
amargurado porque dizem-lhe que deixou
de haver mar
como o escrevem nas paredes invisíveis
que jamais existirá amor
os homens e as mulheres todos morrerão
todos os barcos se afundarão
e haverá eternamente mar
e amor
palavras e versos sem sentido contra as
nuvens do amanhecer,
Tudo é tão pouco e tão vago
como as ruas triste de uma cidade sem
coração
com todas as janelas enceradas
portões de entrada
sótãos e escadas em madeira
que é tão pouco
dentro de mim
como um rio sem fim
vagueando sobre as oliveiras dos
silêncios
este meu corpo de sílaba adormecida
poisado nu sobre o papel de embrulho
que servirá como teu lençol nos divãs
do desejo...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
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